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O academicismo em contabilidade e a gestão por números

Há uma infinidade de índices que classificam as universidades, os departamentos e os pesquisadores individuais com base em uma série de índices. Invariavelmente, incluem uma mensuração da pesquisa, geralmente baseada em uma combinação da quantidade e qualidade de publicações em periódicos. As discussões informais com pesquisadores em contabilidade envolvem a problemática dos rankings de periódicos e dos indicadores da gestão de desempenho. Por que isso funciona assim?

As razões são complexas, porém, entre as entidades de fomento à pesquisa, especialmente as fontes governamentais, observa-se o desejo de concentrar os fundos em centros de excelência. Dado o movimento em direção ao ensino universitário em massa, considera-se impossível financiar todas as pesquisas acadêmicas. Além disso, as universidades voltadas à pesquisa são vistas como produtoras do desenvolvimento econômico, por sua capacidade de inovar em termos de produtos e serviços com alto valor agregado. Consequentemente, os formuladores de políticas são sensíveis aos rankings internacionais de universidades voltadas à pesquisa no contexto nacional em relação à produção de pesquisa e seu impacto. Além disso, há um legítimo desejo de monitorar e responsabilizar aqueles que recebem auxílio financeiro e de verificar se o financiamento tem-se mostrado eficaz.

Para as universidades voltadas à pesquisa, os rankings são vitais quando se trata de reputação e impacto, e não são menos importantes em relação ao recrutamento dos melhores alunos, muitas vezes por um preço premium, atraindo pesquisadores de ponta e obtendo financiamento de pesquisa. Assim, unidades de gestão superior e unidades especializadas monitoram constantemente e buscam administrar o desempenho de pesquisa. Em princípio, isso é sensato: no passado, alguns (porém, provavelmente, uma pequena minoria dos) acadêmicos financiavam a realização de pesquisas e não dedicavam a devida atenção a seus deveres nesse sentido. Trata-se de um erro supor que houve uma "idade de ouro" na qual os pesquisadores autônomos invariavelmente alcançavam avanços substanciais.

Pode-se dizer que a virada em direção a uma maior avaliação da pesquisa trouxe benefícios para a pesquisa em contabilidade. Sua produção e variedade em termos de teoria, temas e estudos empíricos aumentou bastante ao longo dos últimos quarenta anos. A contabilidade tornou-se uma vibrante ciência social. Além disso, os rankings proporcionam proteção aos pesquisadores da contabilidade: os administradores de uma universidade não podem montar a equipe do departamento de contabilidade apenas com professores alheios à pesquisa e comprometidos exclusivamente com o ensino, que muitas vezes se limitam a replicar cursos profissionalizantes, ou deixar os departamentos de contabilidade desprovidos de financiamento da pesquisa ao alocar os recursos para outras áreas sem correr o risco de queda nos indicadores externos de qualidade de pesquisa. Dada a escassez de pesquisadores eficientes em contabilidade no plano internacional, seu valor tem aumentado, o que se reflete nos níveis salariais.

No entanto, esse contexto também trouxe riscos. Há diversos índices de classificação de universidades e departamentos e eles abrangem (embora de modo muito diferente) uma ampla gama de fatores, tais como: o impacto da pesquisa; as contribuições para a comunidade acadêmica e geral; os salários dos alunos após a graduação; e a avaliação do aprendizado dos alunos. Surgem algumas controvérsias acerca da confiabilidade, da mensuração e da eficácia de tais índices. Por exemplo, com frequência, altos índices de aprendizado dos alunos são correlacionados à generosidade da atribuição de notas: por isso, há tendência de aumento das notas e empobrecimento do currículo e das provas. Muitas vezes, a avaliação de periódicos por pares depende do parecer dos reitores, que podem não estar cientes tanto do modus operandi de áreas especializadas, e de acadêmicos estabelecidos, que podem mostrar resistência a novas ideias que contestam sua obra. A capacidade de obtenção de bolsas de pesquisa não está invariavelmente ligada a uma produção eficaz. Os rankings podem estar sujeitos a manipulação e busca de interesses particulares. Por exemplo, há relatos recorrentes de editores que solicitam que os autores excluam referências de periódicos concorrentes e incluam mais referências de suas próprias publicações, a fim de aumentar seus índices de citação e diminuir os índices de seus concorrentes. Além disso, as citações podem não ser confiáveis. Os artigos de revisão tendem a ser citados com mais frequência do que os artigos empíricos especializados e nem todos os artigos em periódicos que ocupam as posições mais altas nos rankings alcançam altos índices de citação, ao passo que diversos artigos publicados em outras fontes os obtêm. Uma análise de todas essas questões vai além do escopo desta contribuição, que se concentra em apenas um elemento, ou seja, a classificação dos periódicos de pesquisa em contabilidade e seu papel na avaliação de desempenho.

A avaliação do desempenho em pesquisa é problemática (Gray, Guthrie, & Parker, 2002Gray, R., Guthrie, J., & Parker, L. (2002). Rites of passage and the self-immolation of academic accounting labour: an essay exploring exclusivity versus mutuality in accounting. Accounting Forum, 26(1), 1-30.; Guthrie, Parker, & Gray, 2004a). Ele pode ser mensurado de vários modos, inclusive de acordo com o volume de publicações, sua "posição" segundo o meio de publicação, o montante do financiamento de pesquisa ou o número de acordos de direitos autorais ou patentes. Os rankings de periódicos provêm de diversas fontes. Em primeiro lugar, há índices elaborados pelos editores, como Science Citation Index, Web of Science, Scopus e ISI, que são baseados em citações em periódicos selecionados. Em segundo lugar, há inúmeros índices elaborados por algumas universidades particulares e seus departamentos, especialmente nos EUA. A pontuação varia consideravelmente, mas com frequência se baseia na percepção dos acadêmicos de ponta, muitas vezes dos reitores, acerca da qualidade de pesquisa. Em terceiro lugar, há tabelas nacionais de classificação, dentre as quais a tabela da Chartered Association of Business School (CABS) do Reino Unido e a tabela do Australian Business Deans Council (ABDC) assumem especial relevância. Ambas foram desenvolvidas ao longo do tempo e têm papel significativo nos exercícios de avaliação de pesquisa realizados por seus respectivos governos. Nenhuma delas segue uma métrica mecanicista, mas os painéis de especialistas acadêmicos baseiam suas pontuações nas percepções levantadas por meio da apuração de consultas públicas, dados qualitativos e quantitativos, exposição ao público e seu feedback e consultoria internacional especializada. Ambas contêm advertências de que não devem ser usadas para juízos "absolutos". Independente do método, muitas vezes o resultado é um ranking de periódicos em uma escala que varia de A* a D. Isso levou muitas universidades a enfrentar dificuldades para recrutar e reter pesquisadores "4 × 4" (aqueles que apresentam 4 artigos publicados em periódicos que ocupam as posições mais altas nos rankings em um período de 4 anos). A equipe que não alcança tais resultados pode sofrer consequências em termos de retenção, aumento da carga horária de ensino e oportunidades de promoção.

Como se poderia esperar, os rankings de pesquisa voltados a periódicos e universidades foram submetidos a considerável exame e debate (ver, por exemplo, Critical Perspectives on Accounting, 2015, 26(1), e Academy of Management Learning and Education, 2009, 8(1)). Há, inclusive, periódicos dedicados ao tema, por exemplo, Research Evaluation and Evaluation: The International Journal of Theory, Research and Practice. Os resultados levantam sérias questões para a pesquisa em contabilidade no âmbito internacional.

Muitos índices, em especial os elaborados por editores e escolas de negócios da vertente norte-americana, englobam apenas um pequeno número de periódicos dentro da gestão e das ciências sociais. Isso se mostra muito marcante em contabilidade, onde o Journal of Accounting Research (JAR), The Accounting Review (TAR), o Journal of Accounting and Economics, e, em certa medida, o Accounting, Organisations and Society (AOS) e o Contemporary Accounting Research (CAR), predominam. Muitos, senão a maioria, dos demais periódicos ou são excluídos ou obtêm uma baixa classificação. Todos são dos EUA, exceto o AOS, que poderia, no caso, ser classificado como um periódico do "meio-Atlântico". Todos eles, exceto o AOS e, em menor medida, o CAR, voltam-se à pesquisa quantitativa, econômica e positivista, em especial em contabilidade financeira, e, paradoxalmente, dada sua atribuição de periódicos avaliados internacionalmente, concentram-se fortemente nos dados e nas questões dos EUA, algo que se reflete na autoria dos artigos e nos membros de seus comitês editoriais.

No entanto, uma característica da pesquisa em contabilidade ao longo dos últimos cinquenta anos tem sido a crescente adoção de teorias e paradigmas alternativos da economia política e das ciências sociais, bem como de métodos de pesquisa qualitativa, principalmente dentro da Europa; e também uma extensão a novos tópicos, por exemplo, crescimento do envolvimento da sociedade civil e da contabilidade social e ambiental. Ao longo dos últimos 20 anos, muitos artigos de alta qualidade foram publicados em um grupo cada vez mais diversificado e mais amplo de periódicos (Guthrie, Parker, & Dumay, 2015Guthrie, J, Parker, L. D., & Dumay, J. (2015). Academic performance, publishing and peer review: peering into the twilight zone. Accounting, Auditing & Accountability Journal , 28(1), 2-13.). Isso trouxe divisões dentro da comunidade acadêmica. Por exemplo, Lowe e Locke (2005Lowe, A. D., & Locke, J. (2005). Perceptions of journal quality and research paradigm: results of a web-based survey of British accounting academics. Accounting, Organizations and Society, 30(1), 81-98.), em um levantamento de pesquisadores em contabilidade britânicos, constataram uma distribuição bimodal aproximada de percepções dos rankings de periódicos: aqueles com uma orientação positivista/funcionalista tendiam a atribuir uma classificação mais alta aos periódicos de sua área, ao passo que os com uma orientação crítica/interpretativista favoreceram periódicos voltados aos seus interesses, por exemplo, AOS, Critical Perspectives on Accounting (CPA) e Accounting, Auditing and Accountability Journal (AAAJ). Em geral, havia evidências de aumento das percepções de alta qualidade atribuídas a estes e outros periódicos mais recentes, como Management Accounting Research.

Potencialmente, é animador como a variedade de abordagens à pesquisa e o surgimento de novos temas podem levar a uma pesquisa mais vibrante em contabilidade, porém, isso ainda não se materializou. Em vez disso, a situação assemelha-se a um evento breve e efêmero. Os periódicos positivistas/funcionalista, supostamente de alta qualidade, raramente publicam artigos de campos novos e emergentes, os autores raramente citam obras fora de seu círculo metodológico, e mesmo quando mudam em direção a temas mais recentes, ignoram pesquisas relevantes fora de seu restrito domínio de periódicos. O silêncio do JAR, do TAR e do Journal of Accounting in Emerging Economies (JAEE) em relação à crítica metodológica é ensurdecedor. Isso tem consequências. Por exemplo, os pesquisadores que estavam previamente focados em retornos financeiros e de investimento passaram a examinar o impacto das estratégias e revelações sociais, ambientais e de sustentabilidade. Tais obras, amplamente informadas pela teoria econômica, têm sido cada vez mais divulgadas nas conferências da vertente norte-americana e similares, porém, não sinalizam nenhuma referência a, ou conhecimento de, pesquisas prévias na área (Guthrie & Parker, 2016Guthrie, J., & Parker, L. D. (2016). Whither the accounting profession, accountants and accounting researchers? Commentary and projections. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 29(1), 2-10.). Assim, as esmagadoras evidências de "maquiagem verde" e as limitações das soluções de casos de negócios são ignoradas. É curioso como, em certas condições, os estudos sociais e ambientais são os artigos mais citados e baixados dos periódicos de contabilidade. Em parte, tal miopia pode ser decorrente das limitações dos programas de doutorado norte-americanos, que restringem a leitura a uma pequena gama de periódicos de "elite" dos EUA. Por exemplo, Schwartz, Williams e Williams (2005Schwartz, B., Williams, S., Williams, P. F. (2005). U.S. Doctoral students familiarity with accounting journals: insights into the structure of the U.S. academy. Critical Perspectives on Accounting, 16(2), 327-348.) constataram que os programas de doutorado norte-americanos tinham pouca familiaridade com periódicos, exceto aqueles tradicionalmente considerados "de primeira linha", e isso se mostrou mais acentuado em programas mais "elitizados". Além disso, há relatos generalizados entre os líderes da academia de contabilidade norte-americana que advertem os professores novatos e os alunos de doutorado acerca do potencial dano à carreira ao publicar em periódicos "alternativos".

Os rankings de periódicos conservadores envolvem uma série de problemas no interior do academicismo global em contabilidade. Os altos índices estão ligados às datas de criação dos periódicos. Basicamente, os periódicos mais antigos, bem estabelecidos, obtêm altas classificações. Os índices comerciais (nos quais os editores podem ter interesses particulares) tendem a ignorar periódicos mais recentes. Conseguir a inserção de um periódico em seus índices requer um longo processo de submissões que, mesmo quando bem-sucedido, é suscetível a levar pelo menos seis anos. Isso pode não se mostrar razoável quando se acredita que adentrar o nível mais alto dos rankings de qualidade de periódicos demanda uma prova substancial de façanha competitiva e que os denominados periódicos de "elite" englobam todos os espectros da pesquisa em contabilidade. No entanto, não é esse o caso. Dadas as pressões impostas aos acadêmicos para publicar em periódicos de "elite", eles podem limitar sua pesquisa aos restritos campos abrangidos por tais periódicos. Portanto, o foco da pesquisa em contabilidade ficou congelado no tempo, e ela se dedica a tópicos e emprega métodos promovidos pelas gerações anteriores. Por exemplo, a história da contabilidade, foco de bastante pesquisa em países latinos, é desprestigiada (em geral, todos os índices de periódicos inexplicavelmente atribuem baixas classificações a publicações de grande mérito, como Accounting History). A lista de tópicos de pesquisa negligenciados por diversos periódicos de ponta em contabilidade é quase infinita. Ela inclui áreas vitais, como contabilidade & desenvolvimento e contabilidade no setor público. Os resultados podem mostrar-se bizarros. Por exemplo, pesquisadores de vários países em desenvolvimento costumam imitar pesquisas sobre o mercado de capitais norte-americano, embora seus países tenham um mercado de capitais fraco, às vezes quase inexistente, e uma economia dominada pelo Estado e empresas de propriedade pública, e questões como a corrupção e o engajamento da sociedade civil sejam primordiais. Apesar do compromisso global com Objetivos de Desenvolvimento do Milênio que enfatizam uma ampla gama de metas de desenvolvimento, por exemplo, educação, saúde, erradicação da pobreza e sustentabilidade ambiental, a pesquisa em contabilidade nacional distancia-se de tais questões em busca de melhores meios para promover os interesses corporativos e das partes interessadas. O problema não se limita aos países pobres. Palea (no prelo) argumenta que a prática generalizada de avaliar a qualidade acadêmica com base em rankings de periódicos, em conformidade com os critérios do mainstream norte-americano, levou pesquisas relevantes em termos do contexto econômico e sociopolítico europeu e dos objetivos fundamentais e da constituição da União Europeia a serem negligenciadas pelos acadêmicos europeus.

A maioria dos índices de pesquisa depende exclusivamente de periódicos publicados em inglês, com evidentes desvantagens para os estudos redigidos em outros idiomas. No entanto, se os rankings forem elaborados para englobar o academicismo do mundo todo em termos on-line, independente do idioma de publicação, então resultados bem diferentes podem ocorrer. Por exemplo, o pesquisador em contabilidade francês Gérard Charreaux acumulou 30 citações em periódicos listados no ISI ao longo de sua vida, enquanto o Google Scholar, que consiste em uma pesquisa de citações na web, constatou que ele recebeu mais de 1.000 citações. A maioria das citações de Charreaux foi recuperada de periódicos franceses não incluídos na base de dados do ISI, porém, é difícil concluir (com base nos dados do ISI) que Charreaux exerceu pequeno impacto em sua área (Adler & Harzing, 2009Adler, N. J., & Harzing, A. W. (2009). When knowledge wins: transcending the sense and nonsense of academic rankings. The Academy of Management Learning & Education, 8(1), 72-95.). Além disso, uma rede de conhecimento global de produtores e consumidores de resultados de pesquisa acadêmica surgiu acompanhada por um crescente volume de obras de diversos países em desenvolvimento (China, Brasil, Rússia e Coreia do Sul), mas ela se torna invisível na maioria dos índices (Larivière, Lozano, & Gingras, 2014Larivière, V. , Lozano, G. A., & Gingras, Y. (2014). Are elite journals declining? Journal of the Association for Information Science and Technology, 65(4), 649-655.).

A maior parte das avaliações de pesquisa em contabilidade privilegia uma única forma de produção acadêmica - artigos de periódico com revisão por pares citados por outros pesquisadores em suas obras publicadas. A maioria dos livros, monografias, trabalhos de congresso e capítulos é ignorada (a exceção é o Google Scholar), porém, até os motores de busca de citações na web são deficientes em termos de registro de citações dentro de e a tais obras (e alguns editores podem assumir a culpa por isso). O resultado foi o virtual desaparecimento do livro acadêmico de autoria única no âmbito da pesquisa em contabilidade. Ademais, na busca pela rápida publicação para atender aos propósitos de curto prazo dos cargos de docência por produção acadêmica, as teses de doutoramento são cada vez mais compostas por vários capítulos em formato de potenciais artigos prontos para submissão a periódicos. Assim, às vezes, elas só abrangem levemente as questões metodológicas. A ênfase na publicação em periódicos tem incentivado o "fatiamento" dos resultados de pesquisa e o afastamento das apresentações abrangentes de investigação científica em formato de livro. Isso é curioso porque, em outras ciências sociais, por exemplo, antropologia, sociologia e política, os livros continuam a ser um importante meio de difusão do conhecimento e eles são avaliados desse modo (Guthrie, Parker, & Gray, 2004bGuthrie, J., Parker, L., & Gray, R. (2004b). Requirements and understandings for publishing academic research: an insider view. In C. Humphrey & W. Lee (Eds.), The real life guide to accounting research: a behind-the-scenes view of using qualitative research methods (pp. 411-432). Oxford: Elsevier.). Por experiência pessoal, é cada vez mais difícil persuadir os líderes acadêmicos a contribuir com livros editados com vistas a tornar o conhecimento de sua área mais acessível a um público mais amplo, seja entre estudantes, profissionais ou formuladores de políticas. Por exemplo, com alguns colegas, editei recentemente uma coletânea de estudos sobre contabilidade em países menos desenvolvidos (Hopper, Tsamenyi, Uddin, & Wickramasinghe, 2012Hopper, T. M, Tsamenyi, M., Uddin, S., & Wickramasinghe, D. (Eds.). (2012). Handbook of accounting and development. Cheltenham: Edward Elgar.). O objetivo foi revisar as pesquisas na área em uma única coletânea para incentivar e auxiliar os principiantes. Felizmente, conseguimos definir autores adequados, porém, várias opções de primeira linha responderam que seria um prazer contribuir porque reconheciam a necessidade de tal livro, mas foram proibidos de escrevê-lo via éditos de reitores que estipulam que eles só devem submeter artigos a 3 ou 4 periódicos indexados.

Para certos autores, as avaliações superficiais de qualidade de pesquisa (principalmente classificações de periódicos) vêm eliminando o modelo tradicional de uma universidade como fórum onde os colegas se envolvem com ideias e insights (Gendron, 2008Gendron, Y. (2008). Constituting the academic performer: the spectre of superficiality and stagnation in academia. European Accounting Review, 17(1), 97‐127.; Hopwood, 2008Hopwood, A. G. (2008). Changing pressures on the research process: on trying to research in an age when curiosity is not enough. European Accounting Review , 17(1), 87-96.). Os valores de referência dos periódicos podem ser a antítese do academicismo e da busca do conhecimento, da criatividade em pesquisa, do enfrentamento de riscos, dos avanços disciplinares e do envolvimento com comunidades, profissões, governo e empresas. Para algumas pessoas, isso reflete a comercialização, corporatização e financeirização das universidades em nível global, onde a pesquisa se torna uma mercadoria cujo proxy é um indicador-chave de desempenho simples. A expansão global de um mercado do Ensino Superior significa que a criação de uma reputação e a exibição de desempenho em pesquisa tornaram-se frequentemente reduzidas à maximização de tais pontuações, com pouca atenção à qualidade e à relevância do conhecimento produzido (Gray et al., 2002Gray, R., Guthrie, J., & Parker, L. (2002). Rites of passage and the self-immolation of academic accounting labour: an essay exploring exclusivity versus mutuality in accounting. Accounting Forum, 26(1), 1-30.; Neumann & Guthrie, 2002Neumann, R., & Guthrie, J. (2002). The corporatization of research in Australian Higher Education. Critical Perspectives on Accounting Journal, 13, 721-741.).

Isso criou um mercado para a pesquisa e os pesquisadores que podem ser negociados no mercado. O montante da produção em pesquisa, os rankings de periódicos e a relação de publicações de um pesquisador tornaram-se objetivos que englobam todas as demais coisas (Marginson & Considine, 2000Marginson, S., & Considine, M. (2000). The enterprise university: power, governance and reinvention in Australia. Cambridge: Cambridge University Press. ). Isso não só prejudica periódicos emergentes e áreas de interesse, mas contribui para a degradação da cultura acadêmica, onde as escolas de administração e os acadêmicos enfatizam o status e a tabela de classificação em vez de abordar importantes questões de interesse para a sociedade em geral. Agora, muitos pesquisadores identificam-se não só por meio de seu campo de pesquisa, mas pela sua vertente metodológica e os periódicos "top" onde publicam, o que promove uma monocultura na qual o meio de publicação é mais importante que seu conteúdo e sua contribuição (Willmott & Mingers, 2012Willmott, H., & Mingers, J. (2012). Taylorizing business school research: on the "one best way" performative effects of journal ranking lists. Human Relations, 66(8), 1051-1073.).

Uma das minhas funções mais deprimentes nos últimos anos tem sido participar de painéis de nomeação em diversas universidades cujos membros, principalmente altos gestores acadêmicos, limitam-se a avaliar os candidatos pelo número de publicações ponderado por uma mensuração da qualidade dos periódicos ao longo de um período. Muitas vezes, isso resultou na nomeação de indivíduos com objetivos triviais. Uma vez fui solicitado a fazer tal classificação e não pude resistir a afirmar que sou um acadêmico, não um marcador de pontos. Como reflexão, eu me pergunto por que alguns departamentos adotam o ritual das entrevistas se poderiam simplesmente classificar os candidatos de acordo com suas pontuações de pesquisa, estipular uma pontuação mínima aceitável e selecionar a partir do topo da lista, como em um orçamento base zero. Do mesmo modo, é triste ver jovens pesquisadores serem pressionados por situações do tipo "publique ou pereça" em detrimento de seu desenvolvimento de pesquisa mais amplo. Em muitos aspectos, as universidades têm reproduzido métodos para controlar e processar o conhecimento similares ao modelo de produção em massa fordista.

No entanto, apesar das reservas acima sobre a avaliação das realizações em pesquisa meramente por indicadores de volume e qualidade, eu não defendo sua completa eliminação, como outros autores recomendam. Como mencionado, os pesquisadores precisam prestar contas. Além disso, ao fornecer evidências um pouco mais objetivas, eles podem facilitar a igualdade de oportunidades, sem deixar de lado a redução da discriminação contra as mulheres e os estrangeiros. Deixar as nomeações, as promoções e a atribuição de financiamento de pesquisa dentro do feudo dos acadêmicos de ponta sem a corroboração por meio de evidências mais objetivas tem promovido e pode promover discriminação e apadrinhamento. Para aqueles que buscam evidências mais consistentes da qualidade de pesquisa, a tabela ABDC proporciona a fonte mais justa e mais extensa, embora deva ser cruzada com o Google Scholar, principalmente no caso de artigos não publicados em inglês. No entanto, como a maioria dos contabilistas pode reconhecer, depender de meros indicadores numéricos não é algo sensato. Os examinadores devem, no mínimo, ler o estudo dos pesquisadores e avaliar seu potencial valor em vez de apenas verificar indicadores de desempenho-chave externos: Isso é inovador? Isso aborda questões políticas e práticas importantes? Paradoxalmente, tenho observado em minha experiência que os departamentos de contabilidade de ponta estabeleceram sua reputação não copiando, mas liderando a área. No entanto, a minha experiência indica que em vez de ouvir pareceres professorais especializados, os pontos de vista relativamente desinformados dos altos gestores universitários predominam cada vez mais, o que sufoca tal criatividade. Compete que as agências de fomento de recursos financeiros, sejam agências governamentais ou instituições de caridade ou associações profissionais, nomeiam painéis de avaliadores que abrangem toda a gama de abordagens metodológicas utilizadas atualmente no âmbito da pesquisa em contabilidade e elas garantem que as submissões sejam avaliadas pelos cânones metodológicos e práticos que sustentam certa abordagem de pesquisa em vez daquelas de um paradigma concorrente. Normalmente, isso iria exigir uma ampla consulta, pareceres especializados diversificados, e tornaria possível a solicitação de comentários externos das partes interessadas.

Por fim, ao longo da minha carreira acadêmica, tenho ouvido pronunciamentos públicos de editores de periódicos que ocupam as posições mais altas nos rankings que se dedicam a uma agenda positivista/funcionalista indicando que eles estão abertos a novas ideias e diferentes abordagens de pesquisa. No entanto, as mudanças no conteúdo de suas publicações foram insignificantes. Talvez eles simplesmente ignorem os estudos alternativos que têm surgido ou se sentem ameaçados por eles ou apenas não os compreendem. O problema não é que seus periódicos não sejam veículos legítimos e dignos para a difusão de áreas especializadas de pesquisa que gozam de prestígio, mas sim que eles passam a impressão de ser (ou são percebidos como) examinadores que lideram toda a pesquisa em nível internacional. Persuadi-los a modificar suas práticas editoriais é algo praticamente fadado ao fracasso. No entanto, tal estado de coisas não prevalece e não precisa prevalecer em nível internacional, o que é comprovado pelo aumento do número de periódicos mais recentes que divulgam novas ideias. Compete aos professores de contabilidade que almejam uma pluralidade de métodos e tópicos garantir que isso seja implementado em decisões administrativas tomadas pelos gestores dentro e fora de suas instituições. Talvez os meios imediatos mais importantes para fazer isso sejam garantir que os programas de doutorado em contabilidade cubram uma ampla gama de temas, teorias e métodos que se destacam na literatura contábil nos dias atuais. Isso pode deixar um legado duradouro e valioso.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2016
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