Acessibilidade / Reportar erro

Em busca de um paradigma: o debate escandinavo sobre a identidade da sociologia do direito

In search of a paradigm: the Scandinavian debate on the identity of sociology of law

Resumo

Este trabalho analisa o debate entre Reza Banakar, Thomas Mathiesen e Håkan Hydén com foco em uma sequência de artigos publicados no periódico Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift entre 1998 e 2001. Escrevendo em um momento em que a realização de estudos sociojurídicos já era prática acadêmica rotineira na Escandinávia, eles propõem soluções bem diferentes para o problema da identidade da sociologia do direito. Assim, o debate escandinavo lança luzes sobre os elementos basilares que atualmente conformam o paradigma sociojurídico em contextos como o brasileiro.

Palavras-chave:
Sociologia do direito; Escandinávia; Paradigma científico

Abstract

This work analyzes the debate between Reza Banakar, Thomas Mathiesen and Håkan Hydén, focusing on a sequence of articles published in the journal Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift between 1998 and 2001. Writing at a time when conducting sociolegal studies already was a routinized academic practice, they propose quite different solutions to the problem of the identity of sociology of law. Thus, the Scandinavian debate sheds light on the ground elements that currently shape the sociolegal paradigm in contexts such as the Brazilian one.

Keywords:
Sociology of law; Scandinavia; Scientific paradigm

1 Introdução1 1 Este artigo é produto do projeto de pesquisa A Sociologia do Direito em Busca de uma Identidade: Debates Clássicos e Contemporâneos, desenvolvido em colaboração com a equipe de trabalho do Grupo de Pesquisa Direito e Sociedade (GPDS) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Chamada Universal – MTCI/CNPq n. 14/2014, Processo 444686/2014-2. Os autores também agradecem aoOñati International Institute for the Sociology of Law(IISL), Espanha, e àLunds Universitet, Suécia, por facilitarem o acesso aos seus acervos bibliográficos.

Este artigo analisa o debate entre Reza Banakar (1959-2020), Thomas Mathiesen (1933-2021) e Håkan Hydén sobre a identidade da sociologia do direito no contexto da Escandinávia de fins do século XX. À época do debate, Banakar, iraniano radicado no Reino Unido e na Suécia, atuava como pesquisador do Centro de Estudos Sociojurídicos da Universidade de Oxford; nos anos seguintes, se notabilizaria por seus trabalhos sobre os fundamentos da pesquisa sociojurídica (2000, 2003). Mathiesen, então catedrático de sociologia do direito na Universidade de Oslo, já era um intelectual internacionalmente consagrado por suas contribuições à criminologia crítica e ao movimento pela abolição da pena de prisão (1974, 1990). Hydén, professor titular na Universidade de Lund, lançava as bases teóricas de uma ciência das normas societais, que logo influenciaria dezenas de estudos sociojurídicos (2011, HYDÉN; SVENSSON, 2008HYDÉN, Håkan; SVENSSON, Måns. The concept of norms in sociology of law. In: HYDÉN, Håkan; WICKENBER, Per (Ed.). Contributions in sociology of law: remarks from a Swedish horizon. Lund: Lund University, 2008. p. 129-146).

O debate desenvolve-se em uma sequência de artigos publicados na Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift entre 1998 e 2001. Esse periódico fundado na Dinamarca, em 1976, com o propósito de difundir o pensamento jurídico crítico, veicula artigos nos idiomas escandinavos e em inglês. Banakar (1998)BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998. inaugura o debate com The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. A convite dos editores, Mathiesen (1998)MATHIESEN, Thomas. Is it all that bad to be a stepchild? Comments on the state of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 83, p. 67-76, 1998. escreve uma resposta, Is it all that bad to be a stepchild? Comments on the state of sociology of law. Também estimulado pelo corpo editorial, Hydén (1999)HYDÉN, Håkan. Even a stepchild eventually grows up: on the identity of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 22, n. 85, p. 71-80, 1999. publica Even a stepchild eventually grows up: on the identity of sociology of law. O debate encerra-se com A passage to “India”: toward a transformative interdisciplinary discourse on law and society, em que Banakar (2001)BANAKAR, Reza. A passage to ‘India’: toward a transformative interdisciplinary discourse on law and society. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 24, n. 92, p. 3-21, 2001. dialoga com os aportes anteriores.

A questão do status epistemológico da sociologia do direito perpassa a história do pensamento jurídico e continua a suscitar polêmica. No entanto, a controvérsia examinada diferencia-se dos debates clássicos sobre essa problemática porque se deu posteriormente à institucionalização da sociologia do direito como especialidade científica.2 2 Por exemplo, o debate entre Eugen Ehrlich e Hans Kelsen no contexto do Império Austro-húngaro do início do século XX (KONZEN; BORDINI, 2019) é anterior à institucionalização; e o debate entre Renato Treves e Norberto Bobbio na Itália dos anos 1970 transcorreu durante este processo (KONZEN; RENNER, 2019). Considerando o debate escandinavo, a posição predominante na comunidade sociojurídica em meados do século XX, favorável à coexistência dos estudos sociojurídicos com os estudos doutrinários em um esquema de divisão do trabalho científico, continua prevalecendo? O que significa conduzir pesquisa científica para os sociólogos do direito da Escandinávia, atualmente?

O objetivo desse artigo, assim, é compreender as convergências e divergências entre as perspectivas de Banakar, Mathiesen e Hydén sobre a identidade da sociologia do direito. Como se verá, a análise das posições defendidas no debate escandinavo pode lançar luzes sobre os elementos basilares que conformam o paradigma sociojurídico nos diferentes contextos em que a sociologia do direito também já se consolidou como uma especialidade científica, como o brasileiro.

A pesquisa bibliográfica realizada, centrada no exame do conjunto de artigos da Retfærd,3 3 A Retfærd também publicou textos dos dinamarqueses Hanne Petersen (2000) e Jørgen Dalberg-Larsen (2000) e das norueguesas Inger Johanne Sand (2000) e Anne Hellum (2000). Petersen e Hellum, todavia, não se engajam na discussão epistemológica; e as reflexões de Dalberg-Larsen e Sand são mais pontuais. procurou abarcar fontes de informação que permitissem situar esse debate considerando as especificidades da trajetória da sociologia do direito na Escandinávia.4 4 Neste trabalho, não são analisadas diretamente fontes em sueco, dinamarquês e norueguês, uma limitação que pode ser relativizada considerando que o inglês é a língua franca dos cientistas sociais escandinavos. A análise desenvolvida tem por base a teoria dos paradigmas científicos de Thomas Kuhn (1970)KUHN, Thomas. The structure of scientific revolutions. 2. ed. Chicago: University of Chicago Press, 1970., há muito utilizada para compreender sociologicamente a pesquisa científica sobre o direito.5 5 Confira, entre outros, Zuleta Puceiro (1981), Faria (1988), Hagen (1995) e Andrade (2003). Inclusive, ao longo do debate escandinavo, é feita referência explícita ao conceito de paradigma de Kuhn. Prioriza-se nessa análise as percepções desses sociólogos do direito sobre o conteúdo do paradigma compartilhado pela comunidade científica de que fazem a parte.

O artigo está dividido em duas seções. Inicialmente, são narradas as condições em que se deu a institucionalização da sociologia do direito na Escandinávia, a fim de mostrar como esse processo levou à ruptura com o paradigma dogmático e à busca por outro paradigma para guiar a pesquisa científica sobre o direito. Na sequência, são analisadas as posições defendidas por Banakar, Mathiesen e Hydén nas páginas da Retfærd, os quais propõem soluções bem diferentes para o problema da identidade da sociologia do direito.

2 Os estudos sociojurídicos na Escandinávia

As portas das universidades escandinavas abriram-se para a sociologia do direito entre as décadas de 1960 e 1970 (HYDÉN, 1986HYDÉN, Håkan. Sociology of law in Scandinavia. Journal of Law and Society, v. 13, n. 1, p. 131-143, 1986.: 133). Uma forma de contar essa história é enfatizar os antecedentes que favoreceram a institucionalização dos estudos sociojurídicos, como o legado do realismo jurídico e a introdução da sociologia geral no ambiente universitário. Porém, essa retrospectiva histórica ficaria incompleta se negligenciada a agência dos sociólogos do direito que vislumbraram a oportunidade de pôr em marcha uma agenda de pesquisa sobre as funções do direito na sociedade em um momento de apogeu do Estado social.

2.1 O legado do realismo jurídico e a introdução da sociologia

Suécia, Dinamarca e Noruega são países unidos pela proximidade geográfica e histórico-cultural. Na segunda metade do século XIX, já haviam se convertido em monarquias constitucionais parlamentaristas. A consolidação do Estado liberal favoreceu a inserção da Escandinávia, uma região com longa tradição na navegação mercantil e rica em recursos naturais como minério de ferro, madeira e potenciais hídricos, no livre-comércio marítimo predominante na Europa. Com o surgimento de empresas capitalistas como madeireiras e siderúrgicas, disseminou-se o trabalho assalariado; em paralelo, investimentos em infraestrutura energética, de transporte e comunicações alavancaram a exportação de bens manufaturados. Quem deixava o campo em busca de melhores condições de vida migrava para centros portuários, comerciais e industriais como Copenhague, Estocolmo e Oslo ou embarcava em um transatlântico em direção aos Estados Unidos.6 6 Para uma síntese da história da Escandinávia, veja Derry (1980). Para um apanhado introdutório à realidade histórico-cultural escandinava a partir de uma perspectiva brasileira, consulte Guimarães (2016).

Em meio a essas transformações, as tradicionais faculdades de direito das cidades universitárias de Uppsala e Lund tiveram de se modernizar, a fim de cumprir a missão de preparar estudantes provenientes das classes sociais mais abastadas para os quadros da burocracia judicial e administrativa. Sob a influência das ideias da Escola Histórica alemã, muitos professores assumiram a condição de cientistas do direito, encarregando-se da tarefa de descrever a ordem jurídica vigente em seus países por meio de estudos doutrinários, conforme os ditames da dogmática jurídica.7 7 Para uma leitura escandinava da gênese da dogmática jurídica, veja Sandström (2005). Nessa tarefa, desenvolviam sistemas conceituais lógico-formais para guiar as operações de aplicação do direito positivo aos casos concretos submetidos à decisão das autoridades estatais, visando racionalizar o trabalho dos juristas práticos em atenção às exigências do ideal de neutralização política da magistratura.8 8 Análises sobre as funções da dogmática jurídica são encontradas em Ferraz Jr. (1980) e Andrade (2003). Em princípios do século XX, embora ainda persistissem resquícios de um pensamento jusnaturalista em franco declínio, o juspositivismo estava firmemente estabelecido nas faculdades de direito dos países escandinavos (ECKHOFF, 1968ECKHOFF, Torstein. Sociology of law in Scandinavia. In: TREVES, Renato; VAN LOON, J. F. Glastra (Org.) Norms and actions: national reports on sociology of law. The Hague: Martinus Nijhoff, 1968. p. 21-50.: 22).

Porém, os conflitos e contradições próprios ao capitalismo industrial não tardaram a recrudescer, levando à articulação de sindicatos e partidos políticos representativos dos trabalhadores, como o Partido Social-democrata Sueco, fundado em 1889. Tal como em outras organizações de esquerda europeias, travou-se no âmbito desse partido um embate entre os defensores da implementação de reformas sociais a partir da conquista do poder pela via eleitoral e os favoráveis à tomada o poder pela revolução socialista.9 9 É célebre o embate entre Eduard Bernstein e Rosa Luxemburgo no caso do Partido Social-democrata Alemão. Para uma análise da ideologia social-democrata no movimento socialista, veja Przeworski (1985). Com a Revolução Bolchevique de 1917, a cisão tornou-se irremediável; ao se distanciarem do leninismo, os social-democratas suecos apostaram em uma política pragmática de negociação e formação de coalizações com outras agremiações partidárias. Com a universalização do sufrágio, o Partido Social-democrata Sueco ampliou a sua base eleitoral e fortaleceu sua presença no parlamento, conseguindo chegar ao governo.10 10 Sobre a ascensão política dos social-democratas na Escandinávia, veja Brandal, Bratberg e Thorsen (2013).

Em meio à crise do modelo de Estado liberal que caracterizou o período entreguerras, articulou-se uma escola de pensamento que abalaria os alicerces do juspositivismo: o realismo jurídico escandinavo. O filósofo sueco Axel Hägerström (1868-1939), um crítico da metafísica que permeia os conceitos jurídicos desconectados do tempo e do espaço, é considerado o inspirador dessa escola.11 11 A literatura sobre o realismo jurídico escandinavo é vasta; veja, entre outros, Bjarup (2005) e Strang (2009). Foram seus alunos na Universidade de Uppsala os mais destacados nomes do realismo jurídico escandinavo, os suecos Vilhelm Lundstedt (1882-1955) e Karl Olivecrona (1897-1980) e o dinamarquês Alf Ross (1889-1979). Não cabe aqui discutir em detalhe as ideias de cada um desses juristas realistas, nem as afinidades entre as suas atitudes epistemológicas e as posturas de seus homólogos estadunidenses,12 12 Karl Llewellyn e Jerome Frank estão entre os principais expoentes do realismo jurídico americano; para uma síntese, veja Leiter (2005); para uma vívida narrativa sobre as origens desta escola, veja Giacomuzzi (2005). mas apenas rememorar o legado dessa corrente de pensamento para os estudos sociojurídicos.

Os realistas escandinavos estavam interessados em compreender as origens sociais do direito e seus efeitos na sociedade. Lundstedt (1933)LUNDSTEDT, Vilhelm. The responsibility of legal science for the fate of man and nations. New York University Law Quarterly Review, v. 10. n. 3, p. 326-340, 1933., docente em Uppsala, insurgia-se contra as doutrinas jurídicas dominantes, que lhe pareciam desprovidas de qualquer valor científico, pois fundadas na idealização de um “mundo do direito” apartado da vida social. Na sua visão, teorias emergentes como a de Kelsen contribuíam para agravar essa situação, pois quanto maior a coerência de uma doutrina metafísica, maior seu distanciamento da realidade (LUNDSTEDT, 1933LUNDSTEDT, Vilhelm. The responsibility of legal science for the fate of man and nations. New York University Law Quarterly Review, v. 10. n. 3, p. 326-340, 1933.: 327). Contra o pensamento metafísico da ciência jurídica, ele propugnava a busca pela verdade, com base em evidências, sobre o impacto das normas nas ações humanas. Para Olivecrona (1939)OLIVECRONA, Karl. Law as fact. London: Oxford University Press, 1939., professor em Lund, era preciso entender as razões da crença na força obrigatória das normas jurídicas, isto é, as diversas motivações das pessoas de carne e osso para obedecê-las, para além da preocupação de incorrer em sanções ou de ter de lidar com outras consequências desagradáveis de uma transgressão.

Conhecendo a realidade, os juristas poderiam incorporar ao seu repertório argumentativo apreciações pragmáticas sobre a utilidade social de adotar determinadas normas ou interpretar de uma ou outra forma o direito positivo (ECKHOFF, 1968ECKHOFF, Torstein. Sociology of law in Scandinavia. In: TREVES, Renato; VAN LOON, J. F. Glastra (Org.) Norms and actions: national reports on sociology of law. The Hague: Martinus Nijhoff, 1968. p. 21-50.: 23). Lundstedt buscou fazer isso como parlamentar social-democrata entre 1929 e 1948, atacando concepções liberais sobre as relações de propriedade e defendendo a introdução de legislação sobre expropriação de terras e tributação de heranças (STRANG, 2009STRANG, Johan. Two generations of Scandinavian legal realists. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 32, n. 1, p. 62-82, 2009.: 66). Contudo, para compreender o funcionamento do direito na realidade e, assim, descobrir como as leis poderiam influenciar condutas ou antecipar as razões que motivavam magistrados a decidir litígios de determinada maneira, fazia-se necessário formular hipóteses explicativas e coletar dados, tarefas impraticáveis sem o devido preparo teórico e metodológico. Olivecrona, em que pese defendesse uma explicação sociológica do direito (1948), não chegou a conduzir qualquer estudo empírico; ele conjugava conhecimentos de filosofia e história do direito com suas convicções políticas e seus saberes práticos de advogado (COTTERRELL, 2013COTTERRELL, Roger. Northern lights: from Swedish realism to sociology of law. Journal of Law and Society, v. 40, n. 4, p. 657-669, 2013.: 662).

Sob o impacto da Segunda Guerra Mundial, o realismo jurídico escandinavo arrefeceu, deixando como legado as atitudes antimetafísicas que animariam o diálogo entre juristas e sociólogos nas décadas seguintes. Alguns de seus adeptos – notadamente Ross, professor em Copenhague – aproximaram-se da escola do positivismo jurídico, buscando renovar o paradigma dogmático com uma definição mais rigorosa do conceito de direito.13 13 Sobre essa escola, a mais influente no pensamento jurídico do século XX, consulte Barzotto (1999). Assim, fortaleceu-se a análise estrutural do direito, desinteressada na facticidade. Ross (1958)ROSS, Alf. On law and justice. London: Stevens & Sons, 1958. considerava que a ciência do direito se dividia entre os estudos doutrinários, que tratam das normas jurídicas, e os estudos sociojurídicos, que versam sobre o direito em ação. Embora sugerisse que era preciso entender as convicções ideológicas dos juízes para postular a existência de uma norma jurídica, prevendo se seria utilizada para motivar decisões, também ele jamais se preocupou em realizar pesquisas empíricas (DALBERG-LARSEN, 2005DALBERG-LARSEN, Jørgen. Alf Ross and the sociology of law. In: WAHLGREN, Peter (ed.) Perspectives on jurisprudence: essays in Honor of Jes Bjarup. Stockholm: Institute for Scandinavian Law, 2005. p. 39-50.).

Conforme a distribuição das tarefas científicas apregoada pelo juspositivismo dominante à época, a concretude da vida social é assunto para economistas, sociólogos, cientistas políticos, antropólogos e psicólogos sociais, mas não para cientistas do direito, a quem caberia descrever o ordenamento jurídico. Kelsen, o principal expoente dessa escola, considerava legítima uma abordagem sociológica para o direito, se respeitado um esquema rígido de divisão do trabalho científico, onde a sociologia do direito ocuparia uma posição de subordinação à dogmática jurídica, já que incapaz de definir seu próprio objeto (KONZEN; BORDINI, 2019KONZEN, Lucas P.; BORDINI, Henrique S. Sociologia do direito contra dogmática: revisitando o debate Ehrlich-Kelsen. Revista Direito e Práxis, v. 10, n. 1, p. 303-334, 2019.: 317-318). Dessa forma, mesmo juristas escandinavos comprometidos com o paradigma dogmático não encontraram razões para se opor quando a sociologia institucionalizada emergiu no segundo pós-guerra, mantendo relativa distância das faculdades de direito, mas arriscando incursões em temáticas afetas à experiência jurídica.

Na Dinamarca, Theodor Geiger (1891-1952), jurista e sociólogo de origem alemã, pode retomar suas atividades na cátedra de sociologia estabelecida na Universidade de Aarhus, ainda antes da invasão do país pela Alemanha. Na Suécia, oficialmente neutra no conflito bélico, o filósofo social Torgny T. Segerstedt (1908-1999) foi designado para assumir a cátedra criada em Uppsala em 1948. Na Noruega, o jurista e sociólogo Vilhelm Aubert (1922-1988), junto com outros intelectuais que haviam atuado na resistência à ocupação nazista, fundou em 1950 o Instituto Norueguês para Pesquisa Social, uma instituição independente. Também em Lund, Estocolmo e Copenhague surgiram iniciativas visando alavancar pesquisas sociológicas. Em que pese a institucionalização da sociologia tenha ocorrido tardiamente nos países escandinavos em comparação com Reino Unido, França, Alemanha e Estados Unidos, os três estavam representados no encontro de constituição da Associação Internacional de Sociologia (ISA), realizado em Oslo, em 1949.14 14 Para a trajetória da sociologia na Suécia, confira Larsson e Magdalenić (2015); na Dinamarca, Kropp (2015); e na Noruega, Birkelund (2006). Uma breve história da ISA encontra-se em Platt (1998).

Geiger, Segerstedt e Aubert estabeleceram interlocução com os realistas jurídicos, interessando-se pelo estudo sociológico do direito. No livro Vorstudien zu einer Soziologie des Rechts, publicado em 1947, Geiger teoriza o processo de formação de um ordenamento jurídico pela substituição de normas consuetudinárias por proposições normativas regulando a atuação do Estado (TREVES, 2002TREVES, Renato. Sociologia del diritto: origini, ricerche, problemi. 5. ed. Torino: Einaudi, 2002.: 172-175), sustentando que as normas orientadoras da ação social podem ser empiricamente observáveis a partir de um conceito sociológico (AGERSNAP, 2000AGERSNAP, Torben. Theodor Geiger: pioneer of sociology in Denmark. Acta Sociologica, v. 43, n. 4, p. 325-330, 2000.: 327). Voltando-se à pesquisa empírica, Segerstedt (1949)SEGERSTEDT, Torgny. A research into the general sense of justice. Theoria, v. 15, p. 323-338, 1949. conduziu um estudo sobre a consciência jurídica da população sueca, com o propósito de descobrir regularidades nas convicções populares sobre as normas e sanções, bem como entender reações às transgressões (COTTERRELL, 2013COTTERRELL, Roger. Northern lights: from Swedish realism to sociology of law. Journal of Law and Society, v. 40, n. 4, p. 657-669, 2013., p. 662-663). Influenciado pela sociologia estadunidense, Aubert estudou as percepções sociais sobre a legislação de crimes econômicos (1952) e de direitos dos empregados domésticos (1956), abrindo caminho para pesquisas sobre as funções do direito (ECKHOFF, 1968ECKHOFF, Torstein. Sociology of law in Scandinavia. In: TREVES, Renato; VAN LOON, J. F. Glastra (Org.) Norms and actions: national reports on sociology of law. The Hague: Martinus Nijhoff, 1968. p. 21-50.: 31).

Também merece registro, pelo seu significado para os estudos sociojurídicos, a expedição organizada pelo governo dinamarquês para estudar o direito da Groenlândia, entre 1948 e 1950. Encarregada da tarefa de descrever as normas aplicáveis à resolução dos conflitos, a equipe liderada pelos juristas Verner Goldschmidt (1916-1982) e Agnete W. Bentzon (1918-2013) viu-se obrigada a realizar extenso trabalho de campo de inspiração antropológica, examinando documentos dos conselhos locais e entrevistando a população dos vilarejos isolados da costa groenlandesa para descobrir como as relações jurídicas funcionavam (BENTZON; AGERSNAP, 2000BENTZON, Agnete W.; AGERSNAP, Torben. Verner Goldschmidt: Danish sociologist of law and culture. Acta Sociologica, v. 43, n. 4, p. 375-380, 2000.: 376-378). Os achados empíricos sobre as normas sociais que regulavam a vida cotidiana e as formas de reação comunitária às transgressões levaram à aprovação de um código penal para a Groenlândia reconhecendo, por exemplo, a importância dos mecanismos de justiça restaurativa (GOLDSCHMIDT, 1956GOLDSCHMIDT, Verner. The Greenland criminal code and its sociological background. Acta Sociologica, v. 1, n. 1, p. 217–55, 1956.).

Nessa gama de temáticas da agenda de pesquisa sociológica do segundo pós-guerra, as questões relacionadas às mudanças na estrutura político-jurídica das sociedades escandinavas assumiam proeminência cada vez maior. Se o advento do realismo jurídico (COTTERRELL, 2015COTTERRELL, Roger. The politics of jurisprudence revisited: a Swedish realist in historical context. Ratio Juris, v. 28, n. 1, p. 1-14, 2015.: 10-11) e a introdução da sociologia (KROPP, 2015KROPP, Kristoffer. A historical account of Danish sociology: a troubled sociology. Basingstoke: Palgrave Macmillan, 2015.: 110-11) nas universidades podem ser interpretados como respostas aos desafios de um momento de esgotamento do Estado liberal, o interesse crescente pela sociologia do direito está relacionado à consolidação do Estado de bem-estar social (HYDÉN, 1986HYDÉN, Håkan. Sociology of law in Scandinavia. Journal of Law and Society, v. 13, n. 1, p. 131-143, 1986.: 136).

2.2 O problema das funções do direito no Estado social

A transição do Estado liberal para o Estado social ocorreu gradualmente na maior parte da Europa ocidental. Entre as múltiplas causas estão o crescimento econômico resultante do capitalismo industrial, a disseminação de ideologias socialistas e a configuração de sistemas de democracia representativa permeáveis à participação popular. Conjunturalmente, a ampliação das funções estatais ganhou ímpeto frente às exigências de planificação da economia decorrentes dos esforços de guerra e reconstrução.15 15 Uma extensa literatura analisa essa transição. No Brasil, é referência o estudo de Bonavides (2007). Nesse modelo político, cabe ao governo intervir na economia para organizar o capitalismo a fim de possibilitar o pleno emprego, assim como assegurar bem-estar à população por meio de políticas redistributivas, conforme os ditames da legislação aprovada pelo parlamento. Porém, como o custeio do setor público depende da tributação da atividade econômica, seu crescimento não pode ocorrer em descompasso com a expansão das empresas privadas, sob pena de se instalar uma crise fiscal.

A estabilidade política marcou a implementação do Estado social na Escandinávia. O Partido Social-democrata Sueco, por exemplo, manteve-se continuamente à frente do governo entre 1933 e 1976. Nesse período, foram promovidas reformas sociais em série em conformidade com a ideologia social-democrata: fortaleceu-se o protagonismo dos sindicatos e das associações patronais nas negociações sobre salários e condições laborais; assegurou-se a manutenção da renda familiar nas mais diversas hipóteses de interrupção do trabalho (falta de demanda no mercado, doença, acidente de trabalho, licença parental, férias, aposentadoria, morte etc.); universalizou-se o acesso à formação educacional e profissional; promoveu-se o acesso igualitário a serviços de saúde e de cuidados diários; e estabeleceram-se patamares elevados de tributação progressiva da renda.16 16 É vasta a literatura sobre essas reformas; entre outros, veja Brandal, Bratberg e Thorsen (2013).

Durante as décadas de 1960 e 1970, em plena Guerra Fria, Suécia, Dinamarca e Noruega já eram vistos como casos bem-sucedidos do modelo do Estado social, afastando-se seja do capitalismo liberal estadunidense, seja do socialismo real soviético. No seu auge, o Estado social conseguiu garantir a efetividade tanto dos direitos civis e políticos quanto dos direitos econômicos e sociais. Qualquer cidadão poderia prover a sua subsistência sem depender do mercado de trabalho, pois eram proporcionados benefícios básicos e serviços públicos de padrão igual para toda a população, assegurando níveis elevados de bem-estar social (ESPING-ANDERSEN, 1990ESPING-ANDERSEN, Gøsta. The three worlds of welfare capitalism. London: The Polity Press, 1990.: 23). Além disso, os laços de dependência econômica dos indivíduos para com suas famílias foram relativizados, pois o Estado assumia responsabilidade direta para com as crianças, os idosos e os desamparados, encorajando o ingresso das mulheres no mercado de trabalho (ESPING-ANDERSEN, 1990ESPING-ANDERSEN, Gøsta. The three worlds of welfare capitalism. London: The Polity Press, 1990.: 28).

Atribui-se esse êxito à habilidade das elites políticas escandinavas de atuar com base em procedimentos deliberativos caracterizados pela construção de consensos, buscando conciliar interesses potencialmente conflituosos dos distintos grupos sociais; bem como ao alto nível cultural da população, que deposita inusual confiança na eficiência da atuação governamental na regulação da economia, gestão da infraestrutura e a proteção dos indivíduos em situação de vulnerabilidade. Essas características do campo político,17 17 Sobre o sistema político e a cultura política na Escandinávia, consulte Arter (2008). todavia, são insuficientes para explicar a ampla e duradoura aceitação das políticas de bem-estar na Escandinávia. O Estado social, em larga medida, também depende do direito estatal, desde cedo convertido em instrumento à serviço das aspirações políticas social-democratas.

As reformas sociais invariavelmente envolviam a introdução de uma legislação tecnicamente complexa, destinada a promover comportamentos socialmente úteis mais que reprimir condutas indesejáveis (AUBERT, 1988AUBERT, Vilhelm. The rule of law and the promotional function of law in the welfare state. In: TEUBNER, Gunter (Ed.) Dilemmas of law in the welfare state. Berlin: Walter de Gruyter, 1988. p. 28-39.), cuja implementação passava pela criação de órgãos administrativos para resolver casos concretos e edição de normas procedimentais para organizar a atuação estatal em nível local (ÅSTRÖM, 2013ÅSTRÖM, Karsten. Parallel norm crating processes. In: BAIER, Matthias (ed.). Social and legal norms: towards a socio-legal understanding of normativity. Farnham: Ashgate, 2013. p. 71-88.). Os estudos doutrinários não conseguiam responder satisfatoriamente os problemas de pesquisa sobre as funções dessas novas normas jurídicas, sua relação com as normas sociais e seu impacto no comportamento dos atores sociais. Nesse contexto, a sociologia do direito, empregando teorias e métodos das ciências sociais, rivalizava com a dogmática jurídica (HYDÉN, 1986HYDÉN, Håkan. Sociology of law in Scandinavia. Journal of Law and Society, v. 13, n. 1, p. 131-143, 1986.: 134).

Os problemas de pesquisa referentes à análise funcional do direito no Estado social mobilizaram os pesquisadores europeus na vanguarda do movimento direito e sociedade, entre as décadas de 1960 e 1970. Um dos marcos desse processo é a articulação, em 1962, do Research Committee on Sociology of Law (RCSL-ISA), tendo representantes dos três países escandinavos entre seus membros fundadores.18 18 Acerca do RCSL/ISA, consulte <http://rcsl.iscte.pt> e <http://www.isa-sociology.org/>. Um dos pesquisadores do RCSL/ISA a se engajar nessa agenda de investigação sobre as funções do direito foi Aubert, que além de atuar no Instituto Norueguês para Pesquisa Social, passara a lecionar na Faculdade de Direito de Oslo. Em estudo sobre os efeitos manifestos e latentes da lei norueguesa sobre o trabalho doméstico (AUBERT, 1966AUBERT, Vilhelm. Some social functions of legislation. Acta Sociologica, v. 10, n. 1/2, p. 98-120, 1966.), discutiu um tema até então abordado em uma perspectiva doutrinária, após realizar uma pesquisa empírica sobre a sua efetividade.

Destoando da posição de outras lideranças do RCSL-ISA, como o italiano Treves (KONZEN; RENNER, 2019KONZEN, Lucas P.; RENNER, Marjorie C. Em defesa da divisão do trabalho científico: o debate Treves-Bobbio e a institucionalização da sociologia do direito na Itália. Revista Brasileira de Sociologia do Direito, v. 6, n. 1, p. 42-66, 2019.), Aubert não acreditava que a sociologia do direito pudesse coexistir com a dogmática jurídica em um esquema de divisão do trabalho científico, por serem os estudos doutrinários irreconciliáveis com os padrões de produção do conhecimento das ciências sociais. Essa postura de confronto aberto com o paradigma dogmático fica evidente no artigo em que critica a tentativa de Ross de transformar a dogmática jurídica em uma ciência social empírica (AUBERT, 1964AUBERT, Vilhelm. The concept of law. Kentucky Law Journal, v. 52, n. 2, p. 363-385, 1964.). Para Aubert, examinar os fundamentos de uma decisão judicial é uma tarefa diferente de tentar compreender os fatores que a condicionam, não sendo aplicáveis aos estudos doutrinários os métodos de verificação das ciências sociais; ademais, a resolução de casos concretos é uma preocupação que raramente se coloca nos estudos sociojurídicos (1964: 372-375). Ainda que se pudesse falar de divisão social do trabalho, não era objeto de divisão o trabalho propriamente “científico”: doutrinadores elaboram argumentos jurídicos, tal qual acontece com advogados e juízes. Essa tomada de posição epistemológica foi determinante para a fortuna dos estudos sociojurídicos na Escandinávia.

No início da década de 1970, Aubert deixou a Faculdade de Direito para assumir uma cátedra de sociologia geral na Universidade de Oslo. Porém, antes de sua saída, concluiu a supervisão da tese de doutorado em sociologia do direito de Mathiesen (1965)MATHIESEN, Thomas. The defences of the weak: a sociological study of a Norwegian correctional institution. London: Tavistock, 1965., um estudo empírico sobre o sistema prisional norueguês. Em 1972, é Mathiesen quem assume a primeira cátedra de sociologia do direito estabelecida na Noruega, representando no debate escandinavo o pensamento da primeira geração de sociólogos do direito. Desenvolvendo pesquisas sociológicas com um viés marxista crítico (MATHIESEN, 1980MATHIESEN, Thomas. Law, society and political action: towards a strategy under late capitalism. London; New York: Academic Press, 1980.), com ênfase nas políticas criminais e nas funções das penas, ele se converteu em um dos principais expoentes da criminologia crítica e do movimento abolicionista (MATHIESEN, 1974MATHIESEN, Thomas. The politics of abolition. New York: John Wiley & Sons, 1974., 1990MATHIESEN, Thomas. Prison on trial: a critical assessment. London: SAGE, 1990.), juntamente com seu colega de Faculdade de Direito, o professor de criminologia Nils Christie (1928-2015). Sob a liderança intelectual de Christie e Mathiesen, vai se estruturar na Universidade de Oslo um dos mais importantes centros de pesquisa sociojurídica da Europa, ofertando cursos de graduação e pós-graduação em criminologia e sociologia do direito.

Na Suécia, Per Stjernquist (1912-2005) esteve na dianteira da institucionalização dos estudos sociojurídicos. Nos anos 1940, impressionado com um trabalho de Olivecrona, ele decidiu cursar o doutorado em Lund sob sua supervisão; porém, dele logo se afastou, desapontado por sua simpatia pela Alemanha nazista (COTTERRELL, 2013COTTERRELL, Roger. Northern lights: from Swedish realism to sociology of law. Journal of Law and Society, v. 40, n. 4, p. 657-669, 2013.: 664). Em 1952, torna-se docente de direito civil, propondo já em sua aula inaugural uma abordagem para o estudo do direito em oposição à dogmática jurídica, influenciado pela obra de Ehrlich sobre o “direito vivo” (HYDÉN, 2013HYDÉN, Håkan. Pioneers in Nordic sociology of law. Revista Eletrônica Direito e Sociedade, v. 1, n. 1, p. 77-90, 2013.: 86). Em 1963, mesmo enfrentando a oposição de seus pares na Faculdade de Direito, ministra um inédito curso de sociologia do direito na Universidade de Lund. Contando com o apoio do governo social-democrata, assume em 1972 a primeira cátedra de sociologia do direito estabelecida na Suécia, no âmbito da Faculdade de Ciências Sociais (COTTERRELL, 2013COTTERRELL, Roger. Northern lights: from Swedish realism to sociology of law. Journal of Law and Society, v. 40, n. 4, p. 657-669, 2013.: 664-665). Nesta posição, Stjernquist (1973)STJERNQUIST, Per. Laws in the forests: a study of the public direction of Swedish private forestry. Lund: CWK Gleerup, 1973. desenvolve pesquisas sobre a regulação das florestas, discutindo a função do direito no gerenciamento de um dos principais recursos econômicos do país.

Sob a direção de Stjernquist, articula-se na Universidade de Lund um departamento especializado em sociologia do direito. Em 1978, um de seus orientandos, Hydén, defende uma tese de doutorado sobre as funções sociais do direito. Em 1988, ele é escolhido para sucedê-lo como catedrático de sociologia do direito. A participação no debate escandinavo de Hydén, um sociólogo do direito da segunda geração, é marcada pela sua concepção da sociologia do direito como uma ciência das normas. Essa perspectiva influenciou teses de doutorado sobre questões como sustentabilidade ambiental, multiculturalismo, gênero e sociedade da informação (HYDÉN; WICKENBERG, 2008; BAIER, 2013BAIER, Matthias (Ed.). Social and legal norms: towards a sociolegal understanding of normativity. Farnham: Ashgate, 2013.), contribuindo para consolidar Lund como um centro de pesquisa sociojurídica capaz de ofertar, assim como Oslo, o ciclo completo de formação em criminologia e sociologia do direito.

A terceira geração de sociólogos do direito a participar do debate escandinavo é representada por Banakar, um dos estudantes de doutorado supervisionados por Hydén em Lund na década de 1990. Após defender uma tese sobre o funcionamento da lei sueca contra a discriminação étnica, ele se transferiu para o Reino Unido, onde atuou junto ao Centro de Estudos Sociojurídicos da Universidade de Oxford antes de assumir uma posição como professor de sociologia do direito na Faculdade de Direito da Universidade de Westminster, em Londres. Na esteira do debate suscitado na Retfærd, buscou retratar a diversidade de abordagens teórico-metodológicas da sociologia do direito contemporânea (BANAKAR: TREVERS, 2002, 2005). Em 2013, já como um sociólogo do direito consagrado, ele retornaria a Lund para assumir a cátedra outrora ocupada por Hydén.

É com certa naturalidade que Banakar se dirige aos sociólogos do direito escandinavos na Retfærd. Mesmo na Dinamarca, onde a influência de Ross constituíra um entrave para o desenvolvimento da sociologia do direito, que acabou se acomodando ao esquema de divisão do trabalho científico com a dogmática jurídica, os estudos sociojurídicos afloravam em finais da década de 1990 (HAMMERSLEV; MADSEN, 2014HAMMERSLEV, Ole; MADSEN, Mikael. The return of sociology in Danish socio-legal studies: a survey of recent trends. International Journal of Law in Context, v. 10, n. 3, p. 397-415, 2014.). Engajaram-se no debate Dalberg-Larsen (1940-2016), professor em Aarhus, interessado na perspectiva do pluralismo jurídico em um momento em que o Estado social era posto à prova, diante de desafios como a integração na União Europeia e a chegada à Escandinávia de imigrantes das mais diversas regiões do planeta; e Petersen, professora de Copenhague conhecida por estender a perspectiva do pluralismo jurídico para os estudos de gênero (1992). As perspectivas do pluralismo jurídico e dos estudos feministas também despontavam nos trabalhos de outras duas debatedoras, Sand e Hellum, professoras em Oslo. Os interlocutores de Banakar podiam até divergir sobre o que definia a identidade da sociologia do direito, mas se reconheciam enquanto integrantes de uma mesma comunidade científica.

3 Como a identidade da sociologia do Direito deve ser definida?

O artigo inaugural do debate na Retfærd sustenta que a sociologia do direito consiste em “[...] um campo de investigação dinâmico que oferece oportunidades quase ilimitadas de pesquisa” (BANAKAR, 1998BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998.: 3, tradução nossa). Em vez de se constituir em um ramo da ciência do direito ou da sociologia, a sociologia do direito oferece uma perspectiva para a abordagem científica do fenômeno jurídico, apresentando-se por vezes sob outras denominações, tais como direito e sociedade, estudos sociojurídicos, movimento sociológico do direito, análise sociológica do direito etc. (BANAKAR, 1998BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998.: 3-4). Essa afirmação permanece incontroversa no debate: a sociologia do direito é uma especialidade reconhecida da pesquisa científica, sendo praticada pelos membros da comunidade sociojurídica.

Banakar se refere aos sociólogos do direito como membros de uma comunidade cientifica sem recorrer diretamente ao conceito de paradigma científico, de modo compatível com a teoria dos paradigmas (KUHN, 1970KUHN, Thomas. The structure of scientific revolutions. 2. ed. Chicago: University of Chicago Press, 1970.: 176). Conforme essa teoria, uma comunidade científica é definida sociologicamente como um grupo de pesquisadores especializados em uma área reconhecida do conhecimento científico que passaram por um processo de formação educacional e treinamento profissional similar, aprendendo a fazer pesquisa científica por uma mesma literatura técnica padrão. Esses pesquisadores tendem a se comunicar facilmente entre si em conferências, revistas especializadas e redes acadêmicas, emitindo juízos profissionais relativamente consensuais em seus pressupostos e perseguindo fins comuns, entre os quais a preparação das próximas gerações de cientistas (KUHN, 1970KUHN, Thomas. The structure of scientific revolutions. 2. ed. Chicago: University of Chicago Press, 1970.: 177-178).

Não obstante, Banakar também afirma que a sociologia do direito apresenta “deficiências paradigmáticas” (1998). Ao seu ver, a sociologia do direito se configura como uma especialidade científica “altamente fragmentada”, que se desenvolve de forma “desordenada e aparentemente não cumulativa” (BANAKAR, 1998BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998.: 3, tradução nossa). As pesquisas sociojurídicas carecem de “coerência intelectual” e “suposições básicas comuns”, predominando os “desacordos”, a “falta de consensos” e uma “miríade de abordagens alternativas sectárias” (BANAKAR, 1998BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998.: 3-4, tradução nossa). Em suma, as diversas orientações teórico-metodológicas existentes se mostram insuficientes para estabelecer fundações sólidas para a pesquisa sociojurídica, determinando quais são os problemas de pesquisa passíveis de formulação e como se deve proceder para respondê-los (BANAKAR, 1998BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998.: 3-5).

O argumento de Banakar sugere que os membros da comunidade sociojurídica não compartilham um paradigma científico nos termos propostos por Kuhn, isto é, carecem de um acordo intersubjetivo acerca do modelo normal de produção do conhecimento em seu respectivo campo de investigação (1970: 177-178). Visando superar esse estado de subdesenvolvimento paradigmático da sociologia do direito, Banakar (1998)BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998. suscita um debate sobre o conteúdo do paradigma adequado para guiar de maneira unificada a pesquisa sociojurídica contemporânea. Mathiesen (1998)MATHIESEN, Thomas. Is it all that bad to be a stepchild? Comments on the state of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 83, p. 67-76, 1998. e Hydén (1999)HYDÉN, Håkan. Even a stepchild eventually grows up: on the identity of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 22, n. 85, p. 71-80, 1999. seguem essa linha de reflexão epistemológica, mesmo propondo soluções bem diferentes para a questão da identidade da sociologia do direito.

3.1 A proposta de Banakar: matrizes teóricas como paradigmas

Para Banakar (1998)BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998., a ausência de um paradigma guiando de forma mais sistemática a pesquisa sociojurídica sinaliza a imaturidade da sociologia do direito como especialidade científica. Metaforicamente, ela está deixando a infância e ingressando na adolescência, uma fase caracterizada pela crise de identidade. Esse é o primeiro sentido do termo stepchild, utilizado no debate para designar a sociologia do direito. No entanto, esse termo também assume uma segunda conotação: a sociologia do direito como “criança” em crise de identidade não tivera uma infância comum, pois desde sempre fora tratada como “bastarda”.19 19 Banakar faz alusão a um artigo de Parsons (1977) problematizando as razões pelas quais cientistas sociais deixaram de se interessar pelo fenômeno jurídico, relegando-o à condição de objeto ilegítimo de pesquisa. A expressão “criança bastarda” preserva sentido pejorativo equivalente ao do termo em inglês, enfatizando a ideia de ilegitimidade na origem que marcaria a sociologia do direito, enquanto fruto de um cruzamento indevido entre o direito e a sociologia.

Na metáfora da stepchild, as causas das “deficiências paradigmáticas” da sociologia do direito residem na sua relutância em se emancipar, afastando-se dos seus “pais” e se afirmando como uma ciência adulta, com identidade própria (BANAKAR, 1998BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998.: 3-5). A pesquisa sociojurídica tende a ser renegada tanto por sociólogos, devido à insuficiente sofisticação teórico-metodológica, quanto por juristas, por sua escassa utilidade para a prática profissional do direito. Diante dessa dupla rejeição, os sociólogos do direito têm seguido caminhos polarizados que, para Banakar, são parte do problema, mais que da solução: um grupo cada vez maior se utiliza de uma abordagem estrutural-funcionalista para responder qualquer problema de pesquisa,20 20 Banakar refere-se aqui explicitamente aos “sistêmicos”, adeptos da teoria dos sistemas de Niklas Luhmann. tomando emprestado o conceito restrito de direito adotado na prática jurídica e contornando as dificuldades metodológicas que envolvem o estudo empírico da ação social de seres humanos concretos; enquanto outro se concentra na coleta de dados empíricos para utilização na argumentação jurídica,21 21 É provável que ele tenha em mente, em sua crítica, o que se conhece no Brasil por “jurimetria” e formas afins de análise instrumental de dados empíricos. produzindo um saber instrumental para as profissões jurídicas (BANAKAR, 1998BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998.: 6-15).

Considerando esses obstáculos epistemológicos, Banakar destaca duas perspectivas que têm contribuído para transformar os estudos sociojurídicos: a perspectiva feminista, que busca entender o modo pelo qual as relações de gênero são produzidas e reproduzidas socialmente, integrando os níveis micro e macrossociológico de análise, valorizando a interdisciplinaridade e enfocando os sujeitos da ação social; e a perspectiva do pluralismo jurídico, que ilumina as diversas ordens normativas coexistentes nas sociedades contemporâneas, desafiando visões ideológicas de que o Estado é a fonte exclusiva de todo o direito (BANAKAR, 1998BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998.: 15-18). Na sua percepção, a comunidade sociojurídica também pode se unir assumindo uma tarefa comum, qual seja, compreender o funcionamento do direito de forma contextualizada e considerando as suas diferentes manifestações na vida social.

Por fim, Banakar identifica duas “matrizes teóricas” (1998: 18-19) desenvolvidas para orientar estudos sociojurídicos que angariaram muitos adeptos na comunidade sociojurídica, podendo vir a assumir o papel de paradigmas fundamentais da sociologia do direito: a teoria da autopoiese do direito, desenvolvida por Gunther Teubner (1993)TEUBNER, Günther. Law as an autopoietic system. Oxford: Blackwell, 1993., e a teoria do pluralismo jurídico, elaborada por Boaventura de Sousa Santos (1995)SANTOS, Boaventura de Sousa. Toward a new common sense: law, science and politics in the paradigmatic transition. London: Routledge, 1995.. Contudo, em sua análise sobre o potencial dessas duas construções teóricas para estabelecer fundações mais consistentes para a pesquisa sociojurídica, Banakar não poupa críticas à teoria da autopoiese do direito, restando implícito em seu argumento a defesa da teoria do pluralismo jurídico como a mais adequada para a compreensão do direito como fenômeno social (1998: 19).

A proposta de Banakar, entretanto, foi duramente criticada no debate escandinavo. Dalberg-Larsen considera indesejável que uma ou algumas poucas matrizes teóricas se tornem dominantes na sociologia do direito (2000: 34). Mesmo revelando sua simpatia pela perspectiva do pluralismo jurídico e sua antipatia pela perspectiva sistêmica, ele não deixa de considerar como válida a escolha de utilizar conceitos da teoria dos sistemas para guiar pesquisas empíricas (2000: 29-34). Sand também afirma rejeitar “[...] a necessidade de se encontrar uma grande teoria única ou dominante para o campo” (2000: 55, tradução nossa), mas como adepta da perspectiva sistêmica defende ao longo de seu artigo as qualidades da teoria da autopoiese para a compreensão sociológica do direito. Hydén igualmente rechaça a ideia de que uma matriz teórica possa vir a integrar a diversidade de vertentes teórico-metodológicas existentes na sociologia do direito contemporânea (1999: 72). As objeções mais contundentes à proposta de Banakar, entretanto, vieram de Mathiesen.

3.2 A crítica de Mathiesen: paradigmas funcionam como camisas de força

Mathiesen assinala que Banakar nem sempre utiliza o conceito de paradigma de modo unívoco (1998: 67). Na sua leitura da teoria de Kuhn, um paradigma científico significa “[...] um conjunto mais ou menos unificado, sistemático e coerente de pressupostos e imaginários, adotados em uma especialidade científica em dado momento histórico, que servem para guiar a teorização e a pesquisa em determinada direção” (MATHIESEN, 1998MATHIESEN, Thomas. Is it all that bad to be a stepchild? Comments on the state of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 83, p. 67-76, 1998.: 67, tradução nossa). Para Mathiesen, ora Banakar se aproxima desse conceito ao se referir ao paradigma dogmático, ora se afasta ao indicar as teorias da autopoiese do direito e do pluralismo jurídico como potenciais candidatas a funcionar como paradigmas fundamentais.

De fato, Banakar não menciona ao longo do seu artigo a obra de Kuhn, mas sim um trabalho de George Ritzer (1975)RITZER, George. Sociology: a multiple paradigm science. The American Sociologist, v. 10, n. 3, p. 156-167, 1975., que ao utilizar a teoria dos paradigmas para explicar a prática científica na sociologia, interpreta-a de forma bastante peculiar. De acordo com Ritzer, há três paradigmas fundamentais que competem entre si por hegemonia na sociologia contemporânea, tornando-a uma ciência multiparadigmática: os paradigmas do “fato social”, da “definição social” e do “comportamento social” (1975: 158-163). Porém, Ritzer equipara paradigmas a matrizes teóricas ao enumerar esses três tipos ideais que explicariam a prática científica dos sociólogos. Assim, se distancia do conceito original de Kuhn, para quem um paradigma científico designa “[...] a constelação inteira de crenças, valores, técnicas etc., compartilhada pelos membros de uma dada comunidade” (1970: 175, tradução nossa).

Tendo feito essa objeção, Mathiesen sugere que a dogmática jurídica como ciência está presa a um paradigma científico no sentido de Kuhn, ao passo que a sociologia geral tende a ser disciplinada por múltiplos paradigmas fundamentais no sentido de Ritzer, isto é, matrizes teóricas que encorajam pesquisa cumulativa durante algum tempo, mas logo acabam sendo substituídas por outras (1998: 71). Ele ilustra o argumento sobre o caráter passageiro das matrizes teóricas na sociologia fazendo referência a construtos teóricos que obtiveram adesão massiva em determinado momento histórico, como é o caso do funcionalismo estrutural de Talcott Parsons no segundo pós-guerra, mas foram completamente abandonados mais tarde (MATHIESEN, 1998MATHIESEN, Thomas. Is it all that bad to be a stepchild? Comments on the state of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 83, p. 67-76, 1998.: 68-71). Fazendo uso de uma metáfora própria a um criminólogo crítico, Mathiesen afirma que paradigmas, em ambos os sentidos, funcionam como “camisas de força”, tolhendo a produção criativa de pesquisa (1998: 71)

Para Mathiesen, a condição de stepchild tem as suas vantagens: “[...] a sociologia do direito, em contraste com as suas disciplinas parentais, proporciona liberdade” (1998: 71, tradução nossa). Ele evoca suas memórias sobre os tempos áureos do Instituto Norueguês de Pesquisa Social, onde sociólogos do direito, juristas, cientistas políticos e sociólogos trocavam saberes entre si e em diálogo com ativistas sociais; e sobre o conflitivo ambiente da Faculdade de Direito de Oslo, onde aprendera muito sobre o funcionamento do direito na sociedade (1998: 73). Se ideias, teorias e interpretações são elementos que estimulam a crítica e a inovação, também podem aprisionar o pensamento, sobretudo quando um ou outro teórico – Luhmann, Teubner, Santos etc. – se transforma em estrela-guia (MATHIESEN, 1998MATHIESEN, Thomas. Is it all that bad to be a stepchild? Comments on the state of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 83, p. 67-76, 1998.: 72-74). Portanto, o ecletismo teórico-metodológico possibilitado pela falta de paradigmas constitui-se em uma virtude da sociologia do direito (MATHIESEN, 1998MATHIESEN, Thomas. Is it all that bad to be a stepchild? Comments on the state of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 83, p. 67-76, 1998.: 74).

Ao que tudo indica, as críticas de Mathiesen foram determinantes para que Banakar reconhecesse, no artigo de fechamento do debate na Retfærd, que não há lugar para qualquer forma de “autocracia teórica” nos estudos sociojurídicos (2001: 6). Se o seu texto autorizara a interpretação de que uma única teoria dominante seria preferível à coexistência de múltiplas perspectivas, então ele concede que falhara na execução da tarefa a que se propusera ao suscitar uma reflexão sobre a identidade da sociologia do direito (2001: 6). Sua intenção não fora provocar “um debate sectário sobre a ‘forma certa’ de definir, ou conduzir, pesquisa na sociologia do direito” (2001: 4, tradução nossa). Na atualidade, “ninguém pode mostrar a direção”, “não há Alexandre, o Grande, [...] que possa liderar o caminho à Índia22 22 Durante a Antiguidade, Alexandre empreendeu campanhas militares expandindo o Império da Macedônia pela Europa, África e Ásia. Derrotando a Pérsia, chegou a invadir a Índia, mas faleceu antes de conquistá-la. (BANAKAR, 2001BANAKAR, Reza. A passage to ‘India’: toward a transformative interdisciplinary discourse on law and society. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 24, n. 92, p. 3-21, 2001.: 3, tradução nossa). Não passa de uma vã ilusão confiar a um ou outro grande teórico a capacidade de ditar como se deve fazer pesquisa em sociologia do direito.

Na opinião de Banakar, a liberdade para escolher temas, teorias e métodos é um valor a ser preservado. Porém, “o endosso dessa ideia de liberdade de pesquisa não deve nos enganar a ponto de subscrevermos o entendimento tácito de que a sociologia do direito é um campo em que ‘vale tudo’ ou em que a roda precisa ser reinventada o tempo todo” (BANAKAR, 2001BANAKAR, Reza. A passage to ‘India’: toward a transformative interdisciplinary discourse on law and society. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 24, n. 92, p. 3-21, 2001.: 4, tradução nossa). Quanto maior for o grau de maturidade alcançado pela sociologia do direito, maiores serão as exigências em relação aos padrões a serem seguidos na produção de conhecimentos (BANAKAR, 2001BANAKAR, Reza. A passage to ‘India’: toward a transformative interdisciplinary discourse on law and society. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 24, n. 92, p. 3-21, 2001.: 4). Assim, a busca por um paradigma, não na forma de uma teoria geral definitiva, mas de uma “matriz discursiva reflexiva” que direcione os estudos sociojurídicos a empreender uma jornada transformativa com resultado incerto, continua tão necessária para o desenvolvimento da sociologia do direito quanto foi para a expansão da Macedônia, na Antiguidade, a busca de “uma passagem para a Índia” (BANAKAR, 2001BANAKAR, Reza. A passage to ‘India’: toward a transformative interdisciplinary discourse on law and society. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 24, n. 92, p. 3-21, 2001.: 4-5).

O apelo de Banakar por um “discurso disciplinar transformativo ou guarda-chuva meta-teórico capaz de abranger diversas teorias” (2001: 9, tradução nossa) encontra sustentação na teoria dos paradigmas de Kuhn, mais que na de Ritzer. Uma ciência eclética, receptiva a qualquer abordagem teórico-metodológica, é uma ciência sem identidade definida. Em uma comunidade científica madura, a agência de um pesquisador, sua liberdade de escolha teórico-metodológica, está condicionada por um paradigma científico. Isso implica definir o que é especial na sociologia do direito em relação a outras especialidades cientificas, justificando cátedras universitárias, centros de pesquisa, periódicos especializados e livros-texto para explicar seus problemas de pesquisa, suas teorias e seus métodos.

3.3 A proposta de Hydén: o interesse temático comum deve ser o fator integrador

Hydén também entende que a sociologia do direito, a despeito das tensões e confrontações interdisciplinares a que está submetida, precisa se desprender das especialidades que a originaram, a sociologia e o direito, para se afirmar enquanto ciência autônoma (1999: 71). Nesse aspecto, ele concorda com a narrativa metafórica de Banakar: a sociologia do direito “[...] até agora, tendo passado pela puberdade, preocupou-se mais em atacar um de seus genitores, o direito (o pai?) com o suporte do outro, a sociologia (a mãe?), o que resultou na sua rejeição pelo pai” (HYDÉN, 1999HYDÉN, Håkan. Even a stepchild eventually grows up: on the identity of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 22, n. 85, p. 71-80, 1999.: 72, tradução nossa). Porém, Hydén mostra os limites dessa metáfora: em seu artigo, Banakar ignora que, no direito, a prática profissional e a ciência jurídica são ontologicamente distintas, inexistindo na sociologia um campo específico de atividade prático-profissional comparável ao do direito (1999: 73).

Como a sociologia do direito pretende conduzir pesquisa científica sobre o direito, mas não estabelecer um campo prático-profissional, não faz sentido falar de um embate entre o saber científico do sociólogo do direito e o saber jurídico do jurista. Os sociólogos do direito não participam diretamente de processos decisórios relativos a conflitos concretos, apenas observam externamente as ações sociais a fim de produzir discursos explicativos do funcionamento do direito (HYDÉN, 1999HYDÉN, Håkan. Even a stepchild eventually grows up: on the identity of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 22, n. 85, p. 71-80, 1999.: 74-75). A relação entre os sociólogos do direito e os cientistas do direito, por outro lado, é efetivamente problemática. Como a dogmática jurídica se apresenta na condição de ciência tradicional do direito, o sociólogo do direito se vê obrigado a desconstruí-la, denunciando o seu caráter ideológico, sem deixar de reconhecer sua função social na orientação da prática jurídica (HYDÉN, 1999HYDÉN, Håkan. Even a stepchild eventually grows up: on the identity of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 22, n. 85, p. 71-80, 1999.: 73-75). Os conceitos da dogmática jurídica entram em conflito com a racionalidade das ciências sociais e, portanto, se mostram inadequados como ponto de partida para a pesquisa científica sobre o direito.

Embora Hydén concorde com a importância de se resolver o problema da identidade da sociologia do direito para a produção de pesquisa sociojurídica cumulativa e sistemática, ele descarta a solução de buscar uma matriz teórica unitária. Na sua visão, os sociólogos do direito precisam compartilhar um objeto característico de investigação (HYDÉN, 1999HYDÉN, Håkan. Even a stepchild eventually grows up: on the identity of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 22, n. 85, p. 71-80, 1999.: 72), assim como ocorre com outros grupos de cientistas sociais, a exemplo dos cientistas políticos (o poder político), antropólogos (a cultura), geógrafos culturais (o espaço social), economistas (a produção e circulação de bens), historiadores (o tempo social) e psicólogos sociais (a psique). Mesmo em especialidades emergentes como os estudos feministas, a unificação da pesquisa, ao fim e ao cabo, depende da existência de um objeto comum: no caso, as relações de gênero. Isso porque a sociedade é um objeto de estudo complexo, podendo ser recortado tematicamente de diversas formas para fins de investigação científica (HYDÉN, 1999HYDÉN, Håkan. Even a stepchild eventually grows up: on the identity of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 22, n. 85, p. 71-80, 1999.: 73).

Se o conceito de direito da dogmática jurídica não pode ser tomado como ponto de partida, como definir o interesse temático comum à comunidade sociojurídica? Para Hydén, a resposta passa por encarar de forma positiva a herança genética da sociologia do direito, buscando o denominador comum entre os interesses dos cientistas do direito e os dos sociólogos gerais; na sua visão, ambos estão interessados no estudo das normas (1999: 76-77). Essencialmente, a sociologia do direito tem como tarefa científica explicar como as normas sociais e jurídicas determinam as ações normativas, isto é, os comportamentos humanos parcial ou integralmente motivados por normas societais empiricamente observáveis (HYDÉN, 1999HYDÉN, Håkan. Even a stepchild eventually grows up: on the identity of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 22, n. 85, p. 71-80, 1999.: 75-80). Portanto, segundo a proposta de Hydén, o estudo das normas societais deve constituir o cerne da sociologia do direito.

A proposta de Hydén foi vista com alguma desconfiança tanto por Mathiesen quanto por Banakar. Por que considerar as normas como o âmago da sociologia do direito em detrimento das relações de poder, por exemplo? (MATHIESEN, 1999: 74-75). Uma teoria das normas poderia mesmo ser algo qualitativamente diverso de outros tantos construtos teóricos utilizados na sociologia do direito, a ponto de definir suas tarefas científicas? (BANAKAR, 2001BANAKAR, Reza. A passage to ‘India’: toward a transformative interdisciplinary discourse on law and society. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 24, n. 92, p. 3-21, 2001.: 5-6). No entanto, ambos são receptivos à construção de uma teoria das normas com base em conceitos sociológicos. Banakar, em especial, considera que a proposta de Hydén tem o mérito de resgatar uma preocupação própria ao projeto científico de percursores como Ehrlich, remetendo aos conceitos que compõem o universo discursivo da comunidade sociojurídica (2001: 13).

No texto de fechamento do debate, Banakar faz referência à criminologia como exemplo de especialidade científica que construiu uma identidade própria (2001: 10), preocupando-se em entender o que há de especial na sociologia do direito em relação a outras especialidades existentes no âmbito das ciências sociais. Ele insiste na necessidade de manter viva a busca por um paradigma, a fim de reforçar institucionalmente a autonomia da sociologia do direito (2001: 19). Porém, sintetiza esse projeto com uma indagação diferente: há algum conceito na sociologia do direito que permita formular um problema comum aos estudos sociojurídicos, salvaguardados interesses temáticos e orientações teórico-metodológicas singulares? (BANAKAR, 2001BANAKAR, Reza. A passage to ‘India’: toward a transformative interdisciplinary discourse on law and society. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 24, n. 92, p. 3-21, 2001.: 14). Buscando responder essa questão, Banakar defende implicitamente uma concepção pluralista do direito como pilar do paradigma sociojurídico (2001: 15). A noção de pluralismo jurídico passa a ser tratada já não mais como uma construção teórica de um sociólogo do direito em específico, mas antes como um conceito basilar do universo discursivo transformador da sociologia do direito.

4 Considerações finais: As lições do debate escandinavo

O debate escandinavo sobre a identidade da sociologia do direito foi travado em um momento em que a realização de estudos sociojurídicos já havia se tornado uma prática acadêmica rotineira. A trajetória singular da sociologia do direito na Escandinávia, alavancada pelo realismo jurídico e pela sociologia geral, está associada ao pioneirismo de pesquisadores como Aubert, na Universidade de Oslo, e Stjernquist, na Universidade de Lund. Entre as décadas de 1960 e 1970, período de apogeu do modelo do Estado social na Noruega e Suécia, eles impulsionaram uma agenda de pesquisa sociojurídica empírica sobre as funções do direito, rejeitando radicalmente a solução de compromisso proposta pela escola do positivismo jurídico contemporâneo, qual seja, a divisão do trabalho entre cientistas do direito e cientistas sociais. No contexto em que se insere o debate entre Banakar, Mathiesen e Hydén, a ruptura com o paradigma dogmático na pesquisa científica em direito não mais se colocava como o principal desafio, pois já estava consumada.

A julgar pelo caso da Escandinávia, quando a sociologia do direito institucionalizada de fato se consolida, o confronto epistemológico com a dogmática jurídica se torna inevitável. Isso ocorre porque a sociologia do direito é incompatível com o paradigma dogmático, ou seja, com os elementos norteadores da produção de conhecimentos na ciência tradicional do direito, como o objeto (direito positivo estatal vigente), a tarefa (descrição das normas do ordenamento jurídico), a metodologia (construção doutrinária de um sistema de normas segundo procedimentos lógico-formais) e a finalidade (busca da certeza e segurança jurídica na decisão de conflitos submetidos a autoridades). Utilizando a metáfora de Banakar, uma solução de compromisso na forma de divisão do trabalho científico certamente facilita a aceitação da stepchild pelo lado paterno, mas se constitui em um obstáculo epistemológico permanente para o desenvolvimento da sociologia do direito.

Se uma mudança do paradigma dominante na pesquisa científica sobre o direito, isto é, uma “revolução científica” (KUHN, 1970KUHN, Thomas. The structure of scientific revolutions. 2. ed. Chicago: University of Chicago Press, 1970.), eventualmente resultar do embate entre sociologia do direito e dogmática jurídica, isso não abalará a prática jurídica necessariamente. Ainda que a dogmática jurídica perca o status de ciência, os modelos jurídicos dogmáticos continuarão a ser ensinados e desenvolvidos, pois permanecerão úteis para os profissionais do direito atuando no âmbito do campo jurídico, comprometidos com a construção de soluções para problemas práticos de interpretação do direito. É também desejável que a pesquisa sociojurídica tenha impacto na argumentação jurídica, mas os sucessos e fracassos do realismo jurídico escandinavo mostram o quanto essa virtualidade depende de uma ciência autônoma. Banakar, Mathiesen e Hydén são sociólogos do direito que de modo algum desprezam os estudos doutrinários, embora não os reconheçam como produtos resultantes de investigação científica.

Ao recorrer às teorias e métodos das ciências sociais, seja para descontruir os conhecimentos da ciência tradicional do direito, seja para produzir pesquisa sociojurídica, os sociólogos do direito têm buscado abrigo no interior de uma comunidade científica há muito estabelecida. O papel desempenhado pelo RCSL/ISA para a institucionalização dos estudos sociojurídicos, não só na Escandinávia, ilustra bem este ponto. Considerar o contexto social, valorizar a pesquisa empírica, buscar a compreensão do funcionamento da sociedade, são elementos que definem tanto a atividade dos sociólogos do direito quanto a dos demais cientistas sociais. Porém, as comunidades científicas, assim como os paradigmas, existem em diferentes níveis (KUHN, 1970KUHN, Thomas. The structure of scientific revolutions. 2. ed. Chicago: University of Chicago Press, 1970.: 177). Assim como a comunidade sociojurídica precisa se inserir na comunidade mais ampla dos cientistas sociais, também almeja se diferenciar em relação a outros grupos, tais como antropólogos, cientistas políticos, geógrafos culturais e sociólogos gerais. Os laços estreitos com o lado materno oferecem conforto para a stepchild, mas constituem outro obstáculo epistemológico para a sua maturidade.

As posições dos representantes das sucessivas gerações da sociologia do direito escandinava mostram que à medida que o processo de institucionalização avança tende a se reforçar a busca por um paradigma. Afinal, quanto maior o desenvolvimento de uma especialidade científica, mais exigentes se tornam os padrões de produção do conhecimento. A pesquisa científica sociojurídica já não mais consegue se diferenciar apenas por ser contrária ao paradigma dogmático ou estar inserida no âmbito das ciências sociais. Esses atributos híbridos são importantes, mas insuficientes para definir a sua identidade. Descrever o direito em seu contexto social (tarefa), pesquisar empiricamente o direito (metodologia) e buscar explicar como funciona o direito na vida social (finalidade) são elementos importantes para definir o conteúdo do paradigma compartilhado pela comunidade sociojurídica, que se mostram compatíveis com a inserção dos sociólogos do direito no âmbito da comunidade mais abrangente dos cientistas sociais. Contudo, estabelecer o que deve ser considerado direito para fins de delimitação do objeto de estudo torna-se difícil, pois a rejeição de um conceito hermético e rigoroso é corolário da negação do paradigma dogmático.

Como lembra Zuleta Puceiro, “a decisão de rechaçar um paradigma implica sempre – e simultaneamente – a de aceitar outro” (1981: 280, tradução nossa). Logo, esse aspecto problemático do debate sobre a identidade da sociologia do direito precisa ser enfrentado, sem sacrificar a diversidade de abordagens teóricas e metodológicas existentes. A defesa da noção do pluralismo jurídico como um dos elementos basilares do paradigma sociojurídico, que encontra sustentação no debate escandinavo, surge como possível resposta para essa questão. Porém, não significa a defesa de uma entre tantas teorias analíticas da pluralidade normativa (como a do próprio Hydén). É um erro confundir uma matriz teórica preponderante entre os sociólogos do direito em determinado contexto espaço-temporal com um paradigma científico. Ao final do debate, Banakar reconhece que “a questão para o futuro da sociologia do direito não é saber se a teoria dos sistemas de Luhmann, ou qualquer outra teoria, fornece a teoria adequada e definitiva do direito em sociedade” (2001: 10).

O debate escandinavo permite formular uma hipótese sobre os elementos basilares que conformam o paradigma que confere identidade à sociologia do direito na atualidade. Porém, ainda que as posições de Banakar, Mathiesen e Hydén reflitam pontos de vista presentes no imaginário da comunidade sociojurídica, nenhum deles se preocupou em investigar empiricamente as percepções dos pesquisadores sociojurídicos para retratar os elementos que definem o paradigma sociojurídico, tal como propõe Kuhn (1970KUHN, Thomas. The structure of scientific revolutions. 2. ed. Chicago: University of Chicago Press, 1970.: 176). Inclusive, é provável que essas percepções não sejam as mesmas em diferentes contextos espaço-temporais, a depender do grau de institucionalização da sociologia do direito. Compreender essas percepções é importante, na medida em que influenciam decisivamente os rumos da pesquisa sociojurídica em contextos como o brasileiro.

No Brasil de princípios do século XXI, a institucionalização de uma comunidade científica sociojurídica tem sido impulsionada por iniciativas como a fundação, em 2010, da Associação Brasileira de Pesquisadores em Sociologia do Direito (ABraSD), e a articulação, em 2011, da Rede de Estudos Empíricos em Direito (REED); entidades que têm editado periódicos científicos especializados, promovido encontros científicos anuais e apoiado o lançamento de editais de fomento à pesquisa empírica. Ao que parece, abrem-se no país perspectivas promissoras para os estudos sociojurídicos (SÁ E SILVA, 2016SÁ E SILVA, Fábio. Vetores, desafios e apostas possíveis na pesquisa empírica em direito no Brasil. Revista de Estudos Empíricos em Direito, v. 3, n. 1, p. 23-53, 2016.). Se a sociologia do direito é, hoje, uma especialidade reconhecida da pesquisa científica desenvolvida nacionalmente, sua consolidação se deve à formação de uma comunidade científica, a exemplo do que ocorreu na Escandinávia. Não seria exagero supor, diante do grau de institucionalização alcançado pela comunidade sociojurídica na atualidade, que também no contexto brasileiro já existem elementos basilares conformando o paradigma científico que guia a pesquisa sociojurídica, similares aos identificados no debate escandinavo. É chegada a hora de suscitar, também por aqui, a interrogação: qual é, afinal, a identidade da sociologia do direito?

  • 1
    Este artigo é produto do projeto de pesquisa A Sociologia do Direito em Busca de uma Identidade: Debates Clássicos e Contemporâneos, desenvolvido em colaboração com a equipe de trabalho do Grupo de Pesquisa Direito e Sociedade (GPDS) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Chamada Universal – MTCI/CNPq n. 14/2014, Processo 444686/2014-2. Os autores também agradecem aoOñati International Institute for the Sociology of Law(IISL), Espanha, e àLunds Universitet, Suécia, por facilitarem o acesso aos seus acervos bibliográficos.
  • 2
    Por exemplo, o debate entre Eugen Ehrlich e Hans Kelsen no contexto do Império Austro-húngaro do início do século XX (KONZEN; BORDINI, 2019KONZEN, Lucas P.; BORDINI, Henrique S. Sociologia do direito contra dogmática: revisitando o debate Ehrlich-Kelsen. Revista Direito e Práxis, v. 10, n. 1, p. 303-334, 2019.) é anterior à institucionalização; e o debate entre Renato Treves e Norberto Bobbio na Itália dos anos 1970 transcorreu durante este processo (KONZEN; RENNER, 2019KONZEN, Lucas P.; RENNER, Marjorie C. Em defesa da divisão do trabalho científico: o debate Treves-Bobbio e a institucionalização da sociologia do direito na Itália. Revista Brasileira de Sociologia do Direito, v. 6, n. 1, p. 42-66, 2019.).
  • 3
    A Retfærd também publicou textos dos dinamarqueses Hanne Petersen (2000)PETERSEN, Hanne. Forgoing new identities in the global family? Challenges for prescriptive and descriptive normative knowledge. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 23, n. 90, p. 46-54, 2000. e Jørgen Dalberg-Larsen (2000) e das norueguesas Inger Johanne Sand (2000)SAND, Inger Johanne. A future or a demise for the theory of the sociology of law: law as a normative, social and communicative function of society. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 23, n. 90, p. 55-75, 2000. e Anne Hellum (2000)HELLUM, Anne. How to improve the doctrinal analyses of legal pluralism: a comparison of legal doctrine about custom and local law in Zimbabwe and Norway. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 23, n. 89, p. 40-62, 2000.. Petersen e Hellum, todavia, não se engajam na discussão epistemológica; e as reflexões de Dalberg-Larsen e Sand são mais pontuais.
  • 4
    Neste trabalho, não são analisadas diretamente fontes em sueco, dinamarquês e norueguês, uma limitação que pode ser relativizada considerando que o inglês é a língua franca dos cientistas sociais escandinavos.
  • 5
    Confira, entre outros, Zuleta Puceiro (1981), Faria (1988)FARIA, José Eduardo. Eficácia jurídica e violência simbólica: o direito como instrumento de transformação social. São Paulo: EDUSP, 1988., Hagen (1995)HAGEN, Johann. Rivalità dei paradigmi nelle scienze giuridiche: la dogmatica giuridica e la sociologia del diritto come paradigmi in competizione. Sociologia del diritto, v. 22, n. 2, p. 5-18, 1995. e Andrade (2003)ANDRADE, Vera. Dogmática jurídica: escorço de sua configuração e identidade. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003..
  • 6
    Para uma síntese da história da Escandinávia, veja Derry (1980). Para um apanhado introdutório à realidade histórico-cultural escandinava a partir de uma perspectiva brasileira, consulte Guimarães (2016)GUIMARÃES, Paulo. Os escandinavos. São Paulo: Contexto, 2016..
  • 7
    Para uma leitura escandinava da gênese da dogmática jurídica, veja Sandström (2005)SANDSTRÖM, Marie. The concept of legal dogmatics revisited. In: BANKOWSKI, Zenon (Ed.). Epistemology and ontology: IVR-Symposium Lund 2003. Stuttgart: Franz Steiner Verlag, 2005. p. 133-140..
  • 8
    Análises sobre as funções da dogmática jurídica são encontradas em Ferraz Jr. (1980) e Andrade (2003)ANDRADE, Vera. Dogmática jurídica: escorço de sua configuração e identidade. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003..
  • 9
    É célebre o embate entre Eduard Bernstein e Rosa Luxemburgo no caso do Partido Social-democrata Alemão. Para uma análise da ideologia social-democrata no movimento socialista, veja Przeworski (1985)PRZEWORSKI, Adam. Capitalism and social democracy. Cambridge: Cambridge University Press, 1985..
  • 10
    Sobre a ascensão política dos social-democratas na Escandinávia, veja Brandal, Bratberg e Thorsen (2013)BRANDAL, Nik; BRATBERG, Øivind; THORSEN, Bratberg. The Nordic model of democracy. London: Palgrave Macmillan, 2013..
  • 11
    A literatura sobre o realismo jurídico escandinavo é vasta; veja, entre outros, Bjarup (2005)BJARUP, Jes. The philosophy of Scandinavian legal realism. Ratio Juris, v. 18, n. 1, p. 1-15, 2005. e Strang (2009)STRANG, Johan. Two generations of Scandinavian legal realists. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 32, n. 1, p. 62-82, 2009..
  • 12
    Karl Llewellyn e Jerome Frank estão entre os principais expoentes do realismo jurídico americano; para uma síntese, veja Leiter (2005)LEITER, Brian. American legal realism. In: GOLDING, Martin; EDMUNDSON, William (Ed.). The Blackwell guide to the philosophy of law and legal theory. Malden: Blackwell Publishing, 2005. p. 50-66.; para uma vívida narrativa sobre as origens desta escola, veja Giacomuzzi (2005)GIACOMUZZI, José Guilherme. As raízes do realismo americano: breve esboço acerca de dicotomias, ideologia e pureza no direito dos EUA. Direito & Justiça, v. 31, n. 2, p. 155-190, 2005..
  • 13
    Sobre essa escola, a mais influente no pensamento jurídico do século XX, consulte Barzotto (1999)BARZOTTO, Luis Fernando. O positivismo jurídico contemporâneo: uma introdução a Kelsen, Ross e Hart. São Leopoldo: UNISINOS, 1999..
  • 14
    Para a trajetória da sociologia na Suécia, confira Larsson e Magdalenić (2015)LARSSON, Anna; MAGDALENIĆ, Sanja. Sociology in Sweden: a history. Basingstoke: Palgrave Macmillan, 2015.; na Dinamarca, Kropp (2015)KROPP, Kristoffer. A historical account of Danish sociology: a troubled sociology. Basingstoke: Palgrave Macmillan, 2015.; e na Noruega, Birkelund (2006)BIRKELUND, Gunn. The genesis of Norwegian sociology: a story of failures and success. Sosiologisk Årbok, n. 3-4, p. 41-67, 2006.. Uma breve história da ISA encontra-se em Platt (1998)PLATT, Jennifer. A brief history of the ISA: 1948-1997. Montréal: ISA, 1998..
  • 15
    Uma extensa literatura analisa essa transição. No Brasil, é referência o estudo de Bonavides (2007)BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2007..
  • 16
    É vasta a literatura sobre essas reformas; entre outros, veja Brandal, Bratberg e Thorsen (2013)BRANDAL, Nik; BRATBERG, Øivind; THORSEN, Bratberg. The Nordic model of democracy. London: Palgrave Macmillan, 2013..
  • 17
    Sobre o sistema político e a cultura política na Escandinávia, consulte Arter (2008)ARTER, David. Scandinavian politics today. 2. ed. Manchester: Manchester University Press, 2008..
  • 18
    Acerca do RCSL/ISA, consulte <http://rcsl.iscte.pt> e <http://www.isa-sociology.org/>.
  • 19
    Banakar faz alusão a um artigo de Parsons (1977)PARSONS, Talcott. Law as an intellectual stepchild. Sociological Inquiry, v. 47, p. 11-58, 1977. problematizando as razões pelas quais cientistas sociais deixaram de se interessar pelo fenômeno jurídico, relegando-o à condição de objeto ilegítimo de pesquisa.
  • 20
    Banakar refere-se aqui explicitamente aos “sistêmicos”, adeptos da teoria dos sistemas de Niklas Luhmann.
  • 21
    É provável que ele tenha em mente, em sua crítica, o que se conhece no Brasil por “jurimetria” e formas afins de análise instrumental de dados empíricos.
  • 22
    Durante a Antiguidade, Alexandre empreendeu campanhas militares expandindo o Império da Macedônia pela Europa, África e Ásia. Derrotando a Pérsia, chegou a invadir a Índia, mas faleceu antes de conquistá-la.

Referências bibliográficas

  • ANDRADE, Vera. Dogmática jurídica: escorço de sua configuração e identidade. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.
  • AGERSNAP, Torben. Theodor Geiger: pioneer of sociology in Denmark. Acta Sociologica, v. 43, n. 4, p. 325-330, 2000.
  • ARTER, David. Scandinavian politics today 2. ed. Manchester: Manchester University Press, 2008.
  • ÅSTRÖM, Karsten. Parallel norm crating processes. In: BAIER, Matthias (ed.). Social and legal norms: towards a socio-legal understanding of normativity. Farnham: Ashgate, 2013. p. 71-88.
  • AUBERT, Vilhelm. White-collar crime and social structure. American Journal of Sociology, v. 58, n. 3m p. 263-271, 1952.
  • AUBERT, Vilhelm. The housemaid: an occupational role in crisis. Acta Sociologica, v. 1, n. 1, p. 149-158, 1956.
  • AUBERT, Vilhelm. The concept of law. Kentucky Law Journal, v. 52, n. 2, p. 363-385, 1964.
  • AUBERT, Vilhelm. Some social functions of legislation. Acta Sociologica, v. 10, n. 1/2, p. 98-120, 1966.
  • AUBERT, Vilhelm. The rule of law and the promotional function of law in the welfare state. In: TEUBNER, Gunter (Ed.) Dilemmas of law in the welfare state Berlin: Walter de Gruyter, 1988. p. 28-39.
  • BAIER, Matthias (Ed.). Social and legal norms: towards a sociolegal understanding of normativity. Farnham: Ashgate, 2013.
  • BANAKAR, Reza. The identity crisis of a “stepchild”: reflections on the paradigmatic deficiencies of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 81, p. 3-21, 1998.
  • BANAKAR, Reza. Reflections on the methodological issues of the sociology of law. Journal of Law and Society, v. 27, n. 2, p. 273-295, 2000.
  • BANAKAR, Reza. A passage to ‘India’: toward a transformative interdisciplinary discourse on law and society. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 24, n. 92, p. 3-21, 2001.
  • BANAKAR, Reza. Merging law and sociology: beyond the dichotomies of socio-legal research. Berlin/Wisconsin: Galda and Wilch, 2003.
  • BANAKAR, Reza; TRAVERS, Max (Ed.). An introduction to law and social theory. Oxford: Hart, 2002.
  • BANAKAR, Reza; TRAVERS, Max (Ed.). Theory and method in socio-legal research. Oxford: Hart, 2005.
  • BARZOTTO, Luis Fernando. O positivismo jurídico contemporâneo: uma introdução a Kelsen, Ross e Hart. São Leopoldo: UNISINOS, 1999.
  • BENTZON, Agnete W.; AGERSNAP, Torben. Verner Goldschmidt: Danish sociologist of law and culture. Acta Sociologica, v. 43, n. 4, p. 375-380, 2000.
  • BIRKELUND, Gunn. The genesis of Norwegian sociology: a story of failures and success. Sosiologisk Årbok, n. 3-4, p. 41-67, 2006.
  • BJARUP, Jes. The philosophy of Scandinavian legal realism. Ratio Juris, v. 18, n. 1, p. 1-15, 2005.
  • BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.
  • BRANDAL, Nik; BRATBERG, Øivind; THORSEN, Bratberg. The Nordic model of democracy London: Palgrave Macmillan, 2013.
  • COTTERRELL, Roger. Northern lights: from Swedish realism to sociology of law. Journal of Law and Society, v. 40, n. 4, p. 657-669, 2013.
  • COTTERRELL, Roger. The politics of jurisprudence revisited: a Swedish realist in historical context. Ratio Juris, v. 28, n. 1, p. 1-14, 2015.
  • DALBERG-LARSEN, Jørgen. Sociology of law from a legal point of view. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 23, n. 89, p. 26-39, 2000.
  • DALBERG-LARSEN, Jørgen. Alf Ross and the sociology of law. In: WAHLGREN, Peter (ed.) Perspectives on jurisprudence: essays in Honor of Jes Bjarup. Stockholm: Institute for Scandinavian Law, 2005. p. 39-50.
  • DERRY, Thomas K. A history of Scandinavia Minneapolis: University of Minnesota Press, 1979.
  • ECKHOFF, Torstein. Sociology of law in Scandinavia. In: TREVES, Renato; VAN LOON, J. F. Glastra (Org.) Norms and actions: national reports on sociology of law. The Hague: Martinus Nijhoff, 1968. p. 21-50.
  • ESPING-ANDERSEN, Gøsta. The three worlds of welfare capitalism London: The Polity Press, 1990.
  • FARIA, José Eduardo. Eficácia jurídica e violência simbólica: o direito como instrumento de transformação social. São Paulo: EDUSP, 1988.
  • FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Função social da dogmática jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980.
  • GIACOMUZZI, José Guilherme. As raízes do realismo americano: breve esboço acerca de dicotomias, ideologia e pureza no direito dos EUA. Direito & Justiça, v. 31, n. 2, p. 155-190, 2005.
  • GOLDSCHMIDT, Verner. The Greenland criminal code and its sociological background. Acta Sociologica, v. 1, n. 1, p. 217–55, 1956.
  • GUIMARÃES, Paulo. Os escandinavos São Paulo: Contexto, 2016.
  • HAGEN, Johann. Rivalità dei paradigmi nelle scienze giuridiche: la dogmatica giuridica e la sociologia del diritto come paradigmi in competizione. Sociologia del diritto, v. 22, n. 2, p. 5-18, 1995.
  • HELLUM, Anne. How to improve the doctrinal analyses of legal pluralism: a comparison of legal doctrine about custom and local law in Zimbabwe and Norway. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 23, n. 89, p. 40-62, 2000.
  • HAMMERSLEV, Ole; MADSEN, Mikael. The return of sociology in Danish socio-legal studies: a survey of recent trends. International Journal of Law in Context, v. 10, n. 3, p. 397-415, 2014.
  • HYDÉN, Håkan. Sociology of law in Scandinavia. Journal of Law and Society, v. 13, n. 1, p. 131-143, 1986.
  • HYDÉN, Håkan. Even a stepchild eventually grows up: on the identity of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 22, n. 85, p. 71-80, 1999.
  • HYDÉN, Håkan. Looking at the world through the lenses of norms: nine reasons for norms, a plea for Norm Science. In: PAPENDORF, Knut; MACHURA, Stefan; ANDENAES, Kristian (Ed.). Understanding law and society: developments in socio-legal studies. Hamburg: LIT Verlag, 2011. p. 120-159.
  • HYDÉN, Håkan. Pioneers in Nordic sociology of law. Revista Eletrônica Direito e Sociedade, v. 1, n. 1, p. 77-90, 2013.
  • HYDÉN, Håkan; WICKENBER, Per (Ed.). Contributions in sociology of law: remarks from a Swedish horizon. Lund: Lund University, 2008.
  • HYDÉN, Håkan; SVENSSON, Måns. The concept of norms in sociology of law. In: HYDÉN, Håkan; WICKENBER, Per (Ed.). Contributions in sociology of law: remarks from a Swedish horizon. Lund: Lund University, 2008. p. 129-146
  • KONZEN, Lucas P.; BORDINI, Henrique S. Sociologia do direito contra dogmática: revisitando o debate Ehrlich-Kelsen. Revista Direito e Práxis, v. 10, n. 1, p. 303-334, 2019.
  • KONZEN, Lucas P.; RENNER, Marjorie C. Em defesa da divisão do trabalho científico: o debate Treves-Bobbio e a institucionalização da sociologia do direito na Itália. Revista Brasileira de Sociologia do Direito, v. 6, n. 1, p. 42-66, 2019.
  • KROPP, Kristoffer. A historical account of Danish sociology: a troubled sociology. Basingstoke: Palgrave Macmillan, 2015.
  • KUHN, Thomas. The structure of scientific revolutions 2. ed. Chicago: University of Chicago Press, 1970.
  • LARSSON, Anna; MAGDALENIĆ, Sanja. Sociology in Sweden: a history. Basingstoke: Palgrave Macmillan, 2015.
  • LEITER, Brian. American legal realism. In: GOLDING, Martin; EDMUNDSON, William (Ed.). The Blackwell guide to the philosophy of law and legal theory. Malden: Blackwell Publishing, 2005. p. 50-66.
  • LUNDSTEDT, Vilhelm. The responsibility of legal science for the fate of man and nations. New York University Law Quarterly Review, v. 10. n. 3, p. 326-340, 1933.
  • MATHIESEN, Thomas. The defences of the weak: a sociological study of a Norwegian correctional institution. London: Tavistock, 1965.
  • MATHIESEN, Thomas. The politics of abolition New York: John Wiley & Sons, 1974.
  • MATHIESEN, Thomas. Law, society and political action: towards a strategy under late capitalism. London; New York: Academic Press, 1980.
  • MATHIESEN, Thomas. Prison on trial: a critical assessment. London: SAGE, 1990.
  • MATHIESEN, Thomas. Is it all that bad to be a stepchild? Comments on the state of sociology of law. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 21, n. 83, p. 67-76, 1998.
  • OLIVECRONA, Karl. Law as fact London: Oxford University Press, 1939.
  • OLIVECRONA, Karl. Is a sociological explanation of law possible? Theoria, v. 14, n. 2, p. 167-207, 1948.
  • PARSONS, Talcott. Law as an intellectual stepchild. Sociological Inquiry, v. 47, p. 11-58, 1977.
  • PETERSEN, Hanne. Forgoing new identities in the global family? Challenges for prescriptive and descriptive normative knowledge. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 23, n. 90, p. 46-54, 2000.
  • PETERSEN, Hanne. On women and legal concepts: informal law and the norm of consideration. Social & Legal Studies, v. 1, n. 4, p. 493–513, 1992.
  • PLATT, Jennifer. A brief history of the ISA: 1948-1997. Montréal: ISA, 1998.
  • PRZEWORSKI, Adam. Capitalism and social democracy Cambridge: Cambridge University Press, 1985.
  • RITZER, George. Sociology: a multiple paradigm science. The American Sociologist, v. 10, n. 3, p. 156-167, 1975.
  • ROSS, Alf. On law and justice London: Stevens & Sons, 1958.
  • SÁ E SILVA, Fábio. Vetores, desafios e apostas possíveis na pesquisa empírica em direito no Brasil. Revista de Estudos Empíricos em Direito, v. 3, n. 1, p. 23-53, 2016.
  • SAND, Inger Johanne. A future or a demise for the theory of the sociology of law: law as a normative, social and communicative function of society. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 23, n. 90, p. 55-75, 2000.
  • SANDSTRÖM, Marie. The concept of legal dogmatics revisited. In: BANKOWSKI, Zenon (Ed.). Epistemology and ontology: IVR-Symposium Lund 2003. Stuttgart: Franz Steiner Verlag, 2005. p. 133-140.
  • SANTOS, Boaventura de Sousa. Toward a new common sense: law, science and politics in the paradigmatic transition. London: Routledge, 1995.
  • SEGERSTEDT, Torgny. A research into the general sense of justice. Theoria, v. 15, p. 323-338, 1949.
  • STJERNQUIST, Per. Laws in the forests: a study of the public direction of Swedish private forestry. Lund: CWK Gleerup, 1973.
  • STRANG, Johan. Two generations of Scandinavian legal realists. Retfærd: Nordisk juridisk tidsskrift, v. 32, n. 1, p. 62-82, 2009.
  • TEUBNER, Günther. Law as an autopoietic system Oxford: Blackwell, 1993.
  • TREVES, Renato. Sociologia del diritto: origini, ricerche, problemi. 5. ed. Torino: Einaudi, 2002.
  • ZULETA PUCEIRO, Enrique. Paradigma dogmático y ciencia del derecho Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1981.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Set 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2022

Histórico

  • Recebido
    17 Ago 2020
  • Aceito
    29 Jan 2021
Universidade do Estado do Rio de Janeiro Rua São Francisco Xavier, 524 - 7º Andar, CEP: 20.550-013, (21) 2334-0507 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: direitoepraxis@gmail.com