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Fatores Determinantes para o Fechamento do Capital de Companhias Listadas na BM&FBOVESPA* * Artigo apresentado na 2ª Edição da BBR Conference: Novos Desafios para Produção Científica, Vitória, ES, dezembro de 2014.

Resumos

Tradicionalmente, o mercado de capitais tem despertado o interesse de acadêmicos e pesquisadores motivados a compreender o processo de abertura do capital e de negociação de títulos das companhias em bolsa de valores. Nesse contexto investigativo, um aspecto vinha sendo negligenciado, o que indica uma lacuna no corpo de conhecimento sobre o mercado de capitais e a governança corporativa: o fechamento do capital de companhias abertas. Objetiva-se identificar os fatores determinantes para o fechamento do capital de companhias abertas listadas na Bolsa de Mercadorias & Futuros BOVESPA (BM&FBOVESPA). Metodologicamente, essa pesquisa relacionou um conjunto de variáveis coletadas junto a dados secundários disponíveis na base de dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), da BM&FBOVESPA e da Economática. A partir da análise de 227 cancelamentos de registro, entre 2001 e 2012, os resultados indicam que o fechamento do capital de companhias listadas na BM&FBOVESPA é determinado pelos seguintes fatores: (i) maior concentração da propriedade e do controle; (ii) menor free-float; (iii) menor liquidez das ações; (iv) maior disponibilidade de caixa; e (v) maior tamanho. O fato de o acionista controlador ser uma companhia de capital aberto ou de capital fechado determina diferenças importantes na decisão de fechamento do capital. Enquanto no primeiro caso a disponibilidade de caixa é o fator mais importante, no segundo a liquidez é o fator mais determinante para o fechamento do capital. Do ponto de vista acadêmico, esta pesquisa amplia os estudos sobre o fechamento do capital, ainda incipientes no contexto do mercado de capitais brasileiro. Para o mercado de capitais, a identificação das características das companhias propensas a cancelar registro pode prevenir investidores preocupados com os riscos inerentes ao momento de aquisição de ações pelo grupo controlador interessado em fechar o capital.

governança corporativa; companhias abertas; fechamento do capital


Traditionally, the capital market has attracted the interest of scholars and researchers, motivated to understand the process of going public and trading securities of companies on a stock exchange. In this research context, an aspect had been neglected, something which indi cates a gap in the body of knowledge about the capital market and corporate governance: delisting of companies. We aim to identify the determining factors for delisting companies from the Commodity & Futures Exchange BOVESPA (BM&FBOVESPA). Methodologically, this research has related a set of variables collected from secondary data available on the database of the Securities Commission of Brazil (CVM), BM&FBOVESPA, and Economatica. By analyzing 227 listing cancellations, between 2001 and 2012, the results indicate that de listing of companies from BM&FBOVESPA is determined by the following factors: (i) greater concentration of ownership and control; (ii) lower free float; (iii) lower liquidity of shares; (iv) greater availability of cash; and (v) larger size. The fact that the controlling shareholder is a public or private company determines significant differences in the decision to delist. While in the first case cash availability is the most important factor, in the second liquidity is the main determining factor for delisting. From the academic viewpoint, this research extends the studies on delisting, still incipient in the Brazilian capital market context. For the capital market, identifying the characteristics of companies prone to cancel listing may prevent investors concerned about inherent risks at the time of acquiring shares by the controlling group interested in delisting.

corporate governance; public companies; delisting


1 INTRODUÇÃO

Este artigo discute os aspectos relacionados à governança corporativa (Blair, 1995Blair, M. M. (1995). Ownership and control: rethinking corporate governance for the twenty-first century. Washington, DC: The Bookings Institutions.; Hart, 1995Hart, O. (1995, maio). Corporate governance: some theory and implications. The Economic Journal, 105(430), 678-689.) e, mais especificamente, ao processo de fechamento do capital de companhias abertas cujas ações eram negociadas em bolsas de valores (Miller & Frankenthaler, 2003Miller, D. A., & Frankenthaler, M. J. (2003, outubro). Securities registration: delisting/deregistration of securities under the Securities Exchange Act of 1934. Insights, 17(10), 7-12.; Weir, Laing, & Wright, 2005Weir, C., Laing, D., & Wright, M. (2005, setembro). Undervaluation, private information, agency costs and the decision to go private. Applied Financial Economics, 15(13), 947-961.; Khan, Vilanova, & Hassairi, 2011Khan, H. U. R., Vilanova, L., & Hassairi, S. A. (2011, junho). Effects of private equity investment on the decisions of European companies to go private: an empirical study. International Journal of Management, 28(2), 493-508.), tendo como foco a identificação dos fatores determinantes para o fechamento do capital.

Analisando o processo histórico do capitalismo americano, constata-se a consolidação da Moderna Sociedade Anônima (Berle & Means, 1984Berle, A. A., & Means, G. C. (1984). A moderna sociedade anônima e a propriedade privada. São Paulo: Abril Cultural.), como um marco na evolução do ciclo de vida de uma organização, quando se acreditava que o ápice estaria em se tornar uma companhia de capital aberto, com ações negociadas no mercado financeiro (Pagano, Panetta, & Zingales, 1998Pagano, M., Panetta, F., & Zingales, L. (1998, fevereiro). Why do companies go public? An empirical analysis. The Journal of Finance, 53(1), 27-64.; Burghof & Schilling, 2003Burghof, H. P., & Schilling, D. (2003). Going private als corporate governance transaktion. Betr Forsch Prax, BFuP, 5, 117-136.). Nesse sentido, o acesso ao mercado financeiro por meio da colocação das ações da companhia em negociação em bolsa de valores via oferta pública inicial (initial public offering - IPO) foi interpretado como um importante estágio do desenvolvimento e amadurecimento das companhias.

Entretanto, nos últimos anos, tem-se observado no mercado financeiro um movimento contrário - o de fechamento do capital de companhias abertas. Como constataram Michelsen e Klein (2011)Michelsen, M., & Klein, C. (2011, março). "Privacy please!": the public to private decision in Germany. Review of Managerial Science, 5(1), 49-85., em pesquisa sobre fechamento do capital na Alemanha, o número de companhias que optam pelo fechamento do capital tem aumentado. Esses achados contradizem a interpretação linear sobre o ciclo de vida das organizações, apontado por Burghof e Schilling (2003).

Segundo Boot, Gopalan e Thakor (2006Boot, A. W. A., Gopalan, R., & Thakor, A. V. (2006, abril). The entrepreneur's choice between private and public ownership. The Journal of Finance, 61(2), 803-836., 2008), o número de companhias que fecharam o capital nos Estados Unidos da América (EUA) cresceu no final da década de 1990 e início da década de 2000. Em 1999, os indicadores apresentados pelos autores apontam que 83 companhias fizeram o fechamento do capital; em 2000 foram 86; em 2003 foram 262; e em 2004 foram 188 companhias. Para os autores, a principal razão para isso foi o declínio dos preços das ações ocorrido a partir de 2000.

Em uma abordagem gerencial, William M. Sinnet (2002)Sinnet, W. M. (2002, outubro). Why private companies stay private. Financial Executive International, 18(7), 51-53., responsável pela matéria intitulada "Why private companies stay private", publicada no Financial Executives International (FEI), constatou que os executivos entrevistados listaram as seguintes vantagens do fechamento do capital: (i) maior autonomia gerencial conferida aos gestores; e (ii) possibilidade de manter o foco no crescimento de longo prazo, ao invés de valorizar a ação no curto prazo, e resultados trimestrais, entre outras. Os executivos listam, também, algumas limitações do fechamento do capital em termos de: (i) liquidez da posição acionária em caso de necessidade de venda de ações; (ii) acesso a fontes de financiamento, uma vez que é comum os financiadores exigirem garantias pessoais dos acionistas; e (iii) avaliação imediata do empreendimento, visto que as ações da companhia não são comumente transacionadas, entre outras.

No contexto do mercado financeiro brasileiro, observa-se a presença dos dois fenômenos: abertura do capital e fechamento do capital. A Figura 1 ilustra o movimento de capitalização de recursos financeiros oriundos dos movimentos de abertura e fechamento do capital das companhias brasileiras listadas na Bolsa de Mercadorias & Futuros BOVESPA (BM&FBOVESPA).

Figura 1
Capitalização de recursos financeiros referentes aos movimentos de abertura e fechamento do capital de companhias brasileiras no período de 2000 a 2012.

Os dados, disponibilizados pelo World Federation of Exchanges (2014)World Federation of Exchanges. (2014). Statistics. Recuperado de http://www.world-exchanges.org/statistics
http://www.world-exchanges.org/statistic...
, indicam que a capitalização de recursos oriundos da abertura do capital teve um aumento em 2007 e, depois, passou por um momento de oscilação e, então, redução da quantidade de recursos financeiros capitalizados. Em relação à capitalização de recursos oriundos do fechamento, houve um aumento do montante de recursos capitalizados a partir de 2007 e manutenção desse patamar nos anos seguintes, até 2012. Os dados revelam, ainda, que há um movimento inverso nos processos de abertura e fechamento do capital.

Diante dessas constatações, entende-se ser necessário investigar e refletir sobre os fatores determinantes que levam as companhias abertas, que se acreditava terem, com a abertura do capital, atingido o estágio mais elevado do ciclo de vida (Burghof & Schilling, 2003), a tomar a decisão de realizar a oferta pública de aquisição (OPA) para fechamento do capital.

Em parte, a opção por investigar o movimento de fechamento do capital encontra fundamento e motivação nos seguintes aspectos: (i) aumento dos custos de manutenção da companhia no mercado, em decorrência de exigências legais que procuram minimizar a possibilidade de ocorrência de escândalos corporativos, como foram os casos da WorldCom e da Enron; (ii) as evidências teóricas e empíricas que relacionam o desenvolvimento do sistema financeiro a um maior desenvolvimento econômico (De Carvalho, 2002), tornando-se relevante investigar a saída das companhias de um mercado supostamente relevante para o financiamento de seu crescimento; e (iii) o fato apontado por Nóbrega, Loyola, Guedes Filho e Pasqual (2000) de que o fechamento do capital é visto como um fator preocupante, à medida que diminui a oferta de papéis, o número de negócios e a liquidez do mercado. Com isso, segundo os autores, o encolhimento do mercado primário e, por consequência, o secundário pode estimular fundos de investimento estrangeiros, por exemplo, a deixar o mercado brasileiro. Então, o mercado fica menos atraente para novas companhias, o que gera um círculo vicioso ruim para o desenvolvimento do mercado financeiro nacional.

É com base nos argumentos teóricos e nas constatações empíricas aqui apresentadas que se formulou o seguinte problema de pesquisa: "Quais são os fatores determinantes para o fechamento do capital de companhias brasileiras listadas na BM&FBOVESPA?". Definiu-se como objetivo geral da pesquisa identificar e analisar os fatores determinantes para o fechamento do capital de companhias brasileiras listadas na BM&FBOVESPA. O estudo foi realizado por meio da coleta e análise de dados secundários, como será explicitado adiante no tópico que apresenta a metodologia da pesquisa.

Estruturou-se o artigo em quatro tópicos, além desta introdução: (i) no segundo tópico, apresenta-se a discussão acerca do processo de fechamento do capital e identificam-se os fatores determinantes para o fechamento, discutidos na literatura nacional e internacional e utilizados nesta pesquisa; (ii) no terceiro, abordam-se os aspectos metodológicos que indicam os procedimentos para a coleta e a análise dos dados; (iii) no quarto são apresentados, discutidos e analisados os resultados da pesquisa; e (iv) no quinto e último tópico tecemos as conclusões.

2 DELISTING NO MERCADO FINANCEIRO: O FECHAMENTO DO CAPITAL DE COMPANHIAS ABERTAS EM DEBATE

Embora no contexto das discussões sobre a governança corporativa e o mercado financeiro predominem os estudos de companhias abertas, já se observa na literatura internacional e nacional um conjunto de estudos de companhias que efetuaram o delisting, ou seja, fecharam seu capital.

Na literatura internacional, autores como Olper e Titman (1993)Olper, T., & Titman, S. (1993). The determinants of leverage buyout activity: free cash flow vs. financial distress costs. Journal of Finance, 48, 1985-1999., Weir et al. (2005) e Khan et al. (2011) têm observado, nos EUA e na Inglaterra, um significativo aumento do número e dos valores das transações do tipo de público para privado - em inglês, public-to-private (PTP) transactions -, em que companhias abertas fecham o capital, por meio do delisting.

Nesse contexto de aumento do movimento de delisting, Michelsen e Klein (2011) defendem que a decisão pelo fechamento do capital não pode ser apenas resultado de decisões impensadas da administração ou do mau funcionamento dos mercados de capitais. É necessário também considerar o ciclo de vida corporativo, uma vez que as decisões de financiamento corporativo envolvem um contexto dinâmico (Burghof & Schilling, 2003). Ao considerar o ciclo de vida, Michelsen e Klein (2011) defendem que a variável tamanho da companhia tem um importante papel na decisão pelo fechamento do capital. Segundo os autores, as pequenas e as médias empresas são mais propensas a experimentar a subvalorização de seus ativos quando comparadas às grandes corporações, estando mais propensas ao fechamento do capital. Em parte, esse aspecto se justifica pelo fato das pequenas e médias empresas produzirem informações de menor visibilidade e de menor interesse para os agentes de mercado, aumentando, com isso, a assimetria informacional que determina a subvalorização da companhia e, consequentemente, a atratividade pelo fechamento do capital. Por outro lado, o crescimento da companhia está condicionado aos custos de fornecimento de informações obrigatórias ao mercado de capitais que tendem a diminuir com o crescimento da companhia (DeAngelo, DeAngelo, & Rice, 1984DeAngelo, H., DeAngelo, L., & Rice, E. M. (1984). Going private: minority freezeouts and stockholder wealth. Journal of Law and Economics, 27, 367-401.).

Segundo Miller e Frankenthaler (2003), no contexto americano, por exemplo, a instabilidade econômica nos mercados de capitais e as rigorosas exigências impostas pela Lei Sarbanes-Oxley (SOX), de 2002, forçaram as companhias abertas a avaliar a relação entre o custo e o benefício de permanecer negociando suas ações no mercado financeiro. O custo de manter o registro de companhia aberta tornou-se um aspecto fundamental, uma vez que as despesas legais, contábeis e outras despesas relacionadas à manutenção do registro aumentaram drasticamente. Nesse sentido, considera-se relevante que a companhia aberta avalie, por um lado, os custos inerentes às exigências legais e institucionais e, por outro, as vantagens dessa condição, como o melhor acesso ao capital para a expansão dos negócios, o financiamento da diversificação das operações, o reforço da imagem corporativa junto ao mercado financeiro e a disponibilidade de uma ampla gama de incentivos para os administradores e empregados.

Um aspecto relevante em relação à decisão pelo delisting, que parece ser consensual na literatura especializada, refere-se ao fato de que mercados de capitais pobres em performance representam um fator relevante para o fechamento do capital. É comum, nesse tipo de mercado, a presença de companhias listadas cujo valor está subavaliado, assim como problemas de agência, que são adquiridas por outras companhias e retiradas da bolsa de valores para passar por um processo de reestruturação do modelo de governança corporativa, tornando-se mais eficientes e eficazes e, consequentemente, mais valorizadas do que quando estavam listadas na bolsa. Essas transações do tipo PTP caracterizam-se pela substituição do monitoramento público pelo privado, fundamentado na concentração da propriedade e na atuação de investidores financeiros (Weir et al., 2005).

Na literatura brasileira, constata-se a presença de poucos estudos que abordam essa questão. Mesmo assim, é possível encontrar alguns trabalhos que discutem, mesmo que perifericamente, o delisting, como, por exemplo, Moreira (2000)Moreira, L. F. (2000). A recompra de ações na BOVESPA (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre., que verificou o impacto do anúncio de recompra de ações sobre seu preço no mercado secundário, apurando a existência de efeito positivo ou negativo sobre a riqueza dos acionistas; Souza, Costa, Almeida e Bortolon (2013)Souza, J. A. S., Costa, W. B., Almeida, J. E. F., & Bortolon, P. M. (2013). Determinantes e consequências do fechamento de capital nas práticas de gerenciamento de resultados. Revista Evidenciação Contábil & Finanças, 1(1), 38-57. analisaram os efeitos do fechamento do capital nos incentivos às práticas de gerenciamento de resultados de companhias brasileiras. Já Eid Junior e Horng (2005) exploraram de modo preliminar as motivações que levam as companhias a fechar o capital.

Nesse estudo, Eid Junior e Horng (2005) investigaram um conjunto de companhias que cancelaram o registro na BM&FBOVESPA entre janeiro de 2000 e março de 2005. Do total de 188 companhias que fecharam o capital, 50 foram em decorrência da incorporação da emissora da OPA por outra companhia listada na BOVESPA; 18 por falta de atualização de registro; 8 devido à migração para outra bolsa; 103 por pedido voluntário da companhia; e 10 por motivos diversos que incluíam a liquidação e a falência.

As principais conclusões da pesquisa foram: (i) a decisão pelo cancelamento de registro voluntário é resultante da análise dos custos e benefícios de manter-se com o capital aberto; (ii) quando os custos para se manter com o capital aberto são maiores, a companhia decide pelo cancelamento do registro, buscando aumentar os benefícios como uma companhia fechada; (iii) as variáveis crescimento da companhia, free-float, e liquidez na negociação das ações possuem relação inversamente proporcional com a decisão pelo fechamento do capital, ou seja, quanto maior forem essas três variáveis, menores serão as possibilidades de cancelamento voluntário de registro; e (iv) as variáveis porte da companhia, grandes investidores (proxy dos custos de monitoramento) e custos para manter o registro na BOVESPA, não foram significativos para a decisão de cancelamento voluntário de registro (Eid Junior & Horng, 2005).

Foi com base nos estudos e pesquisas realizados no contexto internacional e nacional que se definiu o conjunto de fatores determinantes para o fechamento do capital de companhias abertas (e respectivas variáveis) que norteou o processo de coleta e de análise de dados da pesquisa, como será apresentado no subtópico a seguir.

2.1 Conjunto de Fatores Determinantes para o Fechamento do Capital

Para nortear a investigação empírica, foram definidos oito fatores determinantes para o fechamento do capital, sendo que cada um desses fatores será mensurado tendo como referência um conjunto de variáveis, que são: estrutura de propriedade (concentração de votos e free-float), liquidez, disponibilidade de caixa, pagamento de dividendos, crescimento, tamanho e endividamento.

Os dois primeiros fatores são considerados subfatores relacionados ao fator estrutura de propriedade. Segundo Lawrence (1986)Lawrence, E. C. (1986). A comparative analysis of public firms going private. Review of Business and Economic Research, 21(2), 1-17., Zillmer (2002)Zillmer, P. (2002). Public to private-transaktionen in Deutschland: eine empirische analyse öffentlicher Übernahmeangebote. Finanzbetr, 4, 490-495. e Michelsen e Klein (2011), há evidências de que a concentração da propriedade caracterizada pela concentração de votos é condição essencial para a realização de transações do tipo PTP. Zillmer (2002) e Michelsen e Klein (2011) apontam que, na Alemanha, observa-se que uma das condições para o fechamento do capital é o fato do maior controlador possuir 75% do capital votante da companhia. Em parte, esse aspecto encontra fundamento em razão de: (i) a maior concentração reduzir o custo de coordenação do processo de fechamento do capital; e (ii) quanto maior a concentração de controle, mais fácil será o processo de aprovação da operação de fechamento do capital no conselho de administração da companhia (Lawrence, 1986; Michelsen & Klein, 2011).

Em relação ao free-float, constata-se que quanto maior for a proporção de ações em mãos de pequenos investidores (com participações inferiores a 5%), mais difícil será o processo de aprovação em assembleia de acionistas. Com isso, observa-se que companhias com baixo free-float estão mais propensas ao fechamento do capital (Eid Junior & Horng, 2005; Michelsen & Klein, 2011), uma vez que há redução dos custos envolvidos na aquisição de ações circulando no mercado que viabilizem o fechamento do capital (Zillmer, 2002).

O terceiro fator é a liquidez. Eid Junior e Horng (2005), Weir et al. (2005) e Michelsen e Klein (2011) defendem que quanto menor for a liquidez das ações, maior será o incentivo ao fechamento do capital, uma vez que o mercado de ações perde sua função como elemento de avaliação da companhia e de oportunidade de diversificação do risco dos acionistas. Nesse caso, a baixa liquidez das ações dificulta o processo de capitalização da companhia, favorecendo o delisting da companhia junto à bolsa de valores.

A disponibilidade de caixa é apontada como o quarto fator. Em linha com a argumentação anterior e, também, com o desejo de maior discricionariedade sobre o caixa do grupo de gestores/controladores, espera-se uma relação positiva entre disponibilidade de caixa e probabilidade de fechar o capital (Jensen, 1986Jensen, M. (1986, maio). Agency costs and free cash flow, corporate finance and take-overs. American Economics Review, 76(2), 323-329.; Weir et al., 2005). Segundo Jensen (1986), em companhias abertas os gestores têm incentivos para reter caixa, pois sobre este há maior discricionariedade, o que representa um conflito de agência. O fechamento do capital reduz esse custo, uma vez que representa um aumento da participação dos gestores/controladores junto à companhia. Além disso, a redução desse custo pode ocorrer quando o fechamento do capital é financiado por capital de terceiros que monitoram a aplicação em ações da companhia. O aspecto fluxo de caixa livre está, segundo Jensen (1986), ligado às oportunidades de crescimento. Para o autor, firmas com elevado fluxo de caixa livre, mas com oportunidades de crescimento baixo podem investir os recursos em um conjunto de projetos corporativos duvidosos em termos do valor presente, em razão das limitadas oportunidades de investimentos rentáveis na área de operação da companhia.

O pagamento de dividendos é o quinto fator. Segundo Jensen (1986), Weir et al. (2005) e Michelsen e Klein (2011) companhias maduras, com baixa necessidade de investimentos, principalmente em pesquisa e desenvolvimento (P&D), podem experimentar elevados pagamentos de dividendos. Com isso, payouts podem ser alvo de conflitos de interesse entre acionistas e gestores, uma vez que estes últimos querem gerir o recurso distribuído como dividendo de outra forma. Entretanto, na literatura sobre estrutura de propriedade há evidências da utilização dos dividendos como forma de sinalizar aos acionistas minoritários que eles não serão expropriados. Jordan, Liu e Wu (2014)Jordan, B. D., Liu, M. H., & Wu, Q. (2014). Corporate payout policy in dual-class firms. Journal of Corporate Finance, 26, 1-19. Recuperado de 10.1016/j.jcorpfin.2014.02.004
https://doi.org/10.1016/j.jcorpfin.2014....
mostram que firmas com duas classes de ações (com e sem direito a voto) pagam mais dividendos do que as com somente ações com direito a voto. Masulis, Pham e Zein (2011)Masulis, R. W, Pham, P. K., & Zein, J. (2011). Family business groups around the world: financing advantages, control motivations, and organizational choices. Review of Financial Studies, 24(11), 3556-3600. observam grupos empresariais em 45 países e constatam maiores pagamentos de dividendos em grupos familiares. Bortolon (2013) constata maior pagamento de dividendos em estruturas piramidais de controle no Brasil.

O sexto fator é o crescimento. O mercado de capitais é atrativo para companhias com grandes demandas de investimento, o que não é uma característica de companhias geradoras de caixa e maduras. Com isso, defende-se a existência de relação inversamente proporcional entre crescimento e a decisão pelo fechamento do capital (Eid Junior & Horng, 2005; Boot et al., 2008; Michelsen & Klein, 2011; Khan, Vilanova & Hassairi, 2011).

O tamanho é o sétimo fator. Quanto menor for a companhia, menor será o volume de informações geradas e disponibilizadas ao mercado; menor será a atenção dada a ela pelo mercado; menos analistas a acompanham e isso tenderá a afetar a liquidez de suas ações e a avaliação da companhia. Assim, espera-se que quanto menor for a companhia, maior será a probabilidade de fechar o capital (Boot et al., 2008; Michelsen & Klein, 2011).

O oitavo e último fator é o endividamento. Companhias com menor endividamento são mais propensas a fechar o capital, pelo potencial financiamento via dívida e pelo valor esperado dos benefícios fiscais caso a companhia seja lucrativa (Michelsen & Klein, 2011).

Para operacionalizar a análise dos fatores determinantes para o fechamento do capital, foram definidas variáveis relacionadas a cada um dos fatores (Tabela 1).

Tabela 1
Definição operacional das variáveis analisadas na pesquisa

Todas as variáveis foram observadas nos três anos que antecederam o fechamento do capital, tanto para as companhias que fecharam o capital como para as definidas como "comparáveis". Foram observados os valores médios dos três anos anteriores ao cancelamento de registro, para diminuir a influência de variações momentâneas, captando, com isso, valores que reflitam melhor o fator de análise de interesse. As companhias do grupo de controle também tiveram suas médias observadas nos mesmos períodos da semelhante (comparável) que fechou capital. A não inclusão do ano do cancelamento no cálculo das médias justifica-se pelo fato de várias companhias já não enviarem à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) dados das demonstrações financeiras do ano do cancelamento.

3 ASPECTOS METODOLÓGICOS

Metodologicamente, esta pesquisa caracteriza-se como um estudo quantitativo de natureza descritiva e analítica (Tripodi, Fellin, & Meyer, 1981Tripodi, T., Fellin, P., & Meyer, H. J. (1981). Análise da pesquisa social: diretrizes para o uso de pesquisa em serviço social e ciências sociais (2a ed.). Rio de Janeiro: Francisco Alves.) por meio da coleta de dados secundários junto à base de dados da CVM, da BM&FBOVESPA e da Economática. Foi definido como população do estudo o conjunto de todas as companhias listadas na BM&FBOVESPA que fecharam o capital voluntariamente, por meio de pedido de cancelamento de registro junto à CVM, no período de 12 anos entre 2001 e 2012. Como apontado por Eid Junior e Horng (2005), os cancelamentos não voluntários ocorrem principalmente em função da deterioração dos resultados da companhia. O inadimplemento das companhias junto ao órgão regulador por um longo período também é comum nesses casos, o que torna difícil a obtenção de relatórios para análise.

3.1 Base de Dados

No período investigado foram observados 256 cancelamentos de registros. Foram excluídos do estudo 27 "cancelamentos de ofício" e 2 cancelamentos por "elisão por extinção da companhia", por ser involuntários, restando um conjunto de 227 cancelamentos a analisar, constituindo, assim, a amostra da pesquisa.

Para operacionalizar a análise dos dados, optou-se pela definição de um grupo amostral de controle, denominado "comparáveis", constituído por companhias do mesmo setor e porte das companhias que fecharam o capital, mas que se mantiveram com o capital aberto. Foram adotados os 20 setores utilizados na classificação da base de dados Economática. A partir de uma lista ordenada por setor e tamanho do ativo, buscou-se a companhia cancelada e a que permaneceu ativa mais próxima na referida listagem. Esse procedimento possibilitou identificar o total de 150 companhias "comparáveis" para compor o grupo de controle.

A base de dados de companhias que cancelaram registro foi analisada sob dois aspectos iniciais: a natureza jurídica do principal acionista (controlador) que determinou o fechamento do capital e as motivações para o fechamento do capital.

3.2 Natureza Jurídica do Principal Acionista

A natureza jurídica do principal acionista controlador que determinou o fechamento do capital é uma variável fundamental na análise do fenômeno cancelamento de registro. Companhias que cancelaram registro podem ter sido incorporadas ou ter controladores que são de capital aberto. Nessas situações, de alguma forma, mesmo que indireta, seus resultados seriam conhecidos e alvo de análise pelo mercado. Assim, procedeu-se à análise da estrutura de propriedade das 227 companhias no ano do cancelamento de registro, observando as participações acionárias divulgadas nas informações anuais (IAN) (até 2008) e no formulário de referência (FRE) (a partir de 2009). Em 26 companhias não foi possível identificar a estrutura de propriedade, restando 201 companhias para análise. Os resultados são apresentados na Tabela 2.

Tabela 2
Natureza jurídica do principal acionista que determinou o cancelamento de registro

Com base nesses resultados, observa-se que aproximadamente 44% das companhias podem ser consideradas fechadas de fato, pois os controladores são companhias S.A. de capital fechado (50), Ltda. (29) ou pessoa física (9). Entretanto, cerca de 35% terão alguma visibilidade para o mercado, uma vez que os controladores são S.A. de capital aberto (49) ou foram incorporadas por companhias de capital aberto (22). Vale ressaltar, ainda, o percentual de 14,4% de companhias controladas por estrangeiros que decidiram cancelar o registro. Esses dados sugerem a necessidade de investigação de possíveis diferenças dos determinantes da decisão de fechamento do capital em função das características dos principais controladores.

3.3 Motivações para o Fechamento do Capital

A investigação sobre a motivação para o fechamento do capital foi realizada por meio dos documentos públicos divulgados pelas próprias companhias e disponibilizados no site da CVM. A Tabela 3 apresenta uma síntese dos motivos mais frequentes relatados pelas próprias companhias para relacionar a natureza do controlador de maior frequência. A contagem não totaliza 227 companhias, uma vez que vários motivos podem ser enumerados por uma mesma companhia. Foi possível pesquisar a documentação de 221 das 227 companhias, destas, 137 listaram os motivos. Portanto, a Tabela 3 representa a frequência de motivos observados nessas 137 companhias.

Tabela 3
Motivações relatadas pelas companhias para o cancelamento de registro e natureza do controlador

Como se pode observar, os principais motivos são a reorganização societária e a redução de custos. Em parte, esses resultados podem ser considerados interdependentes e alinhados com a literatura internacional. Como enfatizam Miller e Frankenthaler (2003), é necessário que a companhia aberta avalie a relação entre o custo e o benefício de manter-se com o capital aberto ao optar pelo fechamento do capital.

De certa forma, a redução de custos está relacionada, por diversas vias, à reorganização societária da companhia. Via de regra, essa reorganização está, entre outros fatores, atrelada à busca por ganho de performance decorrente da necessidade de implementação de um processo de reestruturação do modelo de governança corporativa, que envolve a substituição do monitoramento público pelo privado e a concentração da propriedade por meio da aquisição de ações disponíveis no mercado, pela via do movimento de fechamento do capital (Weir et al., 2005).

Ao tentar observar o cruzamento das motivações relatadas com a natureza do principal acionista, não parece haver predominância de um tipo de motivação para determinado tipo de controlador, com os motivos mais citados surgindo nos documentos publicados por companhias controladas tanto por companhias de capital aberto como fechadas.

3.4 Modelos Econométricos

Para análise dos fatores determinantes da decisão de cancelamento de registro foram empregados modelos logit com a seguinte estrutura conceitual:

Prob (Fechamento Capitali = 1) = αi + b1 Estrutura Propriedade i + b2 Liquidez i + b3 Disp. Caixa i + b4 Pagto.Dividendos i + b5 Crescimento i + b6 Tamanho i + b7 Endividamento i

A variável "Fechamento do Capital" é do tipo binário, que assume o valor 1 se a companhia cancelou o registro e 0 em caso contrário. A forma como os fatores do modelo foram operacionalizados foi descrita na Tabela 1.

4 APRESENTAÇÃO, DISCUSSÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Neste tópico são apresentados os resultados das análises estatísticas realizadas junto aos dados secundários dos dois grupos investigados: (i) das companhias que fecharam o capital; e (ii) das "comparáveis", pertencentes ao grupo de controle, que se mantiveram com o capital aberto. Estruturou-se este tópico em duas partes: na primeira são apresentadas as estatísticas descritivas e os testes de diferença de médias e na segunda parte são apresentadas as análises multivariadas (de forma geral e segmentada pela natureza do acionista controlador).

4.1 Estatísticas Descritivas e Testes de Diferença de Médias

As variáveis econômico-financeiras utilizadas para mensurar os fatores determinantes para o fechamento do capital, destacadas na Tabela 1, foram obtidas na base de dados Economática. Das 227 companhias foi possível obter dados de no máximo 165 companhias. Para algumas variáveis, esse número caiu para menos da metade. Esse fato justifica-se pela indisponibilidade de dados na Economática, constituindo uma limitação desta pesquisa. Em relação ao grupo de controle, foi possível identificar 150 companhias semelhantes, porém, de capital aberto ("comparáveis"), para proceder a uma análise comparativa com as 165 companhias que fecharam o capital. Também para esse grupo de controle, os dados referentes a algumas variáveis não estavam disponíveis. A apresentação dos resultados foi subdividida em duas partes: (i) uma referente à análise dos fatores determinantes de modo geral, cujas estatísticas descritivas e os resultados dos testes de diferenças de médias são apresentados na Tabela 4; e (ii) outra da mesma natureza, porém, segmentada por dois tipos de controladores, quais sejam, de capital aberto e de capital fechado, cujos resultados são apresentados na Tabela 5.

Tabela 4
Estatística descritiva e testes t de diferença de médias para amostras independentes
Tabela 5
Estatística descritiva e testes t de diferenças de médias para amostras independentes por tipo de controlador

Dos resultados apresentados na Tabela 4 destaca-se que, em relação ao fator estrutura de propriedade, as variáveis concentração de controle (74,79%) e concentração de propriedade (54,59%) observadas no grupo das companhias que fecharam capital foram maiores quando comparadas às companhias que se mantiveram com o capital aberto (60,27% e 44,61%) e estatisticamente significativas em 1%. O free-float também é significativamente menor, tanto no total de ações quanto nas ações com direito a voto. Além disso, os dados de free-float sugerem que a liquidez das ações das companhias que fecharam o capital seja menor que a das que continuaram abertas, entretanto, não foi constatada significância estatística para as diferenças observadas na proxies de liquidez. Esses resultados corroboram as evidências empíricas encontradas por Eid Junior e Horng (2005).

Apesar das críticas à utilização do Ebitda como proxy para o fluxo de caixa operacional (Marçal, 2006; Salotti & Yamamoto, 2005Salotti, B. M., & Yamamoto, M. M. (2005, outubro). Um estudo empírico sobre o Ebitda como representação do fluxo de caixa operacional: estudo em empresas brasileiras. In Anais do 5º Congresso USP de Controladoria e Contabilidade, São Paulo, SP.), a obrigatoriedade da demonstração de fluxo de caixa somente a partir de 2008 e a ausência desse dado em parte do período analisado motivou sua adoção como medida de disponibilidade de caixa. A diferença é estatisticamente significativa para a relação Ebitda / receita, o que sugere a maior discricionariedade por parte dos principais acionistas e está em linha com os trabalhos de Jensen (1986) e Weir et al. (2005). Essa lógica, entretanto, não se repete na análise do dividend yield. A média dessa variável é menor no grupo que fechou capital, mas a diferença não é estatisticamente significativa. Também não foi possível observar diferenças nos níveis de endividamento dos dois grupos.

O baixo crescimento como motivação para o fechamento do capital não foi confirmado por nenhuma das 4 proxies empregadas na pesquisa, apesar de 3 delas apresentarem médias inferiores para o grupo que fechou capital, as diferenças não são estatisticamente significativas. Esses resultados confrontam os de Eid Junior e Horng (2005), embora se deva ressaltar que os autores não trabalham com companhias semelhantes e adotam bases temporais diferentes para as companhias listadas e as que cancelaram registro. As diferenças no tamanho das companhias são fortemente significativas, sendo as que fecharam capital maiores do que as que continuam abertas. Esse resultado tanto pode sinalizar que aquelas que fecharam o capital são mais maduras como pode indicar menores oportunidades de crescimento.

Como teste de robustez, as diferenças foram observadas nas médias dos 2 anos anteriores e do ano anterior. Não se observaram diferenças relevantes nos achados a partir da média dos 3 anos anteriores ao cancelamento de registro. Na tabela são relatadas apenas as estatísticas t dos testes realizados por economia de espaço.

Já em relação à Tabela 5, observa-se que as características de concentração de propriedade e controle são bastante homogêneas entre os 2 tipos de controladores, entretanto, as proxies de liquidez que na Tabela 4 não mostraram diferenças significativas mostram, aqui, uma liquidez claramente menor para as que tinham como controlador no momento do cancelamento uma companhia de capital fechado. Os resultados são os mesmos para as médias dos 2 anos anteriores e do ano anterior. A disponibilidade de caixa em companhias que, no momento do fechamento, tinham controladores de capital aberto eram maiores do que aquelas com controlador de capital fechado. Esse resultado parece sinalizar que o fechamento do capital pode ser importante para conferir maior discricionariedade ao aproveitamento desse caixa dentro dos grupos empresariais controladores (Jensen, 1986). Novamente, as conclusões se repetem para as médias em diferentes períodos.

As oportunidades de crescimento parecem ser maiores para o grupo cujo controlador era de capital aberto quando observada a relação valor de mercado/patrimônio líquido. Como o número de observações é pequeno para essa variável, métodos não paramétricos foram empregados (testes de Wilcoxon e Kruskal-Wallis) e mostraram resultados consistentes com os anteriores. Os resultados se mantêm para as médias dos dois anos anteriores e do ano anterior.

O grupo de companhias cujo controlador era de capital aberto também apresenta tamanho maior que o grupo com controlador capital fechado. Resultado que se repete para as médias dos dois anos e do ano anterior.

4.2 Análises Multivariadas

A análise multivariada, apresentada na Tabela 6, evidenciou resultados coerentes com os observados nos testes de diferenças de médias. A variável com resultados mais consistentes e significativos estatisticamente é a relação Ebitda/receita, indicando que companhias com boa capacidade de geração de caixa operacional têm maior chance de fechar capital. Esse resultado é coerente com os argumentos de Jensen (1986) sobre a busca de maior discricionariedade na utilização de recursos gerados no negócio.

Tabela 6
Modelos logit

A liquidez apresenta relação negativa com as chances de fechar capital, como esperado. Com a menor liquidez, o mercado de ações perde sua função como elemento sinalizador do valor do negócio, o que também aumenta a assimetria de informações e dificulta a captação de novos recursos (Weir et al., 2005; Michelsen & Klein, 2011).

A estrutura de propriedade também é fator determinante na decisão de fechar capital, como apontado por Lawrence (1986) e Michelsen e Klein (2011); isso é identificado, também, por Eid Junior e Horng (2005) no Brasil. Quanto maior for a participação do maior acionista (capital votante ou capital total), maiores serão as chances da companhia fechar o capital. O free-float apresenta coeficientes de acordo com o sinal esperado indicando que quanto maior for o free-float, menor será a chance de ocorrer o fechamento do capital. Entretanto, embora com diferenças estatisticamente significativas na análise univariada, aqui, os resultados não são estatisticamente significativos. Eid Junior e Horng (2005) encontram relação significativa e negativa, entretanto, não utilizam participações acionárias como variáveis explicativas, o que pode explicar a diferença de resultados.

O tamanho, avaliado pelo logaritmo da receita, apresenta sinal contrário ao esperado e indica que quanto maior for o tamanho da companhia, maior será a chance de fechamento do capital. Os resultados são divergentes em relação ao que defendem Boot et al. (2008) e Michelsen e Klein (2011). Segundo os autores, companhias menores têm menor atenção do mercado e de analistas, o que diminuiria sua liquidez e aumentaria a chance de fecharem o capital. O logaritmo da receita nesta análise, entretanto, pode refletir a maior maturidade do negócio e uma menor necessidade de investimentos, o que diminuiria a atratividade do mercado de capitais como fonte de financiamento, explicando, assim, a relação positiva com a chance de fechar capital. Outra possível explicação está relacionada ao fato de que companhias maiores possuem maior complexidade gerencial e estão mais propensas a conflitos de agência devido à maior dificuldade de monitoramento do agente por parte do principal controlador (Jensen & Meckling, 1976).

Como teste de robustez, os modelos foram estimados considerando as médias das variáveis nos dois anos anteriores e no ano anterior. Os resultados não são essencialmente diferentes, mantendo os mesmos sinais. Entretanto, a significância estatística é mais forte para os resultados de concentração acionária e menos forte para o Ebitda/receita e a liquidez. As variáveis relacionadas a free-float apresentam significância estatística em 5% nos modelos com variáveis médias dos dois anos anteriores e 1% para o ano anterior. Os resultados não são apresentados por economia de espaço.

A maior significância das variáveis relacionadas à estrutura de propriedade (percentual do maior acionista e free-float) nas análises dos dois anos anteriores e ano anterior guarda coerência com a evolução observada entre o terceiro e o ano anterior ao cancelamento. Testes de diferença de médias para essas variáveis comparando os valores três anos antes com o ano anterior ao cancelamento mostram diferenças significativas estatisticamente. As participações acionárias, tanto em direitos de votos como totais, tornam-se mais concentradas e o free-float diminui, o que parece sinalizar um movimento de preparação para o cancelamento de registro. Os resultados estão disponíveis para consulta com os autores.

Na Tabela 7 são exploradas eventuais diferenças nos determinantes, levando em conta os diferentes tipos de controlador. Adotou-se o modelo 1 da Tabela 7 como especificação base e mudou-se a variável dependente, considerando no cálculo apenas as companhias com a característica especificada (controlador capital fechado ou aberto). A escolha do modelo 1 é justificada pela possibilidade de avaliar a participação do maior acionista no capital votante, variável mais relevante na análise de diferenças por tipo de controlador.

Tabela 7
Modelos logit segmentados por tipo de controlador

Os resultados mostram que os determinantes são diferentes dependendo do fato do controlador ser de capital aberto ou de capital fechado no momento do cancelamento de registro. A liquidez, em relação negativa com a chance de fechar capital, como esperado (Weir et al., 2005; Michesen & Klein, 2010), consistentemente significativa na análise anterior, é significativa apenas no modelo com as companhias com controlador de capital fechado. O coeficiente também é mais relevante (-14,59), mostrando maior impacto na chance de ocorrer o cancelamento quando o controlador é de capital fechado.

Diferente do observado com a liquidez, a proxy para disponibilidade de caixa, a variável Ebitda/receita mostra-se estatisticamente significativa apenas no modelo com as companhias com controlador capital aberto. A maior discricionariedade para aproveitamento da geração de caixa parece ser mais relevante para companhias controladas por outras de capital aberto, possivelmente por haver mais oportunidades sinérgicas com outros negócios desse controlador de capital aberto.

A concentração de poder de voto, marginalmente significativa no modelo base com todas as companhias que cancelaram registro, perde significância no modelo com companhias cujos controladores eram de capital fechado. Para as demais variáveis não se observam diferenças entre os tipos de controlador. O tamanho, aproximado pelo logaritmo da receita, tem relação positiva com a chance de fechar capital em todos os três modelos.

5 CONCLUSÕES

Os resultados indicam que o fechamento do capital de companhias listadas na BM&FBOVESPA é determinado pelos seguintes fatores: (i) maior concentração da propriedade e do controle; (ii) menor free-float; (iii) menor liquidez das ações; (iv) maior disponibilidade de caixa; e (v) maior tamanho.

A característica do principal acionista também determina diferenças nesses fatores. A disponibilidade de caixa é o fator mais importante para a decisão de fechamento do capital quando os principais acionistas possuem capital aberto e a liquidez é o fator mais relevante para as companhias cujos principais acionistas são de capital fechado.

Em parte, os resultados são convergentes com as características do mercado de capitais brasileiro e das companhias que nele operam. Segundo Leal, Silva e Valadares (2002)Leal, R. P. C., Silva, A. L. C., & Valadares, S. M. (2002, janeiro). Estrutura de controle das companhias brasileiras de capital aberto. Revista de Administração Contemporânea, 6(1), 7-18., as companhias brasileiras com ações negociadas em bolsa são caracterizadas por: (i) elevada concentração do poder de voto; (ii) participações diferentes dos grandes acionistas no capital votante e no capital total; e (iii) acionistas controladores com participações além da necessária à manutenção do controle.

Com isso, pode-se inferir que a decisão pelo fechamento do capital de companhias listadas na BM&FBOVESPA parece ter na concentração da propriedade e do controle seu eixo central e os demais fatores apresentam-se como complementares. Em outros termos, a decisão pelo fechamento do capital tem sua origem na manutenção do controle da companhia (maior percentual de ações com e sem direito a voto) e, a partir desse fator, os demais são implementados gradativamente até a concretização do processo de fechamento do capital.

Espera-se que os resultados aqui apresentados sirvam de orientação para novos estudos e pesquisas sobre o tema no âmbito da academia e no mercado de capitais e sirvam como sinais de alerta para investidores, no sentido de avaliar a propensão que companhias abertas têm para fechar o capital ou não e avaliar os riscos positivos e negativos do investimento em companhias com essas características.

O estudo apresentou limitações, sendo a principal a carência de dados disponíveis sobre as companhias que passaram pelo processo de fechamento do capital. Essa é uma característica intrínseca desse tipo de companhia pelo fato de estar mais propenso a não compartilhar informações com o mercado após o fechamento do capital. Além desses aspectos, ressalta-se que o estudo tem como foco a análise de fatores internos à companhia e que não foram captados os fatores ambientais, tais como a crise financeira de 2008, que se acredita possa ter influenciado o movimento de cancelamento de registros (positiva ou negativamente).

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    Artigo apresentado na 2ª Edição da BBR Conference: Novos Desafios para Produção Científica, Vitória, ES, dezembro de 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2015
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2015

Histórico

  • Recebido
    23 Jul 2014
  • Aceito
    27 Jan 2015
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