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Acupuntura auricular associada aos autocuidados caseiros no tratamento das disfunções temporomandibulares crônicas em mulheres. Relato de casos

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

O objetivo desse estudo foi descrever, em uma série de casos, o efeito da acupuntura auricular associada ou não às técnicas de educação e autocuidados caseiros, no tratamento das disfunções temporomandibulares crônicas em mulheres.

RELATO DOS CASOS:

Nove pacientes com disfunção temporomandibular crônica dolorosa, com idade entre 22 e 45 anos (média de 32,11 anos) foram avaliadas por meio da ficha clínica de disfunções temporomandibulares e dor orofacial da Disciplina de Oclusão II da Universidade de Araraquara, pelo Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders e por um diário de dor com escalas analógicas visuais, entregues semanalmente na referência (primeira semana) e após cada sessão de tratamento (acupuntura auricular e/ou aconselhamento). Durante as três semanas de tratamento, as pacientes receberam instruções para controle das disfunções temporomandibulares, sendo que seis pacientes receberam, além dos autocuidados, acupuntura auricular nos pontos recomendados para o tratamento das disfunções temporomandibulares e sintomas associados (protocolo: Shen-men, sistema neurovegetativo, rim, disfunções temporomandibulares e tríade da ansiedade). A acupuntura auricular associada à educação e autocuidados caseiros apresentou os melhores resultados na remissão/diminuição dos sintomas após 3 semanas de tratamento quando comparada ao grupo que recebeu apenas as instruções de autocuidados.

CONCLUSÃO:

A acupuntura auricular associada à educação e às técnicas de autocuidados caseiros demonstrou melhores resultados no controle da dor dos pacientes com disfunção temporomandibular.

Descritores:
Acupuntura auricular; Dor facial; Terapêutica; Transtornos da articulação temporomandibular

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

This study aimed at describing, in a case series, the effect of ear acupuncture associated or not to education and home self-care techniques in the treatment of chronic temporomandibular disorders in women.

CASE REPORT:

Nine patients with chronic painful temporomandibular disorder, aged between 22 and 45 years of age (mean of 32.11 years) were evaluated with the clinical chart of temporomandibular disorders and orofacial pain of the Occlusion II discipline, Universidade de Araraquara, with the Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders and by a pain diary with visual analog scales delivered once a week in reference (first week) and after each treatment session (ear acupuncture and/or counseling). During the three weeks of treatment, patients were oriented to control temporomandibular disorders, being that six patients, in addition to self-care, have also received ear acupuncture in recommended points to treat temporomandibular disorders and associated symptoms (protocol: Shen-men, neurovegetative system, kidneys, temporomandibular disorders and anxiety triad). Ear acupuncture associated to education and home self-care has shown the best results in symptoms remission/improvement after 3 weeks of treatment as compared to the group receiving just self-care orientations.

CONCLUSION:

Ear acupuncture associated to education and home self-care techniques has shown better results to control pain of patients with temporomandibular disorder.

Keywords:
Acupuncture; Ear; Facial pain; Temporomandibular joint disorders; Therapeutics

INTRODUÇÃO

Segundo a Academia Americana de Dor Orofacial11 American Academy of Orofacial Pain. General assessment of the orofacial pain patient. In: de Leeuw R, Klasser GD, editores. Orofacial pain - guidelines for assessment, diagnosis and management. 5th ed. Chicago: Quintessence; 2013. 25-46p. (AAOP), a disfunção temporomandibular (DTM) é definida como um conjunto de sinais clínicos que envolvem os músculos mastigatórios, a articulação temporomandibular (ATM) e estruturas associadas. Os sintomas mais frequentemente relatados pelos pacientes são: fadiga muscular, dores na face, na ATM e/ou nos músculos mastigatórios, dores na cabeça e/ou nos ouvidos e limitação e/ou desvios dos movimentos mandibulares22 Peck CC, Goulet JP, Lobbezoo F, Schiffman EL, Alstergren P, Anderson GC, et al. Expanding the taxonomy of the diagnostic criteria for temporomandibular disorders. J Oral Rehabil. 2014;41(1):2-23..

Estudos epidemiológicos demonstraram que de 40 a 70% da população apresentaram ao menos um sinal de DTM33 Carrara SV, Conti PC, Barbosa JS. Termo do primeiro Consenso em Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial. Dental Press J Orthod. 2012;15(3):114-20.. Uma vez que são de causa multifatorial44 Maixner W, Diatchenko L, Dubner R, Fillingim RB, Greenspan JD, Knott C, et al. Orofacial pain prospective evaluation and risk assessment study--the OPPERA study. J Pain. 2011;12(11 Suppl):T4-11.e1-2., diversas modalidades de tratamento são propostas e utilizadas com êxito. Contudo, as terapias mais recomendadas são as reversíveis e não invasivas, as quais devem ser a primeira opção de escolha no tratamento das DTM, com o objetivo de controlar a dor e recuperar a função do sistema estomatognático22 Peck CC, Goulet JP, Lobbezoo F, Schiffman EL, Alstergren P, Anderson GC, et al. Expanding the taxonomy of the diagnostic criteria for temporomandibular disorders. J Oral Rehabil. 2014;41(1):2-23.,33 Carrara SV, Conti PC, Barbosa JS. Termo do primeiro Consenso em Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial. Dental Press J Orthod. 2012;15(3):114-20.. A modalidade terapêutica mais conservadora e uma das mais importantes dentre as indicadas para o controle da DTM é baseada na educação, responsabilidade e autodesenvolvimento do paciente, o que inclui os autocuidados, os exercícios musculares e a redução de fatores contribuintes55 Fricton J. Myogenous temporomandibular disorders: diagnostic and management considerations. Dent Clin North Am. 2007;51(1):61-83.

6 Campi LB, Camparis CM, Jordani PC, Gonçalves DA. Influência de abordagens biopsicossociais e autocuidados no controle das disfunções temporomandibulares crônicas. Rev Dor. 2013;14(3):219-22.
-77 Wieckiewicz M, Boening K, Wiland P, Shiau YY, Paradowska-Stolarz A. Reported concepts for the treatment modalities and pain management of temporomandibular disorders. J Headache Pain. 2015;16:106.. Educar o paciente sobre o problema para desenvolver a termoterapia, automassagem, alongamento, estabilização, coordenação e mobilização mandibular é, certamente, uma das chaves para o tratamento eficaz.

A acupuntura é uma modalidade terapêutica conservadora que tem sido empregada com sucesso em pacientes com DTM99 Borin GC, Corrêa EC, Silva AM, Milanesi JM. Acupuntura como recurso terapêutico na dor e na gravidade da desordem temporomandibular. Fisioter Pesqui. 2011;18(3):217-22.

10 Florian MR, Meirelles MP, Sousa ML. Disfunção temporomandibular e acupuntura: uma terapia integrativa e complementar. Odontol Clin-Cient. 2011;10(2):189-92.

11 Rui A, Meirelles MP, Sousa ML. Relato de caso sobre o uso da acupuntura no tratamento da dor orofacial. Arq Ciênc Saúde UNIPAR. 2011;15(3):287-90.

12 Elder C, Ritenbaugh C, Aickin M, Hammerschlag R, Dworkin S, Mist S, et al. Reductions in pain medication use associated with traditional Chinese medicine for chronic pain. Perm J. 2012;16(3):18-23.
-1313 Porporatti AL, Costa YM, Stuginsky-Barbosa J, Bonjardim LR, Conti PC. Acupuncture therapeutic protocols for the management of temporomandibular disorders. Rev Dor. 2015;16(1):53-9.. A acupuntura restabelece o equilíbrio corporal, aliviando a dor e melhorando processos inflamatórios77 Wieckiewicz M, Boening K, Wiland P, Shiau YY, Paradowska-Stolarz A. Reported concepts for the treatment modalities and pain management of temporomandibular disorders. J Headache Pain. 2015;16:106.. A acupuntura auricular é uma vertente da acupuntura sistêmica, que se baseia na inserção de agulhas específicas, sementes e/ou cristais em pontos reflexos situados no pavilhão auricular. Essa técnica possui as vantagens de apresentar poucos efeitos adversos, aplicação ampla e manipulação simples1414 Shi-ying J, Wan-cheng J. Manual prático de auriculopuntura. São Paulo: Rocca. 2012. 93 p.. Uma vez que a acupuntura auricular tem sido usada no controle da dor em diversas condições agudas e crônicas1515 Asher GN, Jonas DE, Coeytaux RR, Reilly AC, Loh YL, Motsinger-Reif AA, et al. Auriculotherapy for pain management: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. J Altern Complement Med. 2010;16(10):1097-108., é importante estudar sua relevância clínica também em DTM.

Diante da atualidade e relevância do tema, considerou-se pertinente a realização deste estudo de casos com o objetivo de avaliar e descrever os efeitos da acupuntura auricular, associada ou não às técnicas de educação e autocuidados caseiros, na frequência e intensidade da dor orofacial no tratamento de nove mulheres com DTM crônica.

RELATOS DOS CASOS

Os casos relatados no presente trabalho fazem parte de um estudo maior, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade de Araraquara (UNIARA), (CAAE - 44886715.9.0000.5383).

A amostra foi composta por seis pacientes da clínica de DTM e dor orofacial da Disciplina de Oclusão II do Curso de Odontologia da UNIARA e por três alunas do referido curso. As participantes foram recrutadas por meio de divulgação da pesquisa e posteriormente avaliadas e tratadas durante o segundo semestre de 2015 por alunos treinados.

Todas as participantes foram submetidas à avaliação clínica de acordo com os seguintes instrumentos e protocolos:

1) Ficha clínica, elaborada pela Clínica da Disciplina de Oclusão II, para detalhar a queixa principal da paciente, as características da dor da DTM (local, intensidade, qualidade, duração, fatores agravantes e amenizantes), a presença de outras condições dolorosas (como cefaleias e dores corporais), bem como a história médica; 2) Os critérios propostos pela AAOP¹ foram usados para o diagnóstico diferencial com outras condições que podem mimetizar uma DTM; 3) Os Critérios de Diagnóstico para Pesquisa das Disfunções Temporomandibulares (RDC/TMD)1616 Dworkin SF, LeResche L. Research diagnostic criteria for temporomandibular disorders: review, criteria, examinations and specifications, critique. J Craniomandib Disord. 1992;6(4):301-55., em sua versão em português, foram usados para confirmação do diagnóstico de DTM obtido por meio da avaliação clínica anterior; 4) Diário de dor e escala analógica visual (EAV). As pacientes receberam um diário de dor para anotar todos os dias em que houve dor, marcando também a intensidade referente à sua dor naquele dia por meio da EAV.

Após o preenchimento da ficha clínica da disciplina e confirmada a presença de DTM crônica (mais de seis meses), o questionário do RDC/TMD foi preenchido pelas próprias pacientes, sendo que um pesquisador esteve presente para ajudá-las em caso de dúvida. O protocolo do exame do Eixo II foi realizado por um dos pesquisadores, graduando em odontologia e treinado para a sua condução. Durante uma semana, as pacientes foram instruídas a preencher um diário de dor para identificar a frequência e a intensidade das crises de dor previamente ao tratamento (referência). A partir daí, as pacientes foram encaminhadas para receber o tratamento, ou seja, educação e aconselhamento associados ou não à acupuntura auricular. Todas as pacientes receberam as mesmas instruções de autocuidado por meio de um vídeo educativo e de um folheto, desenvolvidos exclusivamente para esse fim. Além disso, seis pacientes receberam acupuntura auricular em uma das orelhas por meio da aplicação de sementes de mostarda nos pontos recomendados para o tratamento da DTM e de sintomas associados (pontos Shen-men, sistema neurovegetativo (SNV), DTM, tríade da ansiedade e rim), intercalando-se o lado de colocação à cada sessão. Duas professoras com experiência na área foram responsáveis por supervisionar a determinação e aplicação das sementes nas pacientes.

A cada sessão foi entregue um novo diário para que as pacientes preenchessem durante a semana vigente, assinalando o(s) dia(s) de dor, a(s) sua(s) respectiva(s) intensidade(s) e outras informações a respeito. Caso houvesse necessidade, o folheto educativo era redistribuído. Todas as pacientes foram tratadas por meio de sessões únicas semanais ao longo de 3 semanas. Nas sessões, as pacientes assistiam ao vídeo novamente e sanavam dúvidas em relação às instruções passadas (pacientes 1 a 9), sendo que no grupo pertinente, as mesmas tinham suas sementes trocadas (pacientes 1 a 6).

Para o presente estudo, foram considerados os seguintes critérios de inclusão: Presença de DTM dolorosa crônica - tempo de dor maior do que seis meses (IASP); gênero feminino com idade entre 18 e 50 anos; graduação da dor crônica II ou III, segundo RDC/TMD eixo II.

Adicionalmente, os seguintes critérios de exclusão foram adotados: Pacientes em uso de fármacos de ação central para dor, como antidepressivos, ansiolíticos, anticonvulsivantes, relaxantes musculares; presença de dor odontogênica, dor neuropática e lesões intraorais; pacientes com alterações das funções cognitivas e comprometimento da capacidade de comunicação; apresentar doenças degenerativas, inflamatórias, infecciosas, oncológicas ou doenças sistêmicas neuromusculares; histórico de trauma ou fratura na região da face ou base do crânio; pacientes em tratamento ortodôntico; pacientes sob tratamento fisioterapêutico ou outro tratamento para dor orofacial. Todas as pacientes que foram selecionadas para tratamento foram convidadas a participar do estudo, recebendo todas as informações necessárias de maneira verbal e escrita. Somente após leitura, entendimento e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), iniciou-se o tratamento considerado como estudo piloto.

Com relação aos diagnósticos atribuídos por meio do RDC/TMD descritos na tabela 1, todas as pacientes apresentaram diagnósticos do grupo I (dor miofascial), cinco delas (1, 2, 3, 5 e 8) apresentando dor miofascial com limitação de abertura bucal. Já em relação ao grupo II, quatro pacientes apresentaram diagnóstico de deslocamento do disco com redução, sendo duas pacientes disfunção unilateral (3 e 7) e nas outras bilateral (5 e 9). Quanto ao grupo III (outras condições articulares), a maioria das pacientes apresentou artralgia bilateralmente na ATM (2, 3, 5, 6 e 9). Portanto, pode-se dizer que a maioria das pacientes apresentou diagnóstico de DTM dolorosa crônica mista, ou seja, dor de origem muscular e articular, e apenas duas apresentaram DTM dolorosa de origem exclusivamente muscular (1 e 4).

Tabela 1
Caracterização diagnóstica da amostra

Com relação ao perfil psicológico das pacientes atendidas, pode-se verificar que, conforme determinado pelos critérios de inclusão, todas as pacientes apresentaram graduação da dor crônica em nível II (baixa incapacidade e alta intensidade de dor). Porém em relação à presença de depressão, quatro participantes apresentaram sintomas graves (3, 4, 6, 7 e 8), enquanto duas apresentaram sintomas moderados e três apresentaram escore normal. Em relação aos sintomas físicos não específicos, como dores de cabeça, corpo, fraqueza, tontura, sentimentos de culpa, entre outros, seis pacientes (2, 4, 6, 7, 8 e 9) se distribuíram no grau grave, duas no moderado e apenas uma no grau normal. Por fim, as limitações relativas quanto à função mandibular variaram bastante entre as pacientes, de 0% até 100% (Tabela 1).

A figura 1 demonstra o número de dias em que as pacientes que receberam acupuntura mais aconselhamento tiveram dor nas semanas de acompanhamento. Em relação ao número de dias de dor relatado na referência, o que se pode observar é que em três pacientes decaíram os dias de dor logo após a primeira sessão de acupuntura (1, 3 e 4). Em duas delas, houve redução acentuada no número de dias com dor (1: 100%; 4: 83%). Três pacientes mantiveram a mesma frequência de dias de dor (2, 5 e 6) e uma demonstrou agravamento após a terceira sessão (3: 66%).

Figura 1
Dias de dor ao longo de 4 semanas (pacientes acupuntura + aconselhamento)

A figura 2 demonstra a evolução das pacientes que apenas receberam autocuidados e o que se pode verificar é que nenhuma delas apresentou redução após a primeira sessão de instrução. Duas pacientes mantiveram praticamente o mesmo padrão de dias de dor da referência (8 e 9), uma delas apresentando leve aumento nos dias de dor (9: 25% de agravamento). Apenas uma das pacientes apresentou redução nos dias de dor em relação à referência, observada apenas após a terceira semana de tratamento (7: 50%).

Figura 2
Dias de dor ao longo de 4 semanas (pacientes aconselhamento)

A figura 3 apresenta a intensidade média de dor demonstrada pelas pacientes que receberam acupuntura mais aconselhamento por meio da EAV no referido período. Logo após a primeira sessão, três pacientes reduziram a intensidade da dor (1, 2 e 6). Três pacientes apresentaram redução da intensidade de dor em relação à referência no fim do tratamento (1, 100%; 3, 27% e 6, 37%), em uma a intensidade se manteve praticamente semelhante (2) e em duas aumentou (4: 28% e 5: 20%). Na figura 4 está demonstrada a intensidade da dor das pacientes que apenas receberam aconselhamento. Todas as pacientes apresentaram agravamento da intensidade da dor após a primeira sessão (7, 8 e 9). Nota-se redução da intensidade da dor em relação à referência em duas pacientes (7: 59% melhora, 9: 23%). Em uma paciente a dor aumentou quase em 100% durante o período (8).

Figura 3
Média da intensidade de dor pela escala analógica visual ao longo de 4 semanas (pacientes acupuntura + aconselhamento)

EAV = escala analógica visual.


Figura 4
Média da intensidade de dor pela escala analógica visual ao longo de 4 semanas (pacientes aconselhamento)

EAV = escala analógica visual.


DISCUSSÃO

A presença de dor é um dos motivos mais comuns para a busca por profissionais da saúde e também para o uso de fármacos1515 Asher GN, Jonas DE, Coeytaux RR, Reilly AC, Loh YL, Motsinger-Reif AA, et al. Auriculotherapy for pain management: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. J Altern Complement Med. 2010;16(10):1097-108.. Dentre essas dores, destaca-se a dor por DTM33 Carrara SV, Conti PC, Barbosa JS. Termo do primeiro Consenso em Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial. Dental Press J Orthod. 2012;15(3):114-20.. Para a Medicina Tradicional Chinesa, a orelha possui pontos que se referem a todo o organismo humano e esse tratamento tem ganhado espaço no Ocidente nos últimos anos por ser considerado simples e eficaz no combate de dores, doenças, fatores emocionais, entre outros vários problemas1414 Shi-ying J, Wan-cheng J. Manual prático de auriculopuntura. São Paulo: Rocca. 2012. 93 p.. Resultados recentes sugerem a eficácia da acupuntura auricular na melhora tanto de dores orofaciais crônicas como na melhora na qualidade de vida dos pacientes1010 Florian MR, Meirelles MP, Sousa ML. Disfunção temporomandibular e acupuntura: uma terapia integrativa e complementar. Odontol Clin-Cient. 2011;10(2):189-92..

Nas pacientes 1 a 6, a acupuntura auricular foi realizada adicionalmente às instruções de autocuidado, por meio da aplicação de sementes de mostarda em pontos pré-determinados na orelha que representavam órgãos sistêmicos, locais da dor e/ou problemas funcionais1414 Shi-ying J, Wan-cheng J. Manual prático de auriculopuntura. São Paulo: Rocca. 2012. 93 p., ao longo de 4 sessões semanais. O protocolo escolhido para o tratamento, com base na literatura disponível, consistiu nos seguintes pontos: 1- Portão divino (Shen-men), pelos efeitos calmante, analgésico, anti-inflamatório e sedativo; 2- Rim (Shen), pela prancha de órgãos internos chinesa, que mantém a energia vital, filtra o sangue e elimina as toxinas do organismo, além do controle de neurastenia; 3- Sistema Neurovegetativo ou Simpático que pela prancha do sistema nervoso chinês equilibra todas as funções involuntárias do organismo como fome, sono, digestão, batimentos cardíacos; 4- Ponto da DTM, pelas pranchas francesa e chinesa (zona de convergência de pontos da ATM, maxila, mandíbula, dentes, língua e palato) e 5- Tríade da ansiedade, pela prancha de problemas funcionais francesa, composta pelos pontos da felicidade, da regulação metabólica e da alegria1313 Porporatti AL, Costa YM, Stuginsky-Barbosa J, Bonjardim LR, Conti PC. Acupuncture therapeutic protocols for the management of temporomandibular disorders. Rev Dor. 2015;16(1):53-9..

Apesar de ambos os grupos apresentarem pacientes com níveis constantes de dor e também agravamentos, algumas pacientes demonstraram melhoras significativas, especialmente quanto à diminuição da intensidade da dor em curto prazo. Entre as pacientes que receberam autocuidados associados à acupuntura, as porcentagens de redução dos dias de dor durante a semana e das intensidades da dor foram, descritivamente, maiores. Com a acupuntura, a resposta do organismo parece ser mais rápida, reduzindo a intensidade dos sintomas, muitas vezes fazendo-os desaparecer. Os relatos de caso disponíveis na literatura apontam uma melhora significativa da DTM em pacientes tratados com acupuntura auricular com os pontos utilizados neste estudo88 Michelotti A, de Wijer A, Steenks M, Farella M. Home-exercise regimes for the management of non-especific temporomandibular disorders. J Oral Rehabil. 2005;32(11):779-85.

9 Borin GC, Corrêa EC, Silva AM, Milanesi JM. Acupuntura como recurso terapêutico na dor e na gravidade da desordem temporomandibular. Fisioter Pesqui. 2011;18(3):217-22.
-1010 Florian MR, Meirelles MP, Sousa ML. Disfunção temporomandibular e acupuntura: uma terapia integrativa e complementar. Odontol Clin-Cient. 2011;10(2):189-92., porém sugerem-se pontos adicionais para o referido tratamento, como por exemplo, o ponto da neurastenia/ nervosismo, o ponto do coração e do pulmão, que atuam no controle de aspectos emocionais como ansiedade, nervosismo, alegria e tristeza, e outros como fígado, vesícula biliar e intestino grosso, relacionados também a aspectos emocionais como raiva, tomada de decisão/coragem e tristeza1010 Florian MR, Meirelles MP, Sousa ML. Disfunção temporomandibular e acupuntura: uma terapia integrativa e complementar. Odontol Clin-Cient. 2011;10(2):189-92.,1111 Rui A, Meirelles MP, Sousa ML. Relato de caso sobre o uso da acupuntura no tratamento da dor orofacial. Arq Ciênc Saúde UNIPAR. 2011;15(3):287-90.. Esses pontos não foram escolhidos para o presente estudo, mas poderiam ter complementado a abordagem e aumentado eficácia do tratamento.

A acupuntura auricular é uma técnica sensível, que atua por meio de mecanismos diferentes da acupuntura sistêmica1515 Asher GN, Jonas DE, Coeytaux RR, Reilly AC, Loh YL, Motsinger-Reif AA, et al. Auriculotherapy for pain management: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. J Altern Complement Med. 2010;16(10):1097-108.. Segundo a neurofisiologia, os impulsos aferentes dos pontos auriculares projetam-se em direção a neurônios correspondentes ou adjacentes no sistema nervoso central. Quando há alterações em órgãos ou em regiões do corpo, há uma conexão entre o impulso aferente da orelha e o(s) neurônio(s) do sistema nervoso central, gerando respostas específicas1414 Shi-ying J, Wan-cheng J. Manual prático de auriculopuntura. São Paulo: Rocca. 2012. 93 p.. Quando se estimulam esses pontos na orelha, o paciente sente dor e ocorre por contrairritação, efeito inibitório do foco patológico de excitação, até que o círculo de doença seja bloqueado, aliviado ou curado. Além disso, a acupuntura auricular atua regulando o sistema endócrino e imunológico por transmissão neuro-humoral, fortalecendo a capacidade de combate à doença1414 Shi-ying J, Wan-cheng J. Manual prático de auriculopuntura. São Paulo: Rocca. 2012. 93 p..

Para promover nivelamento das pacientes quanto à sensação e à percepção da dor, apenas foram incluídas pacientes que apresentassem dor orofacial crônica, ou seja, há mais de seis meses. Quando a DTM passa a ser crônica, a presença de sintomas como cefaleias, depressão, fadiga crônica, desordens do sono, decréscimo de produtibilidade, sensação de inadequação, baixa autoestima, isolamento e variações do humor sobrepõem-se aos demais sintomas1717 Auvenshine RC. Temporomandibular disorders: associated features. Dent Clin North Am. 2007;51(1):105-27., o que talvez exigisse uma abordagem de pontos maior que a empregada, além da associação de várias modalidades terapêuticas complementares77 Wieckiewicz M, Boening K, Wiland P, Shiau YY, Paradowska-Stolarz A. Reported concepts for the treatment modalities and pain management of temporomandibular disorders. J Headache Pain. 2015;16:106.. Certamente, isso pode ter contribuído para a melhora observada nas pacientes que receberam as terapias conjuntamente. É sabido, ainda, que as DTM crônicas demandam mais tempo de tratamento por serem dores mais complexas e o período do tratamento proposto foi curto. Estudos relatam melhora dos sintomas da DTM com a terapia caseira e autocuidados após 6 semanas77 Wieckiewicz M, Boening K, Wiland P, Shiau YY, Paradowska-Stolarz A. Reported concepts for the treatment modalities and pain management of temporomandibular disorders. J Headache Pain. 2015;16:106.. Já para as terapias com acupuntura auricular os ciclos de tratamento iniciais variam de cinco a 10 aplicações1414 Shi-ying J, Wan-cheng J. Manual prático de auriculopuntura. São Paulo: Rocca. 2012. 93 p.. Apesar do pouco tempo empregado, melhoras promissoras foram observadas. Uma problemática importante é que o diagnóstico realizado nesse estudo foi ocidental1313 Porporatti AL, Costa YM, Stuginsky-Barbosa J, Bonjardim LR, Conti PC. Acupuncture therapeutic protocols for the management of temporomandibular disorders. Rev Dor. 2015;16(1):53-9., baseado na mensuração da presença de sinais e sintomas de DTM, coletados de forma objetiva por meio de ficha clínica e do RDC/TMD. Apesar da padronização visando à seleção de indivíduos com semelhante graduação de dor (II e III), existem variações na amostra quanto às estruturas acometidas pela disfunção e outros parâmetros como depressão, sintomas físicos não específicos e limitações na função mandibular, o que dificulta a comparação de achados entre os pacientes e entre os grupos de tratamento. Deve-se ressaltar ainda que o tratamento foi baseado no mesmo protocolo para toda a amostra. A acupuntura é, certamente, uma técnica oriental que busca individualizar o tratamento do paciente em uma visão holística, diante das necessidades sistêmicas particulares de cada paciente. Neste estudo, que servirá de base para a determinação do protocolo para um estudo clínico, houve a necessidade de padronizar a metodologia, e assim, a individualização do tratamento, como no estudo realizado por Elder et al. 1212 Elder C, Ritenbaugh C, Aickin M, Hammerschlag R, Dworkin S, Mist S, et al. Reductions in pain medication use associated with traditional Chinese medicine for chronic pain. Perm J. 2012;16(3):18-23., foi impraticável como é na maioria dos estudos clínicos.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, pode-se destacar que a acupuntura auricular como terapia associada ao autocuidado caseiro demonstrou melhores resultados no controle da DTM. Porém, o emprego dessa técnica precisa de melhores evidências, baseadas em estudos clínicos com padrões mais bem definidos e delineados, em longo prazo.

  • Fontes de fomento: não há.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2016

Histórico

  • Recebido
    10 Abr 2016
  • Aceito
    26 Jul 2016
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