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Mensuração da dor perineal no pós-parto vaginal imediato

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

O puerpério é um período em que ocorrem mudanças fisiológicas no corpo da mulher, e a maioria delas sofre trauma perineal no período expulsivo, que pode ocasionar dor perineal, e é considerada a causa mais comum de morbidade no puerpério. O objetivo deste estudo foi mensurar a dor perineal no pós-parto vaginal imediato e a possível associação com os seus fatores de riscos.

MÉTODOS:

Foram avaliadas 147 puérperas que tiveram parto vaginal durante os meses de setembro de 2013 a maio de 2014. Os instrumentos utilizados para coleta de dados foram ficha de dados pessoais, características sócio-demográficas e clínicas; questionário McGill Pain Questionnaire; e escala numérica da dor.

RESULTADOS:

Das mulheres avaliadas, 76 (51,7%) relataram sentir dor no período imediato ao parto. Dentre as entrevistadas que sentiram dor 51 (67,1%) eram primíparas, 71 (93,4%) sofreram algum trauma perineal, 55 (72,3%) tiveram seu recém- -nascido pesando acima de 3kg, e 41 (53,9%) tinham acima de 21 anos de idade. A característica sensorial referente ao McGill Pain Questionnaire foi a mais citada, e a dor esteve associada à presença de episiotomia (p=0,002), e laceração (p=0,039). Ainda, observou-se associação significativa entre a presença de dor e a paridade (p=0,028).

CONCLUSÃO:

A dor foi presente em mais da metade da população estudada, demonstrando associação com as variáveis paridade e trauma perineal.

Descritores:
Dor; Paridade; Período pós-parto

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Postpartum is a period where there are physiological changes in women’s body, and most of them suffer perineal trauma during the expulsion period, which may induce perineal pain and is considered the most common cause of postpartum morbidity. This study aimed at measuring perineal pain in the immediate vaginal postpartum period and the possible association with its risk factors.

METHODS:

Participated in the study 147 vaginal postpartum women in the period from September 2013 to May 2014. Data collection tools were personal data files, socio-demographic and clinical characteristics, McGill Pain Questionnaire and pain numerical scale.

RESULTS:

From all evaluated women, 76 (51.7%) reported pain in the immediate postpartum period. Among respondents with pain, 51 (67.1%) were primiparous, 71 (93.4%) had suffered some perineal trauma, 55 (72.3%) had babies weighing above 3 kg, and 41 (53.9%) were above 21 years of age. Mc Gill Pain Questionnaire sensory characteristics were the most commonly mentioned and pain was associated to episiotomy (p=0.002) and laceration (p=0.039). There has also been significant association between pain and parity (p=0.028).

CONCLUSION:

Pain was present in more than half the studied population, showing an association with variable parity and perineal trauma.

Keywords:
Pain; Parity; Postpartum period

INTRODUÇÃO

O puerpério é um período em que ocorrem mudanças fisiológicas no corpo da mulher, e a maioria delas sofre algum tipo de lesão no períneo durante o parto, podendo desenvolver morbidades, em especial, a presença de dor11 Bertozzi S, Londero AP, Fruscalzo A, Driul L, Marchesoni D. Prevalence and risk factors for dyspareunia and unsatisfying sexual relationships in a cohort of primiparous and secondiparous women after 12 months postpartum. Int J Sexual Health. 2010;22(1):47-53.

2 Santos JO, Bolanho IC, Mota JQ, Coleoni L, Oliveira MA. Frequência de lesões perineais ocorridas nos partos vaginais em uma instituição hospitalar. Esc Anna Nery. 2008;12(4):658-63.
-33 Riesco ML, Costa AS, Almeida SF, Basile AL, Oliveira SM. Episiotomia, laceração e integridade perineal em partos normais: análise de fatores associados. Rev Enferm UERJ. 2011;19(1):77-83.. Dentre os fatores que aumentam as chances de manutenção da integridade perineal estão o número de partos vaginais anteriores e o peso do recém-nascido (RN) abaixo de 3.125g44 Johanson R. Perineal massage for prevention of perineal trauma in childbirth. Lancet. 2000;335(9200):250-1..

A perda da integridade dos tecidos da região genital durante o parto é definida como trauma perineal, e pode ser decorrente de uma incisão cirúrgica como a episiotomia, ou de lesão espontânea, denominada laceração. Algumas complicações podem ser desencadeadas em decorrência dessa lesão, tais como, o surgimento de incontinência urinária e fecal, dispareunia, e as disfunções no assoalho pélvico55 Albers LL, Borders N. Minimizing genital tract trauma and related pain following spontaneous vaginal birth. J Midwifery Womens Health. 2007;52(3):246-53.

6 Almeida SF, Riesco ML. Randomized controlled clinical trial on two perineal trauma suture techniques in normal delivery. Rev Lat Am Enfermagem. 2008;16(2):272-9.

7 Carroli G, Mignini L. Episiotomy for vaginal birth. Cochrane Database Syst Rev. 2009;(1):CD000081.
-88 Scarabotto LB, Riesco ML. [Factors related to perineal trauma in normal births in nulliparous]. Rev Esc Enferm USP. 2006;40(3):389-95. Portuguese..

A laceração perineal é classificada em primeiro grau, ao atingir a pele e a mucosa; em segundo grau, quando se estende até os músculos perineais; e classificada em terceiro grau, ao atingir o músculo esfíncter do ânus. A ocorrência dessas lesões depende de diversos fatores relacionados às condições maternas, ao feto e ao parto99 Costa AV, Sales RM, Moura FM, Costa RS, Moura LJ. Vivência das mulheres sobre a episiotomia. Rev Enferm UFPI. 2012;1(1):50-5.. Por sua vez, a episiotomia é uma estratégia cirúrgica aplicada no período expulsivo que tem como objetivo evitar lacerações na região perineal. No entanto, por vezes, pode constituir um trauma perineal mais grave que uma laceração espontânea, sendo identificada clinicamente pela incisão dos músculos transversos superficiais do períneo e bulbocavernoso, além da pele e da mucosa.

Alguns fatores aumentam o índice da episiotomia, tais como, nuliparidade, prematuridade, períneo pouco distensível com a musculatura tensa, exaustão materna, operatória transpélvica, tais como o fórceps ou vácuo-extração e apresentação pélvica44 Johanson R. Perineal massage for prevention of perineal trauma in childbirth. Lancet. 2000;335(9200):250-1.,99 Costa AV, Sales RM, Moura FM, Costa RS, Moura LJ. Vivência das mulheres sobre a episiotomia. Rev Enferm UFPI. 2012;1(1):50-5.,1010 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticos de Saúde. Área Técnica de Saúde da Mulher. Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher/ Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde, Área Técnica da Mulher. - Brasília: Ministério da Saúde, 2001.. Entre as morbidades decorrentes da episiotomia realizada no introito vaginal durante o par-to, pode-se citar sangramento vaginal, infecção, deiscência de sutura e hematoma que podem desencadear a dor perineal e a incontinência urinária e fecal, interferindo no processo de amamentação66 Almeida SF, Riesco ML. Randomized controlled clinical trial on two perineal trauma suture techniques in normal delivery. Rev Lat Am Enfermagem. 2008;16(2):272-9.,88 Scarabotto LB, Riesco ML. [Factors related to perineal trauma in normal births in nulliparous]. Rev Esc Enferm USP. 2006;40(3):389-95. Portuguese.,1010 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticos de Saúde. Área Técnica de Saúde da Mulher. Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher/ Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde, Área Técnica da Mulher. - Brasília: Ministério da Saúde, 2001..

O Ministério da Saúde considera o uso liberal ou rotineiro da episiotomia como prática claramente prejudicial ou ineficaz e que deve ser eliminada1111 Brasil. Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher - PNDS 2006: dimensões do processo reprodutivo e da saúde da criança/ Ministério da Saúde, Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. - Brasília: Ministério da Saúde, 2009.. Dados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da mulher 2006 (PNDS)1212 Francisco AA, Oliveira SM, Santos JO, Silva FM. Avaliação e tratamento da dor perineal no pós-parto vaginal. Acta Paul Enferm. 2011;24(1):94-100. mostram que a alta frequência da realização da episiotomia (71,6%), em particular nas regiões Sudeste (80,3%), Centro Oeste (78,8%) e Sul (78,5%), revelam o uso rotineiro dessa prática e, consequentemente, a predominância de um modelo mais intervencionista também na condução do parto normal no Brasil. Por outro lado, há relatos da falta de medidas que contribuam para o conforto da mulher. Sendo assim, torna-se prioridade a assistência dos profissionais de saúde às mulheres durante o período puerperal, para que sejam identificadas e valorizadas as morbidades decorrentes dos traumas perineais, sobretudo, a presença da dor33 Riesco ML, Costa AS, Almeida SF, Basile AL, Oliveira SM. Episiotomia, laceração e integridade perineal em partos normais: análise de fatores associados. Rev Enferm UERJ. 2011;19(1):77-83..

A dor perineal é descrita pela literatura como sequela frequente do processo de parto, sendo caracterizada como aguda e considerada causa comum de morbidade no puerpério1313 Beleza AC, Ferreira CH, Sousa L, Nakano A. Mensuração e caracterização da dor após episiotomia e sua relação com a limitação de atividades. Rev Bras Enferm, Brasília. 2012;65(2):264-8.. A dor aguda leva o indivíduo a manifestações de sintomas como alterações no padrão do sono, apetite e libido, manifestações de irritabilidade, alterações de energia, diminuição da capacidade de concentração, restrições na capacidade para as atividades familiares, profissionais e sociais1414 Kreling MC, da Cruz DA, Pimenta CA. [Prevalence of chronic pain in adult workers]. Rev Bras Enferm. 2006;59(4):509-13. Portuguese..

Nesse sentido, torna-se necessário o estudo da dor perineal no puerpério imediato após parto vaginal, pois a avaliação dessa dor pode encorajar os profissionais de saúde envolvidos no processo de parto natural a entender melhor as consequências que podem ocorrer na qualidade de vida das parturientes devido a uma conduta mal elaborada, melhorando a assistência durante e após o parto. Assim, o objetivo deste estudo foi mensurar a dor perineal no pós-parto vaginal imediato, e sua associação com os possíveis fatores de risco.

MÉTODOS

Foi realizado um estudo descritivo com delineamento transversal, que foi desenvolvido na sala de parto e na enfermaria do alojamento conjunto do Hospital Dom Malan (Gestão IMIP) e Maternidade de Juazeiro, situados na cidade de Petrolina/PE e Juazeiro/BA, respectivamente, A amostra do estudo foi composta por 147 puérperas que haviam sido submetidas ao parto vaginal. A coleta de dados ocorreu durante os meses de setembro de 2013 a maio de 2014.

Incluíram-se no estudo mulheres que tiveram gestação de baixo risco, puérperas em pós-parto vaginal com ou sem trauma perineal, primíparas e multíparas. Quanto aos critérios de exclusão, pode-se citar: infecção do trato urinário diagnosticada, gestação gemelar ou história de aborto recorrente, mulheres vítimas de violência/abuso sexual, quadro de depressão anterior ou atual diagnosticada, não falar e não compreender a língua portuguesa.

Realizou-se um estudo piloto em 10 puérperas para verificar a compreensão e eficácia dos instrumentos de coleta de dados e possíveis vieses, correções ou limitações nos procedimentos de pesquisa.

Na avaliação das puérperas foram empregados os seguintes instrumentos de coleta de dados: ficha de dados pessoais com as características sócio-demográficas e clínicas das mulheres entrevistadas. Para mensurar a dor, utilizou-se o questionário McGill Pain Questionnaire (MPQ)1515 Martinez JE, Grassi DC, Marques LG. Análise da aplicabilidade de três instrumentos de avaliação de dor em distintas unidades de atendimento: ambulatório, enfermaria e urgência. Rev Bras Reumatol. 2011;51(4):304-8.,1616 Pimenta CA, Teixeira MJ. [Proposal to adapt the McGill Pain Questionnaire into Portuguese]. Rev Esc Enferm USP. 1996;30(3):473-83. Portuguese., que é um instrumento multidimensional que avalia vários aspectos da dor por meio de palavras que o paciente escolhe para expressá-la. Os descritores são divididos em quatro grupos: sensorial discriminativo, afetivo motivacional, avaliativo cognitivo, e miscelânea. Os resultados podem ser alcançados por meio do índice numérico de descritores que é o número de palavras escolhidas pela participante para caracterizar a sua dor, sendo o valor máximo 20, pois a voluntária deve escolher apenas uma palavra de cada subgrupo, ou pelo índice de dor calculado pela somatória dos valores de intensidade de cada descritor (0-5), tendo este o valor máximo de 8. Além disso, foi utilizada a escala visual numérica da dor (EVN), que consiste em uma escala unidimensional fácil de administrar e de ser compreendida pelo participante. É composta por uma linha horizontal com números de zero a 10, e em seus extremos visualizam-se as expressões: “nenhuma dor” (zero) e “dor insuportável” (10). A participante deve marcar na linha o número que corresponde à sua dor; quanto maior o escore maior a intensidade da dor1717 Pitangui AC, Sousa L, Ferreira CH, Gomes FA, Nakano AM. Mensuração e características da dor perineal em primíparas submetidas à episiotomia. Acta Paul Enferm. 2009;22(1):77-82..

Foi empregada uma única avaliação nas puérperas que ocorreu com o mínimo de 6h e máximo de 24h pós-parto. Esse período foi relativo respectivamente ao momento em que a mulher já poderia sair do leito e de cessação da analgesia, caso essa tenha sido empregada; e limite de 24h, referente à fase aguda da lesão, processo inflamatório e maior predominância a dor. No caso de as puérperas terem feito emprego de recursos para alivio de dor, o período de seu efeito era controlado com base na posologia do fármaco, considerando assim, as possíveis interferências na avaliação inicial da dor1717 Pitangui AC, Sousa L, Ferreira CH, Gomes FA, Nakano AM. Mensuração e características da dor perineal em primíparas submetidas à episiotomia. Acta Paul Enferm. 2009;22(1):77-82.

18 Pitangui AC, Araújo RC, Bezerra MJ, Ribeiro CO, Nakano, AM. Low and highfrequency TENS in post-episiotomy pain relief: a randomized, double-blind clinical trial. Braz J Phys Ther. 2014;(18):72-8.
-1919 Pitangui AC, de Sousa L, Gomes FA, Ferreira CH, Nakano AM. High-frequency TENS in post-episiotomy pain relief in primiparous puerpere: a randomized, controlled trial. J Obstet Gynaecol Res. 2012;38(7):980-7..

A coleta de dados foi realizada por dois avaliadores devidamente treinados que realizaram as avaliações em conjunto. Um avaliador foi responsável por entrevistar as puérperas enquanto o outro anotava os dados na ficha de avaliação.

A amostra não probabilística foi intencional e por conveniência os dados foram processados e analisados pelo programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 16 (SPSS Inc., Chicago, IL, Estados Unidos da América, Release 16.0.2, 2008). Após a codificação das variáveis em um banco de dados e a validação por dupla entrada, procedeu-se à análise exploratória das variáveis. A análise dos resultados foi descritiva e analítica. Inicialmente, foi verificada a normalidade dos dados, diante de uma distribuição simétrica foi utilizado medida de tendência central e de dispersão para apresentação das variáveis contínuas, ou medida de tendência central adicionada a separatrizes quando a distribuição consistisse em não paramétrica. Foram calculadas prevalências e possíveis associações por meio do teste Qui-quadrado de Pearson ou Exato de Fisher. Em todas as análises foi adotado o nível de significância de p≤0,05. Intervalos de confiança (IC) quando determinados foram exatos.

A pesquisa realizada ofereceu riscos mínimos às participantes, sendo esses relacionados ao constrangimento em responder às questões. Dessa forma, os questionamentos foram feitos de forma reservada apenas para as participantes sem que outras pessoas pudessem interferir nas respostas. Além disso, em caso de ter observado algum sintoma de depressão pós-parto ou quadro álgico no momento da entrevista, a pesquisadora encaminhou a paciente aos profissionais especializados para atendimento. Os benefícios do estudo consistiram na possível identificação da intensidade da dor percebida pela puérpera, e assim possibilitar uma intervenção precoce no cuidado a saúde da mulher.

Este estudo seguiu as determinações éticas para pesquisa com seres humanos, segundo a Declaração de Helsinki, 2000. Foram também seguidas as diretrizes e normas que regulamentam as pesquisas envolvendo seres humanos, contidas na resolução 466, de 12 de dezembro de 2012. As participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e foram informadas quanto ao sigilo em relação aos dados coletados.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa da Universidade de Pernambuco sob protocolo n. 412.370/2013.

RESULTADOS

O estudo avaliou 147 puérperas com idade mediana de 21 anos, variando de 14 a 39 anos, mediana de consulta pré-natal consistindo em 7, estando entre zero e 15 consultas, e peso do RN com mediana de 3.196g. Na tabela 1 observam-se os aspectos sócio-demográficos das pacientes, assim como os aspectos clínicos.

Tabela 1
Características sócio-demográficas e clínicas das puérperas entrevistadas no alojamento conjunto do Hospital Dom Malan Gestão IMIP em Petrolina PE e Maternidade de Juazeiro situado na cidade de Juazeiro-BA

Dentre as mulheres analisadas observou-se que 76 (51,7%) relataram sentir algum grau de dor no período imediato ao parto. Na tabela 2 pode-se observar a associação realizada entre a presença de dor e os fatores avaliados.

Tabela 2
Associação da presença de dor perineal e as variáveis idade, peso do recém-nascido, paridade e trauma perineal

O escore de dor mais relatado pelas puérperas foi o moderado com média de valor de 5,22±2,31 variando com mínimo de um e máximo de 10. Os valores mais prevalentes foram cinco relatados por 21 (27,6%) puérperas, seguido do quatro por 11 mulheres (14,5%) e 7 (13,2%),os demais valores foram citados por 34 (44,7%) puérperas que se encontravam com queixa álgica. Pode-se observar na tabela 3 o resultado do questionário MPQ, no qual as características da dor pós-parto foram delineadas.

Tabela 3
Característica da dor através do questionário McGill Pain -Questionnaire

DISCUSSÃO

No presente estudo foi observado um índice elevado de trauma perineal após parto vaginal, no qual a frequência de episiotomia foi de 23,1%, e a presença de laceração foi de 50,3% entre os traumas perineais. Corroborando o presente estudo, Mouta et al.2020 Mouta RJ, Pilotto DT, Varens OM, Progianti JM. Relação entre posição adotada pela mulher no parto, integridade perineal e vitalidade do recém-nascido. Rev Enferm UERJ. 2008;16(4):472-6. encontraram uma frequência de 73,4% de traumas perineais, no qual 68,52% desses traumas foram laceração. Em contrapartida, Santos et al.22 Santos JO, Bolanho IC, Mota JQ, Coleoni L, Oliveira MA. Frequência de lesões perineais ocorridas nos partos vaginais em uma instituição hospitalar. Esc Anna Nery. 2008;12(4):658-63. demonstraram que dos 279 prontuários analisados, houve episiotomia sem laceração em 86,99% das mulheres.

São bem relatados os riscos devido ao emprego rotineiro da episiotomia, destacando que seu uso restrito acarreta vantagens estabelecidas, tais como, a menor incidência de trauma perineal posterior ou traumas perineais mais severos, menores índices de dor e complicações pós-parto, além de não existir evidências de melhor resultado materno ou perinatais com o uso da episiotomia88 Scarabotto LB, Riesco ML. [Factors related to perineal trauma in normal births in nulliparous]. Rev Esc Enferm USP. 2006;40(3):389-95. Portuguese..

Neste estudo, ficou evidenciada a associação entre a dor e os traumas perineais, entretanto, houve maior associação dessa dor com a episiotomia. Nesse contexto, as mulheres que passaram por uma episiotomia podem ter duas vezes mais queixas de dor perineal do que um grupo com períneo íntegro2121 Tomasso G, Althabe F, Cafferata ML, Alemán A, Sosa C, Belizán JM. Debemos seguir haciendo la episiotomía en forma rutinaria? Rev Obstet Gynecol Venezuela. 2002;62(2):115-21. e a dor pode ser menor quando a mulher faz exercícios durante o trabalho de parto e ainda, a imobilidade materna pode contribuir para o aumento do número de distocias e risco de cesarianas, por prejudicar a progressão ou descida fetal2222 Zwelling E. Overcoming the challenges: maternalmovement and positioning to facilitate labor progress.MCN Am J Matern Child Nurs. 2010;35(2):72-8..

Quanto à associação entre dor e paridade, encontrou-se associação entre esses fatores, onde 51 (34,7%) primíparas e 25 (17%) multíparas relataram dor perineal. Assim, pode-se dizer que algumas dificuldades sofridas por primíparas durante o parto, tais como falta de conhecimento e preparo, vivência de um elevado número de emoções negativas, preocupação com o estado de saúde do bebê, podem levar a um trabalho de parto demorado e vir a gerar dor após o parto2323 Costa RA, Figueiredo BC, Pacheco AP, Pais A. Parto: expectativas, experiências, dor e satisfação. Psicologia, Saúde & Doenças. 2003;4(1):47-67..

No que diz respeito à idade, foram avaliadas 147 puérperas de idade mediana de 21 anos, variando de 14 a 39 anos, a dor esteve presente em 35 (46,1%) mulheres até 21 anos, e em 41 (53,9%) mulheres que tinham idade acima de 21 anos, mas esse marcador não demonstrou associação com a dor. Da mesma forma, não foi encontrada relação ao associar a dor com o peso do RN. Esses dados podem não ter obtido associação devido ao pequeno número da amostra, associado a uma grande variedade nos valores dos marcadores peso do RN e idade materna.

Com relação à mensuração da dor, as entrevistadas quantificaram a dor perineal no pós-parto como moderada, sendo 5 a intensidade mais citada, corroborando Beleza et al.1313 Beleza AC, Ferreira CH, Sousa L, Nakano A. Mensuração e caracterização da dor após episiotomia e sua relação com a limitação de atividades. Rev Bras Enferm, Brasília. 2012;65(2):264-8., que analisaram o nível de dor referido pelas puérperas após o parto com episiotomia, e encontraram a intensidade de dor consistindo em 4 (valor mediano), sendo o mínimo 1 e o máximo 10, e a média e o desvio padrão de 5 e 2,07, respectivamente.

Alguns fatores podem estar relacionados ao aumento das dores no período puerperal, tais como, número excessivo de toques vaginais, devido ao risco de poderem ocasionar alterações nos tecidos da região, e o tempo prolongado do trabalho de parto que pode representar um risco para a região perineal da mulher, podendo representar maior manipulação da região genital, resultando em queixa de dor no período puerperal1313 Beleza AC, Ferreira CH, Sousa L, Nakano A. Mensuração e caracterização da dor após episiotomia e sua relação com a limitação de atividades. Rev Bras Enferm, Brasília. 2012;65(2):264-8..

Neste estudo, para descrever a característica da dor no pós-parto vaginal, utilizou-se o MPQ, no qual a maioria das entrevistadas expressou que sua dor tinha um caráter sensitivo, ocasionando nesse grupo de descritores o maior índice de dor declarado, sendo esse de 34. Resultado semelhante foi encontrado no estudo de Pitangui et al.1717 Pitangui AC, Sousa L, Ferreira CH, Gomes FA, Nakano AM. Mensuração e características da dor perineal em primíparas submetidas à episiotomia. Acta Paul Enferm. 2009;22(1):77-82.no qual grande parte das mulheres escolheram os descritores da categoria sensitiva como os que melhor definiam a dor após episiotomia.

De acordo com Pimenta e Teixeira1616 Pimenta CA, Teixeira MJ. [Proposal to adapt the McGill Pain Questionnaire into Portuguese]. Rev Esc Enferm USP. 1996;30(3):473-83. Portuguese. instrumentos multidimensionais para a avaliação de dor são utilizados para demonstrar a interação entre os pacientes e os profissionais de saúde a respeito da experiência dolorosa. Sendo assim, torna-se necessária uma compreensão do quadro álgico para a implementação de medidas analgésicas e avaliação da eficácia terapêutica.

Diante do exposto, espera-se que as prevalências encontradas nesta pesquisa possam demonstrar a necessidade em de identificar e caracterizar dor perineal nas mulheres durante o puerpério, a fim de evitar futuras complicações. Além disso, espera-se que os resultados demonstrados possam dar suporte a uma nova conduta dos profissionais de saúde durante o trabalho de parto, em busca de melhor qualidade de vida das mulheres no pós-parto.

CONCLUSÃO

A presença da dor perineal foi a mais prevalente nesta amostra, demonstrando associação com as variáveis paridade e trauma perineal. Porém, não foi possível associar a dor perineal com as variáveis peso do RN e idade. Assim, é constatada a necessidade de uma intervenção multidisciplinar direcionada à saúde da mulher e principalmente ao alívio de dor durante o puerpério imediato.

  • Fontes de fomento: não há.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    02 Jul 2015
  • Aceito
    19 Out 2015
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