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Desempenho em consciência fonológica por crianças com transtorno fonológico: comparação de dois instrumentos

Resumos

OBJETIVO: analisar e comparar o desempenho em consciência fonológica em dois grupos de crianças com transtorno fonológico, sendo um em tratamento fonoaudiológico e outro sem intervenção, a partir de dois instrumentos de avaliação. MÉTODO: amostra de 21 crianças, de ambos os sexos, na faixa etária de 5 anos e 6 meses a 8 anos e 10 meses de idade, com transtorno fonológico. Dez crianças pertenciam ao Grupo 1 que se refere às que não foram submetidas a tratamento fonoaudiológico; e 11 crianças compunham o Grupo 2, correspondente àquelas em intervenção fonoaudiológica por um período superior a 4 meses. Foram utilizados dois instrumentos de avaliação: Perfil de Habilidades Fonológicas (PHF) e Prova de Consciência Fonológica (PCF). RESULTADOS: 85% das crianças do Grupo 1 e Grupo 2 apresentaram desempenho inferior em, pelo menos, um dos dois testes aplicados. O Perfil de Habilidades Fonológicas mostrou alteração de consciência fonológica em 13 (62%) sujeitos e a Prova de Consciência Fonológica em 16 sujeitos (76%), além disso, houve concordância entre os testes em 14 casos (66,7%). Não houve diferença estatisticamente significante comparando os resultados obtidos pelos dois grupos avaliados, tanto pelo PHF quanto pelo PCF de forma global, embora a concordância dos achados ocorreu na maioria dos casos. Porém, considerando as variáveis idade e escolaridade, no PCF constatou-se diferença estatística significante. Os resultados mostraram que há certa variabilidade nos achados obtidos da PCF e do PHF, nas faixas etárias de 5, 6 e 8 anos, enquanto que na faixa etária de 7 anos ambos os instrumentos mostraram-se sensíveis para a detecção da alteração de consciência fonológica e também para o acompanhamento do processo terapêutico. CONCLUSÃO: a maioria das crianças da amostra (85%), independente da terapia fonoaudiológica, apresentou desempenho inferior ao esperado para sua faixa etária em um dos dois instrumentos de avaliação da consciência fonológica, demonstrando a importância da intervenção fonoaudiológica com maior ênfase neste aspecto, já que este irá refletir-se diretamente no processo de alfabetização do indivíduo.

Linguagem Infantil; Distúrbios da Fala; Avaliação; Transtornos da Articulação


PURPOSE: to analyze and compare the performance of phonological awareness in two groups of children with phonological disorder, one in speech therapy and the other without intervention using two instruments of evaluation. METHOD: sample of 21 children, both genders, aged from 5 years and 6 months old to 8 years and 10 months old, with phonological disorder. Ten of these children belonged to Group 1, which includes children who have not undergone speech therapy treatment; and 11 children composed Group 2, corresponding to those in speech therapy intervention for a period longer than 4 months. Two instruments of evaluation were used: Profile of Phonological Abilities and Phonological Awareness Test RESULTS: 85% of the children in Group 1 and Group 2 presented low performance in at least one of the two tests applied. The Profile of Phonological Abilities showed phonological alteration in 13 (62%) subjects and the Phonological Awareness Test in 16 subjects (76%). Moreover, there was consistency between the tests in 14 cases (66.7%). There was no statistically significant difference when we compare the results obtained by the two groups evaluated with phonological disorders for both the PPA and the PAT in general, even though the consistency between the findings happened in the majority of the cases. However, considering the age variables and schooling, in the PAT we found statistically significant difference. The results showed that there is certain variance in the findings obtained of the PPA and the PAT, in the age group of 5, 6 and 8 years old, whereas in the age group of 7 years old both instruments had revealed themselves sensible to the detection of the alteration of phonological awareness and for the follow up of the therapeutical process. CONCLUSION: most children in the sample (85%), independent of speech therapy, showed inferior performance than the expected for their age group in one of two instruments of evaluation, demonstrating the importance of speech therapy with emphasis on this aspect, because this will be reflected directly in the process of literacy of the children.

Child Language; Speech Disorders; Evaluation; Articulation Disorders


Desempenho em consciência fonológica por crianças com transtorno fonológico: comparação de dois instrumentos

Marcela Rosolen StefaniniI; Breila Vilela de OliveiraII; Fabiana Carla MarcelinoIII; Luciana Paula MaximinoIV

IFonoaudióloga; Especializanda do curso de Audiologia Clínica e Educacional do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais - Universidade de São Paulo HRAC-USP, Bauru, SP, Brasil

IIFonoaudióloga; Mestranda em Ciências Biológicas (Genética) pelo Instituto de Biociências de Botucatu da Universidade Estadual Paulista, IBB-UNESP, Botucatu, SP, Brasil

IIIFonoaudióloga; Docente do IESB-Preve; Fonoaudióloga Clínica e Educacional na Escola Criarte, Bauru, SP, Brasil

IVFonoaudióloga; Professora Doutora do Departamento de Fonoaudiologia da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo - FOB-USP, Bauru, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Marcela Rosolen Stefanini Alameda Dr. Octávio Pinheiro Brizola, 7-12 - Cidade Universitária Bauru - SP E-mail: marcelastefanini@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: analisar e comparar o desempenho em consciência fonológica em dois grupos de crianças com transtorno fonológico, sendo um em tratamento fonoaudiológico e outro sem intervenção, a partir de dois instrumentos de avaliação.

MÉTODO: amostra de 21 crianças, de ambos os sexos, na faixa etária de 5 anos e 6 meses a 8 anos e 10 meses de idade, com transtorno fonológico. Dez crianças pertenciam ao Grupo 1 que se refere às que não foram submetidas a tratamento fonoaudiológico; e 11 crianças compunham o Grupo 2, correspondente àquelas em intervenção fonoaudiológica por um período superior a 4 meses. Foram utilizados dois instrumentos de avaliação: Perfil de Habilidades Fonológicas (PHF) e Prova de Consciência Fonológica (PCF).

RESULTADOS: 85% das crianças do Grupo 1 e Grupo 2 apresentaram desempenho inferior em, pelo menos, um dos dois testes aplicados. O Perfil de Habilidades Fonológicas mostrou alteração de consciência fonológica em 13 (62%) sujeitos e a Prova de Consciência Fonológica em 16 sujeitos (76%), além disso, houve concordância entre os testes em 14 casos (66,7%). Não houve diferença estatisticamente significante comparando os resultados obtidos pelos dois grupos avaliados, tanto pelo PHF quanto pelo PCF de forma global, embora a concordância dos achados ocorreu na maioria dos casos. Porém, considerando as variáveis idade e escolaridade, no PCF constatou-se diferença estatística significante. Os resultados mostraram que há certa variabilidade nos achados obtidos da PCF e do PHF, nas faixas etárias de 5, 6 e 8 anos, enquanto que na faixa etária de 7 anos ambos os instrumentos mostraram-se sensíveis para a detecção da alteração de consciência fonológica e também para o acompanhamento do processo terapêutico.

CONCLUSÃO: a maioria das crianças da amostra (85%), independente da terapia fonoaudiológica, apresentou desempenho inferior ao esperado para sua faixa etária em um dos dois instrumentos de avaliação da consciência fonológica, demonstrando a importância da intervenção fonoaudiológica com maior ênfase neste aspecto, já que este irá refletir-se diretamente no processo de alfabetização do indivíduo.

Descritores: Linguagem Infantil; Distúrbios da Fala; Avaliação; Transtornos da Articulação

ABSTRACT

PURPOSE: to analyze and compare the performance of phonological awareness in two groups of children with phonological disorder, one in speech therapy and the other without intervention using two instruments of evaluation.

METHOD: sample of 21 children, both genders, aged from 5 years and 6 months old to 8 years and 10 months old, with phonological disorder. Ten of these children belonged to Group 1, which includes children who have not undergone speech therapy treatment; and 11 children composed Group 2, corresponding to those in speech therapy intervention for a period longer than 4 months. Two instruments of evaluation were used: Profile of Phonological Abilities and Phonological Awareness Test

RESULTS: 85% of the children in Group 1 and Group 2 presented low performance in at least one of the two tests applied. The Profile of Phonological Abilities showed phonological alteration in 13 (62%) subjects and the Phonological Awareness Test in 16 subjects (76%). Moreover, there was consistency between the tests in 14 cases (66.7%). There was no statistically significant difference when we compare the results obtained by the two groups evaluated with phonological disorders for both the PPA and the PAT in general, even though the consistency between the findings happened in the majority of the cases. However, considering the age variables and schooling, in the PAT we found statistically significant difference. The results showed that there is certain variance in the findings obtained of the PPA and the PAT, in the age group of 5, 6 and 8 years old, whereas in the age group of 7 years old both instruments had revealed themselves sensible to the detection of the alteration of phonological awareness and for the follow up of the therapeutical process.

CONCLUSION: most children in the sample (85%), independent of speech therapy, showed inferior performance than the expected for their age group in one of two instruments of evaluation, demonstrating the importance of speech therapy with emphasis on this aspect, because this will be reflected directly in the process of literacy of the children.

Keywords: Child Language; Speech Disorders; Evaluation; Articulation Disorders

INTRODUÇÃO

A criança desenvolve seu sistema fonológico de maneira gradual e natural, mas este desenvolvimento respeita etapas maturacionais e depende do meio ao qual ela está inserida devido aos estímulos que receberá. Durante a aquisição fonológica, processos de simplificação fonológica são normais na criança ainda pequena, porém tais processos vão sendo abandonados e dão lugar a produções mais complexas. Quando a aquisição fonológica não ocorre de acordo com o esperado, a criança apresenta uma alteração no sistema fonológico, que difere do que é considerado normal do padrão adulto, é o chamado transtorno fonológico¹.

Transtorno fonológico é uma dificuldade que a criança apresenta em usar as regras do sistema fonológico, que incluem os fonemas e a sua distribuição, bem como os tipos de estruturas silábicas pertinentes à língua. Assim se identificaria uma criança com transtorno fonológico pela fala de difícil compreensão causada pela presença dos processos fonológicos não esperados para sua idade. A causa do transtorno fonológico ainda é desconhecida e o grau de inteligibilidade de fala é variado, por isso existem diversos estudos que relacionam causas biológicas, psicossociais, ambientais e o aspecto familial a este transtorno2.

Uma vez que crianças com esse quadro têm alterações na sensibilidade fonológica, estas podem, mais tarde, ter dificuldades quanto à aprendizagem da leitura e da escrita durante a alfabetização, evidenciando a importância de se identificar, ainda na fase pré-escolar, o transtorno fonológico³.

A consciência fonológica é parte do desenvolvimento do aspecto fonológico da linguagem e se define como a habilidade de manipular, detectar e distinguir a estrutura sonora das palavras desde a substituição de um determinado som até a segmentação deste em unidades menores. O processo de alfabetização engloba tarefas fonológicas como, analisar as palavras em seus componentes, utilizando-se de regras para correspondência entre sons e letras, ou seja, significante e significado (fonema e grafema) da palavra4.

O desenvolvimento da consciência fonológica e da memória de trabalho depende da idade cronológica e maturidade do indivíduo. Estas habilidades se correlacionam e são de extrema importância no início da aquisição ortográfica5.

Alguns autores concluíram em seu estudo4 que a consciência fonológica ocorre paralelamente ao desenvolvimento do letramento, porém, inicialmente elas não têm um grau de dependência elevado. Na medida em que a alfabetização vai se aprimorando a consciência fonológica também se lapida e caminham juntas auxiliando a criança no aperfeiçoamento de suas funções cognitivas, refletindo-se assim em todo o processo de construção do aprendizado.

A eficiência de modelos terapêuticos que utilizam tarefas de consciência fonológica é descrita por vários autores. Seja para prevenção ou intervenção, estes modelos melhoram a capacidade na identificação das letras, análise fonológica, reconhecimento global da palavra, leitura de palavras isoladas, letramento, entre outros. Portanto, facilitam a aquisição do código alfabético, necessário para a habilidade de leitura e escrita6-10.

Por ser tão frequente e poder trazer maiores prejuízos ao desenvolvimento das crianças, o transtorno fonológico preocupa o fonoaudiólogo, o qual vem ampliando sua atuação na prevenção e reabilitação destas alterações da linguagem. Desta forma, este trabalho tem como objetivo analisar e comparar o desempenho em consciência fonológica em dois grupos de crianças com transtorno fonológico, sendo um em tratamento fonoaudiológico e outro sem intervenção, a partir de dois instrumentos de avaliação.

MÉTODO

Participaram deste estudo 21 crianças, de ambos os sexos, na faixa etária de 5 anos e 6 meses a 8 anos e 10 meses de idade, com transtorno fonológico que não fazia parte de um quadro global de atraso do desenvolvimento.

O estudo foi realizado na Clínica de Fonoaudiologia da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo (FOB-USP).

Das 21 crianças, 10 delas pertenciam ao Grupo 1 (G1) que se refere às crianças as quais ainda não foram submetidas a tratamento fonoaudiológico e 11 crianças compunham o Grupo 2 (G2), correspondente àquelas em intervenção fonoaudiológica por um período de no mínimo 4 meses e no máximo 8 meses. A intervenção fonoaudiológica teve por objetivo a reorganização do sistema de sons da criança, visando à generalização e a melhora da inteligibilidade de fala. O modelo de terapia utilizado foi o Modelo de Ciclos Modificado11.

Como critérios para inclusão nos grupos, consideraram-se aptos a participar da pesquisa os sujeitos que: foram autorizados pelos pais ou responsáveis para a participação por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; apresentaram diagnóstico de transtorno fonológico de acordo com a literatura e tinham idade entre cinco e oito anos de idade.

Os critérios de exclusão foram: alterações evidentes nos aspectos neurológico, cognitivo, psicológico e/ou emocional, bem como alterações audiológicas.

Na Tabela 1 está descrita a caracterização dos participantes quanto à idade cronológica e o nível de escolaridade.

As crianças foram submetidas à avaliação formal por meio dos seguintes instrumentos de avaliação: Prova de Consciência Fonológica12 e Perfil de Habilidades Fonológicas13.

Prova de Consciência Fonológica (PCF)

A prova tem como objetivo avaliar as habilidades fonológicas subjacentes à linguagem escrita. Ela é composta de dez subtestes: Síntese Silábica; Síntese Fonêmica; Rima; Aliteração; Segmentação Silábica; Segmentação Fonêmica; Manipulação Silábica; Manipulação fonêmica; Transposição Silábica; Transposição Fonêmica.

Cada subteste é composto por quatro itens e, ainda, por dois exemplos iniciais em que o pesquisador explica à criança o que deve ser feito e corrige sua resposta caso seja incorreta.

Os resultados foram analisados a partir da porcentagem de acertos, podendo variar de zero a 40 acertos e a normatização destes escores para diferentes níveis de escolaridade propostos pelos estudos de Capovilla, Capovilla e Silveira14.

A Prova de Consciência Fonológica mostrou-se, em diferentes estudos, um instrumento sensível ao grau de desenvolvimento fonológico das crianças, sendo o desempenho por ela medido altamente correlacionado com o desempenho de leitura e escrita e de grande valor preditivo para esses desempenhos subsequentes.

Perfil de Habilidades Fonológicas (PHF)

Esse instrumento é constituído pelos itens que identificam e compõem as habilidades fonológicas de análise, adição, segmentação, subtração, substituição, rimas, rima sequencial, reversão silábica e imagem articulatória; e pode ser aplicado em crianças de 5 a 10 anos de idade, sendo que os itens que avaliam o nível fonêmico só serão aplicados em crianças acima de 7 anos.

No início de cada item há uma ordem e um modelo pré-estabelecidos. No modelo, as duas primeiras citações são utilizadas para demonstrar a tarefa. Entendida a atividade, a criança deve então responder os quatro itens selecionados.

Nos itens análise inicial, segmentação vocabular, recepção de rimas, rima sequencial e imagem articulatória, os acertos contam 2 pontos, enquanto nas provas de análise final e média, adição de sílabas e fonemas, segmentação frasal, subtração de sílabas e fonemas, substituição e reversão silábica, a contagem positiva será de um ponto. Em caso de erro é assinalado o valor 0. Esses valores são somados no final de cada item, e ao término da aplicação para a obtenção dos escores totais que são analisados a partir da idade da criança.

Caso a criança apresente dificuldade em trabalhar o nível auditivo abstrato, deve-se auxiliá-la com pistas concretas (material utilizado como mediador visual).

É um instrumento de triagem desenvolvido com objetivo de fornecer dados sobre a capacidade de o indivíduo processar os aspectos fonológicos da língua13.

Por meio de uma pesquisa com crianças normais foram estabelecidos valores que classificam quantitativamente os seus desempenhos (Tabela 2)13.

Anteriormente a realização deste trabalho, o mesmo teve sua aprovação concedida pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo (FOB-USP), sob processo nº 121/2007. Foram respeitados todos os princípios legais conforme versa a Resolução 196/196 do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa CONEP. Todos os indivíduos e seus responsáveis foram informados sobre os objetivos e procedimentos da pesquisa (carta de informação ao paciente) assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Os resultados foram organizados em banco de dados para facilitar sua análise. Nesta condição, a análise estatística obedeceu a critérios dos procedimentos do manual do examinador de cada instrumento utilizado. Também foram realizadas análises estatísticas pertinentes visando à comparação entre as categorias de análise.

Os testes estatísticos utilizados neste estudo foram: Teste Exato de Fisher, Teste de McNemar e Teste de Mann-Whitney, com nível de significância de p<0,05.

RESULTADOS

As Tabelas 3 e 4 apresentam a classificação do G1 no Perfil de Habilidades Fonológicas e na Prova de Consciência Fonológica respectivamente.

As Tabelas 5 e 6 apresentam a classificação do G2 no Perfil de Habilidades Fonológicas e na Prova de Consciência Fonológica respectivamente.

A Tabela 7 apresenta a comparação da sensibilidade dos resultados nos testes PCF e PHF nos G1 e G2.

Visando comparar o desempenho do G1 e G2 no PHF e na PCF, foi realizada a análise estatística por meio do Teste Exato de Fisher, encontrando resultados não significantes tanto no PHF (p=0,65944) quanto na PCF (p=0,31078).

O nível de concordância entre os testes utilizados, PHF e PCF, foi realizado por meio do Teste de McNemar, registrando concordância em 14 casos (66,7%), porém não foi observada diferença estatística significante (p=0,44969).

O Teste Mann-Whitney foi utilizado para comparar os resultados do PHF e da PCF com as variáveis idade e escolaridade.

Na comparação do PHF com as variáveis idade e escolaridade, não foi observada diferença estatística significante, respectivamente, com p= 0,185 e p= 0,161. Na comparação da PCF, com as variáveis, como pôde ser observado na Tabela 8, constatou-se diferença estatística significante para idade e escolaridade, respectivamente, com p= 0,04 e p=0,04. Dessa forma, observa-se que as crianças com desempenho abaixo do esperado apresentavam maior idade e escolaridade.

DISCUSSÃO

Foi observado que 85% das crianças do G1 e G2 apresentaram desempenho inferior em, pelo menos, um dos dois testes aplicados, concordando com os achados de trabalhos que encontraram dificuldades nas capacidades fonológicas de crianças com transtorno fonológico15-17, independente da terapia fonoaudiológica.

Diversos autores relacionam o desenvolvimento do processamento fonológico com as habilidades precoces de leitura e escrita, por isso uma criança com alterações em sua capacidade fonológica pode apresentar dificuldades de linguagem e de leitura, no último caso, pois apresentam déficits na integração ortográfica e fonológica a nível cortical fazendo uso de rotas diferentes às demais crianças sem dificuldades18-21.

Considerando a capacidade de detectar alteração dos dois instrumentos, verificou-se que o PHF mostrou alteração de consciência fonológica em 13 (62%) sujeitos e a PCF em 16 sujeitos (76%), além disso, houve concordância entre os testes em 14 casos (66,7%), do total de 21 sujeitos.

Cabe ressaltar que mesmo com porcentagens próximas, se analisadas no contexto global, os resultados em G2 diferiram em 45% da amostra, ou seja, 5 crianças apresentaram desempenho diferenciado quando comparados os instrumentos; já em G1, 20% dos resultados diferiram entre si, ou seja, em 2 sujeitos apenas. A literatura não relata estudos neste âmbito.

Considerando o nível de escolaridade, a idade e o desempenho dos sujeitos, evidencia-se que a maioria das crianças de primeira e segunda séries do Ensino Fundamental teve desempenho abaixo do esperado na aplicação da PCF, com diferença estatística significante, porém considerando estes mesmos parâmetros no PHF, não foi encontrada diferença estatística significante.

Como a grande maioria das crianças com desempenho insatisfatório do G1 e G2, estão na primeira e segunda séries do ensino fundamental, em fase de alfabetização ou já alfabetizados, estes resultados diferem dos achados de estudos que hipotetizam uma relação mútua entre a consciência fonológica e aprendizagem da leitura e escrita4,22-25. Ao longo do desenvolvimento escolar, as crianças que apresentam habilidades orais pouco desenvolvidas, como no caso dos transtornos fonológicos, são sobrecarregadas. Esse aspecto denota a importância da linguagem oral para os aspectos da aprendizagem da linguagem escrita, na medida em que a consciência fonológica é uma habilidade a ser integrada no ambiente acadêmico.

Analisando todas as habilidades fonológicas da PCF e correlacionando ao nível de escolaridade, observa-se que todas as crianças tiveram pontuação esperada para seu nível em algumas habilidades, tanto no G1 como no G2. Até mesmo as crianças não alfabetizadas. O que concorda com diferentes estudos26,27 que supõem que alguns dos níveis de consciência fonológica antecedem a aquisição da linguagem escrita, enquanto outros são possivelmente mais um resultado dessa aquisição.

Um estudo com pré-escolares que receberam treinamento especializado de consciência fonológica e da percepção em geral, com base na estimulação da consciência fonológica para a aprendizagem da leitura e da escrita mostrou ser este desnecessário, sendo o treino perceptual suficiente28. Outro autor concluiu com seu estudo que, de uma maneira geral, a consciência fonológica evolui no decorrer da aprendizagem da leitura e da escrita, ao correlacionar, estas três variáveis entre as quatro primeiras séries do ensino fundamental, reforçando a idéia da evolução destas habilidades para crianças sem alterações no aspecto fonológico29.

Também pode-se observar que mesmo após tempo superior a 4 meses e a terapia focando os aspectos relacionados às habilidades fonológicas, no caso do grupo 2, ainda existe evidente dificuldade nas habilidades envolvidas na consciência fonológica, o que concorda com outro estudo30 que comparou o desempenho das habilidades em consciência fonológica de sujeitos com histórico de transtorno fonológico após sua superação, por meio de terapia fonológica com indivíduos em desenvolvimento fonológico típico, e demonstrou que mesmo após a intervenção fonológica, os sujeitos com a alteração em questão apresentaram desempenho inferior nas habilidades de consciência fonológica.

Considerando os resultados obtidos por idade nos G1 e G2, observa-se que quase todas as crianças na faixa etária de 5 anos apresentaram resultado alterado tanto no PCF como no PHF, o que mostra a sensibilidade dos dois instrumentos para acompanhar o transtorno fonológico e maior sensibilidade da PCF para detectar uma alteração de consciência fonológica dessas crianças.

Na faixa etária de 6 anos, ambos os instrumentos são sensíveis na avaliação para detecção da alteração, mas para as reavaliações de acompanhamento o PHF mostra-se mais sensível. Aos 7 anos a PCF e o PHF revelaram mesma sensibilidade de 100% para o momento de avaliação bem como para o de acompanhamento da evolução terapêutica. E, aos 8 anos, a PCF mostrou-se mais sensível tanto para detecção inicial de alterações de consciência fonológica quanto para o acompanhamento dos casos nesta idade.

Assim, a consciência fonológica pode ser vista como uma hierarquia de processos baseados nos níveis de complexidade do sistema fonológico. Um nível mais alto de consciência requer uma análise minuciosa das menores unidades do sistema fonológico, como, por exemplo, os fonemas; e um nível mais rudimentar de consciência requer uma análise mais superficial de unidades maiores de sons, as sílabas9,23,31,32.

Considerando a necessidade de instrumentos precisos para o diagnóstico e acompanhamento do transtorno fonológico, o presente estudo evidenciou que o desempenho de crianças com transtorno fonológico tanto na PCF como no PHF foram semelhantes na amostra do G1 e discrepantes na maioria da amostra pesquisada no G2. Destaca-se, ainda, que essas provas fornecem elementos importantes para a escolha do modelo de intervenção que será aplicado a cada sujeito, já que a consciência fonológica juntamente com a discriminação auditiva e a terapia de contraste mínimo são as terapias mais populares para problemas fonológicos, entre terapeutas do Reino Unido33. A abordagem fonoaudiológica baseada na hierarquia dos traços distintivos e na consciência fonológica também mostrou-se eficaz na superação dos processos fonológicos e na evolução de crianças com transtorno fonológico27.

CONCLUSÃO

Concluiu-se com o estudo que a maioria das crianças da amostra (85%), independente da terapia fonoaudiológica, apresentou desempenho inferior ao esperado para sua faixa etária em um dos dois instrumentos de avaliação da consciência fonológica, demonstrando a importância da intervenção fonoaudiológica com ênfase neste aspecto, já que este irá refletir-se diretamente no processo de alfabetização do indivíduo.

Recebido em: 29/09/2011

Aceito em: 19/04/2012

Conflito de interesses: inexistente

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  • Endereço para correspondência:

    Marcela Rosolen Stefanini
    Alameda Dr. Octávio Pinheiro Brizola, 7-12 - Cidade Universitária
    Bauru - SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Maio 2013
    • Data do Fascículo
      Out 2013

    Histórico

    • Recebido
      29 Set 2011
    • Aceito
      19 Abr 2012
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