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Impacto da troca de auditoria na comparabilidade dos relatórios financeiros* * Artigo apresentado na XIX USP International Conference in Accounting, São Paulo, SP, Brasil, julho de 2019. ,** ** Este trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) - Código de Financiamento 001.

Resumo

O objetivo deste trabalho é analisar o efeito do rodízio e tenure das firmas e sócios de auditoria na comparabilidade e consistência dos relatórios financeiros. Diversos estudos trataram do efeito do rodízio de auditoria sobre a qualidade dos relatórios financeiros. Entretanto, nenhum deles se debruçou especificamente em analisar este impacto na comparabilidade e consistência dos relatórios financeiros. Existem discussões em âmbito internacional sobre os impactos do rodízio obrigatório do sócio e da firma de auditoria no amago acadêmico, bem como em órgãos reguladores de diferentes países. Devido à peculiaridade do ambiente regulatório brasileiro, pode-se contribuir com as discussões sobre as consequências da implementação do rodízio obrigatório de auditoria. A amostra contou com 50 companhias que foram analisadas em períodos anuais entre 2012 e 2018. Para mensurar a medida de comparabilidade, utilizou-se a similaridade da função contábil de DeFranco, Kothari e Verdi (2011), e a respectiva adaptação, para medir a consistência, desenvolvida por Ribeiro (2014). Quanto à análise dos dados, recorreu-se à estatística descritiva e, em sequência, à análise multivariada em painel. Os resultados indicam que a troca (obrigatória e voluntária) da firma de auditoria e do sócio de auditoria não prejudicam a comparabilidade e a consistência dos relatórios financeiros. As evidências sugerem que períodos de relacionamentos de até três anos entre firma de auditoria e empresa auditada contribuem com o aumento significativo da comparabilidade e da consistência. Este achado indica que a obrigatoriedade do rodízio não prejudica a capacidade dos investidores em comparar seus investimentos. Adicionalmente, demonstra-se aos reguladores que uma eventual redução do prazo da troca obrigatória (de cinco para três anos, como na Itália) estaria alinhado com as práticas de mercado e implicaria o aumento da comparabilidade e consistência das informações financeiras.

Palavras-chave:
comparabilidade; rodízio de auditores; consistência

Abstract

This study aims to assess the effect of the rotation and tenure of audit firm and audit partner on the comparability and consistency of financial reports. Several studies have addressed the effect of auditor rotation on the quality of financial reports, but none of them focused specifically on the impact on the comparability and consistency of financial reports. Around the world, the impact of mandatory rotation of audit partner and audit firm is being discussed in academia and regulatory bodies. The peculiarity of the Brazilian regulatory environment allows us to contribute to the discussions on the effects of implementing mandatory auditor rotation. Our sample included 50 companies for which we analyzed data from 2012 to 2018. To measure comparability, we used the similarity of the accounting function model by DeFranco, Kothari and Verdi (2011), and to measure consistency we used the adaptations to this model proposed by Ribeiro (2014). For data analysis, we used descriptive statistics and multivariate panel analysis. Our results suggest that the rotation (mandatory and voluntary) of audit firm and audit partner does not affect the comparability and consistency of financial reports. Results also suggest that auditor-client relationships of up to three years contribute to a significant increase in comparability and consistency, indicating that mandatory rotation does not impair investors’ ability to compare the information concerning their investments. In addition, regulators are shown that a possible reduction in the mandatory rotation term (from five to three years, as in Italy) would be in line with market practices and would imply an increase in the comparability and consistency of financial information.

Keywords:
comparability; auditor rotation; consistency

1. INTRODUÇÃO

O papel do auditor externo, desde sua origem, é trazer credibilidade às informações prestadas pelas companhias sobre o seu desempenho econômico e financeiro. Com isso, eles reduzem o risco informacional (Lu & Sivaramakrishnan, 2009Lu, T., & Sivaramakrishnan, K. (2009). Mandatory audit firm rotation: Fresh look versus poor knowledge. Journal of Accounting and Public Policy, 28(2), 71-91.) e podem contribuir para um processo de alocação de capital mais eficiente em economias de mercado.

Um dos aspectos que está diretamente relacionado com a eficiência (qualidade) dos serviços prestados pelos auditores externos é a sua independência em relação à companhia auditada (DeAngelo, 1981DeAngelo, L. E. (1981). Auditor size and audit quality. Journal of Accounting and Economics, 3(3), 183-199.). Sobre isso, Raiborn, Schorg e Massoud (2006Raiborn, C., Schorg, C. A., & Massoud, M. (2006). Should auditor rotation be mandatory? Journal of Corporate Accounting & Finance, 17(4), 37-49.) ressaltam que se não existir independência na relação auditor-auditada, a própria finalidade da auditoria ficaria comprometida e o mercado não reagiria à função do auditor, tornando-a irrelevante. Em um passado recente, escândalos corporativos, com empresas como a Enron, deram uma amostra de que problemas de independência entre auditor-auditada podem acarretar a diminuição da reputação e, por sua vez, a extinção da participação no mercado e, até mesmo, a falência de grandes firmas de auditoria como a Arthur Andersen - considerada uma das cinco maiores do mundo na ocasião - além de trazer grandes prejuízos para a economia de um país.

Entre as soluções encontradas pelos reguladores para aumentar a independência da relação auditor-auditada está o rodízio obrigatório de firmas ou de sócios de auditoria. O rodízio obrigatório das firmas de auditoria externa tem como objetivo garantir a independência do auditor e, dessa forma, reduzir a pressão dos clientes em relacionamentos de longo prazo. Segundo a Securities and Exchange Commission (SEC, 2003Securities and Exchange Commission (SEC). (2003). Strengthening the Commission’s requirements regarding auditor independence. Final Rule 68, File No. S7-49-02. Washington, DC: SEC.), o rodízio obrigatório de auditores daria um “fresh look” nos demonstrativos financeiros, aumentando a independência da auditoria e, como consequência, a qualidade dos serviços prestados para os usuários. Em termos empíricos, pesquisas feitas por Jennings, Pany e Reckers (2006Jennings, M. M., Pany, K. J., & Reckers, P. M. (2006). Strong corporate governance and audit firm rotation: Effects on judges’ independence perceptions and litigation judgments. Accounting Horizons, 20(3), 253-270.), Daniels e Booker (2011Daniels, B. W., & Booker, Q. (2011). The effects of audit firm rotation on perceived auditor independence and audit quality. Research in Accounting Regulation, 23(1), 78-82.) e Dopuch, King e Schwartz (2001Dopuch, N., King, R. R., & Schwartz, R. (2001). An experimental investigation of retention and rotation requirements. Journal of Accounting Research, 39(1), 93-117.) comprovaram uma relação positiva com o ganho de independência de auditores na adoção do rodízio obrigatório das firmas de auditoria.

Embora a percepção dos usuários sobre a independência do auditor seja pró-rodízio obrigatório, quando se trata da relação entre a permanência do auditor e a qualidade da informação contábil, os indícios apontam para outra direção. Os resultados das pesquisas de DeFond e Zhang (2014DeFond, M. L., & Zhang, J. (2014). A review of archival auditing research. Journal of Accounting and Economics, 58(2-3), 275-326.) e Casterella e Johnston (2013Casterella, J. R., & Johnston, D. (2013). Can the academic literature contribute to the debate over mandatory audit firm rotation? Research in Accounting Regulation, 25(1), 108-116.) indicam relação positiva entre a tenure (período de permanência do auditor na empresa auditada) e a qualidade do lucro, medida por gerenciamento de resultados por accruals e outras métricas como conservadorismo. Grande parte dessas pesquisas atribui tal resultado ao ganho de expertise presente nos trabalhos de auditoria, em uma relação na qual o tempo de permanência do auditor ou da firma é mais longo.

Essa lógica, contudo, deve ser vista com cuidado, pois o trabalho realizado por Chi, Lisic e Pevzner (2011Chi, W., Lisic, L. L., & Pevzner, M. (2011). Is enhanced audit quality associated with greater real earnings management? Accounting Horizons, 25(2), 315-335.) indicou que a tenure maior estaria associada a maiores níveis de gerenciamento de resultados por atividades operacionais. Os autores atribuem os achados de sua pesquisa a um trade-off entre gerenciamento por accruals e o gerenciamento operacional. Segundo Chi et al. (2011Chi, W., Lisic, L. L., & Pevzner, M. (2011). Is enhanced audit quality associated with greater real earnings management? Accounting Horizons, 25(2), 315-335.), os gestores aumentam o gerenciamento de resultados operacionais quando pressionados por longas relações com auditores independentes. Isso, geralmente, prejudica a qualidade da informação financeira e pode comprometer, inclusive, a performance operacional da empresa de modo agregado em longo prazo, tendo em vista que o gerenciamento por operações possui efeito mais persistente do que o realizado por accruals.

O processo decisório dos investidores e credores (foco principal dos serviços da auditoria externa) é constituído, basicamente, por duas decisões principais: alocar seu capital entre as alternativas de investimento e dar continuidade ou não a tais investimentos (Healy & Palepu, 2001Healy, P. M., & Palepu, K. G. (2001). Information asymmetry, corporate disclosure, and the capital markets: A review of the empirical disclosure literature. Journal of Accounting and Economics, 31(1-3), 405-440.). Dentro dessas perspectivas decisórias, é necessário que o investidor ou credor possua nível informacional adequado, com informações de qualidade para que possa comparar as diferentes alternativas e julgar qual o caminho a seguir dentro de sua propensão ao risco. Com base nessa lógica, a comparabilidade ganha destaque como característica qualitativa de melhoria, como mencionado por Simmons (1967Simmons, J. K. (1967). A concept of comparability in financial reporting. The Accounting Review, 42(4), 680-692.), no aumento da utilidade da informação contábil para os usuários externos.

A comparabilidade é uma medida de qualidade da informação que está no âmago das decisões de investimento e possui um papel fundamental na qualidade do ambiente informacional, influenciando a alocação de capital entre países (DeFond, Hu, Hung & Li, 2011DeFond, M. L., Hu, X., Hung, M., & Li, S. (2011). The impact of mandatory IFRS adoption on foreign mutual fund ownership: The role of comparability. Journal of Accounting and Economics, 51(3), 240-258.; Fang, Maffett & Zhang, 2015Fang, V. W., Maffett, M., & Zhang, B. (2015). Foreign institutional ownership and the global convergence of financial reporting practices. Journal of Accounting Research, 53(3), 593-631.; Yip & Young, 2012Yip, R. W., & Young, D. (2012). Does mandatory IFRS adoption improve information comparability? The Accounting Review, 87(5), 1767-1789.), a liquidez de mercado (Barth, Landsman, Lang & Williams, 2013Barth, M. E., Landsman, W. R., Lang, M. H., & Williams, C. D. (2013). Effects on comparability and capital market benefits of voluntary adoption of IFRS by US firms: Insights from voluntary adoption of IFRS by non-US firms. Rock Center for Corporate Governance at Stanford University. Working Papers, (3074).), a qualidade das previsões dos analistas (DeFranco, Kothari & Verdi, 2011DeFranco, G., Kothari, S. P., & Verdi, R. S. (2011). The benefits of financial statement comparability. Journal of Accounting Research, 49(4), 895-931.), a proteção de acionistas minoritários (Kim, Kraft & Ryan, 2013Kim, S., Kraft, P., & Ryan, S. G. (2013). Financial statement comparability and credit risk. Review of Accounting Studies, 18(3), 783-823.) e a proteção de credores na concessão de crédito (Fang, Li, Xin e Zhang, 2012Fang, X., Li, Y., Xin, B., & Zhang, W. J. (2012). Accounting comparability and loan contracting. Working Paper.).

As medidas de comparabilidade utilizadas nesta pesquisa foram: a similaridade da função contábil original de DeFranco et al. (2011DeFranco, G., Kothari, S. P., & Verdi, R. S. (2011). The benefits of financial statement comparability. Journal of Accounting Research, 49(4), 895-931.) e a adaptação da medida feita na pesquisa de Ribeiro (2014Ribeiro, A. M. (2014). Poder discricionário do gestor e comparabilidade dos relatórios financeiros: uma análise dos efeitos da convergência do Brasil às IFRS (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo.). Segundo a estrutura conceitual do International Financial Reporting Standards (IFRS, 2018International Financial Reporting Standards (IFRS). (2018). Conceptual framework for financial reporting. London: IFRS.), comparabilidade é uma característica qualitativa da informação que permite aos usuários dos relatórios financeiros identificarem as similaridades e as diferenças nos demonstrativos financeiros de duas empresas distintas e entre a mesma empresa ao longo do tempo. De modo prático, a comparabilidade é construída por meio do processo contábil de reconhecimento, mensuração e evidenciação. Para duas companhias que apresentam eventos econômicos iguais é esperado o mesmo processo contábil para se obter a comparabilidade.

A troca de firma ou do sócio de auditoria ou o seu período de permanência pode impactar esse processo, pois seus apontamentos podem alterar significativamente o modo como os gestores interpretam seus eventos econômicos. As trocas de firma ou sócio podem influenciar a comparabilidade de modo positivo ou negativo. Do lado negativo, pode ocorrer a ruptura em algum procedimento ou viés diferente da nova firma (ou auditor) quanto a algum procedimento contábil já consolidado, ensejando a necessidade de uma nova interpretação. Isso pode afetar o processo contábil e a forma com que os gestores mapeiam contabilmente o seu negócio. Por exemplo, o novo auditor, por medo do risco de litígio, pode questionar uma política para classificação de uma provisão como possível, exigindo sua classificação como provável. Isso iria afetar o lucro contábil do exercício sem necessariamente ter ocorrido alguma alteração no fundamento econômico na visão dos administradores do negócio. Essa alternância na interpretação pode ser prejudicial à comparabilidade. Do lado positivo, o novo auditor ou firma, tendo em vista a necessidade de realizar um mapeamento mais aprofundado para conhecer o negócio - também relacionado com o maior risco de litígio segundo DeFond e Zhang (2014DeFond, M. L., & Zhang, J. (2014). A review of archival auditing research. Journal of Accounting and Economics, 58(2-3), 275-326.) -, pode motivar um comportamento mais conservador dos gestores e inibir práticas de gerenciamento de resultados por accruals, o que deve melhorar a comparabilidade no curto prazo.

Embora existam diversos estudos que trataram do efeito do rodízio de auditores (firmas e sócios) sobre a qualidade das informações financeiras - os trabalhos de DeFond & Zhang (2014DeFond, M. L., & Zhang, J. (2014). A review of archival auditing research. Journal of Accounting and Economics, 58(2-3), 275-326.) e de Casterella & Johnston (2013Casterella, J. R., & Johnston, D. (2013). Can the academic literature contribute to the debate over mandatory audit firm rotation? Research in Accounting Regulation, 25(1), 108-116.) trazem uma lista extensa de pesquisas sobre o tema -, nenhum deles se debruçou diretamente sobre a comparabilidade dos relatórios financeiros. As pesquisas que mais se aproximam do tema foram feitas por Li, Qi e Zhang (2017Li, L., Qi, B., & and Zhang, J. (2017). The effect of engagement auditors on financial statement comparability. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=3047631.
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), que analisaram o efeito de duas empresas possuírem a mesma firma de auditoria sobre a comparabilidade; Francis, Pinnuck e Watanabe (2014Francis, J. R., Pinnuck, M. L., & Watanabe, O. (2014). Auditor style and financial statement comparability. The Accounting Review, 89(2), 605-633.), que testaram o efeito da auditoria feita por duas firmas do grupo das quatro maiores (Big 4) na comparabilidade; e Zhang (2018Zhang, J. H. (2018). Accounting comparability, audit effort, and audit outcomes. Contemporary Accounting Research, 35(1), 245-276.) que analisou como a comparabilidade impacta o risco de auditoria, uma vez que as vantagens ou desvantagens do rodízio de auditores ainda não estão consolidadas empiricamente na literatura (DeFond & Zhang, 2014DeFond, M. L., & Zhang, J. (2014). A review of archival auditing research. Journal of Accounting and Economics, 58(2-3), 275-326.) e que existe discussões do Public Company Accounting Oversight Board sobre a imposição da obrigatoriedade do rodízio de firmas de auditoria nos Estados Unidos, o que poderia afetar diversas empresas ao redor do mundo, as quais negociam suas ações no mercado norte-americano. Esta pesquisa possui como objetivo analisar qual o efeito do rodízio e tenure das firmas e dos sócios de auditoria na comparabilidade e na consistência dos relatórios financeiros.

Como pano de fundo da discussão, foram escolhidas as companhias abertas do Brasil, pois o país apresenta a obrigatoriedade do rodízio de firmas de auditoria desde a instrução n. 308/1999 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM, 1999Comissão de Valores Mobiliários (CVM) (1999). Instrução n. 308. Com as alterações introduzidas pelas instruções CVM n. 509/2011, 545/2014 e 591/2017. ), ou seja, as companhias abertas já estão mais do que adaptadas ao processo. Além disso, o país apresentou, no ano de 2008, uma exceção ao rodízio obrigatório trazido pela deliberação da CVM 549 em decorrência da adoção do padrão internacional no país. Esse aspecto permitiu a análise da troca voluntária e obrigatória do auditor e da firma e fez que o país fosse o cenário ideal de estudo, tendo em vista que poucos apresentam a mesma condição institucional.

Os resultados obtidos com a pesquisa comprovam que o rodízio obrigatório, a troca voluntária da firma de auditoria ou a troca do sócio de auditoria não prejudicam a comparabilidade e a consistência dos relatórios financeiros. Por outro lado, os achados também indicam que a tenure de até três anos para firmas de auditoria influencia de modo positivo tanto a comparabilidade quanto a consistência dos relatórios financeiros. Esses achados vão ao encontro das evidências apresentadas nas pesquisas de DeFond e Subramanyam (1998DeFond, M. L., & Subramanyam, K. R. (1998). Auditor changes and discretionary accruals. Journal of Accounting and Economics, 25(1), 35-67.), que identificaram uma postura mais conservadora do auditor na troca de auditores em decorrência do maior risco de litígio, e, no trabalho de Chi et al. (2011Chi, W., Lisic, L. L., & Pevzner, M. (2011). Is enhanced audit quality associated with greater real earnings management? Accounting Horizons, 25(2), 315-335.), cujos resultados sugerem que existe um trade-off entre a manipulação de resultados feitas por accruals e a realizada por operações pelos gestores quando a relação com o auditor se torna de longa data. Essa relação é nociva à comparabilidade e para a consistência, pois os resultados operacionais são ajustados, mas as políticas contábeis permanecem as mesmas, não capturando tais ajustes.

Esta pesquisa contribui para a discussão da necessidade de firmas e de sócios de auditoria realizarem o rodízio do auditor em até cinco anos, como estabelecido pela legislação, da mesma forma que contribui à discussão de o rodízio ser realizado em períodos inferiores a cinco anos, uma vez que o rodízio da firma e do sócio de auditoria não é nociva à comparabilidade e à consistência dos relatórios financeiros. A contribuição para as empresas não realizarem relacionamentos de longo prazo com os seus autores decorre também dos resultados que sugerem a associação de maiores níveis de comparabilidade e consistência quando a permanência das firmas de auditoria se refere a períodos de até três anos. Assim, entende-se que os aspectos positivos da troca de auditor como a sua maior independência em relação à companhia auditada sobrepujam os aspectos positivos como o ganho de expertise da maior permanência (tenure) quando se trata da comparabilidade e consistência dos relatórios financeiros no ambiente analisado.

2. ESTUDOS RELACIONADOS COM A PESQUISA

O rodízio de auditores é um assunto que possui diversas ramificações de pesquisas. Entre as principais e mais consolidadas estão: (i) a investigação da qualidade dos serviços de auditoria com o rodízio obrigatório ou a tenure dos sócios e das firmas de auditoria (Daniels & Booker, 2011Daniels, B. W., & Booker, Q. (2011). The effects of audit firm rotation on perceived auditor independence and audit quality. Research in Accounting Regulation, 23(1), 78-82.; Kwon, Lim & Simnett, 2014Kwon, S. Y., Lim, Y., & Simnett, R. (2014). The effect of mandatory audit firm rotation on audit quality and audit fees: Empirical evidence from the Korean audit market. Auditing: A Journal of Practice & Theory, 33(4), 167-196.; Lowensohn, Reck, Casterella & Lewis, 2007Lowensohn, S., Reck, J., Casterella, J. R., & Lewis, B. (2007). An empirical investigation of auditor rotation requirements. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1021789
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
; Myers, Myers & Omer, 2003Myers, J. N., Myers, L. A., & Omer, T. C. (2003). Exploring the term of the auditor-client relationship and the quality of earnings: A case for mandatory auditor rotation? The Accounting Review, 78(3), 779-799.; Nagy, 2005Nagy, A. L. (2005). Mandatory audit firm turnover, financial reporting quality, and client bargaining power: The case of Arthur Andersen. Accounting Horizons, 19(2), 51-68.); (ii) a análise da dinâmica entre o rodízio de auditores e firmas de auditoria e a sua independência em relação à companhia auditada (Arel, Brody & Pany, 2006Arel, B., Brody, R., & Pany, K. (2006). Findings on the effects of audit firm rotation on the audit process under varying strengths of corporate governance. Advances in Accounting, 22, 1-27.; Dopuch et al., 2001Dopuch, N., King, R. R., & Schwartz, R. (2001). An experimental investigation of retention and rotation requirements. Journal of Accounting Research, 39(1), 93-117.; Jennings et al., 2006Jennings, M. M., Pany, K. J., & Reckers, P. M. (2006). Strong corporate governance and audit firm rotation: Effects on judges’ independence perceptions and litigation judgments. Accounting Horizons, 20(3), 253-270.; Kaplan & Mauldin, 2008Kaplan, S. E., & Mauldin, E. G. (2008). Auditor rotation and the appearance of independence: Evidence from non-professional investors. Journal of Accounting and Public Policy, 27(2), 177-192.; Wang & Tuttle, 2009Wang, K. J., & Tuttle, B. M. (2009). The impact of auditor rotation on auditor-client negotiation. Accounting, Organizations and Society, 34(2), 222-243.); e (iii) a relação da qualidade da informação financeira com a troca e com a permanência (tenure) do auditor ou firma de auditoria (Chen, Lin & Lin 2008Chen, C. Y., Lin, C. J., & Lin, Y. C. (2008). Audit partner tenure, audit firm tenure, and discretionary accruals: Does long auditor tenure impair earnings quality? Contemporary Accounting Research, 25(2), 415-445.; Chi et al., 2011Chi, W., Lisic, L. L., & Pevzner, M. (2011). Is enhanced audit quality associated with greater real earnings management? Accounting Horizons, 25(2), 315-335.; Davis, Soo & Trompeter, 2009Davis, L. R., Soo, B. S., & Trompeter, G. M. (2009). Auditor tenure and the ability to meet or beat earnings forecasts. Contemporary Accounting Research, 26(2), 517-548.; Ghosh & Moon, 2005Ghosh, A., & Moon, D. (2005). Auditor tenure and perceptions of audit quality. The Accounting Review, 80(2), 585-612.; Jenkins & Valury, 2008Jenkins, D. S., & Velury, U. (2008). Does auditor tenure influence the reporting of conservative earnings? Journal of Accounting and Public Policy, 27(2), 115-132.; Johnson, Khurana & Reynolds, 2002Johnson, V. E., Khurana, I. K., & Reynolds, J. K. (2002). Audit‐firm tenure and the quality of financial reports. Contemporary Accounting Research, 19(4), 637-660.; Li, 2010Li, D. (2010). Does auditor tenure affect accounting conservatism? Further evidence. Journal of Accounting and Public Policy, 29(3), 226-241.; Myers et al., 2003Myers, J. N., Myers, L. A., & Omer, T. C. (2003). Exploring the term of the auditor-client relationship and the quality of earnings: A case for mandatory auditor rotation? The Accounting Review, 78(3), 779-799.).

Os resultados dessas pesquisas geralmente são conflitantes e não suportam por unanimidade a necessidade do rodízio obrigatório, principalmente quando o assunto é a qualidade da informação financeira e a tenure da firma e dos auditores. Johnson et al. (2002Johnson, V. E., Khurana, I. K., & Reynolds, J. K. (2002). Audit‐firm tenure and the quality of financial reports. Contemporary Accounting Research, 19(4), 637-660.), por exemplo, com dados de 10 anos em companhias dos Estados Unidos, encontraram que a maior tenure não prejudica a qualidade dos relatórios financeiros, medida pelos accruals passíveis de serem gerenciados e pela persistência do lucro. Os autores dividiram a tenure por ano, bem como consideraram o período curto (2 a 3 anos), médio (4 a 8 anos) e longo (acima de 9 anos) em seu modelo. Os resultados demonstraram que as duas medidas de qualidade são maiores para o período médio em relação ao curto, mas no longo não foi significativo, ou seja, quando a relação é muito curta, a qualidade do lucro tende a decrescer comparativamente a uma relação mais longa. Entretanto, a relação auditor-auditada muito longa também não agrega qualidade no lucro em relação ao período médio.

Na mesma linha, Myers et al. (2003Myers, J. N., Myers, L. A., & Omer, T. C. (2003). Exploring the term of the auditor-client relationship and the quality of earnings: A case for mandatory auditor rotation? The Accounting Review, 78(3), 779-799.) também encontraram resultados similares. Contudo, os autores utilizaram como medida de qualidade do lucro o gerenciamento de resultados calculado pelo modelo de Jones e os accruals absolutos correntes. Os resultados obtidos pelos autores apontam que relacionamentos mais longos com os auditores aumentam as restrições das firmas por práticas extremas de gestão e, dessa forma, diminui a utilização de accruals discricionários, principalmente nos extremos da distribuição. Ghosh e Moon (2005Ghosh, A., & Moon, D. (2005). Auditor tenure and perceptions of audit quality. The Accounting Review, 80(2), 585-612.), por sua vez, aplicaram um questionário aos investidores e concluíram que relacionamentos mais longos não prejudicam a qualidade do lucro na visão dos respondentes.

Chen et al. (2008Chen, C. Y., Lin, C. J., & Lin, Y. C. (2008). Audit partner tenure, audit firm tenure, and discretionary accruals: Does long auditor tenure impair earnings quality? Contemporary Accounting Research, 25(2), 415-445.) testaram a relação da permanência com a qualidade do lucro, medida por uma métrica ajustada pela performance dos accruals discricionários na Tailândia. Os autores concluíram que, com o controle da troca de sócios de auditoria, os relacionamentos mais longos, entre sócio de auditoria e a companhia, não prejudicam a qualidade do lucro; pelo contrário, aumentam a qualidade desse item nos relatórios financeiros. Davis et al. (2009Davis, L. R., Soo, B. S., & Trompeter, G. M. (2009). Auditor tenure and the ability to meet or beat earnings forecasts. Contemporary Accounting Research, 26(2), 517-548.) também usaram o gerenciamento de resultados por accruals para testar a relação da qualidade com a tenure e controlaram o período pré e pós-SOX em companhias dos Estados Unidos. Os resultados obtidos comprovam que no período pré-SOX há o aumento do gerenciamento de resultados conforme o aumento da tenure do sócio de auditoria. Entretanto, após a implementação da SOX, mesmo com aumento da tenure do sócio de auditoria, houve declínio no gerenciamento de resultados.

Na contramão desses resultados, a pesquisa feita por Li (2010Li, D. (2010). Does auditor tenure affect accounting conservatism? Further evidence. Journal of Accounting and Public Policy, 29(3), 226-241.) evidenciou uma relação positiva para grandes firmas que são constantemente monitoradas, mas negativa para pequenas empresas sem monitoramento no mercado, entre a tenure do sócio de auditoria e o conservadorismo contábil. Chi et al., (2011Chi, W., Lisic, L. L., & Pevzner, M. (2011). Is enhanced audit quality associated with greater real earnings management? Accounting Horizons, 25(2), 315-335.), por sua vez, encontraram relação positiva entre a permanência do sócio de auditoria e o gerenciamento de resultados por operações, além da relação negativa entre a permanência do sócio de auditoria com o gerenciamento por accruals. Segundo os autores, esse achado demonstra que, na impossibilidade de gerenciar resultados por accruals, os gestores recorrem ao gerenciamento operacional. Vale ressaltar que essa situação pode se tornar um problema para os usuários da informação financeira, porque o gerenciamento por operações, geralmente, é mais persistente do que a manipulação por accruals e pode afetar a performance operacional da entidade.

Embora os estudos sobre qualidade versus permanência possam afetar a comparabilidade (pois ela é uma medida de qualidade da informação), três estudos se destacam dos demais por analisarem diretamente essa característica qualitativa de melhoria. A primeira pesquisa foi feita por Francis et al. (2014Francis, J. R., Pinnuck, M. L., & Watanabe, O. (2014). Auditor style and financial statement comparability. The Accounting Review, 89(2), 605-633.), cujo objetivo foi analisar como o porte das firmas de auditoria (Big4) impactava a comparabilidade dos relatórios financeiros. Mais especificamente, os autores procuraram analisar se um par de empresas auditado por firmas do mesmo porte implicam aumento da comparabilidade de seus relatórios. Quando o par de empresas é auditado por firmas do grupo das quatro maiores empresas (Big 4), isto é, a EY, Deloitte, PWC e KPMG, apresentam demonstrações contábeis mais comparáveis do que pares de empresas que são auditadas por firmas de portes distintos. Como medida de comparabilidade, os autores utilizaram a covariação do lucro e uma medida de proximidade de accruals. Os autores concluíram que o porte da firma de auditoria pode direcionar a forma com que a empresa interpreta a sua realidade econômica.

O segundo trabalho que analisou a relação direta da auditoria com a comparabilidade foi feito por Li et al. (2017Li, L., Qi, B., & and Zhang, J. (2017). The effect of engagement auditors on financial statement comparability. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=3047631.
https://ssrn.com/abstract=3047631...
). O objetivo da pesquisa de Li et al. (2017Li, L., Qi, B., & and Zhang, J. (2017). The effect of engagement auditors on financial statement comparability. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=3047631.
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), em complemento ao estudo de Francis et al. (2014Francis, J. R., Pinnuck, M. L., & Watanabe, O. (2014). Auditor style and financial statement comparability. The Accounting Review, 89(2), 605-633.), foi testar a comparabilidade de duas empresas auditadas pelo mesmo sócio de auditoria. As medidas de comparabilidade utilizadas foram as mesmas do trabalho anterior de Francis et al. (2014Francis, J. R., Pinnuck, M. L., & Watanabe, O. (2014). Auditor style and financial statement comparability. The Accounting Review, 89(2), 605-633.), ou seja, a covariação do lucro e a medida de proximidade de accruals. Os resultados evidenciados por Li et al. (2017Li, L., Qi, B., & and Zhang, J. (2017). The effect of engagement auditors on financial statement comparability. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=3047631.
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) também elucidaram maior nível de comparabilidade para companhias engajadas pelo mesmo sócio de auditoria em relação às empresas que são auditadas por sócios distintos, inclusive dentro da mesma firma de auditoria. A pesquisa de Li et al. (2017Li, L., Qi, B., & and Zhang, J. (2017). The effect of engagement auditors on financial statement comparability. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=3047631.
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) contribui para o entendimento de que, mesmo dentro de firmas de auditoria com uma opinião institucionalizada, os sócios podem fazer diferença no modo como as empresas reconhecem e mensuram seus eventos econômicos.

Por fim, o terceiro artigo foi escrito por Zhang (2018Zhang, J. H. (2018). Accounting comparability, audit effort, and audit outcomes. Contemporary Accounting Research, 35(1), 245-276.). O autor inverteu a lógica das demais pesquisas e investigou como a comparabilidade, medida pela similaridade da função contábil de DeFranco et al. (2011DeFranco, G., Kothari, S. P., & Verdi, R. S. (2011). The benefits of financial statement comparability. Journal of Accounting Research, 49(4), 895-931.), pode influenciar o risco de auditoria e a eficiência do trabalho do auditor. Zhang (2018Zhang, J. H. (2018). Accounting comparability, audit effort, and audit outcomes. Contemporary Accounting Research, 35(1), 245-276.) encontrou, em uma amostra de empresas dos Estados Unidos, que a comparabilidade está associada à menor probabilidade de erro de opinião do auditor, bem como ao menor esforço (mensurado pelo valor cobrado e pelo atraso) por parte do auditor na consecução dos seus trabalhos. Zhang (2018Zhang, J. H. (2018). Accounting comparability, audit effort, and audit outcomes. Contemporary Accounting Research, 35(1), 245-276.) concluiu que a comparabilidade é uma característica relevante para se mensurar o risco de auditoria.

O que pode ser extraído desses três trabalhos diretamente relacionados com esta pesquisa é que a comparabilidade geralmente apresentou relação significativa com o porte do auditor, com o sócio engajado na auditoria de duas empresas e pode influenciar no risco de auditoria, além do planejamento dos trabalhos do sócio de auditoria (Francis et al., 2014Francis, J. R., Pinnuck, M. L., & Watanabe, O. (2014). Auditor style and financial statement comparability. The Accounting Review, 89(2), 605-633.; Li et al., 2017Li, L., Qi, B., & and Zhang, J. (2017). The effect of engagement auditors on financial statement comparability. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=3047631.
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; Zhang, 2018Zhang, J. H. (2018). Accounting comparability, audit effort, and audit outcomes. Contemporary Accounting Research, 35(1), 245-276.). Não obstante, esses três estudos tenham chegado a conclusões relevantes, nenhum deles teve o mesmo escopo desta pesquisa. As pesquisas que apresentaram uma lógica mais próxima (embora tenham testado o porte da firma ou o sócio e não a troca como neste trabalho) utilizaram uma medida de comparabilidade diferente.

Tanto Francis et al. (2014Francis, J. R., Pinnuck, M. L., & Watanabe, O. (2014). Auditor style and financial statement comparability. The Accounting Review, 89(2), 605-633.) como Li et al. (2017Li, L., Qi, B., & and Zhang, J. (2017). The effect of engagement auditors on financial statement comparability. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=3047631.
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) utilizaram como medida de comparabilidade a covariação dos lucros. Essa medida, conforme Ribeiro, Carmo, Fávero e Carvalho (2016aRibeiro, A. M., do Carmo, C. H. S., Lopes Fávero, L. P., & de Carvalho, L. N. G. (2016a). Comparabilidade X uniformidade dos relatórios financeiros: uma análise empírica durante o período de transição regulatória da contabilidade brasileira ao padrão internacional. Advances in Scientific & Applied Accounting, 9(3), 262-282.) está mais próxima da uniformidade do que da comparabilidade e apresenta um racional subjacente muito diferente da medida original de DeFranco et al. (2011DeFranco, G., Kothari, S. P., & Verdi, R. S. (2011). The benefits of financial statement comparability. Journal of Accounting Research, 49(4), 895-931.), que foi utilizada nesta pesquisa. A única investigação que utilizou a mesma medida deste trabalho de comparabilidade foi a de Zhang (2018Zhang, J. H. (2018). Accounting comparability, audit effort, and audit outcomes. Contemporary Accounting Research, 35(1), 245-276.), mas com objetivo diferente. No trabalho de Zhang (2018Zhang, J. H. (2018). Accounting comparability, audit effort, and audit outcomes. Contemporary Accounting Research, 35(1), 245-276.), a métrica de DeFranco et al. (2011DeFranco, G., Kothari, S. P., & Verdi, R. S. (2011). The benefits of financial statement comparability. Journal of Accounting Research, 49(4), 895-931.) foi uma variável independente para testar como ela impactava o risco de auditoria e o planejamento dos trabalhos dos sócios de auditoria. Neste trabalho ela será a variável dependente e será analisado qual o efeito da troca de firma e de sócio de auditoria sobre essa medida.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A população compreende a todas as companhias que negociaram ações na Brasil, Bolsa, Balcão (B3) entre 2010 e 2018. Esse intervalo foi escolhido em decorrência da adoção do padrão internacional (isto é, das IFRS) no Brasil. A amostra inicial corresponde a todas as empresas que apresentaram informações disponíveis no período da análise, isto é, 211 companhias, classificadas conforme seu setor de atividades econômicas.

O critério utilizado para essa classificação foi o North American Classification System (NAICS), em nível 3. O nível 3 do NAICS é o mais analítico e consegue aproximar mais as companhias dentro de suas subatividades. Essa aproximação é necessária, pois os eventos econômicos subjacentes dentro de cada setor devem ser os mais próximos possível, tendo em vista que para se fazer comparações é necessário haver parâmetros. Após a classificação setorial, foram apurados 79 setores passíveis de análise. Destes, optou-se por utilizar os setores que possuíam pelo menos 4 companhias passíveis de comparação. Como o setor é uma variável que necessita de controle no modelo de comparabilidade (Ribeiro, 2014Ribeiro, A. M. (2014). Poder discricionário do gestor e comparabilidade dos relatórios financeiros: uma análise dos efeitos da convergência do Brasil às IFRS (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo.), utilizar setores com poucas companhias iria carregar os graus de liberdade do modelo sem trazer variabilidade adequada à medida de comparabilidade.

Da mesma maneira que Francis et al. (2014Francis, J. R., Pinnuck, M. L., & Watanabe, O. (2014). Auditor style and financial statement comparability. The Accounting Review, 89(2), 605-633.), não foram consideradas as empresas do setor de Administração de Empresas (holdings), porque essas companhias administram outras organizações com objetos distintos e, geralmente, não podem ser comparadas na mesma base. Do mesmo modo que Ribeiro, Carmo, Fávero e Carvalho (2016bRibeiro, A. M., do Carmo, C. H. S., Lopes Fávero, L. P., & de Carvalho, L. N. (2016b). Poder discricionário do gestor e comparabilidade dos relatórios financeiros: uma análise do processo de transição regulatória da contabilidade brasileira. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 12-28.), não foram contempladas companhias que utilizam moeda funcional diferente do real (Embraer). Além disso, não participaram da amostra final as empresas do setor de bancos (12 companhias), já que apresentam diferenças quanto às normas (redigidas pelo Banco Central do Brasil) adotadas pelas empresas dos demais setores. Assim, a amostra foi composta por 50 empresas de 7 setores distintos.

A respeito do cálculo da medida de comparabilidade, recorreu-se à similaridade da função contábil desenvolvida por DeFranco et al. (2011DeFranco, G., Kothari, S. P., & Verdi, R. S. (2011). The benefits of financial statement comparability. Journal of Accounting Research, 49(4), 895-931.). O racional subjacente ao cálculo da medida consta no Apêndice A Apêndice A - Comparabilidade dos relatórios financeiros A medida de comparabilidade utilizada nesta pesquisa corresponde à similaridade da função contábil, desenvolvida por DeFranco et al. (2011) com as adaptações propostas por Yip e Young (2012) e Ribeiro et al. (2016a). Estes autores realizaram duas adaptações no modelo de similaridade da função contábil. A primeira corresponde à substituição do valor de mercado pelo ativo total das empresas. Com isso, a variável dependente da primeira equação da métrica da similaridade da função contábil consiste no retorno como variável independente e no lucro líquido dividido pelo ativo total, isto é, a Rentabilidade do Ativo (ROA). No trabalho original a proxy de valor de mercado foi utilizada para isolar o efeito tamanho sobre a medida. A opção desta pesquisa foi pelo ativo, pois é mais consistente e não apresenta problemas de liquidez. A segunda adaptação consiste em diminuir os períodos necessários para o cálculo da comparabilidade, de 16 para 12 trimestres. Segundo os autores, essa adaptação mantém as propriedades da similaridade da função contábil e, consequentemente, captura a comparabilidade dos relatórios financeiros adequadamente. Esta redução no período permite analisar mais anos da medida, pois a norma internacional passou a vigorar de forma obrigatória apenas a partir de 2010. Neste contexto, para mensurar a medida de comparabilidade, o primeiro passo foi estimar a função contábil de cada empresa, ao considerar os últimos 12 períodos trimestrais, conforme a equação a seguir: R O A i t = α i + β i R e t o r n o i t + ε i t (1) em que ROAit = lucro líquido trimestral sobre o ativo total da companhia i no período t não consolidado; e Retornoit = retorno acionário trimestral da companhia i no período t, calculado a partir do preço de fechamento das ações ordinárias, ajustado para proventos e desdobramentos. Em seguida, foram estimados os parâmetros das funções individuais, ao projetar o ROA esperado [E(ROA)] das empresas, de forma individual, a partir dos resultados obtidos por intermédio da equação (1). A equação do [E(ROA)] é demonstrada na sequência: E R O A i i t = α i ^ + β i ^ R e t o r n o i t (2) em que E(ROA)iit = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia i no período t; e Retornoit = retorno acionário trimestral da companhia i no período t, calculado a partir do preço de fechamento das ações ordinárias, ajustado para proventos e desdobramentos. Foi calculado, também, o ROA esperado da mesma companhia com os estimadores das outras empresas que pertencem ao mesmo setor, a partir da equação a seguir: E R O A i j t = α i ^ + β i ^ R e t o r n o i t (3) em que E(ROA)iji = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia j no período t; e Retornoit = retorno acionário trimestral da companhia i no período t, calculado a partir do preço de fechamento das ações ordinárias, ajustado para proventos e desdobramentos. Considerar o evento econômico de uma empresa a partir dos estimadores de outra companhia do mesmo setor consiste na ideia de manter o evento econômico constante. Desse modo, a comparabilidade das companhias corresponde à média da distância dos resultados obtidos por intermédio da Equação (2) e (3) para cada período trimestral, isto é: [E(ROAiit ) - E(ROAijt )]. Conforme a equação (4). C o m p i j t = - 1 12 ∑ t - 11 t ⃒ E R O A i i t - E R O A i j t ⃒ (4) em que Compbijt = medida de comparabilidade individual relativa da companhia i com base na empresa j no período t; E(ROA)iit = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia i no período t; e E(ROA)iji = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia j no período t. Como a comparabilidade é uma medida de distância entre as funções, quanto mais próximo de zero o resultado da equação (4) mais comparáveis são os pares de companhias dentro de cada setor (DeFranco et al., 2011). A medida é multiplicada por −1 para se ter a noção de seu crescimento a partir de sua curva ascendente, o que facilita a visualização gráfica e sua interpretação. A partir da Equação (4) estabelecem-se as distâncias médias entre as funções de duas companhias. A partir do cálculo das médias destas distâncias, ao considerar as empresas de referência, obteve-se a medida de comparabilidade de cada companhia. A equação consta a seguir: C O M P M i t = C o m p b i j t n (5) em que COMPMit = medida de comparabilidade de cada empresa em relação aos seus pares que pertencem ao mesmo setor; Compbijt = medida de comparabilidade individual relativa à companhia i com base na empresa j no período t; e n = número de companhias do setor. No final, as companhias com maiores níveis de comparabilidades médias serão as empresas que possuírem a medida COMPM mais próxima de zero, e as que tiverem os menores níveis de comparabilidade são as que possuem os menores valores desta medida, isto é, mais distantes de zero. . Já a segunda medida utilizada compreende a comparabilidade ao longo do tempo. Para essa medida, definiu-se o nome de consistência, com o propósito de diferenciar da medida original de DeFranco et al. (2011DeFranco, G., Kothari, S. P., & Verdi, R. S. (2011). The benefits of financial statement comparability. Journal of Accounting Research, 49(4), 895-931.). Essa medida foi originalmente adaptada na tese de Ribeiro (2014Ribeiro, A. M. (2014). Poder discricionário do gestor e comparabilidade dos relatórios financeiros: uma análise dos efeitos da convergência do Brasil às IFRS (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo.) e seu cômputo consta no Apêndice B Apêndice B - Consistência dos relatórios financeiros A segunda medida de comparabilidade utilizada nesta pesquisa foi a comparabilidade ao longo do tempo para uma determinada companhia. Para essa medida, definiu-se o nome de consistência, de modo a diferenciar da medida original de DeFranco et al. (2011). Essa medida de comparabilidade ao longo do tempo foi originalmente adaptada pela tese de Ribeiro (2014) e selecionada por este trabalho para averiguar o efeito da troca de auditores nas comparações entre as mesmas companhias, porém em anos distintos. A opção pela medida de consistência foi feita em decorrência das implicações práticas desta análise. Quando ocorre a troca de auditores ou firmas de auditoria pode acontecer, também, uma alteração no entendimento sobre um determinado procedimento contábil realizado pela companhia. Essa alteração pode mudar a forma com que um determinado evento econômico é reconhecido no resultado e alterar a percepção de desempenho dos usuários da informação financeira. Ou seja, os analistas podem achar que houve uma alteração do evento econômico, quando na verdade o que se alterou foi o entendimento da empresa sobre como contabilizá-lo. Em decorrência disto, a troca de auditores pode ter um efeito mais perverso sobre a consistência do que sobre a comparabilidade para os usuários da informação financeira. Para calcular a medida de consistência foi utilizado o mesmo racional subjacente ao da comparabilidade. A adaptação foi feita no parâmetro de comparação. Em vez de se utilizar os pares do setor, foi utilizado o retorno da mesma empresa defasado em um período trimestral, conforme exposto na Equação (6). E R O A i i t = α i ^ + β i ^ R e t o r n o t - 1 (6) em que E(ROA)iit = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia i no período t; Retornoit-1 = retorno acionário trimestral da companhia i no período t-1, calculado a partir do preço de fechamento das ações ordinárias, ajustado para proventos e desdobramentos, referente ao trimestre anterior. Analisar o evento econômico de uma empresa a partir de seus estimadores em um período defasado (t-1) significa que a companhia mantém suas informações consistentes ao longo do tempo diante dos eventos econômicos. Nesse contexto, a consistência se refere à média da distância das funções obtidas a partir da Equação (2) e (6), para cada trimestre, [E(ROAiit ) - E(ROAiit-1 )]. Desse modo, quanto mais próximos são os resultados dessas duas funções, maior é a consistência das informações contábeis de uma mesma companhia ao longo do tempo. Assim, para medir a consistência intertemporal de cada empresa, foi calculada a medida da proximidade de cada função, por trimestre, ao considerar a seguinte equação: C O N S I S i i t = - 1 12 ∑ t - 11 t ⃒ E R O A i i t - E R O A i i t - 1 ⃒ (7) em que CONSISiit = medida de consistência individual relativa da companhia i com base na empresa i no período t; E(ROA)iit = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia i no período t; E(ROA)iji = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia i no período t-1. Diferentemente da medida de comparabilidade que é calculada com base na média das distâncias de diferentes empresas, a medida de consistência é mensurada fundamentada na mesma empresa ao longo do tempo. Desta forma, o resultado da Equação (7) consiste na medida de consistência da empresa. .

Quanto ao período de análise, para o cálculo da comparabilidade e da consistência, considerou-se o intervalo entre os anos de 2010 e 2018. Esse lapso temporal corresponde ao período full IFRS no Brasil. As informações necessárias para o cálculo dessas variáveis foram coletadas por meio da base de dados da Economatica®. O período inicial do painel corresponde ao ano de 2012, tendo em vista que para mensurar a medida de comparabilidade e consistência se faz necessário o uso de dados referentes aos 11 trimestres anteriores e ao trimestre atual de cada companhia. Quanto à coleta dos dados acerca da troca e da permanência da firma e do sócio de auditoria, recorreu-se ao relatório do auditor externo que consta no endereço eletrônico da CVM. Vale ressaltar que, para a medida de tenure dos sócios e das firmas, foram coletadas as informações das firmas de auditoria e dos sócios de auditoria desde o início do seu relacionamento, ou seja, em alguns casos, o período analisado para essa variável especificamente retroagiu a anos anteriores ao período de corte 2012-2018. Na Tabela 1, são apresentadas as variáveis dependentes e independentes utilizadas nos modelos multivariados.

Tabela 1
Variáveis dependentes e independentes utilizadas no modelo

As variáveis de interesse desta pesquisa são a troca obrigatória e voluntária, além da tenure de curto prazo do sócio de auditoria e da firma de auditoria. Quanto às variáveis tenure do sócio de auditoria e tenure da firma de auditoria, identificou-se que nenhuma das empresas teve permanência do sócio de auditoria acima de 5 anos e da firma de auditoria acima de 8 anos. Com isso, houve permanência do sócio de auditoria e da firma de auditoria apenas de médio prazo (4 a 8 anos) e nenhum caso de longo prazo (acima de 9 anos), como apresentado no trabalho de Johnson et al. (2002Johnson, V. E., Khurana, I. K., & Reynolds, J. K. (2002). Audit‐firm tenure and the quality of financial reports. Contemporary Accounting Research, 19(4), 637-660.). Assim, utilizou-se apenas uma variável dicotômica para o sócio de auditoria (TENCSOCIO) e para a firma (TENCFIRMA), já que a relação de permanência do sócio e da firma de auditoria é curto ou médio nesta pesquisa.

Ainda, recorreu-se a variáveis de controle conforme estabelecidas nas investigações de Zhang (2018Zhang, J. H. (2018). Accounting comparability, audit effort, and audit outcomes. Contemporary Accounting Research, 35(1), 245-276.), Ribeiro (2014Ribeiro, A. M. (2014). Poder discricionário do gestor e comparabilidade dos relatórios financeiros: uma análise dos efeitos da convergência do Brasil às IFRS (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo.), Ribeiro et al. (2016aRibeiro, A. M., do Carmo, C. H. S., Lopes Fávero, L. P., & de Carvalho, L. N. G. (2016a). Comparabilidade X uniformidade dos relatórios financeiros: uma análise empírica durante o período de transição regulatória da contabilidade brasileira ao padrão internacional. Advances in Scientific & Applied Accounting, 9(3), 262-282.) e Ribeiro et al. (2016bRibeiro, A. M., do Carmo, C. H. S., Lopes Fávero, L. P., & de Carvalho, L. N. (2016b). Poder discricionário do gestor e comparabilidade dos relatórios financeiros: uma análise do processo de transição regulatória da contabilidade brasileira. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 12-28.). Segundo os autores, a medida de comparabilidade possui relação significativa com o market-to-book (MB), grau de alavancagem operacional (GAO), tamanho da empresa (TAM), setor de atividade econômica da empresa e se trocou o porte das firmas de auditoria. Além disso, utilizou-se a variável crise econômica (CRISE), dado que os resultados demonstraram redução na comparabilidade, especialmente em períodos que o PIB apresentou variação negativa.

Ao considerar o tratamento da amostra, o número total possível de observações corresponde a 350, em que 39 se referem a observações com dados insuficientes. Com isso, a amostra foi composta por 311 observações. Além disso, os dados foram submetidos ao tratamento multivariado de outliers. Optou-se pela técnica desenvolvida por Hadi (1992Hadi, A. S. (1992). Identifying multiple outliers in multivariate data. Journal of the Royal Statistical Society. Series B (Methodological), 54(3), 761-771.), que detectou 51 outliers, excluídos da amostra. Dessa forma, a amostra final foi composta por 260 observações.

Quanto ao modelo em painel, ele pode ser classificado como curto (há maior quantidade de observações do que períodos analisados) e desbalanceado (existem observações faltantes ao longo do tempo). Para determinar a estimação mais adequada de acordo com a característica dos dados, realizou-se o teste Breusch-Pagan (BP) nos quatro modelos multivariados. Esse teste nos modelos multivariados do impacto da firma de auditoria e do sócio de auditoria na comparabilidade (Modelo 1 e Modelo 2) sugere que a estimação mais adequada confere ao pooled ordinary least square (POLS). O teste de BP indicou que a estimação mais adequada dos modelos multivariados correspondentes ao impacto da firma e do sócio de auditoria na consistência (Modelo 3 e Modelo 4) compreende ao efeito aleatório - vale lembrar que não foi considerado o modelo de efeitos fixos, pois as análises multivariadas contaram com o controle de setores.

Ressalta-se que, para cumprir os pressupostos dos modelos multivariados, foi realizado o teste de correlação de Pearson, bem como, o teste de Variance Inflation Factor (VIF). Esses testes demonstraram que nenhuma das variáveis independentes apresentou correlação acima de 0,70, da mesma forma que, todos os valores do teste VIF foram inferiores a 5. Com esses resultados, como sugerido por Fávero e Belfiore (2017Fávero, L. P., & Belfiore, P. (2017). Manual de análise de dados: estatística e modelagem multivariada com Excel®, SPSS® e Stata®. Rio de Janeiro, RJ: Elsevier.), nenhum dos modelos multivariados estão suscetíveis ao problema de multicolinearidade. Ademais, todos os modelos multivariados foram clusterizados nos indivíduos para que os resultados não estivessem suscetíveis a problemas relacionados à heterocedasticidade dos dados, assim como à autocorrelação serial.

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Na Tabela 2 são apresentados os resultados correspondentes à análise descritiva das variáveis quantitativas.

Tabela 2
Estatística descritiva das variáveis quantitativas

Ao analisar a tenure da firma de auditoria e do sócio de auditoria, percebe-se que em média a tenure do sócio de auditoria é de 2 anos e 1 mês, menor do que a tenure da firma de auditoria, uma vez que foi de 2 anos e 6 meses, em média. Essa informação é interessante, pois demonstra que a troca, normalmente, ocorre antes do período em que ela deve ser efetuada de modo obrigatório. Assim, entende-se que, em média, a tenure do sócio de auditoria e da firma de auditoria é de curto prazo. Esse entendimento é válido, pois 73,74% das observações apresentam tenure da firma de auditoria de curto prazo e 83,84% dos dados possuem tenure do sócio de auditoria de curto prazo, indício que vai contra a argumentação pró-regulação do rodízio que determina a troca em 5 anos. Cabe ressaltar que a média da tenure do sócio de auditoria é dissemelhante ao tempo de permanência encontrado nos estudos de Chi et al. (2011Chi, W., Lisic, L. L., & Pevzner, M. (2011). Is enhanced audit quality associated with greater real earnings management? Accounting Horizons, 25(2), 315-335.) e Chen et al. (2008Chen, C. Y., Lin, C. J., & Lin, Y. C. (2008). Audit partner tenure, audit firm tenure, and discretionary accruals: Does long auditor tenure impair earnings quality? Contemporary Accounting Research, 25(2), 415-445.). Nesses estudos, a tenure do sócio de auditoria apresentou média de aproximadamente 13 anos e, 8 anos e 4 meses, respectivamente. Isso pode ser justificado, a partir da lógica de que no Brasil o rodízio obrigatório já está estabelecido a mais de uma década, ou seja, é um mecanismo não baseado em mercado consolidado e as empresas já estão adaptadas. Outra explicação pode ser o alto turnover de sócios das firmas de auditoria e o baixo grau de especialização dos auditores devido ao curto período de relacionamento estabelecido pela regra do rodízio obrigatório. Esses indícios destacam que a tenure do auditor no Brasil seja classificada como curto, ao considerar o estudo de Casterella e Johnston (2013Casterella, J. R., & Johnston, D. (2013). Can the academic literature contribute to the debate over mandatory audit firm rotation? Research in Accounting Regulation, 25(1), 108-116.).

Já a medida de comparabilidade apresentou média de -4,24. Ela foi consideravelmente inferior aos resultados de estudos relacionados, tais como o de DeFranco et al. (2011DeFranco, G., Kothari, S. P., & Verdi, R. S. (2011). The benefits of financial statement comparability. Journal of Accounting Research, 49(4), 895-931.), Sohn (2016Sohn, B. C. (2016). The effect of accounting comparability on the accrual-based and real earnings management. Journal of Accounting and Public Policy, 35(5), 513-539.), Fang et al. (2012Fang, X., Li, Y., Xin, B., & Zhang, W. J. (2012). Accounting comparability and loan contracting. Working Paper.) e Ribeiro et al. (2016bRibeiro, A. M., do Carmo, C. H. S., Lopes Fávero, L. P., & de Carvalho, L. N. (2016b). Poder discricionário do gestor e comparabilidade dos relatórios financeiros: uma análise do processo de transição regulatória da contabilidade brasileira. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 12-28.). Porque nesses estudos a comparabilidade apresentou média de: -2,70; -1,90; -2,03 e -2,63, respectivamente. Uma explicação factível para esse achado corresponde à desaceleração econômica que ocorreu no país a partir do segundo trimestre de 2014.

Em uma análise ao longo dos anos, percebe-se diminuição na comparabilidade das empresas, sendo que essa característica qualitativa de melhoria apresentou média de -3,10 em 2012 e -3,33 em 2013. Ao realizar o teste T de Student, ao nível de 5%, os resultados demonstraram que não houve diferença significativa na média da comparabilidade entre esses dois períodos anuais. Contudo, em 2014 a média da comparabilidade foi de -4,15, mesmo assim, não houve diferença significativa com o ano anterior. Entretanto, em 2015 a média da comparabilidade foi de -4,68. Resultado que apresentou diferença significativa (ao nível de 5%) à média da comparabilidade do ano anterior, isto é, 2014. Esse comportamento de diminuição significativa na média da comparabilidade persistiu no ano de 2016, em que essa característica qualitativa de melhoria apresentou média de -6,00. Em 2017 a comparabilidade apresentou média de -5,46, resultado que não é significativamente diferente da média da comparabilidade no ano de 2016. No ano de 2018 a média da comparabilidade foi de -3,21 e, dessa forma, percebe-se aumento significativo na média (ao nível de 5%) dessa característica qualitativa de melhoria quando comparada com a média do ano anterior.

A consistência apresentou média de -0,87, semelhante ao resultado encontrado por Ribeiro (2014Ribeiro, A. M. (2014). Poder discricionário do gestor e comparabilidade dos relatórios financeiros: uma análise dos efeitos da convergência do Brasil às IFRS (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo.). Diferente da comparabilidade, a consistência não apresentou diminuição acentuada ao considerar o lapso temporal analisado. Por meio do teste de Wilcoxon, ao nível de 5%, não foi identificada diferença significativa do nível de consistência dos relatórios financeiros das companhias em relação ao nível desse aspecto no ano anterior. A média dessa variável foi de -0,78; -0,81; -0,78 em 2012, 2013 e 2014, respectivamente. Nos anos em que o PIB foi negativo, a consistência teve comportamento semelhante aos períodos anteriores, com média de -0,98 e -0,93 em 2015 e 2016, respectivamente. Em 2017, a consistência apresentou média de -1,07, e em 2018 a média foi de -0,74, sem diferença significativa entre esses períodos. Os resultados da medida de comparabilidade e consistência, por período anual, são apresentados na Figura 1.

Figura 1
Comportamento da comparabilidade e da consistência entre 2012 e 2017

A próxima análise corresponde aos modelos de regressão de dados em painel para as medidas investigadas. Para evitar a sobreposição de períodos, as trocas dos sócios e firmas de auditoria foram separadas em dois modelos distintos, assim como o seu respectivo tipo de permanência (tenure de curto prazo e tenure de médio prazo). Esse procedimento foi necessário, pois quase sempre em que ocorreu a troca da firma de auditoria o sócio responsável pelo serviço de auditoria também foi trocado. Com isso, os períodos entre o rodízio da firma de auditoria e do sócio de auditoria ficariam praticamente sobrepostos e o seu efeito não seria capturado adequadamente. Na Tabela 3 constam os resultados dos fatores relacionados à medida de comparabilidade e consistência.

Tabela 3
Modelo multivariado da medida de comparabilidade e consistência

Ao considerar o Modelo 1, do efeito das trocas, tenure e porte da firma de auditoria na comparabilidade, percebeu-se que a troca obrigatória da firma de auditoria, em decorrência da instrução n. 308 (CVM, 1999Comissão de Valores Mobiliários (CVM) (1999). Instrução n. 308. Com as alterações introduzidas pelas instruções CVM n. 509/2011, 545/2014 e 591/2017. ) e, posteriormente, da deliberação n. 549 (CVM, 2008Comissão de Valores Mobiliários (CVM). (2008). Deliberação n. 549. ), não influenciou significativamente a comparabilidade dos relatórios financeiros. Da mesma forma, as companhias que realizaram a troca da firma de auditoria de forma voluntária também não sofreram impacto em suas medidas de comparabilidade. Assim, constatou-se que a troca da firma de auditoria não influenciou a comparabilidade, contrariando o resultado do trabalho de Silvestre et al. (2018Silvestre, A. O., Costa, C. M., & Kronbauer, C. A. (2018). Audit rotation and earnings quality: An analysis using discretionary accruals. BBR - Brazilian Business Review, 15(5), 410-426.), que detectou redução na qualidade dos accruals associada às trocas das firmas de auditoria. Os resultados desta pesquisa também diferem dos achados de Kim et al. (2015Kim, H., Lee, H., & Lee, J. E. (2015). Mandatory audit firm rotation and audit quality. Journal of Applied Business Research, 31(3), 1089.), pois os autores mencionam que a melhora da qualidade dos accruals ocorre apenas nas trocas obrigatórias.

Ainda no que tange o Modelo 1, os resultados indicam que a tenure de curto prazo da firma de auditoria está relacionada com maiores níveis de comparabilidade se comparada à tenure de períodos superiores a 3 anos. Com isso, pode-se inferir que o aumento do período da relação entre a firma de auditoria e o cliente é prejudicial à comparabilidade dos relatórios financeiros. Esse resultado diverge, em geral, da literatura sobre a qualidade da informação e a tenure das firmas de auditoria que revelam relação positiva entre o maior período de permanência do auditor e a qualidade dos lucros (Casterella & Johnston, 2013Casterella, J. R., & Johnston, D. (2013). Can the academic literature contribute to the debate over mandatory audit firm rotation? Research in Accounting Regulation, 25(1), 108-116.). Essa divergência pode ser explicada em parte pelo estudo de Bell et al. (2015Bell, T. B., Causholli, M., & Knechel, W. R. (2015). Audit firm tenure, non‐audit services, and internal assessments of audit quality. Journal of Accounting Research, 53(3), 461-509.), haja vista que existe uma curva ótima entre a tenure e a qualidade da auditoria. Segundo os autores, uma relação muito longa entre auditor e auditada é prejudicial à qualidade da auditoria e pode ter reflexos na qualidade da informação.

Nesta pesquisa, a curva da tenure média das firmas pode ser considerada como relativamente curta, tendo em vista que é abaixo de 3 anos. Como no ambiente brasileiro as empresas trocam a firma de auditoria antes mesmo do rodízio obrigatório (que exige a troca em 5 anos), as companhias que mantêm a firma de auditoria apresentam a tendência em prevalecer com práticas contábeis menos conservadoras. Esse aspecto foi similar na pesquisa realizada por Cameron, Prencipe e Trombetta (2014Cameran, M., Prencipe, A., & Trombetta, M. (2014). Mandatory audit firm rotation and audit quality. European Accounting Review, 25(1), 35-58.). Ao analisarem a relação entre o rodízio e a qualidade da auditoria em empresas italianas (rodízio obrigatório de firmas de 3 em 3 anos), os autores encontraram que a troca favorece a maior qualidade dos relatórios financeiros por meio de um maior conservadorismo contábil no último ano de permanência da firma na companhia auditada. Esse indício pode estar relacionado à pesquisa de DeFond e Subramanyam (1998DeFond, M. L., & Subramanyam, K. R. (1998). Auditor changes and discretionary accruals. Journal of Accounting and Economics, 25(1), 35-67.), que atribuem o aumento do conservadorismo ao maior risco de litígio no momento da troca de auditoria. Quanto às demais variáveis, elas não foram significativas, com exceção da variável crise econômica.

No Modelo 2, não houve efeito significativo da troca do sócio de auditoria na comparabilidade dos relatórios financeiros. Achado que é diferente da investigação de Jenkins e Vellury (2008Jenkins, D. S., & Velury, U. (2008). Does auditor tenure influence the reporting of conservative earnings? Journal of Accounting and Public Policy, 27(2), 115-132.), uma vez que apresentaram o efeito do rodízio dos sócios de auditoria após a implementação da SOX. Os autores encontraram uma relação negativa entre a qualidade da informação contábil e o rodízio no curto (até 3 anos) e no médio (de 3 a 5 anos) prazos. Uma possível diferença entre os resultados pode ser explicada pelo ambiente institucional dos dois trabalhos. Enquanto no Brasil o regulamento já está em vigor a quase duas décadas, a pesquisa de Jenkins e Vellury (2008Jenkins, D. S., & Velury, U. (2008). Does auditor tenure influence the reporting of conservative earnings? Journal of Accounting and Public Policy, 27(2), 115-132.) foi conduzida em um ambiente regulatório implementado recentemente.

As evidências demonstram que a permanência de curto ou médio prazo do sócio de auditoria não apresenta diferenças significativas na comparabilidade. Isso vai de encontro aos achados de Chi et al. (2011Chi, W., Lisic, L. L., & Pevzner, M. (2011). Is enhanced audit quality associated with greater real earnings management? Accounting Horizons, 25(2), 315-335.), haja vista que os autores mencionam que há um trade-off entre a manipulação de resultados por accruals para uma manipulação operacional em relacionamentos de longo prazo com os sócios de auditoria. Contudo, os autores consideram relacionamentos de longo prazo acima de 8 anos e este aspecto não foi encontrado nesta pesquisa.

Cabe destacar como análise adicional que, em ambos os modelos da comparabilidade (Modelo 1 e 2), a crise econômica apresentou relação negativa com essa característica qualitativa de melhoria. Esse resultado expõe que em períodos de retração econômica há diminuição na qualidade dos relatórios financeiros. Esse fato também foi observado por Paulo e Mota (2019Paulo, E., & Mota, R. H. G. (2019). Ciclos econômicos e estratégias de gerenciamento de resultados contábeis: um estudo nas companhias abertas brasileiras. Revista Contabilidade & Finanças, 30(80), 216-233.) em sua pesquisa sobre gerenciamento por accruals. Segundo os autores, em momentos de crise os gestores recorrem a um maior uso de accruals discricionários para gerenciar seus resultados. Esse aspecto pode ser observado também na atual crise gerada pelo COVID-19. Alguns bancos brasileiros foram muito mais conservadores do que outros na calibragem de suas estimativas com perdas em operações de crédito, essas diferenças de interpretação podem ser acentuadas em períodos de crise e afetam de modo significativo a comparabilidade dos relatórios financeiros.

Na análise da consistência dos relatórios financeiros (Modelos 3 e 4), não houve efeito significativo da troca da firma (obrigatória ou voluntária) ou do sócio de auditoria. O único impacto identificado na consistência foi da tenure de curto prazo da firma de auditoria. Assim como na comparabilidade, o resultado do Modelo 3 demonstra um efeito positivo sobre a consistência quando a relação é de até 3 anos em comparação com uma relação mais longa.

No que compreende ao sócio de auditoria, observa-se que a sua troca não está relacionada com o nível de consistência dos relatórios financeiros. De modo similar, a tenure do sócio de auditoria de curto prazo não tem nível de consistência distinto da tenure do sócio de auditoria de médio prazo. Nesse sentido, percebe-se que esses aspectos (rodízio e tenure) do sócio de auditoria não impactam a consistência dos relatórios financeiros. Fenômeno que pode estar relacionado aos mesmos procedimentos utilizados por diferentes sócios de auditoria que pertencem à mesma firma de auditoria (Francis et al., 2014Francis, J. R., Pinnuck, M. L., & Watanabe, O. (2014). Auditor style and financial statement comparability. The Accounting Review, 89(2), 605-633.). Assim, mesmo que haja a troca do sócio de auditoria por outro sócio da mesma firma, durante a prestação do serviço de auditoria serão aplicados os mesmos procedimentos internos estipulados - vale lembrar que isso também pode estar ocorrendo no que confere ao tempo de permanência do sócio de auditoria, no qual o mesmo estilo de auditoria irá se repetir com o próximo sócio responsável que pertence à mesma firma de auditoria.

Para finalizar, a troca do porte da firma de auditoria também não teve efeito significativo nas medidas analisadas. Esse resultado destoa dos achados do estudo de Francis et al. (2014Francis, J. R., Pinnuck, M. L., & Watanabe, O. (2014). Auditor style and financial statement comparability. The Accounting Review, 89(2), 605-633.) e indica que, no Brasil, mesmo para as empresas consideradas fora do grupo das Big 4, existe um alinhamento do pensamento mais amplo, que extrapola o porte relativo das firmas de auditoria.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo objetivou analisar qual o efeito do rodízio e tenure das firmas e dos sócios de auditoria na comparabilidade e na consistência dos relatórios financeiros. As evidências indicam que o rodízio obrigatório e a troca voluntária das firmas de auditoria não estão relacionados com o nível de comparabilidade e de consistência dos relatórios financeiros. Esses achados contribuem com as discussões sobre o rodízio, pois evidenciam que não existe uma mudança repentina de interpretação sobre o processo contábil mesmo quando ocorre a troca no agente que comprova sua autenticidade.

No campo teórico, os resultados contribuem com as discussões estabelecidas nas pesquisas de Jenkins e Vellury (2008Jenkins, D. S., & Velury, U. (2008). Does auditor tenure influence the reporting of conservative earnings? Journal of Accounting and Public Policy, 27(2), 115-132.), Kim et al. (2015Kim, H., Lee, H., & Lee, J. E. (2015). Mandatory audit firm rotation and audit quality. Journal of Applied Business Research, 31(3), 1089.), Wolf, Tackett e Claypool (1999Wolf, F. M., Tackett, J. A., & Claypool, G. A. (1999). Audit disaster futures: antidotes for the expectation gap? Managerial Auditing Journal, 14(9), 468-478.) e Defond e Francis (2005DeFond, M. L., & Francis, J. R. (2005). Audit research after sarbanes-oxley. Auditing: A Journal of Practice & Theory, 24(s-1), 5-30.) ao considerar que a troca não foi prejudicial à comparabilidade e à consistência das informações presentes nas demonstrações financeiras. Além disso, os resultados sugerem que a tenure de curto prazo da firma de auditoria está relacionada a maiores níveis de comparabilidade e de consistência dos relatórios financeiros do que a tenure da firma de auditoria de prazo maior, ou seja, superiores a 3 anos.

Vale ressaltar que esses resultados têm implicações no âmbito prático, visto que o rodízio das firmas de auditoria não afeta a comparabilidade e a consistência dos relatórios financeiros e, dessa forma, pode ser um indicativo de que o rodízio obrigatório das firmas de auditoria é eficaz. Isso porque não há mudança repentina no nível de comparabilidade e de consistência dos relatórios financeiros no ano que foi realizado o rodízio, indicando que a firma de auditoria que auditava a empresa anteriormente não perdeu a sua independência com a empresa auditada. Ademais, os resultados sobre a tenure da firma de auditoria podem auxiliar no que tange à discussão dos benefícios do rodízio obrigatório, haja vista que elucida que a tenure de curto prazo está relacionada com maior nível de comparabilidade e consistência dos relatórios financeiros. Com isso, entende-se que com o aumento do período da tenure da firma de auditoria, a comparabilidade dos relatórios financeiros diminui ao ponto de poder prejudicar o processo decisório dos investidores. Assim, entende-se que o rodízio obrigatório das firmas de auditoria pode ser necessário e benéfico para os investidores.

Apesar disso, os resultados sugerem que o rodízio do sócio de auditoria não está relacionado com a comparabilidade e com a consistência dos relatórios financeiros. Esse resultado, embora esteja em contraponto com a discussão apresentada por Myers et al. (2003Myers, J. N., Myers, L. A., & Omer, T. C. (2003). Exploring the term of the auditor-client relationship and the quality of earnings: A case for mandatory auditor rotation? The Accounting Review, 78(3), 779-799.), sinaliza que a troca mais relevante é da firma de auditoria e não do sócio. Isso ficou claro, pois não houve diferença significativa da medida de consistência e comparabilidade ao considerar a tenure de curto prazo e a tenure de longo prazo. Desse modo, esses achados podem gerar contribuições ao trabalho de Johnson et al. (2002Johnson, V. E., Khurana, I. K., & Reynolds, J. K. (2002). Audit‐firm tenure and the quality of financial reports. Contemporary Accounting Research, 19(4), 637-660.), em que a qualidade dos relatórios financeiros só tem implicações em nível da firma de auditoria. Essas evidências podem auxiliar os usuários externos (órgãos reguladores e investidores), bem como, as próprias empresas, uma vez que podem indicar que os procedimentos de auditoria realizados por diferentes sócios de auditoria de uma mesma firma de auditoria são similares em um ambiente institucional com rodízio obrigatório implementado. Assim, nesse ambiente regulatório, a ligação entre a firma de auditoria e a empresa auditada sobrepõe a importância da ligação entre o sócio de auditoria e a companhia auditada, especialmente, no efeito prejudicial da tenure de longos períodos nos relatórios financeiros.

Este estudo não foi isento de limitações, sendo que, como Ribeiro et al. (2016bRibeiro, A. M., do Carmo, C. H. S., Lopes Fávero, L. P., & de Carvalho, L. N. (2016b). Poder discricionário do gestor e comparabilidade dos relatórios financeiros: uma análise do processo de transição regulatória da contabilidade brasileira. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 12-28.), uma delas corresponde em não considerar possíveis políticas que estejam no resultado abrangente. Outra limitação corresponde ao número reduzido de observações, devido ao tamanho do mercado de capitais brasileiro, em comparação com demais investigações sobre a comparabilidade em outros países, como a de DeFranco et al. (2011DeFranco, G., Kothari, S. P., & Verdi, R. S. (2011). The benefits of financial statement comparability. Journal of Accounting Research, 49(4), 895-931.). Recomenda-se, para pesquisas futuras, analisar o efeito do estilo da auditoria, bem como os efeitos do gerenciamento de resultados e ambiente macroeconômico na comparabilidade e consistência dos relatórios financeiros.

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  • *
    Artigo apresentado na XIX USP International Conference in Accounting, São Paulo, SP, Brasil, julho de 2019.
  • **
    Este trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) - Código de Financiamento 001.

Apêndice A - Comparabilidade dos relatórios financeiros

A medida de comparabilidade utilizada nesta pesquisa corresponde à similaridade da função contábil, desenvolvida por DeFranco et al. (2011) com as adaptações propostas por Yip e Young (2012) e Ribeiro et al. (2016a). Estes autores realizaram duas adaptações no modelo de similaridade da função contábil. A primeira corresponde à substituição do valor de mercado pelo ativo total das empresas. Com isso, a variável dependente da primeira equação da métrica da similaridade da função contábil consiste no retorno como variável independente e no lucro líquido dividido pelo ativo total, isto é, a Rentabilidade do Ativo (ROA). No trabalho original a proxy de valor de mercado foi utilizada para isolar o efeito tamanho sobre a medida. A opção desta pesquisa foi pelo ativo, pois é mais consistente e não apresenta problemas de liquidez.

A segunda adaptação consiste em diminuir os períodos necessários para o cálculo da comparabilidade, de 16 para 12 trimestres. Segundo os autores, essa adaptação mantém as propriedades da similaridade da função contábil e, consequentemente, captura a comparabilidade dos relatórios financeiros adequadamente. Esta redução no período permite analisar mais anos da medida, pois a norma internacional passou a vigorar de forma obrigatória apenas a partir de 2010.

Neste contexto, para mensurar a medida de comparabilidade, o primeiro passo foi estimar a função contábil de cada empresa, ao considerar os últimos 12 períodos trimestrais, conforme a equação a seguir:

R O A i t = α i + β i R e t o r n o i t + ε i t (1)

em que ROAit = lucro líquido trimestral sobre o ativo total da companhia i no período t não consolidado; e Retornoit = retorno acionário trimestral da companhia i no período t, calculado a partir do preço de fechamento das ações ordinárias, ajustado para proventos e desdobramentos.

Em seguida, foram estimados os parâmetros das funções individuais, ao projetar o ROA esperado [E(ROA)] das empresas, de forma individual, a partir dos resultados obtidos por intermédio da equação (1). A equação do [E(ROA)] é demonstrada na sequência:

E R O A i i t = α i ^ + β i ^ R e t o r n o i t (2)

em que E(ROA)iit = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia i no período t; e Retornoit = retorno acionário trimestral da companhia i no período t, calculado a partir do preço de fechamento das ações ordinárias, ajustado para proventos e desdobramentos.

Foi calculado, também, o ROA esperado da mesma companhia com os estimadores das outras empresas que pertencem ao mesmo setor, a partir da equação a seguir:

E R O A i j t = α i ^ + β i ^ R e t o r n o i t (3)

em que E(ROA)iji = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia j no período t; e Retornoit = retorno acionário trimestral da companhia i no período t, calculado a partir do preço de fechamento das ações ordinárias, ajustado para proventos e desdobramentos.

Considerar o evento econômico de uma empresa a partir dos estimadores de outra companhia do mesmo setor consiste na ideia de manter o evento econômico constante. Desse modo, a comparabilidade das companhias corresponde à média da distância dos resultados obtidos por intermédio da Equação (2) e (3) para cada período trimestral, isto é: [E(ROAiit ) - E(ROAijt )]. Conforme a equação (4).

C o m p i j t = - 1 12 t - 11 t E R O A i i t - E R O A i j t (4)

em que Compbijt = medida de comparabilidade individual relativa da companhia i com base na empresa j no período t; E(ROA)iit = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia i no período t; e E(ROA)iji = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia j no período t.

Como a comparabilidade é uma medida de distância entre as funções, quanto mais próximo de zero o resultado da equação (4) mais comparáveis são os pares de companhias dentro de cada setor (DeFranco et al., 2011). A medida é multiplicada por −1 para se ter a noção de seu crescimento a partir de sua curva ascendente, o que facilita a visualização gráfica e sua interpretação.

A partir da Equação (4) estabelecem-se as distâncias médias entre as funções de duas companhias. A partir do cálculo das médias destas distâncias, ao considerar as empresas de referência, obteve-se a medida de comparabilidade de cada companhia. A equação consta a seguir:

C O M P M i t = C o m p b i j t n (5)

em que COMPMit = medida de comparabilidade de cada empresa em relação aos seus pares que pertencem ao mesmo setor; Compbijt = medida de comparabilidade individual relativa à companhia i com base na empresa j no período t; e n = número de companhias do setor.

No final, as companhias com maiores níveis de comparabilidades médias serão as empresas que possuírem a medida COMPM mais próxima de zero, e as que tiverem os menores níveis de comparabilidade são as que possuem os menores valores desta medida, isto é, mais distantes de zero.

Apêndice B - Consistência dos relatórios financeiros

A segunda medida de comparabilidade utilizada nesta pesquisa foi a comparabilidade ao longo do tempo para uma determinada companhia. Para essa medida, definiu-se o nome de consistência, de modo a diferenciar da medida original de DeFranco et al. (2011). Essa medida de comparabilidade ao longo do tempo foi originalmente adaptada pela tese de Ribeiro (2014) e selecionada por este trabalho para averiguar o efeito da troca de auditores nas comparações entre as mesmas companhias, porém em anos distintos.

A opção pela medida de consistência foi feita em decorrência das implicações práticas desta análise. Quando ocorre a troca de auditores ou firmas de auditoria pode acontecer, também, uma alteração no entendimento sobre um determinado procedimento contábil realizado pela companhia. Essa alteração pode mudar a forma com que um determinado evento econômico é reconhecido no resultado e alterar a percepção de desempenho dos usuários da informação financeira. Ou seja, os analistas podem achar que houve uma alteração do evento econômico, quando na verdade o que se alterou foi o entendimento da empresa sobre como contabilizá-lo. Em decorrência disto, a troca de auditores pode ter um efeito mais perverso sobre a consistência do que sobre a comparabilidade para os usuários da informação financeira.

Para calcular a medida de consistência foi utilizado o mesmo racional subjacente ao da comparabilidade. A adaptação foi feita no parâmetro de comparação. Em vez de se utilizar os pares do setor, foi utilizado o retorno da mesma empresa defasado em um período trimestral, conforme exposto na Equação (6).

E R O A i i t = α i ^ + β i ^ R e t o r n o t - 1 (6)

em que E(ROA)iit = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia i no período t; Retornoit-1 = retorno acionário trimestral da companhia i no período t-1, calculado a partir do preço de fechamento das ações ordinárias, ajustado para proventos e desdobramentos, referente ao trimestre anterior.

Analisar o evento econômico de uma empresa a partir de seus estimadores em um período defasado (t-1) significa que a companhia mantém suas informações consistentes ao longo do tempo diante dos eventos econômicos. Nesse contexto, a consistência se refere à média da distância das funções obtidas a partir da Equação (2) e (6), para cada trimestre, [E(ROAiit ) - E(ROAiit-1 )]. Desse modo, quanto mais próximos são os resultados dessas duas funções, maior é a consistência das informações contábeis de uma mesma companhia ao longo do tempo. Assim, para medir a consistência intertemporal de cada empresa, foi calculada a medida da proximidade de cada função, por trimestre, ao considerar a seguinte equação:

C O N S I S i i t = - 1 12 t - 11 t E R O A i i t - E R O A i i t - 1 (7)

em que CONSISiit = medida de consistência individual relativa da companhia i com base na empresa i no período t; E(ROA)iit = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia i no período t; E(ROA)iji = ROA esperado da empresa i com os parâmetros da companhia i no período t-1.

Diferentemente da medida de comparabilidade que é calculada com base na média das distâncias de diferentes empresas, a medida de consistência é mensurada fundamentada na mesma empresa ao longo do tempo. Desta forma, o resultado da Equação (7) consiste na medida de consistência da empresa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2021

Histórico

  • Recebido
    23 Mar 2020
  • Revisado
    04 Abr 2020
  • Aceito
    18 Jan 2021
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