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Pé doloroso do idoso associado à incapacidade funcional

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O pé doloroso no idoso pode interferir no equilíbrio e no ciclo da marcha podendo ser um fator contribuinte para a incapacidade funcional na população geriátrica. O objetivo deste estudo foi avaliar a frequência de incapacidade funcional associada ao pé doloroso no idoso. MÉTODO: Cem participantes, com idade > 60 anos, dor no pé de intensidade > 30 mm pela escala analógica visual (EAV) de dor. Foram analisados os tipos de pés e suas lesões, tipos de calçados, ocorrência de queda, sua circunstância e consequência. Aplicado o Índice Manchester de Incapacidade Associada ao Pé Doloroso no Idoso (MFPDI) e a EAV ao repouso e movimento, Índice de Marcha Dinâmica (DGI), e Escala de Atividade Instrumental de Vida Diária (AIVD). Análise estatística com os testes de Spermann e regressão múltipla, com nível de significância em 5% (p < 0,05). RESULTADOS: Foi observada prevalência de incapacidade funcional associada ao pé doloroso maior que 50%. Na análise univariada houve correlações significantes da incapacidade funcional associada ao pé doloroso com intensidade de dor no pé ao movimento (p < 0,002), o nível de independência funcional para as AIVD (p < 0,001), e a funcionalidade de marcha, equilíbrio e risco de queda (p < 0,003), em relação a esta última variável, a associação foi importante. Na análise multivariada, as mesmas correlações mantiveram-se significantes (p < 0,05). CONCLUSÃO: A incapacidade funcional associada ao pé doloroso foi muito prevalente no idoso, e correlacionou-se significativamente com a intensidade da dor no pé em movimento, o nível de independência funcional para as AIVD, e a funcionalidade da marcha/equilíbrio e risco de queda.

Doenças do pé; Dor; Idoso


BACKGROUND AND OBJECTIVES: Foot pain in elderly people may interfere with gait balance and cycle and may contribute for functional incapacity in the geriatric population. This study aimed at evaluating the frequency of functional incapacity associated to foot pain in elderly people. METHOD: Participated in this study 100 elderly people aged 60 years, with foot pain intensity of 30 mm by the pain visual analog scale (VAS). Types of feet and their injuries, types of shoes, falls, their circumstances and consequences were evaluated. Manchester Foot Pain Disability Index (MFPDI) and VAS at rest and movement, dynamic gait index and instrumental activity of daily life scale (IADL) were applied. Sperman and multiple regression tests were used for statistical analysis with significance level of 5% (p < 0.05). RESULTS: There has been prevalence of functional incapacity associated to foot pain above 50%. Univariate analysis has shown significant correlations of functional incapacity associated to foot pain and foot pain intensity at movement (p < 0.002), with the level of functional independence for IADL (p < 0.001), and with gait functionality, balance and risk for falls (p < 0.003), with significant association with the latter. The same correlations were significant in the multivariate analysis (p < 0.005). CONCLUSION: Functional incapacity associated to foot pain was highly prevalent in the elderly and was significantly correlated to foot pain intensity at movement, to the level of functional independence for IADL and to gait / balance functionality and risk for falls.

Elderly; Foot diseases; Pain


ARTIGO ORIGINAL

Pé doloroso do idoso associado à incapacidade funcional* * Recebido do Instituto de Geriatria e Gerontologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). São Paulo, SP.

Sabrina Canhada Ferrari PratoI; Fânia Cristina SantosII; Virgínia Fernandes Moça TrevisaniIII

IFisioterapeuta, Mestre e Doutora em Medicina Interna e Terapêutica pela Universidade Federal de São Paulo. (UNIFESP), São Paulo, Brasil

IIMédica Geriatra, Mestre e Doutora em Medicina na Universidade Federal de São Paulo. (UNIFESP). São Paulo, SP, Brasil

IIIMédica Reumatologista, Mestre e Doutora em Reumatologia pela Universidade Federal de São Paulo. (UNIFESP). São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dra. Sabrina Canhada Ferrari Prato Rua João Huss, 200/103 – Gleba Palhano 86050-490 Londrina, PR Fones: (11) 9957-8849 / (43) 8813-8441 E-mail: sabrinacferrari@yahoo.com.br

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O pé doloroso no idoso pode interferir no equilíbrio e no ciclo da marcha podendo ser um fator contribuinte para a incapacidade funcional na população geriátrica. O objetivo deste estudo foi avaliar a frequência de incapacidade funcional associada ao pé doloroso no idoso.

MÉTODO: Cem participantes, com idade > 60 anos, dor no pé de intensidade > 30 mm pela escala analógica visual (EAV) de dor. Foram analisados os tipos de pés e suas lesões, tipos de calçados, ocorrência de queda, sua circunstância e consequência. Aplicado o Índice Manchester de Incapacidade Associada ao Pé Doloroso no Idoso (MFPDI) e a EAV ao repouso e movimento, Índice de Marcha Dinâmica (DGI), e Escala de Atividade Instrumental de Vida Diária (AIVD). Análise estatística com os testes de Spermann e regressão múltipla, com nível de significância em 5% (p < 0,05).

RESULTADOS: Foi observada prevalência de incapacidade funcional associada ao pé doloroso maior que 50%. Na análise univariada houve correlações significantes da incapacidade funcional associada ao pé doloroso com intensidade de dor no pé ao movimento (p < 0,002), o nível de independência funcional para as AIVD (p < 0,001), e a funcionalidade de marcha, equilíbrio e risco de queda (p < 0,003), em relação a esta última variável, a associação foi importante. Na análise multivariada, as mesmas correlações mantiveram-se significantes (p < 0,05).

CONCLUSÃO: A incapacidade funcional associada ao pé doloroso foi muito prevalente no idoso, e correlacionou-se significativamente com a intensidade da dor no pé em movimento, o nível de independência funcional para as AIVD, e a funcionalidade da marcha/equilíbrio e risco de queda.

Descritores: Doenças do pé, Dor, Idoso.

INTRODUÇÃO

Com o envelhecimento, a manutenção de autonomia está intimamente ligada à qualidade de vida (QV). Portanto, uma forma de se procurar quantificar a QV de um indivíduo é pelo grau de autonomia com que ele desempenha as funções do dia a dia de forma independente, dentro de um contexto socioeconômico e cultural. Estudo afirma que envelhecer mantendo todas as funções não significa problema, quer para o indivíduo ou para a comunidade; quando as funções começam a deteriorar é que os problemas começam a surgir, uma vez que o indivíduo perde sua autonomia1. Entre os vários problemas que interferem na capacidade funcional, um deles é o acometimento nos pés dos idosos. As evidências obtidas de estudos detalhados de diversos males dos pés sugerem que mais de 80% da população tem algum tipo de problema com os pés2. Tais problemas trazem para o idoso algumas consequências como: diminuição da força, coordenação, e aumenta a instabilidade postural e o risco de queda resultando em incapacidade funcional3.

Os pés são os pontos de convergência do peso do corpo durante a deambulação, tendo estruturas bem detalhadas para execução desta função. Tal responsabilidade atribuída aos pés faz com que fiquem mais suscetíveis às lesões e às deformidades. Essas alterações geram frequentemente instabilidade postural, tendo como consequência as quedas3.

O grande risco de quedas está relacionado com desordens nos pés e nos calçados4. Estudo3 realizado por esses autores demonstrou que anormalidades nos dedos, calosidades e calçados inadequados podem prejudicar a caminhada e aumentar o risco de quedas.

A presença de problemas nos pés pode interferir diretamente no equilíbrio e no ciclo da marcha podendo consequentemente ser um fator contribuinte para a incapacidade funcional e quedas na população geriátrica.

O objetivo foi avaliar a frequência de incapacidade funcional associada ao pé doloroso no idoso e a influência de fatores correlatos utilizando o Índice Manchester de Incapacidade Associada ao Pé Doloroso no Idoso (MFPDI), a fim de preservar a autonomia e a independência.

MÉTODO

Após aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa (Parecer nº 0274/07) da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), realizou-se este estudo no período de março de 2007 a dezembro de 2008.

Trata-se de estudo transversal, descritivo e analítico conduzido a partir de uma amostra de idosos. Foram avaliados 100 indivíduos em nível ambulatorial na Disciplina de Geriatria e Gerontologia da UNIFESP. Os critérios de inclusão foram: idade > 60 anos, ambos os gêneros, e com dor no pé de intensidade > 30 mm; mensurada pela escala analógica visual (EAV) de dor ao repouso e/ou movimentação, e duração > a 3 meses. Foram excluídos aqueles com dor irradiada ou referida para o pé; amputação de membro inferior e aqueles que não deambulavam e não apresentavam compreensão e motivação para a participação no estudo. Todos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Um protocolo de investigação foi aplicado, e o mesmo abordava variáveis como: dados sócio-demográficos, ocorrência de queda, sua circunstância e consequência, tipo de calçado mais utilizado. Também se realizou o exame físico dos pés, e posterior classificação nos diferentes tipos de pés e lesões.

Além desse protocolo, foram aplicados alguns instrumentos, tais como:

O MFPDI consiste em 19 questões, que é dividido em quatro subescalas: 9 questões de incapacidade, 5 questões de dor, 3 questões de preocupação e 2 questões de dificuldade. Em cada questão, o paciente tem de apontar a frequência dos sintomas nos pés, nos últimos 30 dias. Se a incapacidade é ausente, a alternativa "nunca, em nenhum momento" é assinada. Se presente, uma das alternativas "sim, em alguns dias" ou "sim na maioria/todos os dias" deve ser escolhida. Usando uma estratégia de pontuação simples, somam-se todos os pontos expressando assim o grau de incapacidade. A pontuação do MFPDI é da seguinte maneira: "nunca em nenhum momento" (ponto = 0), "sim, em alguns dias" (ponto = 1) e "sim na maioria/todos os dias" (ponto = 2). A pontuação é de 0 a 385.

A EAV consiste de uma linha de 100 mm, com âncoras em ambas as extremidades. Numa delas é marcada "sem dor" e na outra extremidade é indicada "máximo de dor". Os pacientes foram orientados a escolher um valor que melhor refletisse sua dor nos pés no último mês em repouso (EAVr) e em movimentação (EAVm) e uma régua foi usada para mensurar a dor de 0-100 mm. A linha utilizada foi horizontal e com descritores ao longo da escala6.

O índice de marcha dinâmica (DGI), consiste de 8 tarefas que envolvem a marcha em diferentes contextos sensoriais, que incluem superfície plana, mudanças na velocidade da marcha, movimentos horizontais e verticais da cabeça, passar por cima e contornar obstáculos, giro sobre seu próprio eixo corporal, subir e descer escadas. Cada paciente foi avaliado por meio de uma escala ordinal com 4 categorias de acordo com o seu desempenho em cada tarefa: comprometimento grave (0), comprometimento moderado (1), comprometimento leve (2) e marcha normal (3). A pontuação máxima é de 24 pontos e um escore inferior a 19 pontos prediz risco para quedas7.

A escala de atividades instrumentais da vida diária (AIVD), consiste de 9 questões que avaliam a relação ao uso do telefone, às viagens, à realização de compras, ao preparo de refeições, ao trabalho doméstico, ao uso de medicamentos e ao manuseio do dinheiro. A pontuação é da seguinte maneira: dependência (1), capacidade com ajuda (2) e independência (3). A pontuação máxima é de 27 pontos cujos valores representam o nível de independência funcional: independente (19 a 27 pontos); dependente parcial, onde necessita algum auxílio (10 a 18 pontos) e dependente total (1 a 9 pontos)8.

Após o término das avaliações, todos os participantes foram encaminhados para tratamentos, individuais e específicos, para os pés.

Para as frequências das variáveis sócio-demográficas, tipos e lesões dos pés, tipo de calçado, queda com sua circunstância e consequência, MFPDI, DGI e AIVD, foi utilizada uma avaliação descritiva com frequências absolutas (N) e relativas (%).

Para a EAV em repouso e EAV em movimentação foram realizadas a mediana como medida de tendência central e o intervalo interquartil (Q1 e Q3) para medida de variabilidade.

As associações do MFPDI com o protocolo de investigação foi realizado por meio dos testes de Mann-Whitney e de Kruskal-Wallis.

O teste de Spearman (RS) foi utilizado nas análises de correlação entre a incapacidade funcional associada ao pé doloroso e todas as variáveis envolvidas, e o modelo de regressão múltipla foi utilizado para as variáveis que se correlacionaram significativamente no modelo anterior. Foi considerado estatisticamente significante (p < 0,05).

RESULTADOS

Amostra composta por 100 idosos, predominâncias da faixa etária de 60 a 70 anos (43%), o gênero feminino (85%) e da raça branca (60%).

Quanto aos tipos e lesões nos pés, os achados mais frequentes foram 83% pés valgos e 52% planos, e 64% de prevalência de lesões de pele, sendo que do total da amostra, 63% apresentavam lesões na unha e 53% apresentavam deformidades nos dedos. Os tipos de calçados mais frequentemente utilizados foram tênis e moleca (29% cada), sandália (22%), chinelo (15%) e mule (5%).

Referente à queda, observou-se que cerca de 60 idosos caíram pelo menos uma vez no último ano, e desses 27% caíram duas ou mais vezes. Segundo sua circunstância, ocorreu dentro de casa (53%) ou na rua (47%), e quanto à sua consequência, observou-se que em 22% dos casos resultou em fratura, apesar de que em 55% não resultou em nenhuma lesão, ou resultou em lesões graves ou moderadas, respectivamente entre 18% e 27%.

A frequência de incapacidade funcional associada ao pé doloroso no idoso utilizando o MFPDI foi > 50% (resposta sim, na maioria dos dias/todos os dias), com exceções das questões IM1, IM5, IM9 e IM15 (Tabela 1).

Quanto à intensidade de dor no pé, as medianas apresentadas foram de 80 mm na EAVm e na 60 mm EAVr. Segundo a funcionalidade da marcha e do equilíbrio, e do risco de queda utilizando-se o DGI, foi > 30%, observou-se um comprometimento funcional moderado na amostra estudada. Referente ao nível de independência funcional para as AIVD a frequência foi > 60% da amostra eram independentes.

Nas análises de associações, foram demonstradas que a incapacidade funcional associada ao pé doloroso no idoso não se correlacionou significativamente com os grupos gênero (U = 500,0; p = 0,18), moradia (U = 484,5; p = 0,14), lesões de pele (U = 1024,5; p = 0,36), lesões de unha (U = 1140,5; p = 0,18); lesões vasculares (U = 495,0; p = 0,170, deformidades de dedos (U = 1173,0; p = 0,62), pé plano (U = 1032,0; p = 0,16), pé cavo (U = 987,0; p = 0,07), pé varo (U = 145,0; p = 1,0), pé valgo (U = 1146,5; p = 0,66), prática regular de atividade física (U = 1098,0; p = 0,37) e fratura (U = 881,0; p = 0,65) através do teste de Mann-Wallis (U). Na questão de pé equino não tem os dois grupos, porque só um paciente tinha pé equino.

Para a análise de associação do MFPDI com o protocolo de investigação, utilizando o teste de Kruskal-Wallis (H) para as seguintes variáveis: raça (H = 0,75; p = 0,86), estado civil (H = 1,54; p = 0,82), número de quedas (H = 0,34; p = 0,84), lesões por queda (H = 1,08; p = 0,58), local da queda (H = 2,64; p = 0,46), cômodo (H = 10,7; p = 0,15), período do dia (H = 3,26; p = 0,51), tipo de calçado (H = 2,82; p = 0,59) não houve diferença estatisticamente significante. Embora a análise geral dos grupos de escolaridade (H = 10,3; p = 0,03) tenham apresentado um p < 0,05, a análise a posteriori não confirmou a diferença relatada, pois o valor de p entre grupos foi de p > 0,05.

Também, não foram demonstradas correlações com as variáveis queda e EAVr. Houve correlações baixas, contudo estatisticamente significante, com a EAVm (p < 0,002) e com o nível de independência funcional para as AIVD (p < 0,001). Ocorreu correlação estatisticamente significante também com o DGI (p < 0,003), correlação essa de grau moderado (Tabela 2).

Num modelo de regressão múltipla, onde as variáveis que se associaram significativamente correlacionadas com a incapacidade funcional de associada ao pé doloroso foram analisada, ou seja, as variáveis queda, EAVr, EAVm, DGI e a AIVD, demonstrou-se que as mesmas associaram-se de forma independente e significativa com o MFPDI, do ponto de vista estatístico (Tabela 3).

DISCUSSÃO

Neste estudo com idosos acompanhados em nível ambulatorial, e portadores de dor no pé, a maioria (85%) eram do gênero feminino, e essa diferença de gênero é claramente evidente na literatura. Há um consenso geral, que as mulheres desenvolvem e relatam mais problemas nos pés do que os homens. Isto pode ser atribuído, primeiramente, pela influência dos calçados de salto altos e bico fino, que aumentam a chance de desenvolvimento de problemas no pé com o avanço da idade; como hálux valgo, deformidades nos dedos e calosidades nos pés. Outro aspecto é a tolerância à dor, as mulheres relatam sentir mais dores que os homens e consequentemente procuram mais os serviços de saúde9.

Os principais tipos pés e suas lesões nos idosos analisados foram os pés valgo e plano, e as lesões de pele/unha e de deformidades nos dedos, e esses dados são semelhantes aos achados em estudo10 com 417 idosos com mais de 60 anos, que observaram 84% de prevalência de afecções dermatológicas nos pés, e 86% de deformidades nos dedos. Em outro estudo11, também avaliando os pés de 459 idosos com dor no pé, 65 anos ou mais, relataram grande prevalência de pés valgos e deformidade nos dedos, e ainda, relataram que a dor no pé associou-se significativamente com aqueles tipos de pés e deformidades. A grande frequência de lesões no pé na presente casuística assume um papel importante referindo-se a população idosa, pois como observado em outro achado12, quanto às doenças que acometem os pés dos idosos, as afecções como calos, ulcerações, deformidades de dedos e o tipo de pé plano são observações clínicas muito frequentes em idosos, e essas podem resultar em alteração no padrão da marcha, afetando assim, a sua estabilidade postural.

No presente estudo observou-se que apenas 29% dos indivíduos faziam uso do calçado tênis com mais frequência, calçado esse considerado adequado e seguro para os idosos. A maioria dos indivíduos (71%) fazia uso de calçados inadequados, sendo esses, principalmente, do tipo moleca, sandália, chinelo e mule. Os idosos geralmente escolhem o tipo de calçado com material macio e estrutura flexível, que parece ser mais confortável, e acomodam melhor as deformidades dolorosas dos pés e tais fatos poderiam concorrer para as escolhas inadequadas de calçados, pois outros fatores são mais importantes, como segurança.

A ocorrência de queda é um sério problema e comum entre os idosos, e no presente estudo, 60% relataram ter sofrido queda no último ano, e desses, 27% caíram duas ou mais vezes, o que caracteriza o chamado "caidor crônico". Também, observou-se que em 22% das quedas ocorreram fraturas. Estudos13,14 também relataram que cerca de 30% a 60% dos idosos; 65 anos ou mais, que vivem na comunidade, cai uma vez ao ano, e 15% a 30% desses caem ao menos duas vezes ao ano, o que foi semelhante ao encontrado na presente casuística.

A incapacidade funcional associada ao pé doloroso no idoso foi muito frequente, o que pode constituir um problema muito sério no nosso meio. Concordando com esses achados, estudo12 avaliando 172 idosos, com idade entre 62 e 96 anos, concluiu que a dor incapacitante nos pés também foi muito frequente, e ainda, também demonstrou que as mulheres foram as mais afetadas. Um levantamento populacional com a finalidade de estimar a frequência de dores nos pés em Cheshire verificou que em quase 100% das pessoas há o relato de dor nos pés de forma incapacitante. A condição de incapacidade associada ao pé doloroso, naquele estudo, foi de origem multifatorial, sendo ressaltado que o MFPDI foi uma ferramenta eficaz para avaliar a dor no pé incapacitante na população idosa, além de ser fácil e rápido de ser aplicado12.

A intensidade de dor no pé utilizando-se a EAV de dor não esteve correlacionada com a incapacidade funcional associada ao pé doloroso quando a dor ocorria em repouso, contudo, houve correlação significativa quando a dor considerada era em movimento. A avaliação da intensidade de dor no pé é muito importante de ser realizada, mas na literatura não foi encontrado nenhum estudo com esse interesse, mas devido o impacto no declínio da QV do idoso esse aspecto foi abordado.

O DGI apresentou correlação significativa e importante com o MFPDI, ou seja, a incapacidade funcional correlacionada à dor no pé do idoso poderia predispor a instabilidade na marcha, no equilíbrio, e no risco de queda, consequências de peso tratado de idosos. Na literatura, poucos estudos utilizaram o DGI em idosos com dor no pé, e nesses não foram relatados correlações daquele instrumento com problemas nos pés dos idosos. Alguns estudos relataram que o risco de queda correlacionou-se com desordens nos pés. Potenciais prejudicadores de marcha, que também podem aumentar o risco de queda e levar à fratura e restrição das atividades da vida diária, são as anormalidades nos dedos, calosidades e deformidades nos dedos.

No presente estudo pode-se observou-se o mesmo quando se utilizou o DGI, ou seja, a dor incapacitante no pé do idoso associou-se ao risco de queda, contudo, a mesma correlação não foi demonstrada quando as variáveis consideradas foram à ocorrência de queda, suas circunstancia ou consequência. Mas, estudo15 demonstrou que a instabilidade da marcha medida pelo DGI, é um bom indicador do estado de queda para os idosos.

O nível de independência funcional para as AIVD apresentou correlação com o MFPDI, pequena correlação, contudo; significativa do ponto de vista estatístico. Este achado é muito importante ao se considerar o indivíduo idoso. Discordando dos dados do presente, um estudo11 demonstrou que o pé doloroso incapacitante não se correlacionou com o nível de desempenho nas AIVD de 459 idosos, 65 anos ou mais, residentes na Itália.

No presente estudo existem algumas limitações que poderiam influenciar os resultados obtidos, como o possível viés de memória, já que os idosos foram perguntados sobre eventos ocorridos no último ano. O pé doloroso pode apresentar prejuízos adicionais para a saúde dos idosos, constituindo um sério problema para o envelhecimento.

CONCLUSÃO

A prevalência de incapacidade funcional foi alta nos idosos avaliados, e se correlacionou significativa e independentemente com a intensidade da dor no pé ao movimento, com o nível de independência funcional para as atividades instrumentais da vida diária, e com a funcionalidade da marcha/equilíbrio e risco de queda.

AGRADECIMENTOS

Pelas valiosas contribuições neste estudo, agradecemos à Disciplina de Medicina Interna e Terapêutica, ao Centro Cochrane do Brasil, e ao Instituto de Geriatria e Gerontologia (IGG) / Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). São Paulo, SP.

Apresentado em 10 de outubro de 2011.

Aceito para publicação em 27 de janeiro de 2012.

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    Recebido do Instituto de Geriatria e Gerontologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). São Paulo, SP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Mar 2012
    • Data do Fascículo
      Mar 2012

    Histórico

    • Recebido
      10 Out 2011
    • Aceito
      27 Jan 2012
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