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Profissional de contabilidade e denúncia: uma tipologia de influência de lógicas institucionais

RESUMO

O objetivo principal do artigo é compreender como as lógicas institucionais (LIs) - Família, Religião, Comunidade, Estado, Profissão, Organização e Mercado de Capitais e de Trabalho - influenciam (ou não) o profissional de contabilidade brasileiro na intenção de denunciar irregularidades. O estudo avança sobre uma lacuna epistêmica ao utilizar a teoria das LIs para compreender o profissional em seu mundo, de forma ampla, em contraposição aos estudos de denúncias que geralmente se baseiam em teorias comportamentais. A maioria desses estudos é quantitativa, utilizando a técnica da vinheta (elaborada por pesquisadores), a qual destaca a relevância deste trabalho, uma vez que opta por permitir que os contadores reflitam sobre o fenômeno e elaborem explicações para suas ações e as dimensões que as circundam. A principal contribuição encontra-se no avanço teórico em contabilidade pela ampliação do modelo clássico de denúncia, para que se reconheça socioinstitucionalmente o processo de reflexão do indivíduo (no nível micro) e os elementos estruturantes (níveis macro e meso) envolvidos. Em termos metodológicos, o estudo é qualitativo e interpretativo, baseado na análise de conteúdo (AC) pela lente do círculo hermenêutico. Dentre os resultados, destacam-se: (a) tipologia da influência das LIs na intenção de denúncia de irregularidades por profissional de contabilidade; (b) diferenciação de influências para favorecer ou evitar a denúncia segundo lógicas diversas; (c) discussões sobre as premissas de que maior proteção e apoio ao denunciante favoreceriam a denúncia ou, em contrapartida, que o reconhecimento e a recompensa financeira seriam considerados fatores que não favoreceriam a denúncia, entre outros aspectos. O impacto e a aplicabilidade do estudo advêm de uma abordagem alternativa em termos epistêmico-metodológicos, permitindo a compreensão da estrutura socioinstitucional que influencia a intenção de denúncia, portanto, possibilitando a construção de mecanismos que ampliem o potencial de denúncia.

Palavras-chave:
contabilidade financeira; profissional contábil; denúncia; lógicas institucionais

ABSTRACT

The main objective of this article is to understand how institutional logics (ILs) - family, religion, community, state, profession, organization, and capital and labor market - influence (or not) the Brazilian accounting professional in their intention to report irregularities. The study helps fill an epistemic gap by using the theory of ILs to comprehensively understand the professional in their world, in contrast with the whistleblowing studies that are generally based on behavioral theories. Most of those studies are quantitative, using the vignette technique (elaborated by researchers), which highlights the relevance of this paper, as it chooses to allow the accountants to reflect on the phenomenon and elaborate explanations for their actions and the dimensions that surround them. The main contribution lies in the theoretical advancement in accounting by extending the classic whistleblowing model, in order to socioinstitutionally recognize the individual’s reflection process (at the micro level) and the structuring elements (macro and meso levels) involved. In methodological terms, the study is qualitative and interpretative, based on content analysis (CA) through the lens of the hermeneutic circle. Standing out among the results are: (a) a typology of the influence of ILs on the accounting professional’s intention to report irregularities; (b) the differentiation of influences that favor whistleblowing or lead to the avoidance of it according to various logics; and (c) discussions about the premises that greater protection and support for the whistleblower would favor whistleblowing or, in contrast, that recognition and financial reward would be considered as factors that would not favor whistleblowing, among other aspects. The impact and applicability of the study derive from an alternative approach in epistemic-methodological terms, enabling an understanding of the socioinstitutional structure that influences whistleblowing intentions, thus allowing for the construction of mechanisms that increase the potential for whistleblowing.

Keywords:
financial accounting; accounting professional; whistleblowing; institutional logics

1. INTRODUÇÃO

O objetivo principal deste estudo é compreender como as lógicas institucionais (LIs) - Família, Religião, Comunidade, Estado, Profissão, Organização e Mercado de Capitais e de Trabalho - influenciam (ou não) o profissional de contabilidade do Brasil na intenção de denunciar sobre irregularidades conhecidas em decorrência da atuação profissional a autoridades ou outras entidades que possam promover providências. Destaca-se que, neste trabalho, adota-se o termo denúncia (português) como equivalente a whistleblowing (inglês).

O objeto (intenção de denúncia por profissional de contabilidade do Brasil) e o sujeito (profissional de contabilidade brasileiro) têm como base a indicação de que o profissional de contabilidade tem uma posição ideal para assistência inestimável e antecipada à identificação de ilícitos pelo seu acesso à informação (Taylor & Thomas, 2012Taylor, E., & Thomas, J. (2012). Blowing the whistle without fear. Accounting Today, 26(5), 8.), podendo evitar resultados danosos às empresas, aos stakeholders e à própria sociedade (Shawver & Clements, 2008Shawver, T., & Clements, H. A. (2008). Whistleblowing: Factors that contribute to management accountants reporting questionable dilemmas. Management Accounting Quarterly, 9(2), 26.).

Adicionalmente, este estudo situa-se no contexto de iniciativas de combate à fraude e à corrupção, tanto no âmbito nacional quanto internacional, com o estabelecimento de normas e mecanismos como a Lei Dodd-Frank nos Estados Unidos da América, que estabelece recompensa financeira como incentivo à denúncia, incluindo a de contadores; a Resolução CFC n. 1.445/2013Resolution CFC nº 1,445/2013. (2013). Discusses the procedures to be observed by professionals and Accounting Organizations, when exercising their functions, for compliance with the obligations foreseen in Law n. 9,613/1998 and subsequent alterations. https://www1.cfc.org.br/sisweb/SRE/docs/RES_1445.pdf
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, que incluiu a obrigação para profissionais de contabilidade denunciarem operações suspeitas de lavagem de dinheiro que tenham conhecimento, a edição da Lei Anticorrupção (Lei 12.846, de 1 de agosto de 2013Law n. 12,846, of August 1st of 013. (2013, August 1st). Discusses the administrative and civil liability of legal entities for practicing acts against the public, national, or foreign administration, and makes other arrangements. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm
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) e seu regulamento (Decreto n. 8.420, de 18 de março de 2015Decree n. 8,420. (2015, March 18th). Regulates Law n. 12,846, of August 1st of 2013, which discussed the administrative liability of legal entities for the practice of acts against the public, national, or foreign administration and makes other arrangements. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/decreto/d8420.htm
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), que estabelecem a manutenção de canais de denúncia pelas entidades brasileiras e, em 2019, o início da discussão sobre a atualização do Código de Ética Profissional do Contador (CEPC) brasileiro alinhado aos padrões internacionais da International Federation of Accountants (IFAC), que indicava a possibilidade de denúncia de irregularidades.

O profissional de contabilidade tinha como paradigma o dever do sigilo (Resolução CFC nº 80/1996Resolution CFC nº 80/1996. (1996). Establishes rules for operational auditing and implements a model for auditing reports. https://leismunicipais.com.br/a/rj/r/rio-de-janeiro/resolucao/1996/8/80/resolucao-n-80-1996-estabelece-normas-para-auditoria-operacional-e-institui-modelo-de-relatorio-de-auditoria
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), e a chamada Non-Compliance with Laws and Regulations (NoClar) da International Ethics Standards Board for Accountants (IESBA) indica que esse profissional deve informar aos órgãos competentes irregularidades encontradas nas entidades às quais preste serviço. Esse contexto se mostrou uma oportunidade para estudar o profissional de contabilidade e as influências sobre a intenção de realização (ou não) de denúncia sobre irregularidades conhecidas em decorrência de sua atuação profissional, que inclui o cumprimento da finalidade da contabilidade, qual seja, fornecer informações aos seus usuários (Ferrari, 2003Ferrari, E. L. (2003). Contabilidade geral. Impetus.) revestidas pela transparência, relevância, fidedignidade, confiabilidade e accountability.

As pessoas que consideram a possibilidade de denúncia podem enfrentar dilemas. Seus papéis envolvem obediência, confidencialidade e lealdade (Bowie & Duska, 1990Bowie, N. E., & Duska, R. F. (1990). Business ethics. Prentice Hall.) à organização a ser denunciada, conflitando com sua integridade (fidelidade a si mesmo) e com as responsabilidades percebidas para com os outros, como associações profissionais ou público em geral (Jubb, 1999Jubb, P. B. (1999). Whistleblowing: A restrictive definition and interpretation. Journal of Business Ethics, 21, 77-94. https://doi.org/10.1023/A:1005922701763
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). Quando empregado, o profissional tem o dever de obediência à empresa, podendo essa situação gerar dilemas (Shawver & Clements, 2008Shawver, T., & Clements, H. A. (2008). Whistleblowing: Factors that contribute to management accountants reporting questionable dilemmas. Management Accounting Quarterly, 9(2), 26.).

A intenção de denúncia é um fenômeno complexo, com implicações psicológicas, organizacionais, sociais e jurídicas (Sampaio & Sobral, 2013Sampaio, D. B., & Sobral, F. (2013). Speak now or forever hold your peace? An essay on whistleblowing and its interfaces with the Brazilian culture. Brazilian Administration Review, 10(4), 370-388. https://doi.org/10.1590/S1807-76922013000400002
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). Na maioria das pesquisas internacionais, os estudiosos têm tido dificuldade em identificar previsores consistentes do comportamento relacionado à denúncia, indicando como inconclusivas variáveis como assertividade, autoritarismo, autoestima e lócus de controle interno relacionadas à dimensão individual, desconsiderando aspectos da estrutura social (Henik, 2015Henik, E. (2015). Understanding whistle-blowing: A set-theoretic approach. Journal of Business Research, 68(2), 442-450. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2014.06.004
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).

Considerando essa complexidade, optou-se, neste estudo, pela Teoria das Lógicas Institucionais (TLI) apresentada por Thornton et al. (2012Thornton, P. H., Ocasio, W., & Lounsbury, M. (2012). The institutional logics perspective: A new approach to culture, structure, and process. Oxford University Press.), por reconhecer que os indivíduos, as organizações e a sociedade sofrem influência de distintas LIs. Essas lógicas podem ser definidas como padrões históricos de práticas, suposições, valores, crenças e regras materiais socialmente construídos pelas quais os indivíduos produzem e reproduzem sua existência material, organizam-se no tempo e no espaço, dando significado à sua realidade social ao lidar com as dimensões micro, meso e macro (Thornton & Ocasio, 1999Thornton, P. H., & Ocasio, W. (1999). Institutional logics and the historical contingency of power in organizations: Executive succession in the higher education publishing industry, 1958-1990. American Journal of Sociology, 105(3), 801-843. ). Considera-se, neste trabalho, que a TLI, por meio das suas LIs, é uma lente que permite compreender, de forma mais ampla, as influências sobre a intenção de denúncia. Destarte, o presente estudo procura responder à seguinte questão: como as LIs influenciam a intenção de denúncia do profissional de contabilidade do Brasil quanto a irregularidades conhecidas em decorrência da atuação profissional? Essa compreensão pode gerar insumos para a elaboração de políticas e diretrizes por legisladores, reguladores e outras entidades.

2. REVISITANDO O MODELO DE DENÚNCIA PELA LENTE DA TLI

2.1 Esclarecendo Conceitos, Origens e Usos

O termo whistleblower, em inglês, surge da união de whistle (apito) e blower (soprador), remetendo à ideia daquele que, identificando determinada situação relevante, assopra o apito para chamar a atenção sobre o que está ocorrendo (Rocha, 2016Rocha, M. A. (2016). Subsídios ao debate para a implantação dos programas e whistleblower no Brasil. Revista de Doutrina da 4ª Região, 75. https://revistadoutrina.trf4.jus.br/index.htm?https://revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao075/Marcio_Rocha.html
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). O sentido da expressão em inglês é mais amplo do que em português (denunciante), porque o conceito de whistleblower se estende à pessoa que divulga informações ao público em geral (podendo ser da sociedade civil ou imprensa), ou seja, no popular, é aquele que “põe a boca no trombone” (Bento, 2015Bento, L. V. (2015). O princípio da proteção ao denunciante: parâmetros internacionais e o direito brasileiro. Novos Estudos Jurídicos, 20(2), 785-809.).

Existem algumas definições de whistleblowing, como a divulgação por membros da organização quanto a práticas ilegais, imorais ou ilegítimas sob controle do empregador para quem possa ter ação efetiva (Near & Miceli, 1985Near, J. P., & Miceli, M. P. (1985). Organizational dissidence: The case of whistle-blowing. Journal of Business Ethics, 4(1), 1-16. https://doi.org/10.1007/BF00382668
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). Ou como ato de divulgação, deliberado e não obrigatório, de pessoa que teve acesso privilegiado a dados da organização, sobre ilegalidade não trivial ou irregularidade real, suspeita ou antecipada, que implica e está sob o controle dessa organização para uma entidade externa com potencial de correção (Jubb, 1999Jubb, P. B. (1999). Whistleblowing: A restrictive definition and interpretation. Journal of Business Ethics, 21, 77-94. https://doi.org/10.1023/A:1005922701763
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).

Neste estudo, restringimos o foco de whistleblowing, associando-o à noção de denúncia e configurando-o como o ato de revelação de uma pessoa (empregado, estagiário, voluntário, prestador de serviço, fornecedor, consultor ou qualquer outro tipo de vínculo, ainda que descontinuado) que tem ou teve envolvimento com as atividades de uma entidade (com ou sem fins lucrativos; privada ou pública; pequena, média, grande) e que, tendo conhecimento sobre desvios (ilegais, imorais, antiéticos, ilegítimos, ilícitos, tais como ações ou omissões relacionadas, por exemplo, a corrupção, fraude, lavagem de dinheiro, nepotismo, abuso de autoridade), em curso ou com potencial de ocorrência, decide relatar a quem possa promover providências (interromper o desvio, apurar responsabilidades, estabelecer sanções, promover divulgação e/ou prevenção) no âmbito interno ou externo à entidade. Destaca-se que os conceitos referentes à informante, testemunha ou participante de acordo de delação ou leniência são distintos e não são tratados neste trabalho.

2.2 Profissional de Contabilidade e Dilema Sigilo-Denúncia

O profissional de contabilidade é visto como conservador, inflexível e técnico (Longo et al., 2014Longo, I., Meurer, A., & Oliveira, M. R. (2014). A imagem do contador pela percepção pública: um estudo sobre o nível de estereotipagem acerca desses profissionais. In Anais do Congresso UFSC de Controladoria e Finanças & Iniciação Científica em Contabilidade (p. 1-17).), mas percebido com integridade e responsabilidade social (Cardoso et al., 2006Cardoso, J. L., Souza, M. A., & Almeida, L. B. (2006). Perfil do contador na atualidade: um estudo exploratório. Revista Base, 3(3), 275-284.). Ao desempenhar seu papel, o profissional de contabilidade enfrenta regras formais, legais e morais de comportamento relacionadas às questões éticas. Compreende-se como ética a preocupação quanto aos julgamentos morais envolvidos na tomada de decisões sobre o que é moralmente certo ou errado ou, ainda, moralmente bom ou ruim, pressupondo-se a existência de padrões morais os quais afetam nosso bem-estar humano, não estabelecidos ou alterados por decisões de órgãos competentes, baseando-se em julgamentos imparciais que sobrepõem os próprios interesses (Riahi-Belkaoui, 2004Riahi-Belkaoui, A. (2004). Accounting theory. Thomson Learning.).

O profissional de contabilidade tem a posição ideal para assistência à identificação antecipada de ilícitos pelo seu acesso à informação (Taylor & Thomas, 2012Taylor, E., & Thomas, J. (2012). Blowing the whistle without fear. Accounting Today, 26(5), 8.), lidando com decisões que podem resultar em julgamentos éticos e morais. Contudo, podem vivenciar o dilema de lealdade, que ocorre a uma pessoa que queira denunciar um malfeito referente à entidade na qual atua (Elliston, 1982Elliston, F. (1982). Anonymity and whistleblowing. Journal of Business Ethics, 1(3), 167-177. ), tendo historicamente, dentre seus deveres profissionais, o sigilo sobre o que souber no exercício profissional (Resolução CFC n. 80/1996Resolution CFC nº 80/1996. (1996). Establishes rules for operational auditing and implements a model for auditing reports. https://leismunicipais.com.br/a/rj/r/rio-de-janeiro/resolucao/1996/8/80/resolucao-n-80-1996-estabelece-normas-para-auditoria-operacional-e-institui-modelo-de-relatorio-de-auditoria
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). Argumentamos que é diante desse dilema, entre a cultura do sigilo e do potencial de denúncia, que as LIs socialmente construídas exercem poder, influenciando a reflexão do contador quanto à intenção de denúncia, em contraponto aos estudos atualmente desenvolvidos no país.

2.3 Lentes Teóricas em Estudos no Brasil

Os estudos sobre denúncia e contabilidade no Brasil têm focado em teorias comportamentais e em elementos específicos como estudantes, setor ou auditor (ver Tabela 1). As teorias comportamentais que sustentam os estudos em denúncia e contabilidade no Brasil são as seguintes: do clima ético; da ação racional/fundamentada; do comportamento planejado ou pró-social; da motivação; do poder; da equidade; da dependência de recursos; da justiça organizacional; cultural de Hofstede; e da agência, sendo agrupadas em fatores organizacionais, individuais, situacionais e demográficos (Vasconcelos, 2015Vasconcelos, A. F. (2015). Influência do julgamento ético, lócus de controle, clima ético organizacional e materialidade do delito sobre as intenções de whistleblowing dos auditores internos no Brasil [Doctoral Thesis]. Universidade da Bahia.).

Tabela 1
Estudos no Brasil relacionando denúncia e contabilidade

Reconhecendo os avanços propiciados por estudos comportamentais anteriores, nesta pesquisa, avança-se ao focar no profissional de contabilidade do Brasil sob a lente sociológica, qualitativa e interpretativa sobre o fenômeno. Assim, procura-se preencher uma lacuna epistêmica ao adotar a TLI para acessar a reflexão do profissional de contabilidade e seu mundo socialmente construído, por meio da análise multidimensional das lógicas.

2.4 A TLI como Oportunidade Epistemológica por meio de suas LIs

A TLI é uma opção para organização e interpretação de eventos, ações, significados e experiências complexos, ambíguos e em evolução em nosso mundo (Smircich & Stubbart, 1985Smircich, L., & Stubbart, C. (1985). Strategic management in an enacted world. Academy of Management Review, 4(10), 724-736. https://www.jstor.org/stable/258041
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). As LIs mostram-se relevantes no balizamento de reflexão e ação individual por serem: “os padrões históricos socialmente construídos de práticas, suposições, valores, crenças e regras materiais pelas quais os indivíduos produzem e reproduzem sua subsistência material, organizam-se no tempo e no espaço e fornecem significado para sua realidade social” (Thornton & Ocasio, 1999Thornton, P. H., & Ocasio, W. (1999). Institutional logics and the historical contingency of power in organizations: Executive succession in the higher education publishing industry, 1958-1990. American Journal of Sociology, 105(3), 801-843. , p. 804, tradução livre nossa).

Conforme Hills et al. (2013Hills, S., Voronov, M., & Hinings, C. R. (2013). Putting new wine in old bottles: utilizing rhetorical history to overcome stigma associated with a previously dominant logic. In S. Hills et al. Institutional logics in action (pp. 99-137). Emerald.), uma das principais contribuições das LIs é permitir reconhecer, de forma mais ampla, as contradições e contestações institucionais que permeiam várias áreas, resultando em impacto tanto às pessoas quanto às organizações, principalmente quando atores tentam deslocar uma lógica para outra, defender uma lógica preferida ou navegar em lógicas múltiplas que coexistem em uma área. As LIs têm sido usadas para o desenvolvimento dos mais diversos tipos de estudo, até mesmo sendo esse fato, de acordo com Friedland e Arjaliès (2019Friedland, R., & Arjaliès, D.-L. (2019). X-institutional logics: Out or in? [Working Paper]. Social Science Research Network. ), o argumento mais usado pelos seus críticos.

As principais críticas e defesas às LIs identificadas estão consolidadas na Tabela 2. Apesar das críticas, pode-se reconhecer que a sociedade é composta por múltiplas ordens institucionais ou grupos sociais os quais têm uma lógica central própria formada por práticas e símbolos que compreendem princípios disponíveis para elaboração dos indivíduos e das organizações e, assim, o possível valor das LIs como lente para estudos.

Tabela 2
Lógicas institucionais (LIs) - Críticas e defesas

Essas LIs servem para decifrar os vocabulários de motivos, de lógicas de ação e o sentido de si em um setor social específico, como a Família, a Religião, o Estado, a Profissão, a Organização, o Mercado (Thornton, 2004Thornton, P. H. (2004). Markets from culture: Institutional logics and organizational decisions in higher education publishing. Stanford University Press.) e Comunidade (Thornton et al., 2012Thornton, P. H., Ocasio, W., & Lounsbury, M. (2012). The institutional logics perspective: A new approach to culture, structure, and process. Oxford University Press.). As LIs na sociedade se referem, portanto, a entendimentos aceitos para a adequação em contextos distintos, como mercados, profissões e comunidades e, para tanto, residem e perpetuam-se por meio de formas e categorias organizacionais legítimas, assim como por discursos, práticas e identidades coletivas (Almandoz, 2014Almandoz, J. (2014). Founding teams as carriers of competing logics: When institutional forces predict banks’ risk exposure. Administrative Science Quarterly, 59(3), 442-473.) que, neste estudo, objetivam ser reconhecidas e incorporadas ao modelo clássico do processo de denúncia.

2.5 Modelo de Denúncia pela Lente da TLI

Os estudos sobre denúncia, em geral, sustentam-se em um modelo clássico que, conforme Henik (2015Henik, E. (2015). Understanding whistle-blowing: A set-theoretic approach. Journal of Business Research, 68(2), 442-450. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2014.06.004
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), é composto por cinco estágios: ocorrência de um evento como gatilho; um observador reconhece o evento como problemático e decide qual ação tomar; há a ação; a organização reage ao relatório; e o denunciante avalia a resposta e decide se encerra ou reinicia o processo. Esse modelo é base para o proposto neste estudo, mas, como as influências institucionais são desconsideradas, entende-se que deva ser ampliado pela TLI de forma a permitir reconhecer a reflexão do indivíduo diante de elementos advindos da estrutura social na qual está imerso. Assim, propomos o Modelo do Processo de Denúncia a partir desse apresentado por Henik (2015Henik, E. (2015). Understanding whistle-blowing: A set-theoretic approach. Journal of Business Research, 68(2), 442-450. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2014.06.004
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), cuja ampliação pela TLI permite a inclusão de um segundo estágio (ver Figura 1). Ou seja, entre o evento desencadeador e a ação em si, propõe-se que se reconheça o processo de reflexão do indivíduo, momento no qual as LIs de nível macro (sociedade) e meso (ambiental) influenciam a intenção de ação no nível micro (indivíduo).

A inclusão do segundo estágio, referente à intenção de denúncia, ocorre depois do reconhecimento do evento como problemático e antes do estágio da definição da ação a ser tomada (realização ou não da denúncia). É nesse que o observador reflete sobre o potencial de denúncia, sofrendo influência das LIs, construindo um sentido de sua intenção à realização ou à evitação da denúncia. Muitas denúncias podem, de fato, nunca ocorrer e o modelo ser interrompido ainda nesse segundo estágio, pois o sujeito é influenciado pela teia de lógicas na qual está imerso.

Figura 1
Contribuição ao Modelo do Processo de Denúncia

Portanto, com a incorporação do segundo estágio e das LIs, pretende-se acessar a compreensão do contador, refletindo sobre ele mesmo em um mundo socialmente constituído, estruturado e institucionalizado e que pode ser compreendido em níveis de poder como social, estrutural e situacional, embalando, assim, as forças da sociedade, das instituições e do indivíduo (Alford & Friedland, 1985Alford, R. R., & Friedland, R. (1985). Powers of theory: Capitalism, the state and democracy. Cambridge University Press.). Procura-se atender à lacuna apontada na literatura de se reconhecer as complexas influências na vida organizacional, sugerindo atenção para os sentimentos e as crenças, tanto quanto à cognição como às escolhas (Mutch, 2018Mutch, A. (2018). Practice, substance, and history: Reframing institutional logics. Academy of Management.).

3. METODOLOGIA

Os estudos em LIs têm usado os seguintes meios de análise: eventos históricos; métodos interpretativos; triangulação e tipos ideais, podendo acomodar dados em vários níveis de análise, como nível individual (micro), organizacional (meso) e ambiental (macro) (Thornton & Ocasio, 2008Thornton, P., & Ocasio, W. (2008). Institutional Logics. In R. Greenwood et al., The SAGE handbook of organizational institutionalism (99-128). Sage.). Neste estudo, optou-se pela triangulação de métodos [análise de conteúdo (AC), análise hermenêutica (AH), tipologia] e pelo foco em capturar, no nível microindividual, as influências do nível meso-organizacional e macroestrutural (Sauerbronn & Faria, 2011Sauerbronn, F. F., & Faria, A. (2011). Agência em estratégia: conectando prática social e codeterminação. RAM. Revista de Administração Mackenzie, 12(6), 49-75.).

Neste estudo, o sujeito da pesquisa é o profissional de contabilidade brasileiro. A pesquisa foi disponibilizada pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e conselhos regionais de cada unidade federativa aos seus membros. De forma complementar, usou-se a técnica de snowball, na qual o participante é incentivado a divulgar a pesquisa a seus pares. A escolha do profissional de contabilidade como sujeito da pesquisa teve como base teórica que esse tem a posição ideal para assistência à identificação de ilícitos (Taylor & Thomas, 2012Taylor, E., & Thomas, J. (2012). Blowing the whistle without fear. Accounting Today, 26(5), 8.). Este estudo está delimitado ao sujeito de pesquisa, o profissional de contabilidade brasileiro (contador e técnico), não se observando outros tipos de profissionais.

Elaborou-se um questionário (Google Docs) para promover o anonimato e a segurança dos participantes. O instrumento sustentou-se na TLI (Thornton et al., 2012Thornton, P. H., Ocasio, W., & Lounsbury, M. (2012). The institutional logics perspective: A new approach to culture, structure, and process. Oxford University Press.) e foi dividido em seis partes (ver Tabela 3): (i) sobre o perfil do participante; (ii) sobre os principais fatores (sentido amplo) de influência à realização ou não de denúncia e conhecimento de casos referentes à intenção ou realização efetiva de denúncia; (iii) sobre como cada LI influenciaria na denúncia; (iv) sobre quais as LIs que exercem maior influência à intenção de denúncia tanto para realização quanto para não realização; (v) sobre a influência de proteção, reconhecimento, apoio e recompensa; e (vi) uma questão de encerramento para registro de impressões, sugestões ou comentários. Destaca-se que foi realizado pré-teste em duas fases com 18 participantes, aplicando-se o questionário seguido de conversa para averiguação de compreensibilidade, coerência e consistência de cada pergunta.

As duas primeiras partes do questionário foram planejadas para serem respondidas antes das questões específicas sobre a influência das LIs com objetivo de obter respostas isentas dos conceitos que seriam introduzidos na sequência; já as questões finais foram planejadas para serem respondidas depois da introdução desses conceitos. Foram analisados 81 questionários.

Tabela 3
Estrutura do instrumento de coleta de dados

Ressalta-se que o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) com informações sobre o estudo e os compromissos éticos foi assinado no acesso à pesquisa online.

Para a análise dos dados, foi empregada a AC e AH. A AC é um conjunto de instrumentos metodológicos aplicados a discursos extremamente diversificados, incluindo extração de estruturas traduzíveis em modelos, sendo o corpus constituído pelo material submetido aos procedimentos analíticos (Bardin, 1977Bardin, L. (1977). Análise de conteúdo. Martins Fontes.). O corpus neste estudo tem 1.377 registros gerados a partir de 81 questionários com 17 questões. A escolha da geração do corpus a partir de categorias a priori baseadas na TLI pode ser considerada uma limitação ao uso do presente corpus para futuras pesquisas. Corpora distintos poderiam ter sido formados caso adotássemos outra teoria interpretativa ou crítica.

A AC foi desenvolvida em três fases: pré-análise, exploração do material e tratamento dos dados, inferência e interpretação (Bardin, 1977Bardin, L. (1977). Análise de conteúdo. Martins Fontes.). A fase de pré-análise iniciou-se com a transferência do conteúdo de 82 questionários, sendo 81 analisados (apenas um questionário incompleto). Com o suporte do software MaxQDA, fez-se a organização e sistematização inicial para as atividades subsequentes.

Este estudo utilizou-se de categorias a priori e a posteriori que se distinguem pela classificação de formas específicas de conhecimento segundo Boghossian e Williamson (2020Boghossian, P., & Williamson, T. (2020). Debating the a priori. Oxford.) -, sendo a priori a categoria estabelecida previamente de forma independente da experiência e a posteriori a categoria cuja definição depende da experiência e dos dados coletados. Assim, conforme as fases do design de pesquisa, as respostas foram categorizadas na AC a partir das seguintes categorias a priori (ver Tabela 4): (i) LI - Família, Religião, Comunidade, Estado, Profissão, Organização, Mercado de Capitais e Mercado de Trabalho (Thornton et al., 2012Thornton, P. H., Ocasio, W., & Lounsbury, M. (2012). The institutional logics perspective: A new approach to culture, structure, and process. Oxford University Press.); (ii) influência de cada LI, considerando que participantes poderiam não responder, responder que LI influencia ou não influencia a denúncia; (iii) sentido da influência, considerando que a resposta poderia ser positiva (+) para realização de denúncia, negativa (-) para evitação de denúncia, positiva/negativa (+/-) para quando há, simultaneamente, influência de realização/evitação.

Tabela 4
Categorias e subcategorias a priori definidas neste estudo

Já as categorias a posteriori surgem com base no conceito de fishing expeditions de Bardin (1977Bardin, L. (1977). Análise de conteúdo. Martins Fontes.), conforme a repetição de registros de experiências dos participantes. Portanto, são dependentes da experiência dos participantes e de como seus relatos são lidos e interpretados pelos pesquisadores. Na fase de exploração, com objetivo de processar os dados transformando-os de forma sistemática em unidades que permitam a descrição das características pertinentes ao conteúdo, realizou-se a codificação com base nas categorias a priori e nas LIs, influência e sentido (realização/evitação) em cada questão (Tabela 4).

Na fase da AC referente ao tratamento dos dados, inferência e interpretação, busca-se que os resultados sejam significativos (falantes) e válidos, permitindo inferência e interpretação. Como sugere Gibbs (2009Gibbs, G. (2009). Análise de dados qualitativos. Artmed.), foi importante perguntar "o que está acontecendo aqui?", ocasionando a compreensão do quanto esse profissional tem a dizer e a ser conhecido. Daí emergem as categorias a posteriori na fase final da análise de tratamento, constituindo os elementos da Tipologia de Influências das Lógicas Institucionais (TILIs), um dos produtos deste estudo (ver Tabela 5 na seção Resultados).

Adotou-se para análise o círculo hermenêutico, segundo Farooq (2018Farooq, M. B. (2018). A review of Gadamerian and Ricoeurian hermeneutics and its application to interpretive accounting research. Qualitative Research in Organizations and Management, 13(3), 261-283. ), que congrega insights decorrentes da hermenêutica de Gadamer e Ricoeur. Assim, a leitura não foca somente na compreensão do texto, desprovida de qualquer raciocínio. É necessário, conforme os ensinamentos de Ricoeur, dar uma volta maior (long detour), considerando-se que a explanação envolve a realização da análise estrutural do texto, identificando-se seus componentes e o relacionamento de um com o outro (Farooq, 2018Farooq, M. B. (2018). A review of Gadamerian and Ricoeurian hermeneutics and its application to interpretive accounting research. Qualitative Research in Organizations and Management, 13(3), 261-283. ).

As cinco fases do círculo hermenêutico de Farooq (2018Farooq, M. B. (2018). A review of Gadamerian and Ricoeurian hermeneutics and its application to interpretive accounting research. Qualitative Research in Organizations and Management, 13(3), 261-283. ) consideram: (a) que o leitor está localizado em determinado contexto sócio-histórico, carregando preconcepções que definem o horizonte de compreensão existente do leitor; (b) que a pré-configuração e os pré-entendimentos auxiliam o leitor na interpretação do texto, permitindo-o superar as possíveis lacunas (texto-leitor); (c) que o texto é uma entidade autônoma distanciada de seu autor, público e contexto originais, tendo-se o texto descontextualizado que pode ser lido por qualquer leitor de diferentes contextos sócio-históricos; (d) que, na configuração, o leitor busca habitar o mundo do texto, imergindo nele, apropriando-se dele, mas desconfiando da sua linguagem, usando a reflexividade crítica para identificar as estruturas de poder e de ideologias dominantes, assim como para distanciar-se de pré-conceitos improdutivos, permitindo, em contrapartida, que o texto desafie os pré-entendimentos do leitor, sem que nenhum dos dois domine o outro; (e) que na reconfiguração há fusão dos horizontes do texto e do leitor, criando novos horizontes ou perspectivas de compreensão, pois esse se apropria do significado do texto, tornando próprio aquilo que era estrangeiro, permitindo-se ganhar novas compreensões dos fenômenos e da autocompreensão.

A proposta de círculo hermenêutico de Farooq (2018Farooq, M. B. (2018). A review of Gadamerian and Ricoeurian hermeneutics and its application to interpretive accounting research. Qualitative Research in Organizations and Management, 13(3), 261-283. ), como pressuposto epistêmico-metodológico, permitiu acesso a esse conhecimento ao recuperar de Gadamer a “fé nas histórias contadas”, e de Ricoeur a “reflexividade e a desconfiança”. E, ainda, a aplicação de um processo iterativo de interpretação em que, para se compreender o todo, é preciso compreender as partes do texto e vice-versa. A estratégia de coleta e análise considerou o processo hermenêutico no qual as questões seguem uma sequência e a resposta é interpretada, considerando-se a questão que a motivou. A adoção do círculo hermenêutico foi relevante para o desenvolvimento deste trabalho, demonstrando a necessidade: (a) de localização dos pesquisadores, de seu contexto sócio-histórico, preconcepções e horizontes de compreensão; (b) de pré-entendimentos e possíveis lacunas (leitor-texto); (c) de consideração do texto como entidade autônoma; (d) na configuração, de se habitar o mundo do texto, apropriando-se e desconfiando-se dele; e (e) na reconfiguração, uma fusão de perspectivas de compreensão.

4. RESULTADOS

A partir das 81 respostas analisadas, foi possível constatar que os participantes têm 40 anos em média, 60% são homens, 98% têm nível superior, 36% têm título em lato sensu, 36% têm mestrado, 22% bacharel, 4% doutorado e 2% técnico. A partir da consolidação da AH e da AC, foi possível a elaboração de uma TILIs sobre a intenção de denúncia (ver Tabela 5).

Cabe destacar que uma tipologia é um meio heurístico - não uma explicação integral e exaustiva - que visa a estabelecer o sentido do tema que está sendo investigado (Sauerbronn, 2009Sauerbronn, F. F. (2009). Co-determinação e não-ação em estratégia de responsabilidade social empresarial [Doctoral Thesis]. Fundação Getulio Vargas., p. 158) e agregar os resultados para organizar o conhecimento (Bertero, 1981Bertero, C. O. (1981). Tipologias e teoria organizacional. RAE-Revista de Administração de Empresas, 21(1), 31-38. , p. 32).

A consolidação de categorias a posteriori que emergiram das declarações dos participantes permitiu o desenvolvimento da tipologia sobre a intenção de denúncia com base nas LIs. Considerou-se que a influência (para cada uma das LIs) pode ser no sentido tanto da realização quanto de evitação da denúncia, bem como um misto de realização/evitação. As categorias na tipologia (Tabela 5) surgem a partir dos significados capturados e são consolidados, como as influências das LIs sobre a intenção de denúncia (whistleblowing), as quais serão discutidas em maior profundidade na sequência.

4.1 Família

Um dos pré-entendimentos era que a LI Família não seria indicada como relevante, já que a profissão é altamente regulada, tendo implicações legais importantes. A expectativa era da indicação das LIs Profissão e Estado como as mais relevantes. Entretanto, os resultados indicam que a LI Família exerce grande influência na intenção do profissional de contabilidade para realização de denúncia sobre irregularidades conhecidas em função do exercício da profissão, exercendo também influência à evitação. Near e Miceli (1985Near, J. P., & Miceli, M. P. (1985). Organizational dissidence: The case of whistle-blowing. Journal of Business Ethics, 4(1), 1-16. https://doi.org/10.1007/BF00382668
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) sugerem que a família teria sempre papel relevante sobre a intenção de denúncia, em função do apoio dado ao denunciante, até mesmo financeiro. Neste estudo, essa assertiva é confirmada e expandida. Os achados neste estudo apontam para um papel muito mais abrangente quanto à intenção de denúncia do profissional de contabilidade do Brasil, conforme as declarações dos participantes que foram sintetizadas na tipologia. As declarações indicam que a família tem influência acentuada tanto no sentido da realização, em função da ética da família de origem e da família constituída, quanto no sentido de evitação, em função dos riscos adversos à família, principalmente os de subsistência e integridade física.

4.2 Religião

Os achados deste estudo indicam a influência da LI Religião tanto à realização quanto à evitação de denúncia, em função de reprovações ou aprovações da consciência expressada nos elementos referentes ao “julgamento divino”, que tanto pode ser punição ou absolvição do denunciante ou mesmo do infrator. Os conceitos de unidade de crenças e de práticas sagradas de Durkheim (Aldridge, 2010Aldridge, A. (2010). Religião. In J. Scott., Sociologia: conceitos-chave (pp. 171-174). Zahar.) são respaldadas pelos elementos referentes à crença e à prática como influências à denúncia.

Tabela 5
Tipologia de Influências das Lógicas Institucionais (TILIs) sobre a intenção de denúncia

As declarações registradas, de forma geral, ratificam o conceito que a religião é um arranjo social que promove uma forma coletiva e compartilhada de lidar com os dolorosos processos de tomada de decisões de natureza moral (Johnson, 1997Johnson, A. G. (1997). Dicionário de sociologia: Zahar.). Os participantes apresentam algumas contraposições em suas declarações, tais como a prática do perdão ou exposição do pecado alheio, o sentimento de justiça, de benfeitor ou de malfeitor. Essas podem ser associadas ao conceito de Foucault, no qual a religião é um construto social que legitima e distingue afirmações verdadeiras e falsas, servindo como componente-chave nas formações discursivas de poder (Aldridge, 2010Aldridge, A. (2010). Religião. In J. Scott., Sociologia: conceitos-chave (pp. 171-174). Zahar.).

Neste estudo, identificou-se que a LI Religião exerce influência na intenção do profissional de contabilidade para a realização de denúncia sobre irregularidades conhecidas em função do exercício da profissão. Porém essa influência é apresentada como reduzida em comparação com outras LIs, porque os profissionais de contabilidade a indicaram na quarta posição entre as cinco identificadas como as maiores influências para realização de denúncias. Essa indicação contrasta com a relevância dessa LI nos discursos registrados.

4.3 Comunidade

Os resultados corroboram o conceito de que a LI Comunidade tem influência, podendo a denúncia, em comunidade, ser vista como um comportamento altruísta para proteção do interesse público (Alleyne, 2010Alleyne, P. A. (2010). The influence of individual, team and contextual factors on external auditors’ whistle-blowing intentions in Barbados. Towards the development of a conceptual model of external auditors’ whistle-blowing intentions [Doctoral Thesis], University of Bradford. http://hdl.handle.net/10454/5325
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) ou como uma ação egoísta, por objetivo estratégico pessoal (Wahl-Jorgensen & Hunt, 2012Wahl-Jorgensen, K., & Hunt, J. (2012). Journalism, accountability, and the possibilities for structural critique: A case study of coverage of whistleblowing. Journalism, 13(4), 399-416.). Os achados corroboram a contribuição da comunidade para a reflexão e a formação ética e moral de seus membros, sendo também respaldada a conceituação de Amitai Etzioni (1929Etzioni, A. (1929). A sociedade deveria articular o que é bom. In M. Hobbs et al. (Orgs.), O livro da sociologia (pp. 114-119). Globo., p. 117), que diz que "comunidades são uma rede de relações sociais" que "englobam sentidos e, acima de tudo, valores compartilhados".

Contudo, as declarações indicam a influência tanto no sentido de realização quanto de evitação de denúncia em função do nível de elasticidade ética e moral da comunidade, confirmando o conceito que comunidades nem sempre são virtuosas (Etzioni, 1929Etzioni, A. (1929). A sociedade deveria articular o que é bom. In M. Hobbs et al. (Orgs.), O livro da sociologia (pp. 114-119). Globo.). As declarações dos participantes apresentam entrelaçamento teórico com o sentimento de “compromisso mútuo” e de “acentuada interdependência”, confirmando alguns psicólogos que consideram que a comunidade inclui esses sentimentos (Johnson, 1997Johnson, A. G. (1997). Dicionário de sociologia: Zahar., p. 45), porque o membro procura agir de forma a repetir as ações reiteradas e valorizadas pela comunidade para ser aceito e admirado, evitando ser julgado e excluído.

4.4 Estado

Os resultados indicam que a LI Estado tem influência, sendo explicitada nas declarações a expectativa de que o Estado tenha a função de regular, educar, proteger e controlar o cidadão, assim como de apoio, orientação, educação e informação, confirmando Biesanz e Biesanz (1972Biesanz, J., Biesanz, M. (1972). Introdução à ciência social. Nacional.), como citado em Lakatos e Marconi (1999Lakatos, E. M., & Marconi, M. (1999). Sociologia geral. Atlas.). Nos achados, há menções à regulação, pela legislação ou pelas ações do Estado, à educação por meio de ações para esclarecimentos sobre a legislação, e à proteção, por meio de vários elementos, como a necessidade de legislação, estabelecendo direitos e proteção dos denunciantes, principalmente em relação ao anonimato e ao controle do cidadão. As atividades do Estado são consideradas necessárias, sobretudo quanto à repressão de atividades lesivas ao interesse coletivo, nas categorias que fazem referência ao bem comum, à contribuição para o desenvolvimento do país, à melhor gestão ou economia de recursos públicos, ao fortalecimento das instituições e à transparência pública.

A disponibilização de instrumentos de controle social e de transparência pública é mencionada como elemento que pode promover a identificação de irregularidades, influenciando a denúncia. A falta de incentivo e de informação para a denúncia, assim como a falta de apoio, de proteção, de mecanismos de anonimato e de credibilidade das apurações e a ineficiência do Judiciário e do Estado, como um todo, podem levar à descrença no Estado, principalmente pela percepção de que há impunidade. Destarte, o Estado tem papel relevante na promoção da ordem e do bem-estar social, regulando, protegendo e controlando as relações entre as entidades, sendo esperado que atue no combate a irregularidades, principalmente quanto à fraude e à corrupção. É indicado que o profissional de contabilidade se ressente do Estado, sobretudo quanto às suas funções de regulação, proteção, controle das entidades, assim como no auxílio, apoio, orientação e educação àquele que, com o conhecimento de uma irregularidade, tiver intenção de denunciar.

4.5 Profissão

A contabilidade apresenta o status de profissão, mencionado por Weber, com critérios racionais de competência estabelecidos por entidades profissionais que atuam como autoridades legítimas para promoção da deontologia profissional, conforme indicado por Durkhein, e apresenta a relação poder/dependência indicado por Parsons, já que o profissional de contabilidade tem conhecimento técnico específico que sugere a dependência do cliente. O fechamento em grupos semicorporativos (Boudon & Bourricaud, 2007Boudon, R., & Bourricaud, F. (2007). Dicionário crítico de sociologia. Ática.) com objetivo de resguardar o status e os privilégios da profissão é consubstanciado na indicação que as entidades, em relação à intenção de realização de denúncia, priorizam preponderantemente as denúncias relacionadas ao exercício ilegal da profissão. E esse seria um elemento que influencia a evitação de denúncia sobre outros tipos de irregularidades. Os resultados indicam que uma das principais preocupações do profissional contábil é perder o registro profissional. A “ética e a moral” são os elementos mais indicados pelos participantes, tanto com influência à realização e/ou evitação, principalmente porque é um elemento que depende da elasticidade ética.

A necessidade de apoio e proteção das entidades de classe é indicada como mais relevante quando o profissional atua em empresa, pela perda de autonomia e independência e a possibilidade de ter dilemas entre a denúncia e a confidencialidade pela obediência e lealdade à organização (Bowie & Duska, 1990Bowie, N. E., & Duska, R. F. (1990). Business ethics. Prentice Hall.). O estabelecimento de normas e o esclarecimento do processo de denúncia são uma necessidade indicada, corroborando Near e Miceli (1995Near, J. P., & Miceli, M. P. (1995). Effective whistleblowing. The Academy of Management Review, 20(3), 679-708. https://www.jstor.org/stable/258791
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) com base nos trabalhos de Janis e Mann (1977 e Perrucci et al. (1980). No caso dos profissionais de contabilidade do Brasil, normativos estabelecendo condições para a denúncia, tais como regras claras, canais de denúncia, anonimato e apoio ao denunciante, são elementos indicados com influência à realização da denúncia.

A entidade profissional mais lembrada pelos participantes foi o Conselho Regional de Contabilidade (CRC), demonstrando que os membros da classe contábil confiam que essa entidade tenha competência para defender o status e os privilégios almejados para a profissão, confirmando Boudon e Bourricaud (2007Boudon, R., & Bourricaud, F. (2007). Dicionário crítico de sociologia. Ática.).

4.6 Organização

Os participantes indicaram muitos elementos para a LI Organização, podendo esse volume ser justificado pelo esforço que as organizações têm desenvolvido para implantação de programas de integridade. Os achados indicaram elementos como a existência de condições para reporte que, mais especificamente, guarda relação com a disponibilização de canal de denúncia e o estabelecimento de normas estruturadas; em contrapartida, é mencionado que o canal inadequado, a falta de efetividade e a impunidade podem levar à evitação.

A denúncia favorece a organização pela descoberta e descontinuidade de desvios. As organizações são aderentes ao uso de canal de denúncia (Castro et al., 2019Castro, P. R., Amaral, J. V., & Guerreiro, R. (2019). Aderência ao programa de integridade da lei anticorrupção brasileira e implantação de controles internos. Revista Contabilidade & Finanças, 30(80), 186-201. https://doi.org/10.1590/1808-057x201806780
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), pois uma organização processada por alguma irregularidade pode ser vista pelo mercado ou por entidades de controle como uma organização suspeita (Near & Miceli, 1995Near, J. P., & Miceli, M. P. (1995). Effective whistleblowing. The Academy of Management Review, 20(3), 679-708. https://www.jstor.org/stable/258791
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). Há indicação da necessidade de a empresa incentivar o desenvolvimento de ambiente ético pelo risco de flexibilização, como na Teoria da Elasticidade Ética, de Agalgatti e Krishna (2007Agalgatti, B., & Krishna, S. (2007). Business ethics: concepts & practices. Nirali.).

4.7 Mercado de Capitais

A transparência é um dos elementos considerados relevantes na LI Mercado de Capitais, relacionando-se com a simetria de informação pela divulgação em um só momento para todos, tendo que ser evitada a assimetria de informação pelo risco de tráfego de informação (insider trading). Os resultados confirmam a relação entre a transparência e o processo de denúncia (whistleblowing) com o desenvolvimento da confiança pública. Os participantes indicam maior demanda por transparência e por suporte à realização de denúncia, confirmando Brown et al. (2014Brown, A. J., Vandekerckhove, W., & Dreyfus, S. (2014). The relationship between transparency, whistleblowing, and public trust. In P. Ala’I et al., Research handbook on transparency (pp. 30-58). Edward Elgar Publishing.). Adicionalmente, a reputação, compreendida como a coleção de percepções e crenças, do passado e do presente, que residem na consciência dos interessados (Rayner, 2004Rayner, J. (2004). Managing reputational risk: Curbing threats, leveraging opportunities. John Wiley & Sons. ), é indicada como importante, podendo reverberar no mercado de capitais como um todo, com impacto também ao profissional de contabilidade.

4.8 Mercado de Trabalho

Os achados corroboram Near e Miceli (1985Near, J. P., & Miceli, M. P. (1985). Organizational dissidence: The case of whistle-blowing. Journal of Business Ethics, 4(1), 1-16. https://doi.org/10.1007/BF00382668
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) indicando que uma taxa de desemprego relevante no mercado de trabalho do denunciante (determinado pela indústria, localização ou ocupação) arrefece a intenção de denúncia, por ser indicadora de disponibilidade reduzida de alternativas de emprego. Adicionalmente, em função de pressões econômicas, a autonomia e a independência dos profissionais liberais podem ser comprometidas ao precisarem trabalhar como empregados (Johnson, 1997Johnson, A. G. (1997). Dicionário de sociologia: Zahar.), tendo obrigação de obediência, confidencialidade e lealdade à organização (Bowie & Duska, 1990Bowie, N. E., & Duska, R. F. (1990). Business ethics. Prentice Hall.).

A transparência é indicada como relevante no mercado de trabalho. Em um mercado de trabalho composto por empresas éticas, há maior engajamento em decisões transparentes para as partes interessadas, incluindo os empregados, promovendo maior confiança, respeito e percepção de justiça (May, 2013May, S. (2013). Introduction: ethical perspectives and practices. In S. May, Case studies in organizational communication: Ethical perspectives and practices (pp. 1-32). Sage.).

4.9 Conceitos Iniciais

Quanto aos conceitos gerais iniciais sobre a intenção de denúncia, o conhecimento e a reflexão sobre o assunto ainda são bastante incipientes. O profissional de contabilidade do Brasil considera, inicialmente, que a avaliação quanto ao tipo de irregularidade seria o mais relevante para a realização ou não da denúncia. A ética, a moral e a justiça foram a segunda maior citação, sendo indicada a necessidade de fortalecimento ético da profissão para se evitar riscos de flexibilização. A efetividade do processo de denúncia e o risco ao emprego/cliente foram a terceira mais indicada, demonstrando que é importante que o processo de denúncia tenha credibilidade, caso contrário não haverá denúncia, principalmente considerando-se os riscos assumidos.

4.10 Conhecimento de Ocorrência e Desconsideração dos Mecanismos de Denúncia

Quanto ao conhecimento sobre casos de ocorrência de intenção ou realização de denúncia, 74% indicaram não ter conhecimento. Assim, conforme as declarações, cerca de três entre quatro contadores não têm conhecimento quanto à intenção ou realização de denúncia, podendo sugerir que, ou não há irregularidades ocorrendo ou que, ainda que ocorram, de forma geral, a denúncia não é um mecanismo normalmente considerado. Esses dados podem sugerir que há, em princípio, desconsideração do mecanismo de denúncia como opção de combate a irregularidades, e isso pode ser por falta de processos estabelecidos para que a denúncia ocorra ou por falta de promoção do tema entre os profissionais.

4.11 Dimensões Relevantes

Quanto quais seriam as LIs com maior influência para realização e para evitação, foi possível concluir que as com maior influência para realização de denúncia são: Família, Profissão, Estado, Religião/Organização e Comunidade/Mercado de Trabalho/Capitais, enquanto as com maior influência à evitação são: Mercado de Trabalho, Família, Profissão/Organização, Religião, Estado, Mercado de Capitais/Comunidade. Observa-se que Família e Profissão estão entre as três maiores influências, tanto para realização quanto para evitação. Isso demonstra a relevância dessas duas LIs para o profissional de contabilidade do Brasil. A primeira por representar a formação e o desenvolvimento ético e moral, em função do receio de riscos de consequências adversas e pelo compromisso de lealdade e proteção entre os membros da família; a segunda, pela indicação de reconhecimento das entidades profissionais como “fonte de autoridade” (Lakatos & Marconi, 1999Lakatos, E. M., & Marconi, M. (1999). Sociologia geral. Atlas.) e combinação de poder e legitimidade. Em contrapartida, há percepção, por parte dos associados, de que há quebra de expectativa em relação a essa fonte de autoridade, ou seja, de que as entidades profissionais não estão desempenhando o papel esperado em relação ao processo de denúncia, e, então, a influência passa a ser de evitação.

4.12 Mecanismos de Proteção, de Reconhecimento, de Apoio e de Recompensa

Quanto a mecanismos de proteção, de reconhecimento, de apoio e de recompensa, os resultados indicam que 80% dos participantes consideram que a maior proteção (ex.: criação de normas de proteção) favoreceria a intenção de realização de denúncia pelo profissional de contabilidade quanto a irregularidades conhecidas em função do exercício da profissão, 75% consideram que a existência de reconhecimento pela realização de denúncia (ex.: homenagens) não favoreceria, 83% consideram que a existência de apoio das entidades e órgãos relacionados à profissão (CFC, CRC, associações, sindicato) favoreceria e 65% consideram que a existência de recebimento de recompensa financeira não favoreceria. Assim, proteção e apoio são considerados relevantes para a influência no sentido de realização da denúncia de irregularidades, enquanto o reconhecimento e a recompensa financeira foram considerados sem relevância para a realização da denúncia.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A adoção da TLI com suas LIs permitiu compreender dimensões da intenção de denúncia. Os achados ratificaram o conceito que as LIs se estabelecem por padrões históricos de práticas, suposições, valores, crenças e regras materiais socialmente construídos, pelos quais os indivíduos produzem e reproduzem sua subsistência material, organizam-se no tempo e no espaço e fornecem significado à sua realidade social (Thornton & Ocasio, 1999Thornton, P. H., & Ocasio, W. (1999). Institutional logics and the historical contingency of power in organizations: Executive succession in the higher education publishing industry, 1958-1990. American Journal of Sociology, 105(3), 801-843. ).

A opção epistemológica que se teve neste estudo foi olhar para o indivíduo não como comportamento ou evento específico, mas como um todo no contexto do profissional contábil, observando-o refletir sobre o mundo. E considerou-se o modelo conceitual proposto em seis estágios, no qual esse sujeito, ainda no segundo estágio (o da intenção), reflete sobre os próximos estágios como cada um pode acontecer e as possíveis consequências.

Os resultados indicam que a solução de questões requer mais do que mera criação de normas. Considera-se que há necessidade de maior participação dos profissionais de contabilidade nas deliberações e de se conhecer e debater mais sobre o assunto denúncia e suas consequências. A dualidade entre agência e estrutura social é explicitada quando o profissional indica a consideração da sua autonomia parcial e que pode contribuir para a criação, manutenção e transformação do mundo social que o cerca. Em contrapartida, observa-se que a estrutura social pode restringir ou fomentar a mudança ou a estabilidade.

Ressalta-se que algumas crenças iniciais dos pesquisadores não se mostraram relevantes na pesquisa. Considerou-se que o Estado e a Profissão seriam indicados como as LIs mais relevantes, sendo essas duas superadas pela LI Família e seus elementos como, por exemplo, a ética e a moral da família de origem e o desejo de ser exemplo ético e moral à família constituída, principalmente aos filhos. Considerou-se que, com a possibilidade de inclusão no CEPC da obrigatoriedade de reporte pelos profissionais de contabilidade de irregularidades que tivessem conhecimento, conforme legislação e autoridades competentes, a questão do sigilo profissional de contabilidade vs. cliente, em comparação, por exemplo, com a relação advogado vs. cliente, pudesse ser relevante, mas não foi o que ocorreu. Não houve menções relevantes a esses temas. Considerou-se que a possibilidade de recompensa financeira (apresentada inicialmente na Lei Dodd-Frank) seria indicada como influência positiva para a realização de denúncia em função de seu caráter compensatório, mas não foi o que a pesquisa indicou. Nesse tema, os profissionais demonstraram certo tom de indignação do tipo: como eu poderia denunciar alguém por recompensa em dinheiro? O desenvolvimento de cultura em relação à denúncia é considerado mais relevante do que a recompensa financeira. Em contrapartida, alguns consideram que uma recompensa não superaria os riscos à integridade física e psíquica.

Esta pesquisa indica que o medo é uma questão central nesse fenômeno. Embora pesquisas internacionais indiquem que o maior medo do profissional de contabilidade em relação à denúncia é “ser desleal com a empresa” e ter “a reprovação familiar e de amigos”, (Weffort et al., 2018Weffort, E. F., Milan, J. C., & Gonçalves, R. (2018). O contador amedrontado: um estudo sobre fraude e whistleblowing. In Anais do Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós- Graduação em Administração - EnANPAD (p. 1). ), esta pesquisa indicou que o maior medo do profissional de contabilidade do Brasil é o de riscos adversos à família

É possível observar que esses profissionais querem se manifestar, querem ter “força de voz” para expressar o que pensam e querem poder participar da construção da categoria em relação à intenção de denúncia, em função do tamanho das respostas nos questionários.

Os participantes reforçaram a importância de alguns elementos, como: necessidade de esclarecimentos sobre o assunto; incentivo à ética e à moral profissional; proteção à reputação do profissional; a importância da academia para o desenvolvimento de pesquisas; os altos riscos individuais assumidos pelos profissionais em relação ao processo de denúncia; e a necessidade de as entidades profissionais ouvirem e apoiarem efetivamente esse profissional.

As três LIs com maior influência para a realização foram Família, Profissão e Estado; para a evitação, Mercado de Trabalho, Família e Profissão/Organização. A maioria dos participantes indicou: (a) não ter conhecimento quanto a casos de intenção/realização de denúncia; (b) que uma maior proteção e um maior apoio favorecem a realização de denúncia; e (c) que o reconhecimento e a recompensa financeira não favorecem a realização de denúncia.

Podem ser apontadas algumas limitações deste estudo. Primeiro, quanto ao instrumento questionário. A realização de entrevista seria melhor estratégia em função da riqueza que poderia ser gerada. Mas, considerando-se a delicadeza do tema “intenção de denúncia” e a possibilidade de ter a identidade do participante preservada, preferiu-se o questionário, buscando-se mitigar o risco de comprometimento do desenvolvimento adequado da pesquisa. Segundo, quanto à amostra e o corpus, o questionário teve 17 questões abertas, podendo ser um risco de limitação relevante e resultar em um número reduzido de respostas, inviabilizando a pesquisa. Mas esse risco não se materializou porque foram obtidas 81 respostas válidas, resultando em um corpus de 1.377 declarações composto por 22.575 palavras, média de 1.328 por questão, com type-token ratio (TTR) de 0,27, indicando a qualidade da elaboração linguística do texto (cinco caracteres). Terceiro, quanto ao sujeito de pesquisa, a não confirmação de que quem estava respondendo à pesquisa era efetivamente um profissional de contabilidade. Para se amenizar esse risco, a divulgação teve o apoio do CFC, dos CRCs e dos próprios contadores. Por se tratar de um questionário específico para os profissionais com 17 questões abertas, caso um respondente não fosse profissional de contabilidade, a possibilidade de identificação seria alta. Por isso, considera-se que essa possível limitação tenha sido amenizada.

A principal contribuição deste trabalho se dá no desenvolvimento teórico em denúncia e contabilidade, pela ampliação da compreensão da denúncia a partir da TLI e suas LIs, tendo ao centro o profissional de contabilidade que se vê em um mundo complexo com lógicas congruentes, incongruentes e conflitivas, entremeado de dilemas e que vive em base regular. Outra contribuição epistemológica é a própria adoção da TLI como base teórica para o desenvolvimento de estudos sobre denúncia. Uma contribuição prática, como produto deste trabalho, foi a elaboração de uma TILIs, considerando os elementos de cada LI sobre a intenção de denúncia.

Este estudo pode contribuir para que a classe contábil busque conhecer, debater, refletir e aprimorar os conceitos e os mecanismos relacionados à denúncia, promovendo às entidades de classe o conhecimento dos elementos que influenciam a intenção desses profissionais, podendo servir como subsídios na elaboração, por legisladores, reguladores e outras entidades, de políticas e procedimentos para o combate à fraude e à corrupção. No âmbito organizacional, há possibilidade de adoção de estratégias condizentes para aprimoramento da cultura de integridade, principalmente referente à área contábil. No âmbito acadêmico, pode contribuir para o desenvolvimento de estudos sobre a intenção de denúncia do profissional de contabilidade do Brasil, ampliando essa episteme, e para que autoridades tenham subsídios no desenvolvimento de normativos referentes a programas de denúncia, já que o profissional de contabilidade é considerado com o potencial de descoberta antecipada de prática de ilícitos.

Este trabalho pode ser considerado relevante ao se considerar que a maioria dos estudos anteriores sobre denúncia foi quantitativo ou desenvolvido no exterior. No Brasil, os estudos relacionando denúncia e contabilidade ainda são incipientes. Adicionalmente, preenche algumas lacunas ao adotar a TLI e sua LIs, pois os estudos sobre denúncia têm, em geral, utilizado teorias comportamentais, e ao realizar esta pesquisa com profissionais, já que os anteriores focaram em estudantes ou auditores. A TLI permitiu que se observasse esse profissional e seu mundo de forma única, por meio das diversas dimensões que são as LIs. Embora a análise seja desmembrada nas oito lógicas, trata-se de um todo que dialoga entre si. A observação da inter-relação entre as LIs se dá em um sistema interinstitucional, havendo, ainda, a inter-relação entre os elementos em uma mesma LI, em um sistema intrainstitucional.

Quanto aos principais impactos deste estudo, dois podem ser destacados. O primeiro, no desenvolvimento da pesquisa de campo: ao buscar-se essa episteme, encontra-se um ser humano engajado na participação por meio de respostas longas, exercitando a reflexão mesmo em um mundo estruturado e institucionalizado. Esse pode ser traduzível em níveis de poder como o social, estrutural e situacional, embalando, assim, as forças da sociedade, das instituições e do indivíduo. O segundo, pelos resultados: considerando-se essas forças, promove-se a evolução do racional dos sistemas de denúncia, concepções atuais de que o estabelecimento de normas ou manuais resolvem questões, muitas vezes negligenciando o poder de agência do indivíduo e alijando os interessados do processo, sobretudo em ambientes com múltiplas lógicas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    20 Jul 2020
  • Revisado
    08 Set 2020
  • Aceito
    01 Out 2021
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