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A influência do estado nutricional no desempenho escolar

Resumos

OBJETIVO:

analisar a relação entre o estado nutricional e desempenho escolar de crianças do 4º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública de Belo Horizonte assistidas pelo Programa Saúde na Escola.

MÉTODOS:

trata-se de estudo transversal descritivo realizado com 59 estudantes avaliados quanto ao desempenho escolar e estado nutricional por meio do Teste de Desempenho Escolar e do Índice de Massa Corporal por idade - IMC/I, respectivamente. Para entrada, processamento e análise quantitativa dos dados, foi utilizado o SSPS versão 14.0 e para análise antropométrica, o software Who Anthro Plus, versão 1.0.4.

RESULTADOS:

das crianças investigadas, a idade média foi 9,4 anos (±0,85), sendo 34 (57,6%) do gênero masculino. A avaliação antropométrica mostrou que 45 crianças (76,3%) estão eutróficas, uma (1,7%) desnutrida e 13 (22%) com peso acima do esperado, de acordo com os padrões da OMS. O desempenho dos estudantes no TDE prova de escrita foi classificado como inferior (74,6%), médio (15,3%) e superior (10,2%). Na prova de leitura 79,7% obtiveram resultado inferior, 16,9% médio e 3,4% superior e na prova de aritmética 78,0% foram classificados como possuindo desempenho inferior, 16,9% médio e 5,1% superior, respectivamente. Observou-se relação estatisticamente significante entre pior desempenho nas tarefas de escrita e aritmética e o excesso de peso (p< 0,05).

CONCLUSÃO:

o estudo revelou baixo desempenho escolar na maior parte das crianças, sendo que, as crianças acima do peso apresentaram pior resultado nas tarefas de escrita e aritmética.

Fonoaudiologia; Estado Nutricional; Obesidade; Desnutrição; Leitura; Baixo Rendimento Escolar.


PURPOSE:

to analyze the relationship between nutritional status and school performance of children in the 4th year of elementary school of one public school in Belo Horizonte assisted by the School Health Program.

METHODS:

it is cross-sectional descriptive study accomplished with 59 students rated as to the school performance and nutritional status through the School Performance Test and the Body Mass Index by age - BMI / A, respectively. The analysis of the data were performed using the Statistical Package for the Social Sciences, version 14.0 and for the anthropometric analysis the software Who Anthro Plus, version 1.0.4.

RESULTS:

from the researched children, the average age was 9.4 years (±0,85), which 34 (57,6%) male gender. The anthropometric rating revealed that 45 children (76.3%) are eutrophic, one (1.7%) is undernourished and 13 (22%) are weighing more than expected, according to WHO standards. The Student performance in the written test TDE was rated as lower (74.6%), medium (15.3%) andsuperior (10.2%). In the reading test 79.7% achieved lower results, 16.9% medium and 3.4% superior and in the arithmetic test 78.0% were classified as having underperformed, 16.9% medium and 5.1% superior, respectively. It was observed a statistically significance between poorer performance on tasks of writing and arithmetic and overweight (p< 0.05).

CONCLUSION:

the study revealed low school performance in most children, and the children that were overweight had a worse outcome at writing and arithmetic.

Speech; Language and Hearing Sciences; Nutritional Status; Obesity; Malnutrition; Reading; Underachievement


Introdução

A leitura e a escrita são consideradas habilidades fundamentais para a aquisição de conhecimento desde o início de sua aquisição. A evolução do saber tem gerado maior necessidade de leitura, compreensão do texto lido e escrita clara e correta11. Cabral AP, Tavares J. Leitura/compreensão escrita e sucesso acadêmico: um estudo de diagnóstico em quatro universidades portuguesas. Psicologia Escolar e Educacional. 2005;9(2):203-13. sendo que tais atividades estão além do traçar de letras que representam sons e palavras, envolvem ainda extração de informações gráficas sua compreensão e reconstrução do significado22. Tonelotto JMF, Fonseca LC,Tedrus GMSA, Martins SMV, Gibert MAP, Antunes TA, Pensa NAS. Avaliação do desempenho escolar e habilidades básicas de leitura em escolares do ensino fundamental. Aval. psicol. 2005;4(1):33-43..

Apesar da grande importância atribuída à linguagem escrita, um número elevado de crianças sofre devido às dificuldades de aprendizado no período escolar, às quais se relacionam ao baixo desempenho em leitura e escrita, em diferentes graus de duração e intensidade22. Tonelotto JMF, Fonseca LC,Tedrus GMSA, Martins SMV, Gibert MAP, Antunes TA, Pensa NAS. Avaliação do desempenho escolar e habilidades básicas de leitura em escolares do ensino fundamental. Aval. psicol. 2005;4(1):33-43. , 33. Capellini SA, Conrado TLBC. Desempenho de escolares com e sem dificuldades de aprendizagem de ensino particular em habilidade fonológica, nomeação rápida, leitura e escrita. Rev CEFAC. 2009;11(2):183-93.. Neste contexto, profissionais de várias áreas têm realizado estudos sobre o desempenho escolar, buscando analisar a capacidade da criança aprender os conteúdos ministrados22. Tonelotto JMF, Fonseca LC,Tedrus GMSA, Martins SMV, Gibert MAP, Antunes TA, Pensa NAS. Avaliação do desempenho escolar e habilidades básicas de leitura em escolares do ensino fundamental. Aval. psicol. 2005;4(1):33-43. , 44. Brito LO, Ambiel RAM, PAcanaro SV, Grisard E, Alves GAS, Rabelo IS, Rabelo IS, Leme IFAS. Relação das variáveis idade e escolaridade com desempenho escolar de estudantes do ensino fundamental. Aval. Psicol. 2012;11(1):83-93. , 55. Queiroga MSN. O discurso do fracasso escolar na pedagogia crítica. Revista Histedbr. 2010;37:205-19.. Algumas competências ganham destaque e são necessárias para que os processos de aprendizagem ocorram adequadamente22. Tonelotto JMF, Fonseca LC,Tedrus GMSA, Martins SMV, Gibert MAP, Antunes TA, Pensa NAS. Avaliação do desempenho escolar e habilidades básicas de leitura em escolares do ensino fundamental. Aval. psicol. 2005;4(1):33-43..

Dentre os fatores que podem estar relacionados ao desenvolvimento inadequado da leitura e escrita e consequentemente ao baixo desempenho escolar, destacam-se fatores genéticos, hereditários e neurobiológicos; a prematuridade e o baixo peso ao nascimento; alterações no processamento fonológico, visual, de linguagem e auditivo; aspectos psicoemocionais; transtornos do déficit de atenção e hiperatividade66. Siqueira CM, Giannetti JG. Mau desempenho escolar: uma visão atual. Rev Assoc Med Bras. 2011;57(1):78-87.. Além desses, condições pouco estimulantes do ambiente familiar77. Bonamino A, Alves F, Franco C, Cazelli S. Os efeitos das diferentes formas de capital no desempenho escolar: um estudo à luz e de Coleman. Rev Bras Educ. 2010;15(45):487-99., aspectos socioeconômicos77. Bonamino A, Alves F, Franco C, Cazelli S. Os efeitos das diferentes formas de capital no desempenho escolar: um estudo à luz e de Coleman. Rev Bras Educ. 2010;15(45):487-99. , 88. Rodrigues CG, Rios-Neto ELG, Pinto CCX. Diferenças intertemporais na média e distribuição do desempenho escolar no Brasil: o papel do nível socioeconômico, 1997 a 2005. Rev Bras Est Pop. 2011;28(1):5-36. e distúrbios nutricionais99. Brandelero M, Romanholo RA. Avaliação do rendimento escolar em alunos obesos no município de Cacoal/RO. Revista Eletrônica da Facimed. 2011;3(.3):334-43..

Considera-se que o balanceado aporte nutricional é necessário para a execução correta das funções biológicas e sua deficiência ou excesso pode causar alterações que afetam funções cerebrais complexas como os processos cognitivos que envolvem a aprendizagem da leitura e escrita1010. Monteiro CA. Fome, Desnutrição e Pobreza: além da Semântica. Saúde e Sociedade. 2003;12(1):7-11..

Os distúrbios nutricionais são em geral causados por uma alimentação inadequada, podendo a criança estar abaixo ou acima do peso ideal para sua faixa etária. Tais distúrbios trazem maior vulnerabilidade a doenças, devido ao déficit de nutrientes específicos, como por exemplo, o ferro e levam muitas vezes ao absenteísmo escolar e ao atraso de desenvolvimento com relação às demais crianças da própria turma1111. Ministério da Saúde. Caderno de atenção básica: Saúde na escola; 2009.. Outras características observadas nessas crianças são irritabilidade elevada, dificuldade de concentração e baixos níveis de energia99. Brandelero M, Romanholo RA. Avaliação do rendimento escolar em alunos obesos no município de Cacoal/RO. Revista Eletrônica da Facimed. 2011;3(.3):334-43.. A obesidade figura como um distúrbio nutricional e se relaciona a problemas psicossociais, dificuldades comportamentais e nos relacionamentos sociais, familiar e escolar, caracterizando assim, um quadro de depressão, ansiedade e baixo rendimento escolar99. Brandelero M, Romanholo RA. Avaliação do rendimento escolar em alunos obesos no município de Cacoal/RO. Revista Eletrônica da Facimed. 2011;3(.3):334-43.. Da mesma forma, a desnutrição vem sendo associada ao baixo desempenho escolar, podendo em longo prazo reduzir ou até mesmo impedir o pleno desenvolvimento das capacidades do indivíduo, principalmente quando incide no período de crescimento cerebral1212. Schweigert ID, Souza DOG, Perry MLS. Desnutrição, maturação do sistema nervosa central e doenças neuropsiquiátricas. Rev Nutr. 2009;22(2):271-81. , 1313. Benton D, ILSI Europe a.i.s.b.l. The influence of children's diet on their cognition and behavior. Eur J Nutr. 2008;47(suppl 3):25-37. Review..

Este estudo busca analisar a relação entre o estado nutricional e o desempenho escolar de crianças do 4º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública de Belo Horizonte assistidas pelo Programa Saúde na Escola.

Métodos

Pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição, sob protocolo 686/2011.

Trata-se de um estudo transversal descritivo realizado com crianças regularmente matriculadas no 4° ano do Ensino Fundamental de uma escola pública municipal com idade entre 9 e 11 anos, assistidas pelo Programa Saúde na Escola (PSE) do Ministério da Saúde e Ministério da Educação1111. Ministério da Saúde. Caderno de atenção básica: Saúde na escola; 2009..

Inicialmente, os pais das crianças foram esclarecidos quanto aos objetivos e implicações do estudo, e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido autorizando a participação do seu (sua) filho (a) na pesquisa.

Todas as crianças regularmente matriculadas no 4º ano do Ensino Fundamental foram elegíveis para participar do estudo. No entanto, foram excluídos os escolares com perda auditiva, histórico de alteração no desenvolvimento neurológico, e alunos infrequentes.

Os participantes do estudo foram avaliados quanto ao desempenho escolar nos aspectos da leitura, escrita e aritmética e também quanto ao estado nutricional.

Para a realização da avaliação do desempenho escolar foram utilizadas as provas de leitura, escrita e aritmética do Teste de Desempenho Escolar- TDE1414. Stein LM. Teste de Desempenho Escolar; 1994. .O teste de escrita avalia a escrita do nome próprio e de palavras isoladas sob a forma de ditado; o de leitura avalia o reconhecimento de palavras isoladas do contexto e o de aritmética avalia operações matemáticas simples1414. Stein LM. Teste de Desempenho Escolar; 1994.. Esse teste foi aplicado parte em sala de aula (teste de escrita e aritmética) e parte individualmente (teste de leitura). A aplicação do TDE requereu em média 40 minutos em sala de aula, para a parte coletiva, e cinco minutos individualmente. Os resultados foram comparados com a pontuação padrão do teste para escolares da 3ª série (4º ano). Foram considerados os valores de referência do próprio teste e descritos na Figura 1.

Figura 1:
Classificação a partir dos Escores Brutos - 3ª série do TDE nas provas de escrita, aritmética e leitura

Fonte: Teste de Desempenho Escolar. Stein, 1994.

Para avaliação do estado nutricional o peso e a estatura foram aferidos. Tais aferições foram utilizadas juntamente com as informações sobre sexo e idade das crianças para a composição do índice de massa corporal por idade (IMC/I), índice empregado em todas as fases da vida e recomendado internacionalmente no diagnóstico individual e coletivo dos distúrbios nutricionais. Seus valores foram expressos em escore-Z, segundo critérios recomendados pelo Ministério da Saúde1515. PNAN. Classificação do Estado Nutricional (junho de 2009) [cited 2009 4 november]; Available from http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/sisvan_norma_tecnica_criancas.pdf).
http://189.28.128.100/nutricao/docs/gera...
, que estão de acordo com o preconizado pela Organização Mundial de Saúde-OMS1616. The WHO Growth reference data for 5-19 years. WHO, 2007. [cited 2009 2 november]; Available from http://www.who.int/growthref/en/
http://www.who.int/growthref/en/...
.

Os valores de peso e altura foram aferidos pela nutricionista co-autora deste trabalho seguindo as técnicas preconizadas por Jellife1717. Jelliffe DB. The assessment of the nutritional status of the community.Geneva: WHO; 1968.. O peso foi verificado em balança digital, eletrônica com capacidade de 150kg e divisão de 100g (marca Plenna(r)). Durante o procedimento as crianças apresentavam-se com um mínimo de roupas. Todas as crianças foram medidas sem sapatos, com uso de estadiômetro (modelo Altura Exata). Adotou-se a expressão excesso de peso agrupando-se assim as crianças com sobrepeso e obesidade. Para classificação do estado nutricional das crianças, foram considerados os valores de referência descritos na Figura 2.

Figura 2:
Norma técnica para classificação do estado nutricional de crianças de 5 a 10 anos e para adolescentes de 10 a 19 anos

Fonte: WHO 2007

Para entrada, processamento e análise quantitativa dos dados, foi utilizado o programa SSPS versão 14.0 e para a análise antropométrica, o softwareWho Anthro Plus, versão 1.0.4. Os resultados do desempenho no TDE foram comparados aos resultados da avaliação nutricional. Para fins de análise descritiva, foi feita distribuição de frequência das variáveis categóricas envolvidas na avaliação da linguagem em estudo e análise das medidas de tendência central e de dispersão das variáveis contínuas. Foi utilizado o teste Qui-quadrado de Pearson para análise inferencial com nível de significância de 5%.

Resultados

Participaram desse estudo 66 escolares, de ambos os sexos, do 4° ano do Ensino Fundamental de uma escola pública de Belo Horizonte. Destes, um foi excluído por apresentar alteração neurológica, dois por apresentarem perda auditiva e quatro por estarem infrequentes na escola no período de avaliação. Portanto, a amostra final do presente estudo corresponde a 59 crianças.

As crianças apresentaram idade média de 9,4 anos (±0,85), sendo que do total dos escolares avaliados, 34 (57,6%) eram do gênero masculino. Os resultados da avaliação antropométrica mostraram que 45 crianças (76,3%) estavam eutróficas, apenas uma (1,7 %) com peso abaixo do esperado e 13 (22%) acima do peso, sendo 10 e três na faixa de sobrepeso e obesidade respectivamente, de acordo com os padrões da OMS.

O desempenho dos estudantes na prova de escrita do TDE foi classificado como inferior em 74,6%, médio em 15,3% e superior em 10,2% das crianças.Na prova de leitura do TDE, 79,7% obtiveram resultado inferior, 16,9% médio e apenas 3,4% superior enquanto na prova de aritmética 78,0% foram classificados como possuindo desempenho inferior, 16,9% médio e 5,1% superior, respectivamente.

Após a análise dos dados observou-se relação com significância estatística entre pior desempenho nas tarefas de escrita e aritmética e excesso de peso (p< 0,05), conforme demonstrado na Tabela 1.

Tabela 1:
Relação dos resultados das avaliações TDE escrita, leitura, aritmética e estado nutricional de 59 crianças do ensino fundamental

Discussão

Este estudo buscou relacionar estado nutricional e desempenho escolar de crianças do 4º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública de Belo Horizonte assistidas pelo PSE do Ministério da Saúde. Optou-se pela utilização do TDE1414. Stein LM. Teste de Desempenho Escolar; 1994. por ser um teste padronizado e validado, de fácil aplicação e adequado para crianças da faixa etária apresentada. No entanto a padronização desse instrumento de avaliação foi feita com crianças do Sul do país enquanto os alunos pesquisados estão inseridos na realidade da região Sudeste.

No presente estudo, notou-se que a maioria dos estudantes investigados estão eutróficos (76,3%) apresentando conformidade com outras pesquisas realizadas com escolares da mesma faixa etária1818. Pelegrini A, Silva DAS, Petroski EL, Glaner MF. Estado nutricional e fatores associados em escolares domiciliados na área rural e urbana. Rev Nutr. 2010a;23(5):839-46.

19. Pelegrini A, Silva DAS, Petroski EL, Gaya ACA. Sobrepeso e obesidade em escolares brasileiros de sete a nove anos: dados do projeto Esporte Brasil. Rev Paul Pediatr. 2010b;28(3):290-5.
- 2020. Campos LA, Leite AJM, Almeida PC. Nível socioeconômico e sua influência sobre a prevalência de sobrepeso e obesidade em escolares e adolescentes do município de Fortaleza. Rev Nutr. 2006;19(5):531-8.. Sabe-se que o adequado aporte nutricional potencializa o desenvolvimento adequado da criança em suas atividades diárias, visto que a alimentação que não supre ou que excede as necessidades individuais dificulta o bom desempenho das funções biológicas99. Brandelero M, Romanholo RA. Avaliação do rendimento escolar em alunos obesos no município de Cacoal/RO. Revista Eletrônica da Facimed. 2011;3(.3):334-43..

Observou-se, ainda, elevada prevalência de crianças com sobrepeso ou obesidade, resultado esse, que evidencia a transição nutricional pela qual o país tem passado1818. Pelegrini A, Silva DAS, Petroski EL, Glaner MF. Estado nutricional e fatores associados em escolares domiciliados na área rural e urbana. Rev Nutr. 2010a;23(5):839-46.

19. Pelegrini A, Silva DAS, Petroski EL, Gaya ACA. Sobrepeso e obesidade em escolares brasileiros de sete a nove anos: dados do projeto Esporte Brasil. Rev Paul Pediatr. 2010b;28(3):290-5.

20. Campos LA, Leite AJM, Almeida PC. Nível socioeconômico e sua influência sobre a prevalência de sobrepeso e obesidade em escolares e adolescentes do município de Fortaleza. Rev Nutr. 2006;19(5):531-8.
- 2121. Vieira MFA, Araújo CLP, Hallal PC, Madruga SW, Neutzling MB, Matijasevich A, Leal CMA, Menezes AMB. Estado nutricional de escolares de 1a a 4a séries do Ensino Fundamental das escolas urbanas da cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. Cad Saúde Pública. 2008;24(7):1667-74.. Tal processo caracteriza-se por apresentar redução das prevalências dos déficits nutricionais e aumento significante de sobrepeso e obesidade (Ministério da Saúde, 2009), também sendo possível a coexistência de desnutrição, deficiência de micronutrientes e excesso de peso, nas mesmas comunidades ou domicílios1818. Pelegrini A, Silva DAS, Petroski EL, Glaner MF. Estado nutricional e fatores associados em escolares domiciliados na área rural e urbana. Rev Nutr. 2010a;23(5):839-46.. Na amostra investigada encontrou-se apenas uma criança desnutrida, o que pode ser devido a boa qualidade da merenda escolar já que a maioria dos alunos estudam em horário integral e fazem cinco refeições na escola.

Dentre os fatores responsáveis pela mudança do perfil nutricional da população está a alteração no padrão alimentar da sociedade facilitada pelo fácil acesso aos alimentos altamente calóricos e/ou a redução de práticas físicas1111. Ministério da Saúde. Caderno de atenção básica: Saúde na escola; 2009. , 1919. Pelegrini A, Silva DAS, Petroski EL, Gaya ACA. Sobrepeso e obesidade em escolares brasileiros de sete a nove anos: dados do projeto Esporte Brasil. Rev Paul Pediatr. 2010b;28(3):290-5.. Na população brasileira é possível observar um elevado consumo de ácidos graxos saturados, açúcares, produtos industrializados, alimentos ricos em gorduras e guloseimas em detrimento do consumo de legumes, frutas, verduras e carboidratos complexos11, 22.

Possíveis justificativas para alta ocorrência de sobrepeso/obesidade são baixo nível de atividade física, a nutrição inadequada e o período de maturação sexual1919. Pelegrini A, Silva DAS, Petroski EL, Gaya ACA. Sobrepeso e obesidade em escolares brasileiros de sete a nove anos: dados do projeto Esporte Brasil. Rev Paul Pediatr. 2010b;28(3):290-5.. Embora a média de idade das crianças envolvidas esteja abaixo dos 10 anos, época em que normalmente a maturação sexual ainda não se iniciou, há de se considerar essa hipótese, pois a maturação sexual precoce contribui para dobrar a chance de sobrepeso1919. Pelegrini A, Silva DAS, Petroski EL, Gaya ACA. Sobrepeso e obesidade em escolares brasileiros de sete a nove anos: dados do projeto Esporte Brasil. Rev Paul Pediatr. 2010b;28(3):290-5. , 2323. Adair LS, Gordon-Larsen P. Maturational timingand overweight prevalence in US adolescent girls. Am J Public Health. 2001;91(4):642-4.. Além disso, também é nessa fase que ocorre o acúmulo de gordura prévio ao estirão puberal, e o adolescente passa a apresentar grande aquisição pôndero-estatural, ganhando cerca de 50% do seu peso adulto e 20% de sua estatura final2424. Tanner JN. Growth at adolescence with a general consideration of the effects of hereditary and environmental factors upon growth and maturation from birth to maturity.2nd ed. Oxford: Blackwell Scientific Publications; 1962.. Nas meninas, destaca-se ainda que a menarca representa o inicio da desaceleração do crescimento que ocorre no final do estirão puberal, e o maior acúmulo de tecido adiposo2525. Lourenço B, Queiroz LB. Crescimento e desenvolvimento puberal na adolescência. Rev Med.2010;89(2):70-5..

Quanto aos resultados observados no TDE tem-se que o baixo desempenho encontrado está em concordância com o apontado em estudo de crianças do Ensino Fundamental na mesma cidade2626. Pontes VA, Diniz NLF, Martins-Reis VO. Parâmetros e estratégias de leitura e escrita utilizados por crianças de escola pública e privada. REV CEFAC. 2013; No prelo.. No entanto, diferem de forma considerável dos resultados dos estudantes de Porto Alegre, município em que a padronização do TDE foi realizada, o que não pode ser justificado por características regionais dos municípios1414. Stein LM. Teste de Desempenho Escolar; 1994., já que as realidades das localidades citadas anteriormente são semelhantes conforme ilustra o índice de desenvolvimento humano (IDH) de Porto Alegre (0,865) e Belo Horizonte (0,839) 2727. Ranking do IDH dos Municípios do Brasil 2003. PNUD, 2003. [cited 2003]; Available from http://www.pnud.org.br/atlas/ranking/IDH_Municipios_Brasil_2000.
http://www.pnud.org.br/atlas/ranking/IDH...
.

Ao relacionar o estado nutricional ao desempenho escolar, observou-se relação estatisticamente significante entre escrita e excesso de peso, mas não foram encontrados outros estudos que tratem tais variáveis diretamente. O mesmo ocorreu ao relacionar o desempenho escolar no teste de aritmética ao estado nutricional, em que, ficou evidenciado um pior desempenho nos escolares com excesso de peso. Tal achado difere do estudo realizado em estudantes na faixa etária de seis a nove anos, em uma escola particular, o qual não encontrou relação entre estado nutricional e desempenho escolar99. Brandelero M, Romanholo RA. Avaliação do rendimento escolar em alunos obesos no município de Cacoal/RO. Revista Eletrônica da Facimed. 2011;3(.3):334-43..

O pior desempenho dos escolares com excesso de peso nas tarefas citadas anteriormente, pode ser justificado pelo fato do indivíduo em estado de obesidade e sobrepeso realizar menos atividades físicas e ter menos disposição para atividades diárias e aos aspectos emocionais que os envolve99. Brandelero M, Romanholo RA. Avaliação do rendimento escolar em alunos obesos no município de Cacoal/RO. Revista Eletrônica da Facimed. 2011;3(.3):334-43.. Acredita-se que a constante cobrança quanto à aparência e o culto a beleza podem influenciar negativamente o desenvolvimento daqueles que não estão dentro do padrão ideal de beleza, causando, nas crianças, inibição e isolamento. No contexto escolar podem, ainda, gerar dificuldades no desenvolvimento de algumas tarefas devido à vergonha de exposição99. Brandelero M, Romanholo RA. Avaliação do rendimento escolar em alunos obesos no município de Cacoal/RO. Revista Eletrônica da Facimed. 2011;3(.3):334-43.. No entanto, tais justificativas são hipóteses e ainda não existem evidências científicas de tais relações.

Na atual pesquisa os escolares eutróficos, desnutridos, e com excesso de peso não diferiram em relação ao desempenho nas tarefas de leitura. No entanto, a literatura mostra evidências de que os distúrbios nutricionais interferem nas tarefas cognitivas e de linguagem2828. Santos JN, Lemos SMA, Lamounier JA. Estado nutricional e desenvolvimento da linguagem em crianças de uma creche pública. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(4):566-71. , 2929. Sanchez A. Early nutrition and later cognitive achievement in developing countries.UNESCO - United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization; 2009., as quais são precursoras da aquisição da habilidade de leitura.

O estudo confirma a necessidade da existência de políticas de governo que promovam a saúde dos alunos como o Programa Saúde na Escola (PSE), instituído por meio do Decreto Presidencial nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007, resultante do trabalho integrado entre o Ministério da Saúde e o Ministério da Educação e cujo objetivo está em ampliar as ações específicas de saúde aos alunos da rede pública de ensino. Uma das ações previstas pelo PSE visa o acompanhamento e evolução do estado nutricional dos indivíduos da comunidade escolar1111. Ministério da Saúde. Caderno de atenção básica: Saúde na escola; 2009..

A detecção precoce de sobrepeso e obesidade pode facilitar o desenvolvimento de estratégias de saúde pública que tenham por finalidade melhorar a qualidade de vida da população1919. Pelegrini A, Silva DAS, Petroski EL, Gaya ACA. Sobrepeso e obesidade em escolares brasileiros de sete a nove anos: dados do projeto Esporte Brasil. Rev Paul Pediatr. 2010b;28(3):290-5.. No que diz respeito ao desempenho escolar, políticas de governo como essas, possibilitam ações para reduzir/eliminar o mau desempenho, o que é de suma importância, pois crianças com tais dificuldades podem apresentar problemas emocionais levando a repercussões em sua vida individual, familiar, escolar e social66. Siqueira CM, Giannetti JG. Mau desempenho escolar: uma visão atual. Rev Assoc Med Bras. 2011;57(1):78-87..

Os resultados obtidos neste estudo apontam para a necessidade da realização de novas pesquisas a fim de confirmar a relação entre excesso de peso e desempenho escolar. Em decorrência do modelo de estudo adotado, transversal, não foi possível estabelecer uma relação de causalidade das variáveis analisadas. Um estudo longitudinal, no entanto, iria possibilitar um acompanhamento mais proximal das atividades escolares e do estado nutricional, além da identificação deoutros fatores, como o ambiente familiar pouco estimulador e condições socioeconômicas-culturais desfavoráveis, que podem influenciar no desempenho escolar de estudantes. Não foi possível ainda, investigar as crianças em sua vida cotidiana no domicílio e suas relações parentais, condição essa essencial na investigação das causas do baixo rendimento escolar3030. Sawaya SM. Desnutrição e baixo rendimento escolar: contribuições críticas. Estudos Avançados. 2006;20(58):133-46..

Conclusão

Observou-se maior prevalência de excesso de peso em comparação à desnutrição nos escolares do 4º ano do Ensino Fundamental. Obteve-se relação estatisticamente significante entre pior desempenho nas tarefas de escrita e aritmética e o excesso de peso, sugerindo uma interferência negativa do estado nutricional inadequado no desempenho escolar.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2014

Histórico

  • Recebido
    03 Out 2013
  • Aceito
    27 Nov 2013
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