Resumos
OBJETIVO: comparar o efeito do retalho faríngeo e da esfincteroplastia sobre a hipernasalidade da fala e o fechamento velofaríngeo no tratamento de indivíduos com insuficiência velofaríngea residual, por meio de avaliação instrumental.
MÉTODOS: foram avaliados 30 pacientes, com fissura de palato±lábio reparada, submetidos à correção cirúrgica da insuficiência velofaríngea (15 com retalho faríngeo e 15 com esfincteroplastia), avaliados antes e, no mínimo, 1 ano após a cirurgia. A hipernasalidade foi estimada a partir dos escores de nasalância (correlato físico da nasalidade) obtidos por meio da nasometria, durante a leitura de 5 sentenças contendo, exclusivamente, sons orais, considerando como limite de normalidade o escore de 27%. O fechamento velofaríngeo foi aferido a partir da medida da área velofaríngea obtida por meio da técnica fluxo-pressão e foi classificado em: 0-4,9mm2=adequado; 5-19,9mm2=marginal e, >20mm2=inadequado. Diferenças entre as duas técnicas foram consideradas estatisticamente significantes ao nível de 5%.
RESULTADOS: antes da cirurgia, os valores médios de nasalância foram de 43±8,4% e 45±14,2% e de área velofaríngea foram 51±35,4mm2, e 69±29,2mm2, para os grupos retalho faríngeo e esfincteroplastia, respectivamente. Após a cirurgia, os valores médios de nasalância reduziram para 27±10,1% e 31±14,2% e de área velofaríngea para 3,6±5,5mm2 e 24±32,7mm2 para os grupos retalho faríngeo e esfincteroplastia, respectivamente. A redução dos valores de nasalância e área velofaríngea foi estatisticamente significante nos dois grupos.
CONCLUSÃO: estes resultados sugerem que o retalho faríngeo foi mais eficiente do que a esfincteroplastia na eliminação da hipernasalidade e adequação do fechamento velofaríngeo nos pacientes estudados.
Fissura Palatina; Insuficiência Velofaríngea; Rinomanometria
PURPOSE: to compare the effect of pharyngeal flap surgery and sphincteroplasty on hypernasality and velopharyngeal closure in velopharyngeal insufficiency management, by means of instrumental assessment.
METHODS: thirty patients with repaired cleft palate±lip, submitted to surgical treatment for velopharyngeal insufficiency (15 pharyngeal flap and 15 sphincteroplasty) were evaluated before and, at least, 1 year after surgery. Hypernasality was estimated by means of nasalance scores (acoustic correlate of nasality) obtained by nasometry considering a cutoff score of 27%. Velopharyngeal closure was determined by the velopharyngeal area measurement. Nasalance scores were obtained by nasometry, during the reading of a set of 5 sentences containing exclusively oral sounds, considering the cutoff value of 27%. Velopharyngeal area was provided by the measurement of velopharyngeal area by means of pressure-flow technique and was classified as: 0 to 4.9 mm2=adequate; 5 to 19.9 mm2=borderline and ≥20mm2 inadequate. Differences between the two techniques were accepted as significant when p < 0.05.
RESULTS: before surgery. nasalance mean scores were 43±8.4% and 45±14.2% and velopharyngeal area mean were 51±35.4mm2 and 69±29.2mm2 for the pharyngeal flap and sphincteroplasty groups, respectively. After surgery, nasalance mean scores were 27±10.1% and 31±14.2% and velopharyngeal area mean were 3.6±5.5mm2 and 24±32.7mm2 for the pharyngeal flap and sphincteroplasty groups, respectively. The reduction of the nasalance scores and velopharyngeal area was statistically significant in both groups.
CONCLUSION: these results suggest that pharyngeal flap demonstrated to be more efficient than sphincteroplasty in the elimination of hypernasality and adequacy of velopharyngeal closure in the patients studied.
Cleft Palate; Velopharyngeal Insufficiency; Rhinomanometry
Introdução
A insuficiência velofaríngea (IVF) é definida como uma falha do fechamento velofaríngeo, onde parte da corrente aérea é desviada para a cavidade nasal levando ao aparecimento de sintomas que podem prejudicar a fala de diferentes formas1 - 5. O sintoma mais representativo da IVF é a hipernasalidade, que pode persistir mesmo após a correção primária do palato, sendo necessária, nesses casos, a correção cirúrgica secundária6 - 10. Dentre as técnicas cirúrgicas utilizadas para a correção da IVF estão o retalho faríngeo e a esfincteroplastia. O objetivo de ambas é diminuir o espaço entre a oro e a nasofaringe reduzindo, assim, os sintomas decorrentes do fechamento velofaríngeo insuficiente5 , 6 , 11.
A técnica do retalho faríngeo consiste na construção de um retalho miomucoso unindo a parede posterior da faringe ao palato mole, constituindo uma ponte entre ambos, delimitando dois orifícios laterais. A altura e largura do retalho devem ser determinadas de acordo com o tamanho do gap velofaríngeo e o grau de movimento das paredes laterais da faringe, as quais devem ser avaliadas antes da cirurgia, possibilitando a construção do retalho conforme as necessidades de cada caso2. A esfincteroplastia foi proposta como uma solução mais fisiológica para a correção da IVF. Nesta técnica, dois retalhos miomucosos são retirados dos pilares posteriores e das paredes laterais da faringe de cada lado e são suturados entre si e inseridos na parede posterior da faringe, criando, assim, um único orifício central circundado por mucosa e músculo ao nível do véu palatino. O objetivo da técnica é criar um "esfíncter dinâmico" o qual controla a passagem de ar da porção oral para a porção nasal durante a fala2 , 6 , 12.
A aferição dos resultados das cirurgias para correção da IVF, de modo geral, é feita utilizando-se avaliação perceptivo-auditiva da fala associada à avaliação instrumental. Para tanto, é recomendado que se utilize, no mínimo, um dos seguintes métodos instrumentais: nasofaringoscopia, videofluoroscopia, nasometria ou técnica fluxo-pressão13. Estes dois últimos, os quais foram empregados no presente estudo, são considerados métodos indiretos, cujos resultados levam a aferir o estado funcional do mecanismo velofaríngeo. A nasometria e a técnica fluxo-pressão, por fornecerem dados quantitativos, em muito contribuem para o acompanhamento do tratamento cirúrgico, por meio das comparações pré e pós-operatórias14.
A nasometria é uma técnica não invasiva que permite aferir indiretamente a ressonância da fala, ou seja, a hipernasalidade ou a hiponasalidade, por meio da medida da nasalância, uma grandeza física que reflete a quantidade de energia acústica nasal durante a fala, expressa em porcentagem14. A nasalância é determinada, primariamente, pela atividade do esfíncter velofaríngeo, por esta razão os desvios de nasalância são indicativos de IVF3 , 15 , 16. A técnica fluxo-pressão avalia o mecanismo velofaríngeo no seu aspecto funcional, fornecendo dados objetivos sobre as repercussões aerodinâmicas de qualquer falha na função velofaríngea14. Fornece dados quantitativos sobre a função velofaríngea de maneira não invasiva, permitindo aferir a extensão do fechamento velofaríngeo durante a produção do fone plosivo [p] 17. A literatura demonstrou que áreas menores que 5mm2 são sugestivas de fechamento velofaríngeo adequado, 5 a 9mm2, de fechamento adequado-marginal, 10 a 19mm2, de fechamento marginal-inadequado e, iguais ou superiores a 20mm2, de fechamento inadequado18.
Muitos estudos têm demonstrado o sucesso e as complicações das técnicas cirúrgicas secundárias empregadas para o tratamento da IVF, utilizando diferentes metodologias para análise dos resultados cirúrgicos. Alguns empregaram avaliação instrumental direta, por meio da nasoendoscopia e videofluoroscopia12 , 19 - 22 e outros, a avaliação instrumental indireta como a nasometria e a técnica fluxo-pressão12 , 17 , 21 , 23 - 26. Estudos anteriores conduzidos no Laboratório de Fisiologia17 , 26 investigaram o efeito do retalho faríngeo sobre a fala e a respiração dos pacientes com IVF residual, visto tratar-se de uma cirurgia utilizada de rotina no HRAC-USP. Uma investigação a respeito do efeito do retalho faríngeo sobre as vias aéreas superiores mostrou que o retalho levou ao aparecimento de sintomas respiratórios permanentes tais como, respiração oral, ronco e sensação de dificuldade respiratória durante o sono, em 36% dos pacientes em decorrência da diminuição das dimensões da nasofaringe após a cirurgia, avaliadas pela técnica fluxo-pressão27. Um outro estudo analisou os resultados de fala obtidos antes e após a cirurgia de retalho faríngeo em 241 indivíduos, utilizando avaliação nasométrica e aerodinâmica. Os autores verificaram que o retalho faríngeo foi efetivo na redução da hipernasalidade em 68% dos casos de acordo com a nasometria e na melhora do fechamento velofaríngeo em 66% dos pacientes, de acordo com a avaliação aerodinâmica (técnica fluxo-pressão) 17. Recentemente, o efeito do retalho faríngeo foi comparado com outra técnica para correção da IVF, a palatoplastia secundária com veloplastia intravelar. Os autores verificaram que, nos pacientes submetidos à cirurgia de retalho faríngeo, foi observada ausência de hipernasalidade em 70% e fechamento velofaríngeo adequado em 80%, enquanto que naqueles submetidos à palatoplastia secundária com veloplastia intravelar, a hipernasalidade estava ausente em 34% e o fechamento velofaríngeo encontrava-se adequado em 50%, sendo, portanto, o retalho faríngeo mais eficiente que a veloplastia intravelar na correção da hipernasalidade e adequação do fechamento velofaríngeo26.
Os resultados cirúrgicos da esficteroplastia também têm sido frequentemente comparados aos resultados de outras técnicas cirúrgicas isoladas ou combinadas objetivando estabelecer a técnica mais efetiva para correção da insuficiência velofaríngea12 , 21 , 28. Um grupo grande de pesquisadores comparou os resultados de fala obtidos antes e após a esfincteroplastia, em 45 indivíduos e o retalho faríngeo, em 52 indivíduos, utilizando avaliação perceptiva, nasométrica e nasoendoscópica. Os autores verificaram que ambas as técnicas cirúrgicas foram igualmente efetivas na redução dos escores de nasalância e eliminação da hipernasalidade, o que ocorreu em 76% dos casos submetidos à esfincteroplastia e 81% dos casos de retalho faríngeo21. Da mesma forma, outros estudiosos não verificaram diferenças significantes entre um grupo de 26 pacientes submetidos à esfincteroplastia e um grupo de 22 pacientes submetidos à cirurgia de retalho faríngeo, avaliados por meio de nasometria, nasoendoscopia e videofluoroscopia. Os autores mostraram 11,5% de IVF após a esfincteroplastia e 9% após o retalho faríngeo12. Recentemente, um estudo comparou, por meio de avaliação perceptiva, os resultados de fala de 20 pacientes submetidos à esfincteroplastia isolada, 38 submetidos ao retalho faríngeo e 38 submetidos à esfincteroplastia combinada à técnica de Furlow. Os autores verificaram redução significante da hipernasalidade após a cirurgia nos três grupos estudados. Entretanto, demonstraram que os resultados de ressonância foram significantemente melhores para os grupos com retalho faríngeo e esfincteroplastia combinada à técnica de Furlow em comparação ao grupo com esfincteroplastia isolada28.
No presente estudo, pretendeu-se, comparar o efeito do retalho faríngeo e a da esfincteroplastia sobre a nasalidade da fala e o fechamento velofaríngeo utilizando, para tanto, avaliação instrumental.
Métodos
Este estudo retrospectivo foi desenvolvido no Laboratório de Fisiologia do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo (HRAC-USP) após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Instituição, ofício nº 153/2011.
Casuística
Foram avaliados 30 pacientes com IVF residual, submetidos à correção cirúrgica da IVF há, pelo menos, 12 meses sendo, 15 submetidos ao retalho faríngeo e 15 submetidos à esfincteroplastia. A idade dos pacientes variou entre 6 e 38 anos (média de 19±16 anos para o grupo RF e de 18±11 para o grupo EF); 12 pacientes apresentavam fissura de palato isolada, 13 apresentavam fissura de lábio e palato unilateral, 4 apresentavam fissura de lábio e palato bilateral e 1 apresentava IVF sem fissura associada.
Procedimentos
Os pacientes foram avaliados antes da cirurgia (PRÉ) e, no mínimo, 12 meses após a cirurgia (PÓS) de retalho faríngeo (grupo RF) e esfincteroplastia (grupo EF).
Avaliação Nasométrica da Fala - Nasometria
A determinação da nasalância (correlato físico da nasalidade) foi feita utilizando-se um nasômetro modelo 6200-3 IBM (software versão 30-02-3.22). O sistema é composto por dois microfones, posicionados um de cada lado de uma placa de separação sonora, posicionada sobre o lábio superior e mantido em posição por um capacete. O microfone superior capta os sinais do componente nasal da fala e o inferior, os sinais do componente oral, os quais são filtrados, digitalizados e analisados por meio de um software específico. O exame é realizado durante a leitura de um conjunto de 5 frases em português brasileiro contendo sons exclusivamente orais, para identificar hipernasalidade29. Os pacientes incapazes de ler o texto são solicitados a repetir cada frase após o examinador. Na medida em que o indivíduo lê o texto, apresentado na tela do microcomputador conectado ao sistema, os sinais captados pelo microfone aparecem como pontos na tela, formando a configuração de uma curva. A nasalância é calculada pela razão numérica entre a energia acústica nasal e a energia acústica total (soma da energia acústica nasal e oral), multiplicada por 10016. É considerado como limite superior de normalidade o valor de 27%, ou seja, valores superiores a 27% são considerados como indicativos de hipernasalidade14. A Figura 1 mostra, de forma esquemática, a configuração do sistema.
Esquema representativo da instrumentação para medida da nasalância (Nasômetro 6200-3 IBM, Kay Elemetrics Corp., Lincoln Park, NJ, USA).
Medida da área velofaríngea - Técnica fluxo-pressão
A determinação da área velofaríngea durante a fala foi realizada por meio da técnica fluxo-pressão (rinomanometria anterior modificada), utilizando um sistema computadorizado PERCI-SARS (versão 3.50) 30. O princípio da técnica baseia-se no fato de que a área de secção transversa mínima de uma constrição (ou orifício) pode ser estimada pela medida simultânea da pressão diferencial entre os dois lados da constrição e do fluxo aéreo que a atravessa31.
A área velofaríngea é determinada durante a produção do fone plosivo surdo [p], inserido no vocábulo "rampa", emitido pelo indivíduo de 4 a 6 vezes sucessivamente, posicionando-se um cateter no interior da cavidade oral e outro em uma das narinas. O cateter nasal é mantido em posição por um obturador nasal que bloqueia a narina. Ambos os cateteres medem pressões aéreas estáticas que são transmitidas a transdutores de pressão. O fluxo aéreo nasal é medido por meio de um tubo plástico adaptado à outra narina, conectado a um pneumotacógrafo previamente aquecido e ligado a um transdutor de pressão. Os sinais dos três transdutores (pressão nasal, pressão oral e fluxo nasal) são enviados ao sistema PERCI para análise por programa específico A área considerada para tal análise representa a média das múltiplas produções e é calculada pelo próprio programa a partir da equação: A= V/k(2(P/d)1/2, onde A=área de secção transversa mínima nasal do orifício em cm2; V=fluxo nasal em cm3/s; k=0,65; (P=pressão oral-nasal em dinas/cm2; d=densidade do ar (0,001g/cm3). A Figura 2 mostra esquematicamente a configuração do sistema.
Esquema representativo para a determinação da área velofaríngea (Sistema PERCI-SARS, Microtronics Corp., Chapel Hill, NC, USA).
Os valores de área velofaríngea encontrados são analisados de acordo com critério de classificação da função velofaríngea proposto: 0 a 4,9mm2=fechamento velofaríngeo adequado; 5 a 9,9mm2=fechamento velofaríngeo adequado-marginal; 10,0 a 19,9mm2=fechamento velofaríngeo marginal-inadequado e, 20mm2 ou mais=fechamento velofaríngeo inadequado19.
Análise dos Dados
A nasalância está expressa em % e a área velofaríngea em mm2. A comparação dos valores médios de nasalância e da área velofaríngea pré e pós-operatória para a mesma técnica cirúrgica foi feita por meio do teste t de Student para amostras pareadas e a comparação destas duas variáveis entre as técnicas cirúrgicas foi feita por meio do teste t de Student para amostras independentes. Foram aceitos como significantes os valores de p<0,05.
Resultados
Os valores médios de nasalância obtidos na condição PRÉ foram de 43±8,4% nos pacientes do grupo RF e de 45±12,4% nos pacientes do grupo EF, em ambos os casos os valores foram indicativos de hipernasalidade. Na condição PÓS, a nasalância média passou a 27±10,1% no grupo RF e 31±14,2% no grupo EF. A análise estatística mostrou que, após a cirurgia, ambos os grupos apresentaram valores médios de nasalância significantemente menores do que aqueles obtidos antes da cirurgia. Não houve diferença estatisticamente significante entre a nasalância média dos dois grupos tanto na condição PRÉ quanto na condição PÓS (Tabela 1). Os resultados mostraram que, após a cirurgia, o grupo RF passou a apresentar valor médio de nasalância indicativo de normalidade (≤27%), enquanto o valor médio do grupo EF permaneceu indicativo de hipernasalidade. A Figura 3 ilustra estes resultados.
Nasalância média obtida após cirurgia nos pacientes submetidos ao retalho faríngeo e à esfincteroplastia.
Na Tabela 2 estão demonstrados os valores médios ((DP) da área velofaríngea, obtidos nos pacientes dos grupos RF e EF, antes (PRÉ) e após (PÓS) as cirurgias. Os pacientes que apresentaram articulação compensatória na produção do fone [p] não foram incluídos nesta análise (2 indivíduos do grupo RF e 3 do grupo EF). Verificou-se que, antes da cirurgia, a área velofaríngea média no grupo RF foi de 51±35,4mm2 e no grupo EF foi igual a 69±29,2mm2, em ambos os casos indicativos de fechamento velofaríngeo inadequado. Não houve diferença estatisticamente significante entre as áreas velofaríngeas dos dois grupos na condição PRÉ. Após a cirurgia, a área velofaríngea média passou a 3,6±5,5mm2 no grupo RF e a 24±32,7 mm2 no grupo EF. A análise estatística mostrou que a área velofaríngea média obtida após a cirurgia foi significantemente menor que aquela obtida antes da cirurgia nos dois grupos estudados e que a área velofaríngea pós-cirúrgica do grupo RF foi significantemente menor que a do grupo EF. Verificou-se, também, que após a cirurgia, o grupo RF passou a apresentar valores indicativos de fechamento adequado, em média, enquanto que o grupo EF permaneceu com fechamento velofaríngeo inadequado. A Figura 4 ilustra esses resultados.
Porcentagem (número) de pacientes distribuídos de acordo com a classificação do fechamento velofaríngeo aferido após a cirurgia nos grupos retalho faríngeo e esfincteroplastia
Discussão
Dentre as técnicas cirúrgicas empregadas no tratamento da IVF, o retalho faríngeo e a esfincteroplastia são, ainda, as mais utilizadas nos diversos centros craniofaciais do mundo12 , 28 , 32 - 34 e a literatura tem demonstrado o sucesso e os efeitos deletérios de ambas estas técnicas cirúrgicas utilizadas no tratamento da IVF secundária à palatoplastia primária. A maior parte dos estudos utilizou metodologia perceptiva e/ou métodos instrumentais diretos para a avaliação da função velofaríngea, como a nasoendoscopia e a videofluoroscopia12 , 19 - 22. Dois estudos12 , 21, em particular, acrescentaram a nasometria às outras avaliações, como um dos métodos para investigar a nasalidade da fala e comparar, objetivamente, os resultados das duas cirurgias, assim como foi feito no presente estudo. Ambos constataram, por meio da nasometria, que tanto o retalho faríngeo quanto a esfincteroplastia foram eficientes na redução da nasalidade, não havendo diferença estatisticamente significante entre as técnicas cirúrgicas. Este também foi o resultado verificado no presente estudo a partir da análise da nasometria. Entretanto, esses resultados revelaram que somente no grupo de pacientes submetidos ao retalho faríngeo, verificou-se normalização da nasalância (escore médio=27%). O grupo com esfincteroplastia permaneceu com escore de nasalância indicativo de hipernasalidade (31%), sugerindo que o retalho faríngeo foi mais eficiente que a esfincteroplastia na eliminação da hipernasalidade.
Em contrapartida, um recente estudo mostrou que, a esfincteroplastia combinada à técnica de Furlow, bem como o retalho faríngeo foram cirurgias significantemente mais eficientes na redução da hipernasalidade do que a esfincteroplastia realizada isoladamente28. Vale ressaltar, entretanto que, uma limitação deste estudo foi o fato dos autores terem empregado somente avaliação perceptiva da fala para a análise dos seus resultados sem, contudo, avaliar a concordância entre os examinadores.
Outro método de avaliação para aferir os resultados das duas cirurgias sobre a fala dos pacientes neste estudo foi a técnica fluxo-pressão. Nenhum outro relato da literatura utilizou este método instrumental recomendado pela American Cleft-Palate Association 13 para a comparação entre essas técnicas, o que torna inédito os resultados do presente estudo. Este método tem sido utilizado, há muitos anos, pela equipe do Laboratório de Fisiologia para a avaliação dos resultados cirúrgicos do tratamento da IVF, particularmente do retalho faríngeo e da palatoplastia secundária com veloplastia intravelar17 , 24 - 26 , 35 , 36. No presente estudo, esta técnica mostrou-se um instrumento eficiente também para avaliação dos resultados da esfincteroplastia, tornando possível a comparação entre ambas. A técnica fluxo-pressão revelou que houve redução significante da área velofaríngea média em ambos os grupos estudados, como era esperado, visto que o objetivo das duas cirurgias é o de reduzir o espaço da região velofaríngea para promover o fechamento velofaríngeo adequado. Entretanto, diferentemente do que ocorreu com a nasometria, a análise dos dados mostrou que a área velofaríngea média obtida nos pacientes com retalho faríngeo foi significantemente menor que aquela obtida nos pacientes com esfincteroplastia. Analisando o grau de fechamento velofaríngeo, aferido a partir dos valores da área velofaríngea pós-cirúrgica, verificou-se que o grupo de pacientes com retalho faríngeo alcançou, em média, fechamento velofaríngeo adequado, enquanto o grupo de pacientes submetidos à esfincteroplastia permaneceu com fechamento velofaríngeo inadequado. Em outras palavras, a área velofaríngea verificada após o retalho faríngeo, a qual foi significantemente menor que aquela verificada após a esfincteroplastia, parece ter contribuído para proporcionar o fechamento velofaríngeo adequado identificado nos pacientes com retalho faríngeo.
Conclusão
Estes resultados sugerem que o retalho faríngeo foi mais eficiente do que a esfincteroplastia na eliminação da hipernasalidade e adequação do fechamento velofaríngeo nos pacientes estudados.
Referências bibliográficas
- 1 Smith BE, Kuehn DP. Speech Evaluation of Velopharyngeal Dysfunction. J Craniofac Surg. 2007;18(2):251-61.
- 2 Rudnick EF, Sie KC. Velopharyngeal Insufficiency: current concepts in diagnosis and management. Curr Opin Otolaryngol Head Neck Surg. 2008;16(6):366-70.
- 3 Kummer AW editor. Cleft palate and craniofacial anomalies. 2nd ed. San Diego: Singular Thomson Learning; 2008.
- 4 Genaro KF, Fukushiro AP, Suguimoto MLFCP. Avaliação e Tratamento dos Distúrbios da Fala. In: Trindade IEK, Silva Filho OG (Org.). Fissuras Labiopalatinas: uma abordagem interdisciplinar. São Paulo: Santos; 2007. P.109-22.
- 5 Rieger J, Bohlie G, Huryn J, Tang JL, Harris J, Seikaly H. Surgical reconstruction versus prosthetic obturation of extensive soft palate defects: a comparison of speech outcomes. Int J Prosthodont. 2009;22(6):566-72.
- 6 Rocha DL. Tratamento cirúrgico da insuficiência velofaríngea. In: Trindade IEK, Silva Filho OG, organizadores. Fissuras labiopalatinas: uma abordagem interdisciplinar. São Paulo: Santos; 2007. P.145-63.
- 7 Andrades P, Espinosa-de-los-Monteros A, Shell DH, Thurston TE, Fowler JS, Xavier ST et al. The importance of radical intravelar veloplasty during two-flap palatoplasty. Plast Reconstr Surg. 2008;122(4):1121-30.
- 8 Billmiew DA. Surgical management of clefts and velopharyngeal dysfunction. In: Kummer AW, editor. Cleft palate and craniofacial anomalies. 2nd ed. San Diego: Singular; 2008. P.508-40.
- 9 Khosla RK, Mabry K, Castiglione CL. Clinical outcomes of the Furlow z-plasty for primary cleft palate. Cleft Palate Craniofac J. 2008;45(5):501-10.
- 10 Sullivan SR, Marrinan EM, Mulliken JB. Pharyngeal flap outcomes in nonsyndromic children with repaired cleft palate and velopharyngeal insufficiency. Plast Reconstr Surg. 2010;125(1):290-8.
- 11 Ysunza A, Pamplona MC. Velopharyngeal function after two different types of palatoplasty. Internat J Pediatric Otorhinol. 2006;70(6):1031-7.
- 12 Abdel-Aziz M, El-Hoshy H, Ghandour H. Treatment of velopharyngeal insufficiency after cleft palate repair depending on the velopharyngeal closure pattern. The Journal of Craniofacial Surgery. 2011;22(3):813-7.
- 13 American Cleft Palate-Craniofacial Association. Parameters for evaluation and treatment of pacients with cleft lip/palate or other craniofacial anomalies - Revised Edition, 2009.
- 14 Trindade IEK, Yamashita RP, Bento-Gonçalves CGA. Diagnóstico instrumental da disfunção velofaríngea. In: Trindade IEK, Silva Filho OG, organizadores. Fissuras labiopalatinas: uma abordagem interdisciplinar. São Paulo: Santos; 2007. P.123-43.
- 15 Dalston RM, Warren DW, Dalston ET. Use of nasometry as a diagnostic tool for identifying patients with velopharyngeal impairment. Palate Craniofac J. 1991;28:184-9.
- 16 Genaro KF, Yamashita RP, Trindade IEK. Avaliação clínica e instrumental na fissura labiopalatina. In: Fernandes FDM, Mendes BCA, Navas ALPGP (Org.). Tratado de fonoaudiologia. 2ª ed. São Paulo: Roca, 2010.P. 488-503.
- 17 Fukushiro AP, Trindade IEK. Nasometric and aerodynamic outcome analysis of pharyngeal flap surgery for the management of velopharyngeal insufficiency. J Craniofac Surg. 2011;22(5):1647-51.
- 18 Warren DW. Aerodynamics assessment and procedures to determine extent of velopharyngeal inadequacy. In: Bzoch KR, editor. Communicative disorders related to cleft lip and palate. 4th ed. Austin: Pro-Ed;1997. P.411-37.
- 19 Eblen LE, Sie KC. Perceptual and instrumental assessment of velopharyngeal insufficiency. Plast Reconstr Surg. 2002;109:2589-90.
- 20 Liedman-Boshko J, Lohmander A, Persson C, Lith A, Elander A. Perceptual analysis of speech and the activity in the lateral pharyngeal walls before and after velopharyngeal flap surgery. Scand J Plast Reconstr Surg Hand Surg. 2005;39(1):22-32.
- 21 Abyholm F, D'Antonio L, Davidson Ward SL, Kjøll L, Saeed M, Shaw W et al. VPI Surgical Trial Group. Pharyngeal flap and sphincterplasty for velopharyngeal insufficiency have equal outcome at 1 year postoperatively: results of a randomized trial. 2005;42(5):501-11.
- 22 Dailey SA, Karnell MP, Karnell LH, Canady JW. Comparison of resonance outcomes after pharyngeal flap and furlowdouble-opposing z-plasty for surgicalmanagement of velopharyngeal incompetence. Cleft Palate Craniofac J. 2006;43:38-43.
- 23 Armour A, Fischbach S, Klaiman P, Fischer DM. Does velopharyngeal closure pattern affect the success of pharyngeal flap pharyngoplasty? Plast Reconstr Surg. 2005;115(1):45-52.
- 24 Yamashita RP, Oliva TRT, Fukushiro AP, Brustello CMB , Trindade IEK. Efeito da veloplastia intravelar sobre o fechamento velofaríngeo avaliado por meio da técnica fluxo-pressão. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(3):362-8.
- 25 Yamashita RP, Carvalho ELL, Fukushiro AP, Zorzetto NL, Trindade IEK. Efeito da veloplastia intravelar sobre a nasalidade em indivíduos com insuficiência velofaríngea. Rev. CEFAC. 2012;14(4):603-9.
- 26 Barbosa DA, Scarmagnani RH, Fukushiro AP, Trindade IEK, Yamashita RP. Surgical outcome of pharyngeal flap surgery and intravelar veloplasty on the velopharyngeal function. Codas. 2013;25(5):451-5.
- 27 Yamashita RP, Trindade IEK. Long-term effects of pharyngeal flaps on the upper airways of subjects with velopharyngeal insufficiency. Cleft Palate Craniofac J. 2008;45(4):364-79.
- 28 Bohm LA, Padgitt N, Tibesar RJ, Lander TA, Sidman JD. Outcomes of combined Furlow palatoplasty and sphincter pharyngoplasty for velopharyngeal insufficiency. Otolaryngol Head Neck Surg. 2014;150(2):216-21.
- 29 Trindade IEK, Genaro KF, Dalston RM. Nasalance scores of normal brazilian portuguese speakers. Braz J Dysmorphol Speech Disord.1997;1(1):23-4.
- 30 Microtronics Corporation. PERCI SARS system manual. Chapel Hill: Microtronics Corporation,1994.
- 31 Warren DW, Dubois AB. A pressure-flow technique for measuring velopharyngeal orifice area during continuous speech. Clef Palate J. 1964;16:52-7.
- 32 Kilpatrick LA, Kline RM, Hufnagle KE, Vanlue MJ, White DR. Prospective management following sphincter pharyngoplasty. Otolaryngol Head Neck Surg. 2010;142(4):582-5.
- 33 Wójcicki P, Wójcicka G. Prospective evaluation of the outcome of velopharyngeal insufficiency therapy after simultaneous double z-plasty and sphincter pharyngoplasty. Folia Phoniatric Logop. 2010;2(6):271-7.
- 34 Collins J, Cheung K, Farrokhyar C, Strumas N. Pharyngeal flap versus sphincter pharyngoplasty for the treatment of velopharyngeal insufficiency: A meta-analysis. Journal of Plastic, Reconstructive & Aesthetic Surgery. 2012;65(7):864-8.
- 35 Lanziani FF, Yamashita RP, Fukushiro AP, Trindade IEK. Correlação entre fechamento velofaríngeo e dimensões nasofaríngeas após cirurgia de retalho faríngeo avaliados por meio da técnica fluxo-pressão. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(2):250-5.
- 36 Cardia CCP, Yamashita RP, Campos LD, Sampaio-Teixeira AC, Trindade-Suedan IK, Trindade IEK. Obstrução respiratória após cirurgia de retalho faríngeo para correção de insuficiência velofaríngea: revisão da literatura. Rev Bras Cir Craniomaxilofac. 2011;14(4):207-13.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Jun 2015
Histórico
-
Recebido
05 Ago 2014 -
Aceito
18 Set 2014