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Prevalência e fatores associados ao colabamento do meato acústico externo entre usuários de um centro de prevenção e reabilitação de deficiências

RESUMO

Objetivo:

investigar a prevalência do colabamento do meato acústico externo quando utilizados fones supra-aurais e verificar se a ocorrência deste evento é influenciada pelos fatores sexo, idade, cor da pele e orelha em abano.

Métodos:

a pesquisa do colabamento foi conduzida de forma padronizada por meio do posicionamento de um coxim avulso, pressionado contra o pavilhão auricular.

Resultados:

participaram do estudo 436 indivíduos, com idade entre 3 e 97 anos. Foi observado colabamento do meato acústico externo em 11,4% dos indivíduos, apresentando-se de forma bilateral em 90,0% dos casos. A prevalência variou de 6,3% a 36,6% entre os grupos etários. Sexo masculino, idade igual ou superior a 65 anos e presença de orelha em abano foram identificados, independentemente, como fatores associados à ocorrência do evento (p<0,05). Apesar da prevalência do colabamento ser maior entre os que referem pele de cor branca, a diferença não foi estatisticamente significante, comparando-se com os não brancos.

Conclusão:

o colabamento do meato acústico externo, quando utilizados fones supra-aurais, é um evento com maior ocorrência entre homens, idosos e aqueles que apresentam orelha em abano. A prevalência do evento nessa população alerta para a necessidade de uma cuidadosa verificação, prévia a qualquer avaliação com fones supra-aurais.

Descritores:
Meato Acústico Externo; Audiometria; Perda Auditiva; Erros de Diagnóstico; Prevalência

ABSTRACT

Purpose:

to investigate the prevalence of the ear canal collapse when using supra-aural earphones and to verify if this event is influenced by sex, age, color of the skin and prominent ear.

Methods:

the collapse was assessed by a visual inspection after the positioning of a detached cushion, pressured against the external ear.

Results:

a total of 436 individuals, aged 3 to 97 years, participated in the study. Ear canal collapse was observed in 11.4% of the subjects, being mostly bilateral (90.0%). The prevalence ranged from 6.3% to 36.6% across age groups. Males, aged 65 years or above and presence of prominent ear were independently identified as associated factors for the occurrence of ear canal collapse (p<0.05). Despite a higher prevalence for those self-identified as white skinned when compared to non-whites, the difference was not statistically significant.

Conclusion:

the ear canal collapse, when supra-aural earphones are used, is more likely to occur in men, in elderly people, and among those with prominent ears. The prevalence of the event in this population raises the necessity of a careful examination, previous to any evaluation using supra-aural earphones.

Keywords:
Ear Canal; Audiometry; Hearing Loss; Diagnostic Errors; Prevalence

Introdução

A avaliação audiológica convencional, apesar dos avanços tecnológicos, permanece como principal exame no conjunto dos testes disponíveis para a avaliação da audição. Embora aparentemente simples, sua realização requer vários cuidados, raciocínio clínico e bom senso na tomada de decisões, evitando assim equívocos nos resultados11. Almeida BP, Menezes PDL, Andrade KCLD, Teixeira CF. Positioning of earphones and variations in auditory thresholds. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81(6):642-6.,22. Zwislocki J, Kruger B, Miller JD, Niemoeller AF, Shaw EA, Studebaker G. Earphones in audiometry. J Acoust Soc Am. 1988;83(4):1688-9.. Um dos principais cuidados refere-se à verificação de um possível colabamento de meato acústico externo (MAE) quando posicionados os fones supra-aurais. Estes fones exercem pressão sobre o pavilhão auricular33. Mello LAD, Silva RAMD, Gil D. Test-retest variability in the pure tone audiometry: comparison between two transducers. Audiol. Commun. Res. 2015;20(3):239-45.

4. Sauer RC, Ford CN. Collapse of the ear canal during masking for bone conduction. Am J Otol. 1986;7(1):51-4.
-55. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: relato de um caso. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 2004;16(1):95-100. que, em certos casos, ao sofrer modificação de sua posição anatômica natural, promove um fechamento do MAE pela aproximação de suas paredes. Este fenômeno provoca uma redução da energia acústica de todos os sons apresentados por via aérea44. Sauer RC, Ford CN. Collapse of the ear canal during masking for bone conduction. Am J Otol. 1986;7(1):51-4.,55. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: relato de um caso. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 2004;16(1):95-100. e, consequentemente, diminui a percepção auditiva, alterando os resultados de testes liminares, como a audiometria tonal44. Sauer RC, Ford CN. Collapse of the ear canal during masking for bone conduction. Am J Otol. 1986;7(1):51-4.

5. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: relato de um caso. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 2004;16(1):95-100.

6. Toniosso S, Redondo MC, Lopes Filho O. Alterações dos limiares auditivos causados pelo colabamento de meato acústico externo. Rev Bras Otolaringol. 2000;66(6):652-8.
-77. Rizo SR. Correcting for ear canal collapse during audiometry. Ear Hear. 1983;4(5):255-7. ou a pesquisa do limiar eletrofisiológico88. Hosford-Dunn H, Runge CA, Hillel A, Johnson SJ. Auditory brain stem response testing in infants with collapsed ear canals. Ear Hear. 1983;4(5):258-60.,99. Hood LJ. Clinical applications of the auditory brainstem response. San Diego: Singular Publishing Group; 1998., assim como de alguns procedimentos supraliminares, como a pesquisa do reflexo acústico contralateral55. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: relato de um caso. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 2004;16(1):95-100.. Especificamente na audiometria tonal liminar, o colabamento do meato acústico externo pode alterar os limiares de via aérea resultando em um falso componente condutivo de perda auditiva, de 5 a 50 dB, atingindo predominantemente as frequências agudas66. Toniosso S, Redondo MC, Lopes Filho O. Alterações dos limiares auditivos causados pelo colabamento de meato acústico externo. Rev Bras Otolaringol. 2000;66(6):652-8.. Os erros no diagnóstico audiológico decorrentes da interferência do colabamento podem ser evitados com a identificação prévia dos casos, permitindo a utilização de técnicas apropriadas que mantêm patente o conduto auditivo55. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: relato de um caso. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 2004;16(1):95-100.,66. Toniosso S, Redondo MC, Lopes Filho O. Alterações dos limiares auditivos causados pelo colabamento de meato acústico externo. Rev Bras Otolaringol. 2000;66(6):652-8.,1010. Jerger J, Jerger S. Colabamento do conduto auditivo externo. In: Jerger J, Jerger S (orgs). Alterações auditivas: um manual para avaliação clínica. Rio de Janeiro: Atheneu; 1989. p. 29-34.

11. Pearlman RC. Preventing collapsed of external auditory meatus during audiometry. Arch Otolaryngol. 1975;101(11):686-8.

12. Frazza MM, Caovilla HH, Munhoz MSL, Silva MLG, Ganança MM. Audiometria tonal e vocal. In: Munhoz MSL, Caovilla HH, Silva MLG, Ganança MM (orgs). Audiologia clínica. São Paulo: Atheneu; 2000. p. 49-71.
-1313. Randolph LJ, Schow RL. Threshold inaccuracies in an elderly clinical population: ear canal collapse as a possible cause. J Speech Hear Res. 1983;26(1):54-8..

Vários estudos indicam os idosos como mais propensos à ocorrência do fenômeno1010. Jerger J, Jerger S. Colabamento do conduto auditivo externo. In: Jerger J, Jerger S (orgs). Alterações auditivas: um manual para avaliação clínica. Rio de Janeiro: Atheneu; 1989. p. 29-34.,1313. Randolph LJ, Schow RL. Threshold inaccuracies in an elderly clinical population: ear canal collapse as a possible cause. J Speech Hear Res. 1983;26(1):54-8.

14. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: ocorrência em pacientes submetidos à avaliação audiológica e otorrinolaringológica no CEDALVI - USP/Bauru. J Bras de Fonoaudiol. 2004;18(5):17-9.

15. Marangoni AT, Scharlach RC, Silveira MRM, Calais LL, Gil D. Insert earphones: application to avoid collapse of the external auditory canal. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2012;17(1):61-5.
-1616. Oda DTM, Marangoni AT, Gil D. Insertion and supra-aural earphones: audiological assessment in the elderly. Rev. CEFAC. 2014;16(1):31-8.. No entanto, o problema também é identificado em outras faixas etárias44. Sauer RC, Ford CN. Collapse of the ear canal during masking for bone conduction. Am J Otol. 1986;7(1):51-4.,55. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: relato de um caso. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 2004;16(1):95-100.,1414. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: ocorrência em pacientes submetidos à avaliação audiológica e otorrinolaringológica no CEDALVI - USP/Bauru. J Bras de Fonoaudiol. 2004;18(5):17-9.,1717. Mohamad A, Algarni M. Bilateral conductive hearing loss due to collapsed ear canals in a 35 years old female. J Otolaryngol ENT Res. 2016;4(4):110.. O colabamento do MAE pela pressão mecânica sobre o pavilhão auricular está relacionado a características anatômicas individuais. Desta forma, a distribuição do evento na população pode ser diferenciada em determinados subgrupos. Este estudo tem como objetivo investigar a prevalência do colabamento do MAE e verificar se a ocorrência deste evento é influenciada pelos fatores sexo, idade, cor da pele e orelha em abano.

Métodos

Esta pesquisa foi analisada e aprovada pelo Comitê de Ética da União Metropolitana de Educação e Cultura - UNIME, sob n° 175006/2005-21. A população do estudo foi composta por todos os indivíduos que compareceram entre fevereiro e maio de 2006, seqüencialmente, ao atendimento agendado para uma das salas de avaliação de um centro estadual de referência para prevenção e reabilitação do portador de deficiência. Eram elegíveis aqueles com idade igual ou superior a três anos, sem restrição ao sexo ou condição auditiva, excluindo-se aqueles que apresentassem obstrução do MAE, afecções ou malformações de orelha externa, com exceção da orelha em abano.

Todos os indivíduos elegíveis que aceitaram participar do estudo, mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, foram submetidos à pesquisa do colabamento, conduzida de forma padronizada por meio do posicionamento de um coxim avulso, Telephonics, modelo 510C017-1, pressionado contra o pavilhão auricular, respeitando-se as condições naturais à rotina da clínica audiológica. O coxim foi posicionado manualmente pelo examinador. O orifício central, espaço correspondente à adaptação do fone, permitia a visualização do comportamento anatômico das paredes do MAE. Foi considerado colabamento quando ocorreu o fechamento completo do meato acústico durante o procedimento. A aproximação das paredes, com redução acentuada da passagem do conduto auditivo, no entanto sem caracterizar oclusão, foi classificado como estreitamento do MAE. Para facilitar a visualização, foi utilizada a fonte luminosa do otoscópio.

As covariáveis do estudo foram o sexo, a idade - categorizada em cinco grupos etários considerando os diferentes ciclos de vida, isto é, crianças (3 a 12 anos), adolescentes e adultos jovens (13 a 39 anos), adultos (40 a 64 anos), e duas categorias entre os idosos (65 a 74; 75 a 97 anos) -, a cor da pele - auto-referida como branca, morena, mulata, negra ou outra, posteriormente classificada em brancos e não brancos -, e a presença da orelha em abano, definida pela observação do examinador - ângulo maior que 30° entre o pavilhão auricular e o crânio, que ocorre devido ao aumento e lateralização da concha e à falta de dobradura adequada da anti-hélix, associadas ou não1818. Ribeiro FQ. Otoplastia: revisão da literatura e descrição de técnica própria. Acta Otorrinolaringol. 2005;23(2):6-14..

Para a análise, foram estimadas as prevalências do colabamento e do estreitamento para a população em estudo, e identificadas as características relativas à lateralidade. A distribuição do evento principal, o colabamento bilateral, foi analisada de acordo com as categorias das covariáveis. A partir dos resultados obtidos considerando os diferentes grupos etários, foi definido um ponto de corte para criação da variável dicotômica, de forma a agregar os primeiros três grupos etários, com prevalência similar, e os dois grupos etários de idosos, os quais se diferenciaram dos demais. Foram comparadas as prevalências entre homens e mulheres, entre os grupos etários, entre brancos e não brancos, e ainda entre aqueles com e sem orelha em abano, estimando-se as correspondentes razões de prevalência (RP). A inferência estatística baseou-se em intervalos de confiança (IC) estimados pelo método de Mantel-Haenszel para um alfa de 0,05. Como dado complementar, foi estimado o p-valor para as diferenças observadas, adotando-se p ≤ 0,05 para consideração da significância estatística. Os dados foram analisados utilizando-se o programa SAS, versão 8.0.

Resultados

A população final do estudo foi composta por 436 indivíduos, com idade entre 3 e 97 anos, média etária de 41,3 anos (DP=24,6), maioria do sexo feminino (59,6%) e não brancos (84,2%). Uma pequena parcela apresentava orelha em abano (2,5%). A prevalência do colabamento bilateral do MAE, nesta população, foi estimada em 10,3%, atingindo 11,4% quando consideradas também as apresentações unilaterais. Dentre os 50 indivíduos com colabamento, 90,0% apresentaram a condição bilateralmente. Todas as apresentações unilaterais ocorreram acompanhadas do estreitamento do MAE contralateral. A condição de estreitamento, por sua vez, foi observada em proporção similar na população (Tabela 1). A ocorrência do evento foi discretamente maior para a orelha direita (11,4%) quando comparada à esquerda (10,3%), sem constituir, contudo, diferença estatisticamente significante.

Tabela 1
Prevalência das condições de colabamento e estreitamento do meato acústico externo, ao serem utilizados fones supra-aurais, observadas na população do estudo (N=436)

Na Figura 1, são apresentadas as prevalências do colabamento bilateral do MAE entre os usuários, de acordo a idade. A ocorrência do colabamento foi estável entre os três primeiros grupos, observando-se aumento da prevalência entre os idosos, especialmente no grupo de idade mais avançada.

Figura 1:
Prevalência do colabamento do meato acústico externo, de acordo com a idade, na população de estudo (N=436)

A prevalência do colabamento do MAE nesta população, de acordo com as categorias das covariáveis, a magnitude da associação (RP) e os respectivos IC 95%, são apresentados na Tabela 2. Sexo masculino, idade igual ou superior a 65 anos e presença de orelha em abano foram identificados como fatores associados à ocorrência do evento. Apesar da prevalência do colabamento ter sido maior entre os usuários que referiram pele de cor branca, a diferença não foi estatisticamente significante, comparando-se com os não brancos.

Tabela 2
Prevalência, razão de prevalência e respectivos intervalos de confiança para a associação entre as covariáveis do estudo e o colabamento do meato acústico externo na população de estudo (N=436)

Discussão

Os resultados deste estudo sugerem maior chance de colabamento do MAE durante procedimentos audiológicos com fones supra-aurais quando os indivíduos avaliados são homens, ou quando têm idade igual ou superior a 65 anos, ou ainda quando apresentam a característica da orelha em abano. Apesar de não ter sido verificada evidência estatística, existe aparente tendência à maior chance do evento também entre brancos comparando-se aos não brancos.

Algumas definições do colabamento de MAE incluem a aproximação das paredes anatômicas mesmo sem o fechamento do canal auditivo44. Sauer RC, Ford CN. Collapse of the ear canal during masking for bone conduction. Am J Otol. 1986;7(1):51-4.,66. Toniosso S, Redondo MC, Lopes Filho O. Alterações dos limiares auditivos causados pelo colabamento de meato acústico externo. Rev Bras Otolaringol. 2000;66(6):652-8.,1010. Jerger J, Jerger S. Colabamento do conduto auditivo externo. In: Jerger J, Jerger S (orgs). Alterações auditivas: um manual para avaliação clínica. Rio de Janeiro: Atheneu; 1989. p. 29-34.,1414. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: ocorrência em pacientes submetidos à avaliação audiológica e otorrinolaringológica no CEDALVI - USP/Bauru. J Bras de Fonoaudiol. 2004;18(5):17-9.. A redução acentuada na passagem aérea do canal, sem oclusão do MAE, foi considerada, neste estudo, como estreitamento. O termo colabamento foi restrito à condição de oclusão total, em concordância com as definições apresentadas por outros autores44. Sauer RC, Ford CN. Collapse of the ear canal during masking for bone conduction. Am J Otol. 1986;7(1):51-4.,1111. Pearlman RC. Preventing collapsed of external auditory meatus during audiometry. Arch Otolaryngol. 1975;101(11):686-8.. Esta opção terminológica sustenta-se na potencial diferença entre as influências de um colabamento e de um estreitamento do MAE nos resultados dos exames audiológicos. Considera-se que a interferência nos resultados, descrita por diversos estudos44. Sauer RC, Ford CN. Collapse of the ear canal during masking for bone conduction. Am J Otol. 1986;7(1):51-4.,77. Rizo SR. Correcting for ear canal collapse during audiometry. Ear Hear. 1983;4(5):255-7.

8. Hosford-Dunn H, Runge CA, Hillel A, Johnson SJ. Auditory brain stem response testing in infants with collapsed ear canals. Ear Hear. 1983;4(5):258-60.
-99. Hood LJ. Clinical applications of the auditory brainstem response. San Diego: Singular Publishing Group; 1998.,1313. Randolph LJ, Schow RL. Threshold inaccuracies in an elderly clinical population: ear canal collapse as a possible cause. J Speech Hear Res. 1983;26(1):54-8.,1717. Mohamad A, Algarni M. Bilateral conductive hearing loss due to collapsed ear canals in a 35 years old female. J Otolaryngol ENT Res. 2016;4(4):110.,1919. Mahoney CF, Luxon LM. Misdiagnosis of hearing loss due to ear canal collapse: a repot of two cases. J Laryngol Otol. 1996;110(6):561-6.,2020. Schow RL, Goldbaum DE. Collapsed ear canals in the elderly nursing home population. J Speech Hear Disord. 1980;45(2):259-67., decorre predominantemente do fenômeno completo, ou seja, do colabamento do MAE. Esse é um tema que deve continuar sendo discutido entre os pares, pois o consenso na definição é essencial para precisão na conduta, que pode ser diferenciada para uma ou outra condição, e em questões operacionais de pesquisa, permitindo maior comparabilidade entre estudos, pela ausência de viés metodológico na definição dos casos.

Assim, a prevalência do colabamento bilateral entre os indivíduos de 3 a 97 anos da população em estudo foi estimada em aproximadamente 10%, e 11% quando considerado o colabamento em pelo menos uma das orelhas. A comparação destes valores com os apresentados por outros estudos fica prejudicada pelas diferenças na constituição etária entre as populações investigadas, visto que a idade pode aumentar ou diminuir significantemente a prevalência1313. Randolph LJ, Schow RL. Threshold inaccuracies in an elderly clinical population: ear canal collapse as a possible cause. J Speech Hear Res. 1983;26(1):54-8.,1414. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: ocorrência em pacientes submetidos à avaliação audiológica e otorrinolaringológica no CEDALVI - USP/Bauru. J Bras de Fonoaudiol. 2004;18(5):17-9.,2020. Schow RL, Goldbaum DE. Collapsed ear canals in the elderly nursing home population. J Speech Hear Disord. 1980;45(2):259-67.. Assim como os demais, este estudo não é representativo da população em geral, tendo como referência a demanda populacional, com queixa auditiva, atendida em uma clínica audiológica.

A condição de estreitamento foi identificada em proporção similar entre os indivíduos avaliados. É possível que casos que apresentem a redução acentuada do canal auditivo, atualmente, possam ter maior chance de apresentar o colabamento com o avanço da idade. Porém, somente estudos longitudinais poderão comprovar esta hipótese.

Quanto à lateralidade, estudos prévios indicam que o colabamento pode ocorrer uni ou bilateralmente1010. Jerger J, Jerger S. Colabamento do conduto auditivo externo. In: Jerger J, Jerger S (orgs). Alterações auditivas: um manual para avaliação clínica. Rio de Janeiro: Atheneu; 1989. p. 29-34.,1414. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: ocorrência em pacientes submetidos à avaliação audiológica e otorrinolaringológica no CEDALVI - USP/Bauru. J Bras de Fonoaudiol. 2004;18(5):17-9., não havendo diferenças que sugiram uma orelha com maior chance de ser afetada66. Toniosso S, Redondo MC, Lopes Filho O. Alterações dos limiares auditivos causados pelo colabamento de meato acústico externo. Rev Bras Otolaringol. 2000;66(6):652-8.. Os resultados do presente estudo são coerentes com as duas afirmações, e deve-se ressaltar que a predominância da apresentação bilateral, identificada em 90% dos casos, e o estreitamente do MAE contralateral, observado na totalidade dos casos unilaterais, servem de alerta ao examinador no momento em que identificar a ocorrência do colabamento na primeira orelha submetida à verificação.

A análise da influência da idade para a ocorrência do colabamento do MAE, nesta população, revelou prevalência similar entre os três grupos etários mais jovens, constituídos por crianças, adolescentes e adultos. No entanto, a magnitude do evento elevou-se progressivamente para os dois grupos de idosos, atingindo mais de um terço dos indivíduos com 75 anos ou mais. Para a análise da associação, foi comparado o grupo de idosos (idade ≥ 65 anos) com o grupo complementar, identificando-se associação positiva estatisticamente significante. A maior chance de ocorrência do colabamento na população idosa corrobora o resultado de diversos estudos1010. Jerger J, Jerger S. Colabamento do conduto auditivo externo. In: Jerger J, Jerger S (orgs). Alterações auditivas: um manual para avaliação clínica. Rio de Janeiro: Atheneu; 1989. p. 29-34.,1313. Randolph LJ, Schow RL. Threshold inaccuracies in an elderly clinical population: ear canal collapse as a possible cause. J Speech Hear Res. 1983;26(1):54-8.

14. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: ocorrência em pacientes submetidos à avaliação audiológica e otorrinolaringológica no CEDALVI - USP/Bauru. J Bras de Fonoaudiol. 2004;18(5):17-9.
-1515. Marangoni AT, Scharlach RC, Silveira MRM, Calais LL, Gil D. Insert earphones: application to avoid collapse of the external auditory canal. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2012;17(1):61-5.,2020. Schow RL, Goldbaum DE. Collapsed ear canals in the elderly nursing home population. J Speech Hear Disord. 1980;45(2):259-67.. A diminuição da elasticidade nos tecidos do canal auditivo externo decorrente de flacidez cutânea e cartilaginosa é uma hipótese explicativa plausível2121. Mitre EI. Aspectos otorrinolaringológicos do idoso. In: Suzuki HS (org). Conhecimentos essenciais para atender bem o paciente idoso. São José dos Campos: Pulso; 2003. p. 20-6.,2222. Silva APR, Blasca WQ, Lauris JRP, Oliveira JRM. Correlation between the characteristics of resonance and aging of the external ear. CoDAS. 2014;26(2):112-6.. Não foi identificada maior prevalência entre as crianças, em contraponto a achados prévios1414. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: ocorrência em pacientes submetidos à avaliação audiológica e otorrinolaringológica no CEDALVI - USP/Bauru. J Bras de Fonoaudiol. 2004;18(5):17-9., o que pode estar relacionado à não inclusão de crianças menores de 3 anos no presente estudo.

Diferentemente dos resultados obtidos por outros autores1313. Randolph LJ, Schow RL. Threshold inaccuracies in an elderly clinical population: ear canal collapse as a possible cause. J Speech Hear Res. 1983;26(1):54-8.,1414. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: ocorrência em pacientes submetidos à avaliação audiológica e otorrinolaringológica no CEDALVI - USP/Bauru. J Bras de Fonoaudiol. 2004;18(5):17-9., que não identificaram diferença na ocorrência do colabamento entre os sexos, este estudo verificou maior prevalência entre os usuários homens, identificada como 2,7 vezes a prevalência encontrada entre as mulheres, em níveis estatisticamente significantes. Em outras palavras, a ocorrência do colabamento no sexo masculino foi 170% maior do que a observada no sexo feminino. A explicação é desconhecida, mas deve estar relacionada a alguma característica anatômica mais comum no sexo masculino. Por exemplo, dos casos com orelha em abano neste estudo, 72,7% eram homens. É possível que os homens apresentem, em geral, maior ângulo entre o pavilhão auricular e o crânio do que as mulheres, mesmo não tão acentuado para ser classificado como alteração.

Apenas 11 indivíduos, neste estudo, apresentaram a característica da orelha em abano. Mesmo assim, foi possível verificar associação estatisticamente significante com o colabamento do MAE, e a razão de prevalência (3,8) demonstra a força desta associação. Deve-se observar que o grupo reduzido na categoria influenciou para uma menor precisão do IC. A maior chance de indivíduos com orelha em abano apresentarem o colabamento também foi relatada em estudo anterior1010. Jerger J, Jerger S. Colabamento do conduto auditivo externo. In: Jerger J, Jerger S (orgs). Alterações auditivas: um manual para avaliação clínica. Rio de Janeiro: Atheneu; 1989. p. 29-34.. Um maior ângulo entre o pavilhão auricular e a cabeça implica em uma modificação mais acentuada da posição anatômica natural do pavilhão quando posicionados os fones supra-aurais, contribuindo para o colabamento do MAE.

Embora a prevalência do evento entre os usuários brancos tenha sido 50% maior do que entre os não brancos, a associação não foi estatisticamente significante, não podendo ser confirmada. É possível que, tanto o dado auto-referido da cor da pele tenha trazido problemas de classificação correta dos indivíduos, quanto a pequena parcela de brancos pode ter influenciado reduzindo o poder da análise. Desta forma, recomenda-se que a hipótese seja investigada em novos estudos conduzidos com parcela mais expressiva de indivíduos de cor branca, e que utilizem como dado complementar a classificação da cor da pele por pessoal treinado. Não foram localizados estudos prévios que analisaram a relação entre a cor da pele e o colabamento do MAE.

Na identificação de uma orelha que potencialmente apresentará colabamento durante procedimento com fones supra-aurais, o uso de um coxim avulso pode ser um facilitador, pela similaridade entre o modo de verificação e o exame propriamente dito. Porém, o evento pode ser facilmente identificado mesmo sem o uso de instrumentos, pressionando-se com os dedos o pavilhão auricular contra o osso mastóideo, sem aplicar força em qualquer outra direção, pois não seria condizente com a característica da pressão exercida pelos fones. É recomendável o uso de uma fonte luminosa, como a do otoscópio, principalmente na verificação da condição em indivíduos de pele escura. Vários estudos descrevem e quantificam a influência do colabamento nos diversos tipos de exames audiológicos e indicam as estratégias para o manejo do problema, evitando-se os erros no diagnóstico audiológico44. Sauer RC, Ford CN. Collapse of the ear canal during masking for bone conduction. Am J Otol. 1986;7(1):51-4.

5. Campos CF, Cruz MS, Feniman MR. Colabamento do meato acústico externo: relato de um caso. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 2004;16(1):95-100.

6. Toniosso S, Redondo MC, Lopes Filho O. Alterações dos limiares auditivos causados pelo colabamento de meato acústico externo. Rev Bras Otolaringol. 2000;66(6):652-8.
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O estudo apresenta vantagens, como a diferenciação na definição operacional de colabamento e estreitamento, o uso do coxim avulso em procedimento padronizado para inspeção visual do MAE, e um tamanho amostral adequado para a análise dos fatores associados ao evento estudado. Entre as limitações da pesquisa, devem ser consideradas, a ausência de um instrumento preciso na classificação da orelha em abano, o que pode ter induzido à subestimação dos casos pela identificação apenas daqueles com a característica mais proeminente; o fato da inspeção visual não ter sido submetida à contraprova de um segundo observador; e o auto-relato da cor da pele, pela subjetividade da informação, embora a identificação pelo entrevistador também fosse sujeita a problemas de classificação. É recomendável que futuros estudos ponderem os itens aqui apresentados, positivos e negativos, como contribuição para o avanço do conhecimento na área.

Conclusão

O estudo apresenta evidências de que o colabamento do MAE, quando utilizados fones supra-aurais, é um evento com maior ocorrência entre homens, entre idosos, e também entre aqueles que apresentam orelha em abano. A menor prevalência estimada nos grupos etários da população estudada sugere que pelo menos um em cada 20 indivíduos possa apresentar esta condição na clínica audiológica. Desta forma, a atenção constante dos profissionais para a possibilidade do colabamento é essencial para serem evitados equívocos no diagnóstico audiológico, que podem derivar, ainda, em subseqüentes condutas inadequadas. Assim, o conhecimento da distribuição do evento nessa população alerta para a necessidade de uma cuidadosa verificação, prévia a qualquer avaliação ou procedimento com fones supra-aurais, em todos os grupos populacionais.

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    Trabalho de conclusão de pós-graduação lato sensu realizado no Curso de Fonoaudiologia da União Metropolitana de Educação e Cultura - UNIME - Lauro de Freitas (BA), Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2017

Histórico

  • Recebido
    18 Jul 2017
  • Aceito
    21 Set 2017
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