Resumo
Este artigo discute o papel do litígio como uma ferramenta de mudança no campo dos direitos humanos. Ele analisa como as organizações que atuam em litigio estratégico de direitos humanos tem apoiado novas maneiras de fortalecer o litigio no âmbito do mosaico de ferramentas de defesa de direitos para a mudança. Ele aborda as críticas e as novas abordagens, impactos, algumas lições apreendidas, e os desafios para a implementação das decisões.
Palavras-chave: Litígio estratégico; Advocacy; Direitos Humanos
Abstract
This article discusses the role of litigation as a tool for change in the field of human rights. It looks at how organizations working on strategic human rights litigation have supported new ways to strengthen litigation within the mosaic of advocacy tools for change. It addresses the criticisms and new approaches, impacts, lessons learned, and the challenges for implementing decisions.
Keywords: Strategic litigation; Advocacy; Human rights
Introdução
A busca pelos direitos humanos é uma luta de longo prazo e o progresso nesta área é frequentemente acompanhado por reações adversas. Em um mundo de crescente intolerância política e social, os tribunais e os órgãos quase-jurisdicionais estão entre os poucos espaços institucionais onde o poder pode ser questionado, a discordância ouvida, e o escrutínio independente aplicado. A lei por si só pode ser limitada e restritiva, mas quando combinada com mobilização social, defesa de direitos e pesquisa, pode ser um catalisador para a mudança social. Poucos negarão o poder da lei e do contencioso como uma ferramenta contra o apartheid na África do Sul ou pela afirmação dos direitos civis nos EUA. A lei, como aponta Michael McCann, forneceu aos ativistas um recurso importante para o avanço de suas causas, seja a dos direitos civis e políticos, contra a discriminação racial ou para a promoção de uma agenda de direitos socioeconômicos. 1
O litígio estratégico e outras formas de advocacy são ferramentas que têm sido utilizadas por organizações não governamentais, instituições do sistema de justiça e movimentos sociais para empoderar comunidades e indivíduos, defender o estado de direito, promover os direitos humanos e buscar reparações a violações. O longo, incerto, e muitas vezes frustrante processo de litigar direitos humanos nos tribunais pode, todavia, desmobilizar vítimas, esmorecer esforços e reduzir as possibilidades de efetivar ou reparar direitos. Mas apesar de suas falhas, o litigio estratégico pode ter impactos reais e positivos ao longo de um espectro, do material ao emocional, do individual ao coletivo, da promoção à reparação de direitos. Os resultados negativos, por sua vez, aportam aprendizados sobre estratégias adotadas, variáveis exógenas, e sobre os efeitos das decisões. As fundações filantrópicas, nacionais e internacionais, têm investido cada vez mais em estratégias de litígio e assessoria jurídica em diversas áreas e temas – direitos ambientais, econômicos, sociais, culturais, identitários, civis, políticos – e em suporte a grupos e organizações diversas, tais como indígenas, mulheres, defensores de direitos humanos, minorias étnicas.
O litígio possui diversos entendimentos ou significados em diferentes contextos. Para os propósitos deste artigo, o litígio estratégico é um processo com impacto mais amplo do que simplesmente fornecer um remédio para um demandante em certo caso específico. Envolve graus superiores da hierarquia jurisdicional como os tribunais constitucionais ou organismos internacionais, cujo objetivo é modificar, por meio de decisões judiciais, a lei, as políticas públicas ou a prática. Muitas vezes também procura interpretar o direito constitucional ou internacional, especialmente naquelas áreas em que é difícil obter consenso legislativo sobre determinada questão. Para que o litígio de interesse público funcione efetivamente, é necessário um arcabouço legal abrangente; uma mudança nas atitudes judiciais em direção a um judiciário mais progressista; a revisão das regras processuais existentes. Ademais, novas soluções precisam ser moldadas para alcançar resultados efetivos.
O termo ‘litígio’ é usado quando ações judiciais são submetidas a autoridades judiciais que aplicam a lei aos fatos. Esta definição não inclui submissões ao legislativo, executivo ou outras instituições que não têm caráter judicial ou quase-judicial. Já a expressão ‘litígio estratégico em direitos humanos’ se refere a diferentes atividades e é frequentemente usado de forma intercambiável com outros termos, como ‘advocacia e/ou litígio de interesse público’, ‘litígio de políticas públicas’ e ‘litígio em direitos humanos’. Para os propósitos deste artigo, toma-se como definição funcional do termo a ação legal perante uma corte para o alcance de mudanças relacionadas a direitos, legislações, políticas públicas, práticas e/ou a conscientização do público. Litígios que são ‘estratégicos’ estão enraizados em um processo consciente de advogar por objetivos de transformação, e pelos meios para realizá-los, dos quais o litígio é frequentemente apenas um deles. É importante que esse processo envolva advogados e outros atores, considere o contexto político e social, adote uma visão ampla e utilize toda a gama de ferramentas disponível. Tal abordagem pode agregar valor, independentemente do resultado judicial, ao mobilizar outros agentes de mudança e concentrar energias em caminhos mais produtivos para a mudança.
Há quem sustente que a litigância estratégica também pressuponha a decisão de não litigar, para evitar precedentes nocivos, ou mesmo utilizá-la como mecanismo de pressão a instituições e governos contra os quais a demanda se dirige. Como menciona Michael McCann, em muitos casos a “ação legal é mais bem-sucedida quando funciona como uma ameaça não cumprida.” 2
Os efeitos dos impactos e resultados da litigância estratégica não se traduzem em um evento singular; ao contrário, trata-se de uma ocorrência que abarca interpretações subjetivas e abertas e significados positivos e negativos, cujos efeitos ressonam e se estendem ao longo do tempo. É importante, entretanto, distinguir ‘impacto’ de ‘estratégia’. Alguns casos iniciam com base em uma estratégia de resultados de longo alcance, que não se realizam; outros podem alcançar impactos mais amplos sem uma estratégia prévia ou por meio de estratégia desenvolvida durante o curso da ação. Algumas análises indicam que, em áreas altamente diversas da legislação de direitos humanos, “várias ações de litígio incipientes ou discretas foram iniciadas sem grandes ambições, mas passaram a ser vistas como veículos de mudança social mais ampla quando ascenderam aos níveis mais altos do sistema judiciário nacional, regional ou internacional, e articularam-se a outras ferramentas de advocacia.” 3 Muitas variáveis exógenas, além do resultado de mérito, operam no contexto de um litigio estratégico e produzem efeitos.
Este artigo também apresenta ideias sobre o papel que o litígio estratégico pode desempenhar no avanço de uma agenda de direitos humanos. Identifica algumas das críticas e desafios que o litígio estratégico enfrenta, ao mesmo tempo em que discute uma agenda de aprendizagem, questões-chave e desafios para organizações da sociedade civil. A elaboração teórica sobre litígio considera a forma como as organizações e instituições litigantes se articulam com os demais atores do campo e, sobretudo, com aqueles presentes nos territórios das violações de direitos.
(A) O litígio de direitos humanos e o uso da lei como instrumento de mudança: atacando desequilíbrios e desigualdades de poder
A lei e o litígio têm sido fortemente criticados como sendo ferramentas que se alinham a modelos neoliberais de desenvolvimento e a dinâmicas de poder ao falhar em abordar adequadamente as barreiras estruturais à igualdade e à inclusão social. Esquerdistas dos movimentos sociais da África do Sul, por exemplo, tornaram-se avessos à lei e só se referem ao litígio como uma ferramenta de último recurso. O Fórum Anti-Privatização (APF) preferiu usar o protesto direto e a desobediência civil como uma tática em suas lutas contra a privatização dos serviços sociais na África do Sul. Esse foco no protesto direto não é surpreendente, dado o antagonismo histórico da esquerda política em relação à lei e aos direitos, que são vistos como preservadores das relações de poder existentes, legitimando o privilégio e agravando as desigualdades socioeconômicas. Somente quando os protestos diretos se mostraram infrutíferos, os grupos recorreram à lei. Um membro da APF discorre sobre esta escolha ‘tática’ em relação às lutas pelo acesso à água na África do Sul, nos seguintes termos:
... E assim, foi em 2005-2006, com muita apreensão e hesitação inicial, que a APF entrou no terreno institucional-legal da luta de classes, assistindo a cinco representantes, moradores [do bairro] Phiri a preparar e apresentar um caso no Supremo Tribunal de Johanesburgo contestando a legalidade e a constitucionalidade da limitação imposta pela cidade ao abastecimento de água básico gratuito… O caso foi visto como uma tática, parte de uma estratégia maior e de longo prazo que buscava usar todos os meios disponíveis para garantir que a água fosse considerada e tratada como um recurso público ... 4
Para os estudiosos que se filiam aos Estudos Jurídicos Críticos (EJC), como Mark Tushnet, Peter Gabel e Duncan Kennedy, os direitos fazem parte do mecanismo legal que reflete e reforça o exercício do poder pelas elites. No entanto, mesmo dentro da crítica dos EJC à lei, os estudiosos reconhecem que os direitos têm potencial tanto radical quanto conservador. Os direitos humanos têm muitas dimensões que se estendem além da lei, em âmbitos como discurso, aspiração, moralidade e política, 5 enquanto o litígio tem como premissa a noção de que os direitos humanos codificados devem ser aplicados na prática e impostos pelos tribunais. Assim, o que se pode dizer sobre violações de direitos na mídia ou em uma campanha, em um tribunal terá que ser provado. Como sugere McCann,
[...]Apenas construir demandas por direitos convincentes e justificar a posição de reivindicadores desses direitos não é suficiente…. Reconstruções discursivas de direitos devem ser apoiadas por um poder organizacional material que represente um contrapeso instrumental a hierarquias institucionalizadas. Isto significa, é claro, que os que reivindicam direitos devem mobilizar recursos materiais e redes de apoio - dinheiro, organizações de defesa, aliados em outros grupos e no estado, e especialistas, incluindo advogados. Essa mobilização de recursos políticos e legais, seja por indivíduos ou grupos litigantes, é como os direitos se tornam reais. 6
Após algumas experimentações realizadas no século XVIII, o litigio estratégico passou a ser efetivamente utilizado como instrumento de prevenção e reparação de violações de direitos a partir da segunda metade do século XX. 7 O Brasil tem uma longa experiência no uso do litigio visando a transformação das politicas sociais. Luiz Gama, um ex-escravo que recebeu certa educação legal informal e ocupou cargos governamentais, contribuiu para a libertação de mais de quinhentos escravos por meio da persistente demanda de ações perante as cortes brasileiras. 8 As condições para que a litigância estratégica se tornasse relevante e efetiva se realizaram com o advento da estrutura normativa e institucional de direitos humanos pós-II Guerra Mundial, seguida de avanços democráticos em várias regiões. O litígio pode ser um baluarte eficaz contra o retrocesso, particularmente nos sistemas jurídicos que atribuem especial importância ao precedente judicial. Mas a despeito de seu valor especial, litígios estratégicos de direitos humanos são em geral mais efetivos quando jogam um papel complementar na busca por reconhecimento e promoção de direitos, e quando são articulados com demandas sociais.
Nessa linha, Judith N. Shklar e Sam Moyn alertam para o uso da lei por operadores do direito como algo desvinculado do contexto político e de outras importantes dinâmicas não-legais que afetam os direitos humanos. 9 Como Scheingold observou, “advogados/as têm uma inclinação natural de pensar nos litígios de forma apartada de outras táticas políticas, e não como parte de uma estratégia coordenada.” 10 Mesmo que o litígio de direitos pretenda desafiar relações de poder injustas, ele também pode reforçar e legitimar o status quo apelando para e operando dentro do sistema legal existente.
No caso do Brasil, é discurso corrente que os processos políticos pela efetivação dos direitos não se resolvem no Judiciário. Tais processos ganham sentido em outros espaços da sociedade que precisam ser fortalecidos. As ações nos tribunais são “apenas um dos muitos tipos diferentes de recursos e constrangimentos que moldam os termos das lutas de poder entre grupos em conflito.” 11 Protestos, advocacy, pesquisas, campanhas de mídia, lobby legislativo e alianças estratégicas também provaram ser ferramentas úteis de mudança social. O litígio opera por meio de complexa relação com estas outras ferramentas e em geral é mais efetivo se utilizado como estratégica complementar ou combinado com outras abordagens. 12 Nívia Mônica Silva corrobora essa reflexão ao afirmar que é importante repensar se é possível que a esfera do jurídico tenha a capacidade de se tornar um poder contra hegemônico. Ela aponta que:
Pensando na perspectiva do Ministério Público, temos de garantir os direitos humanos que possibilitem a emancipação dos sujeitos, mas a dimensão estritamente jurídica não é suficiente para que tal emancipação aconteça. O que está no alcance dessa esfera – em particular, do Ministério Público – é atuar quando há evidente desnível de forças em um conflito, no sentido de tentar quebrar a lógica de repetição das desigualdades externas dentro dos processos jurídicos.. 13
Essa perspectiva foi adotada pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro que, em 2016 e 2017 atuou para reverter o impacto das políticas de austeridade sobre os direitos dos grupos excluídos e populações vulneráveis. Em Caxias do Sul, por exemplo, frente à ocupação da sede da Prefeitura pelos servidores, aposentados e pensionistas, cujos salários e proventos não vinham sendo pagos há quase dois meses, a Defensoria Pública adotou medidas inovadoras. Além de atuar de forma espontânea e proativa, saindo do gabinete e indo até a sede da Prefeitura para se apresentar àqueles que estavam em situação de vulnerabilidade, atuaram como agentes promotores de seus direitos fundamentais e como intermediários na busca de diálogo e solução pacífica do conflito com o município. 14
A mesma atuação diferenciada ocorreu frente à redução ou encerramento de vários programas que buscavam a promoção de direitos sociais assegurados à população em situação de vulnerabilidade – como moradia, segurança alimentar e saúde. A Defensoria Pública do Rio de Janeiro se valeu de estratégias sócio jurídicas inovadoras para defender e garantir direitos fundamentais de famílias dependentes do aluguel social 15 e dos presos no sistema carcerário: 16 uma forte campanha na mídia para esclarecer a população sobre os impactos das medidas de austeridade, mediante o estabelecimento de conexão entre os direitos violados, o contexto das isenções fiscais a empresas e a crise financeira do estado. Ademais, aliou-se com o Ministério Público estadual que promoveu ações civis públicas contra a concessão de novas isenções e para assegurar o pagamento a fornecedores, especialmente de refeições, aos internos do sistema prisional. 17 Nestes casos, o litígio estratégico criou um espaço para a confrontação direta com o estado em relação às medidas de austeridade, auferindo um nível de visibilidade às demandas dos grupos vulneráveis nunca antes conseguido, e que angariou o apoio da sociedade. Os resultados positivos obtidos – por exemplo, a determinação para o estado pagar os valores dos alugueis sociais atrasados a dez mil famílias e garantir o pagamento dos meses subsequentes, sob pena de bloqueio e arresto dos valores – evidenciam não apenas o impacto instrumental obtido com a determinação para o estado priorizar a manutenção de programas sociais frente ao corte de gastos públicos. Demonstra que a atuação das instituições estatais de justiça (Defensoria e Ministério Público) em prol da justiciabilidade dos direitos sociais, quando há evidente desnível de forças em um conflito, pode contribuir para contrabalançar desigualdades presentes nos processos sócio jurídicos pela efetivação de direitos.
A legitimidade e o respaldo político da Defensoria Pública foram fundamentais para a resolução efetiva de demandas jurídicas por direitos humanos, sendo que tal legitimidade se produziu por meio de trabalho de informação, divulgação, conhecimento, articulação e conscientização dos sujeitos sociais envolvidos nas demandas. Embora o Judiciário tenha, em alguns casos, rechaçado as demandas da Defensoria e do Ministério Público, resultando inclusive em precedentes negativos, 18 a legitimidade de atuação frente aos demandantes foi estabelecida e construída como fator inerente ao próprio trabalho de litígio estratégico.
Esse aspecto é relevante na discussão sobre os impactos materiais, imateriais ou instrumentais para os litigantes e vitimas. Leis e litígios podem empoderar comunidades no sentido de virem a conhecer seus direitos, mas também podem ser debilitadores. O litígio tem sido criticado por criar e manter um desequilíbrio de poder entre os defensores dos direitos humanos, neste caso advogados e seus clientes. As vítimas são muitas vezes desinformadas, com pouca ou nenhuma compreensão da lei, e acabam assumindo uma posição subordinada em relação às táticas e estratégias do litígio decididas pelos operadores do direito. Uma vez que as vítimas são confrontadas com um procedimento legal desconhecido e linguagem complicada, o seu ‘destino foge de suas mãos’, já que os especialistas legais assumem seus problemas. Esse conflito de interesses geralmente surge na busca pelo ‘melhore interesse do cliente’ versus o interesse público, em que é preciso modificar ou regulamentar a lei. Por exemplo, uma sobrevivente de estupro pode desejar aceitar um acordo monetário ao invés de passar pela provação de testemunhar na Corte; entretanto, para estender a obrigação do Estado de proteção contra violência a mais mulheres, pode ser necessária uma alteração legislativa e, neste caso, os advogados têm que ir ao tribunal visando julgamento de um precedente. Barbara Bukovska salienta que:
Tenho observado isso em litígios internacionais ou de alto impacto, em que o interesse e a opinião dos demandantes são raramente levados em consideração; em vez disso, eles são sacrificados em nome do interesse público. Geralmente, quando o caso é apresentado, ou muitas vezes, mesmo antes, a pessoa representada é uma consideração secundária, e o cliente fica relegado a um segundo plano[...]. 19
Este tipo de litígio pode ser debilitante para o cliente e não se pode dizer que contribua para avançar uma abordagem de direitos em relação à igualdade e à inclusão social. Ademais, o fato do esforço dedicado ao litígio ter sido iniciado pelo advogado, pela vítima ou pelo movimento social é menos importante do que a necessidade de todos os atores se legitimarem e reforçarem mutuamente, compartilhando uma estratégia comum.
(B) Mudança real? Os desafios do litígio e sua implementação
O litígio estratégico de direitos humanos também tem sido criticado por seu fracasso em se traduzir em mudança real para grupos excluídos e populações marginalizadas. Por exemplo, nos últimos anos, advogados e organizações que atuam em litígios de interesse público alcançaram numerosas vitórias judiciais que promovem os direitos socioeconômicos. Na prática, no entanto, pouco mudou. Muitos dos direitos inscritos na legislação e confirmados pelos tribunais permanecem não realizados. Por exemplo, um dos mais famosos casos relacionados ao direito à moradia na África do Sul, Grootboom v. África do Sul, confirmou o direito à moradia adequada e a justiciabilidade dos direitos sociais e econômicos e, ainda que tenha resultado em mudanças significativas na legislação da África do Sul sobre habitação, não assegurou à peticionária a efetiva realização deste direito. A Sra. Grootboom apresentou uma demanda ao tribunal em nome de 510 crianças e 290 adultos que viviam em um assentamento informal, em que ela exigia melhores condições habitacionais. Oito anos após a sentença ter sido proferida, em 2008, a Sra. Grootboom faleceu em seu barraco – sem um lar decente. No Brasil, os atingidos pelo rompimento da barragem do Fundão, MG, ainda aguardam, após três anos, a efetivação da reparação integral à violação de seus direitos fundamentais. Então, o que explica essa lacuna entre lei e prática?
Para responder a essa crítica é importante distinguir entre litígio estratégico e litígio ordinário da mesma forma que se distingue entre litígio de interesse público e litígio em nome de determinado grupo ou indivíduo, mesmo que excluído e marginalizado. Os dois não são sinônimos e essa distinção é relevante quando se considera estratégias em nível nacional e internacional. Frequentemente as críticas ao litígio equivalem a uma crítica em relação a um caso que não foi estratégico, e que forneceu um remédio para uma violação sem necessariamente construir ou desenvolver uma estratégia capaz de ir além desta proteção individual e avançar para a realização de um espectro mais amplo de direitos. São distintas as trajetórias das organizações e instituições que promovem litigio estratégico e diferentes as formas de mobilização do direito por parte da sociedade civil. As experiências de litigio estratégico em direitos humanos com frequência convergem em relação ao público-alvo beneficiário (população de baixa renda, grupos minoritários ou discriminados, interesses difusos), à agenda temática (defesa de determinados direitos, especialmente os coletivos) e ao objetivo final (promover a transformação social). Nesse sentido, a advocacia denominada issue ou policy-oriented, voltada a mudanças sociais em áreas sensíveis, ganha relevância. 20 Com base nesta abordagem metodológica, as organizações desenvolvem um trabalho preliminar de escolha de casos paradigmáticos, levando em conta seu potencial impacto social em relação às políticas prioritárias relacionadas ao tema, o custo-benefício, inclusive no caso de precedentes positivos ou negativos, e o envolvimento dos/as demandantes. O litígio estratégico em direitos humanos, ou de interesse público, por sua própria definição é para e em representação a um grupo de pessoas onde o resultado do caso não beneficiará apenas um indivíduo ou grupo, mas terá ramificações para todo o arcabouço legal, na medida do seu potencial de modificar ou criar nova legislação ou política pública ou de fornecer interpretação inovadora e impactante.
Se um indivíduo ou comunidade tem o poder legal de reivindicar, em um tribunal ou instituição similar, remédio para a violação de um direito, então o direito é justiciável no sentido estrito. Estabelecer esse direito demanda, entretanto, um grande esforço em muitos lugares onde não estão consagrados na Constituição ou nas leis, ou quando o direito internacional não é incorporado à legislação interna. Uma das principais estratégias, em tais circunstâncias, tem sido pedir aos tribunais que reconheçam as dimensões socioeconômicas dos direitos civis e políticos, uma vez que estes são mais prováveis de serem efetivados. Ademais, em muitos casos os tribunais acham difícil determinar a implementação de políticas novas e detalhadas com impacto na utilização e distribuição de recursos: por exemplo, produzir e fornecer uma vacina para uma doença específica ou determinar o reassentamento alternativo compulsório em caso de despejo ou deslocamento forçado. Os tribunais são relutantes em intervir no caso de os governos disporem de opções diferentes para proteger e promover os direitos econômicos e sociais ou quando as decisões tem impactos orçamentários significativos. Quando confrontados com escolhas difíceis, os tribunais muitas vezes se submetem ao princípio da separação de poderes, em que governos democraticamente eleitos, e não os tribunais, devem decidir tais questões.
Vivemos uma época de prevalente controvérsia judicial, em que a implementação dos atos dos tribunais é discutida quase tão frequentemente quanto os atos de legisladores e membros do executivo. Nesse padrão emergente, os políticos em todo o mundo estão acompanhando as atividades dos tribunais com crescente interesse e também com crescente hostilidade. A consequência é que parece que entramos em uma nova era constitucional, na qual os tribunais e o poder executivo vivem em um processo semipermanente de suspeitas mútuas. A crescente tensão entre os tribunais progressistas e os governos executivos tem sido evidente em vários países da América Latina, na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) 21 e, mais recentemente, na África do Sul. Por exemplo, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil assim se manifestou após receber a comunicação da CIDH sobre a usina Belo Monte:
“O Governo brasileiro tomou conhecimento, com perplexidade, das medidas que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos[...].
O Governo brasileiro, sem minimizar a relevância do papel que desempenham os sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos, recorda que o caráter de tais sistemas é subsidiário ou complementar, razão pela qual sua atuação somente se legitima na hipótese de falha dos recursos de jurisdição interna. O Governo brasileiro considera as solicitações da CIDH precipitadas e injustificáveis.” 22
No caso da África do Sul, após o julgamento considerado progressivo sobre direitos socioeconômicos pelo juiz Tsoka da Suprema Corte contra a Prefeitura de Johanesburgo, denominado caso Mazibuko, o prefeito da cidade assim se manifestou:
“Os juízes não estão acima da lei ... Não podemos ter uma situação em que um juiz queira assumir o papel de governo. Os juízes devem limitar seu papel ao que devem fazer. Se quiserem governar o país, devem se juntar a partidos políticos e disputar eleições… Não queremos que os juízes assumam o papel do Parlamento ... Os juízes devem limitar o seu papel.” 23
O tema subjacente a essas observações é que o poder do executivo e do legislativo está sendo reduzido pelos tribunais e, em particular, que estes estão interferindo nos demais poderes da República para impor ou modelar políticas públicas. O poder judiciário é frequentemente considerado o ramo mais fraco do governo, pela falta de força executiva e de poder orçamentário.
A separação de poderes diz respeito à exigência de que o judiciário limite o escopo dos julgamentos para evitar infringir as funções dos outros poderes de governo. Reconhecendo esses limites institucionais, os juízes têm buscado medidas criativas voltadas à superação dessas fragilidades e garantindo o cumprimento das decisões judiciais, ao mesmo tempo em que tomam o cuidado de não ultrapassar seu papel de juiz ao decidir sobre questões políticas. Muitas vezes, o próprio julgamento fornece uma explicação de como a decisão se enquadra no escopo da função judicial, que é proteger e garantir a efetiva realização de direitos. Navegar nessa seara tornou-se cada vez mais complexo, tanto para o judiciário quanto para o executivo. Um tema para o aprendizado para quem trabalha com litígio estratégico seria ampliar a compreensão sobre o papel que o governo pode desempenhar na garantia de direitos constitucionais em relação ao papel que o Judiciário desempenha. É possível delinear o papel do judiciário e o do governo de uma maneira que afirme a separação de poderes ao mesmo tempo em que reconhece o dever dos tribunais de interpretar a Constituição? Para Kenarik Boujiakin, na necessária transformação da cultura do judiciário brasileiro, é preciso trazer a Constituição para o centro das reflexões, pois ela – e os processos que lhe deram origem – foi instituída no sentido de romper com o passado de injustiça e desigualdade, e afirmar a sociedade democrática. A Constituição incumbe o judiciário do dever de garantir o que nela está firmado como vontade soberana do povo e que sua atuação deve ser pautada pela dignidade humana. Mesmo isso, no entanto, não tem se mostrado suficiente porque, como em todo processo social e político, a realização plena do que deve ser o judiciário é marcada por tensões e contradições. 24 Por outro lado, muitos estudos demonstram que tais dilemas não são insuperáveis, particularmente se a violação é séria, se decisões políticas ou legislativas já foram tomadas, ou se decisões podem ser formuladas para permitir aos governos a flexibilidade necessária para tomar decisões relacionadas às políticas públicas. 25
Outro entrave à implementação se refere aos tempos longos do litígio, cuja demora afeta a efetivação da justa e integral reparação, a atuação de advogadas e defensoras e a mobilização das vítimas. Se justiça atrasada é justiça negada, as vitimas das violações de direitos humanos poderão argumentar que têm maiores chances de reparação se buscarem outros meios distintos do litígio. Mas a depender do grau, amplitude e complexidade das violações de direitos, muitos acordos e ajustamentos acabam sendo celebrados como medidas de conciliação no âmbito de ações judicializadas. Ainda que poucas entidades da sociedade civil que desenvolvem advocacia estratégica de direitos humanos trabalhem com atividades de mediação e conciliação – as que as praticam normalmente lidam com um grande volume de demandas que precisa ser reduzido 26 – essa prática tem sido utilizada por instituições estatais como forma de reduzir a lacuna entre lei e efetiva proteção ou reparação de direitos. Exemplo recente é a atuação do Ministério Público Federal (MPF) e do Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG) no caso do rompimento da barragem do Fundão, em Mariana, considerado o maior desastre socioambiental já ocorrido no país. 27 União, Estados de MG e ES, MPF e MPMG foram precursores na proposição de ações civis públicas contra as mineradoras visando a reparação dos impactos e dos danos socioambientais, 28 pois anteviram o efeito cascata a outras esferas políticas e os potenciais precedentes que as decisões judiciais poderiam causar. 29 Após três anos do desastre, o processo de reparação não foi sequer iniciado em diversos territórios ao longo da bacia do Rio Doce ainda que um acordo com as empresas (Termo de Transação e Ajustamento de Conduta/TTAC) tenha sido firmado em março de 2016, pendente de homologação pela justiça federal. 30 A nova Bento Rodrigues, distrito mais atingido pela lama, começou a ser erguida há poucos meses.
O ponto de inflexão neste caso é que a quase total ausência de participação dos atingidos nos acordos e ajustamentos firmados, 31 tem interferido nos tempos do litígio de reparação. Os atrasos nas medidas de reparação às vítimas são uma ameaça à própria vida dos atingidos. Delongas na reparação podem resultar em danos irreparáveis aos afetados, posto que há muitos desempregados, mulheres, crianças, idosos e deficientes que não podem correr qualquer risco em relação à tutela de seus direitos. O reconhecimento de que a participação efetiva e sistemática das vítimas é fundamental para acelerar o processo de reparação integral e, portanto, ampliar o impacto do litigio, ocorreu em junho de 2018, por meio da assinatura de novo Termo de Ajustamento no âmbito da ACP, entre as empresas e autoridades públicas. 32 Ele alterou o sistema de governança estabelecido no TTAC, criando espaços de participação para os atingidos, que passarão a integrar estruturas do comitê que valida ações de reparação da fundação Renova, que gere os programas sociais e ambientais. Também assegurou assessoria técnica independente aos atingidos e um processo negocial de repactuação dos programas socioambientais e socioeconômicos. Ainda que o acordo tenha sido criticado por organizações da sociedade civil, 33 o foco no aprimoramento de mecanismos que garantam a participação dos atingidos em todas as fases do processo de reparação dos danos é uma clara manifestação do impacto instrumental das ações de litígio estratégico. A inclusão, no TTAC, da assessoria técnica autônoma, custeada pelas empresas, mas totalmente comprometidas com a defesa dos direitos dos atingidos, resultou num precedente inovador em relação ao conteúdo do direito de reparação integral. Esse resultado advém de complexa articulação entre litigantes, vitimas e movimentos sociais atuantes ao longo da bacia, que se valeram dos processos judiciais e litígios em curso para catalisar a mobilização dos atingidos e suas organizações. O impacto instrumental – mudança na política de reparação integral, incorporando a perspectiva das vítimas – também contribui para o alcance de resultados não-materiais, tais como o empoderamento dos atingidos e o aumento da coesão entre as comunidades afetadas. Esses ciclos de maior articulação social podem não ser lineares ou sustentados, mas influenciam as estratégias de litígio e de construção do movimento, seus tempos e seus impactos.
Por fim, há os custos excessivos do litígio estratégico, muitas vezes proibitivos. Honorários advocatícios e de peritos, custas judiciais, custos de proteção a testemunhas, custos de viagem e comunicação e outras despesas essenciais para muitos desafios legais, estão usualmente além dos meios dos quais dispõem as vítimas. Além disso, casos estratégicos de direitos humanos financiados por indivíduos, organizações ou escritórios de advocacia podem levantar questões sobre sua própria legitimidade. Por exemplo, alguns afirmam que indivíduos abastados, incluindo o financiador da Open Society Foundations (OSF), George Soros, e firmas de advocacia pro-bono, exercem uma influência desproporcional sobre as prioridades dos advogados e dos tribunais. 34 Por outro lado, entretanto, uma das razões impulsionadoras do crescimento do litígio estratégico 35 inclui o papel das fundações filantrópicas, sobretudo as norte-americanas, no financiamento ou promoção desses litígios em todo o mundo. 36 Dentre as fundações que investem em direitos humanos, o investimento em litigio e apoio legal representou, em 2015, 4% do valor total de doações. 37 No período de 2011 a 2015, as principais estratégias mais apoiadas pelas fundações para defesa e promoção dos direitos humanos foram a reforma de sistemas e capacitação e assistência técnica, seguidas do apoio à pesquisa e à documentação. 38 Apesar de ter recebido apenas 4% dos recursos totais da filantropia de direitos humanos, foi o financiamento ao litígio estratégico e apoio legal 39 que mais cresceu no período – 294% –passando de USD 22 milhões em 2011 para USD 86 Milhões em 2005. O suporte a esta estratégia ficou à frente do apoio à organização de base, que cresceu 265%, e do investimento em engajamento e conscientização do público, que subiu 112%. 40 As áreas temáticas na quais mais foram investidos recursos relacionados ao litigio estratégico e apoio legal referem-se a iniciativas para ampliar o acesso à justiça e alcançar a igualdade perante a lei, combate à violência, direito à informação e à liberdade de expressão. O financiamento de doadores preenche frequentemente a lacuna deixada pela ausência ou insuficiência de apoio governamental para ações legais destinadas a gerar impacto político. Em muitos países, a maioria dos recursos investidos em litigio estratégico dependem do financiamento de doadores externos, pois os fundos governamentais para assistência jurídica ou litígios ou as defensorias públicas não são suficientes para responder à demanda. 41
Conclusão
O litígio estratégico é importante e capaz de gerar impactos e mudanças. Para compreender os impactos é necessária uma abordagem multidimensional, que olha para além do resultado material e busca mudanças na jurisprudência, nas práticas institucionais, nas atitudes e nos discursos. A mudança através de litígio estratégico pode ser acelerada ou retardada por uma série de fatores, especialmente os relacionados às interações entre litigantes, vítimas, ativistas, organizações representativas. São essas interações que estabelecem a legitimidade dos litigantes, inclusive das instituições estatais de justiça, para desenhar as estratégias essenciais para que o litígio atinja o impacto desejado. Entretanto, a definição de uma estratégia per se não assegura que o resultado esperado será alcançado. Como os impactos do litígio estratégico tendem a ser imprevisíveis, às vezes paradoxais, ocasionalmente perversos e difíceis de mensurar, a combinação de estratégias de litígio com outros instrumentos capazes de mobilizar as instituições e atores relevantes para a mudança pretendida, é essencial. O desafio para as entidades de defesa de direitos da sociedade civil que atuam em diversas frentes, junto aos poderes executivo, legislativo e judiciário, e que apostam em estratégias integradas para a mobilização de determinada demanda, é definir o melhor conjunto de ferramentas que pode maximizar os resultados positivos. Avaliar os impactos do litígio estratégico é, por sua vez, uma tarefa complexa pois múltiplos fatores podem moldar as percepções dos resultados, positivos ou negativos, tais como o decurso de tempo e as perspectivas dos litigantes e vítimas. Essa complexidade é ampliada quando o litígio estratégico é examinado em determinado contexto e considerado como uma das ferramentas possíveis de mudança social, dentre muitas.
Frente a este complexo quadro, é necessário continuar as pesquisas e análises sobre os impactos do litígio estratégico para o avanço da defesa e da proteção dos direitos humanos. Acima de tudo, este artigo pode ser considerado como um apelo por mais atenção ao litígio estratégico e como um passo na direção a uma compreensão mais profunda desta complexa ferramenta para os direitos humanos e a mudança social. Neste sentido, sugerem-se questões que apontam linhas de investigação a ser desenvolvidas, considerando os desafios para estabelecer relações de causa ou de correlação entre as decisões judiciais e as mudanças subsequentes: a) a ‘politização’ da lei e do judiciário nas sociedades democráticas pode contribuir para que litígio e mobilização por direitos sejam, além de ferramenta legal, também uma ferramenta política para a mudança social? O que isso significa para a mobilização social e para a doutrina da separação de poderes? b) considerando que a lei pode ser uma ferramenta para a mudança social, há novas maneiras de considerar essa abordagem de modo a torná-la mais sensível às críticas tradicionais? c) quais são as formas e táticas organizacionais com maior potencial no litígio estratégico contemporâneo de direitos humanos? Quais são os obstáculos que essas estratégias e táticas encontram e como podem ser superados? Em relação aos impactos do litígio estratégico, 42 uma área relativamente nova de análise é seu significado para os financiadores em termos de desenvolvimento de estratégias de grant-making, medição de resultados e avanço do campo de direitos humanos. Para além do aporte de recursos financeiros, como podem contribuir com parceiros e donatários para o desenvolvimento deste trabalho? Como promover um pensamento mais inovador e formulação de estratégias por parte dos operadores do direito antes de iniciar um litígio de interesse publico? Como auferir impactos para além dos resultados, positivos ou negativos, pela instituição litigante e pelo financiador? Responder a estas e outras questões contribuirá para melhor compreender a mobilização jurídica multifacetada de organizações e instituições de litígio, sendo que as políticas públicas formuladas para este campo devem levar em conta a variedade de experiências, perfis e necessidades de atores bastante distintos entre si.
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1
McCANN, Michael. Rights at Work: Pay Equity Reform and the Politics of Legal Mobilization. Chicago, IL: University of Chicago Press, 1994.
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2
McCANN, Michael. Law and Social Movements. The Blackwell Companion to Law and Society, Blackwell: 2004, p. 514.
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3
Open Society Foundations. Strategic Litigation Impacts: Insights from Global Experience. OSF, New York: 2018, p. 26.
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4
DUGARD, Jackie. ‘Civic Action & Legal Mobilization: The Phiri Water Rights Case’ in HANDMAKER, Jeff. e BERKHOUT, Remko (Orgs) Mobilising Social Justice in South Africa: Perspectives from Researchers and Practitioners. Pretoria University Law Press: 2010, pp. 71-99.
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5
HANNUM, Hurst. Reinvigorating Human Rights for the Twenty-First Century. 16 Human Rights Law Review, 409, 411, 2016.
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6
MCCANN, Michael. The Unbearable Lightness of Rights. 48 Law & Society Review 245, 257, 2014.
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7
Open Society Foundations. Strategic Litigation Impacts: Insights from Global Experience. OSF, New York: 2018, p. 31
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8
Ibid.
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9
SHKLAR, Judith. Legalism: Law, Morals, and Political Trials. Harvard University Press: 1986. E MOYN, Sam. Not Enough: Human Rights in an Unequal World. Harvard University Press: 2018.
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SCHEINGOLD, Stuart. The Politics of Rights: Lawyers, Public Policy, and Political Change. University of Michigan Press, 2d ed: 2004, p. 6. Esta tendência tem sido considerada por muitos outros, como o Instituto de Direitos Econômicos e Sociais da África do Sul (The Socio-Economic Rights Institute of South Africa - SERI). Ver SERI, Public Interest Legal Services in South Africa: Project Report, 2015, p. 11 ("os profissionais da área jurídica estão fortemente inclinados ao litígio como o meio preferido para obter uma reforma legal e frequentemente cultivam uma visão excessivamente otimista, até mesmo ingenuamente romântica do potencial transformador da lei”).
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11
McCANN, Michael. Reform Litigation on Trial. 17 Law and Social Inquiry 715, 740, 1992.
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12
Open Society Foundations. Strategic Litigation Impacts: Insights from Global Experience. OSF, New York: 2018, p. 33.
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Fundo Brasil de Direitos Humanos. Litigância Estratégica em Direitos Humanos: Experiências e Reflexões. FBDH, São Paulo: 2016, p. 21.
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14
XIII Congresso Nacional de Defensores Públicos, ‘Teses e Práticas Exitosas da Defensoria Pública: Em Defesa das Pessoas em Situação de Vulnerabilidade’. ANADEP e ADEPESC, Florianópolis: 2017, p. 187-194. Disponível em https://www.conjur.com.br/2017-mai-31/tj-suspende-liminar-rio-voltar-conceder-incentivos-fiscais
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Segundo o Tribunal de Contas estadual, o Rio de Janeiro deixou de arrecadar R$ 138 bilhões em ICMS entre os anos de 2008 e 2013. O documento constatou que abrir mão desse valor contribuiu para a crise financeira, que culminou com a expedição de Decreto pelo Governador declarando estado de calamidade pública. Ver: https://www.conjur.com.br/dl/calamidade-publica.pdf
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19
BUKOVSKA, Barbara. Perpetrating Good: Unintended Consequences of International Advocacy. São Paulo, SUR N.9, v.5, Jan/2008, p. 7-23.
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20
REKOSH, Edwin.; BUCHKO, K.; TERZIEVA, V. (Orgs). Pursuing the Public Interest: A Handbook for legal Professionals and Activists. Public Interest Law Initiative in Transitional Societies, New York: 2001, p. 1.
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Em 1 de abril de 2011, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos outorgou medidas cautelares a favor dos membros das comunidades indígenas da bacia do Rio Xingu, no Pará, Brasil e solicitou ao Estado Brasileiro a suspensão imediata do processo de licenciamento do projeto e que impedisse qualquer obra de execução da Usina Belo Monte até que fossem observadas condições mínimas. Dentre essas condições estavam uma nova consulta com as comunidades indígenas locais, que deveriam ter acesso ao estudo do impacto socioambiental da obra, e a adoção de medidas vigorosas para impedir a disseminação de doenças entre os índios. Ver: https://www.cidh.oas.org/medidas/2011.port.htm
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DUGARD, Jackie. Choice from No Choice; Rights for the Left? The state, law and the struggle against prepayment water meters in South Africa in MOTTA, Sara and NIELSEN Alf (Orgs), Social Movements in the Global South: Dispossession, Development and Resistance. Palgrave MacMillian, UK: 2011, p. 74.
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24
Fundo Brasil de Direitos Humanos. Litigância Estratégica em Direitos Humanos: Experiências e Reflexões. FBDH, São Paulo: 2016, p. 22.
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25
Centre on Housing Rights and Evictions. Litigating Economic, Social and Cultural Rights: Achievements, Challenges and Strategies. COHRE, Switzerland: 2003, p. 12.
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RODRIGUEZ, Jose. Advocacia de interesse público no Brasil: a atuação das entidades de defesa de direitos da sociedade civil e sua interação com os órgãos de litígio do Estado. Ministério da Justiça, Secretaria de Reforma do Judiciário, Brasília: 2013, p. 61.
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Em 5 de novembro de 2015 ocorreu o rompimento de Fundão, construída e operada pela Samarco Mineração S/A - controlada pela BHP Billiton Brasil Ltda. e pela Vale S/A - despejando 60 milhões de m3 de rejeitos de minério de ferro e ocasionando o maior desastre ambiental, social e econômico já visto no Brasil e um dos maiores no mundo. O rompimento resultou na morte de 19 pessoas, afetando drástica e definitivamente as vidas, o passado, o futuro e o destino de milhares de pessoas em uma extensão de 663 quilômetros, abrangendo 41 cidades desde o distrito de Bento Rodrigues, em Mariana/MG, passando pelo Estado do Espirito Santo, até atingir o mar territorial brasileiro. A Organização das Nações Unidades enquadrou o desastre como um evento violador dos direitos humanos (ONU, 2015). Ver: http://www.mpf.mp.br/para-o-cidadao/caso-mariana , http://mabnacional.org.br/noticia/3-anos-lama-3-anos-luta-marcha-que-marcou-tr-s-anos-injusti-e-descaso-ap-s-derramamento-reje e http://www.mdh.gov.br/informacao-ao-cidadao/participacao-social/conselho-nacional-de-direitos-humanos-cndh/RelatriodaBarragemdoRioDoce_FINAL_APROVADO.pdf
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ACP nº 0023863-07.2016.4.01.3800, ajuizada pelo MPF e a ACP nº 0069758-61.2015.4.01.3400, ajuizada por União, Estado de Minas Gerais Estado do Espírito Santo e outros entes das suas respectivas administrações públicas direta e indireta.
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No caso da ACP proposta pela União e dos Estados de MG e ES talvez o objetivo tenha sido antecipar-se ao MPF e ajuizar as ações como autores, evitando figurar no polo passivo como co-responsáveis pelo desastre.
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O objetivo foi definir medidas e iniciativas que possam contribuir para a celebração de um acordo final nas ações civis públicas em andamento perante a 12ª Vara Federal de Belo Horizonte. Ver http://www.mpf.mp.br/mg/sala-de-imprensa/docs/termo-de-acordo-preliminar-caso-samarco
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À exceção da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Estadual de Mariana, que desde o inicio articulou a iniciativa do litígio com os familiares e vitimas de Bento Rodrigues e outras cidades impactadas na comarca. Já na inicial da ACP o promotor requer que “Na solução definitiva [do direito à reparação integral], as rés [empresas] deverão, com a máxima participação dos atingidos, assegurar os seguintes direitos[...]” Ver: https://www2.mppa.mp.br/sistemas/gcsubsites/upload/25/Acao%20Civil%20Publica%20-%20MPMG%20-%202%20PJ%20MARIANA%20-%20IC%200400_15_00306-1%20e%200400_15_000307-9.pdf
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Para Thiago Alves do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a participação dos moradores ainda é insuficiente. “Apesar de os atingidos terem alguns espaços a mais, as empresas ainda são majoritárias. Então, para nós não adiantou muito. Existe desigualdade imensa de poder”. Ver: https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/desastre-ambiental-em-mariana/noticia/acordo-foi-feito-sem-a-participacao-dos-atingidos-diz-mab-em-relacao-a-termo-sobre-desastre-de-mariana.ghtml e https://www.comriocommar.com.br/blog/nota-publica-do-forum-capixaba-sobre-novo-acordo
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CLIQUENNOIS, Gaëtan e CHAMPETIER, Brice. The Economic, Judicial and Political Influence Exerted by Private Foundations on Cases Taken by NGOs to the European Court of Human Rights: Inklings of a Cold War? European Law Journal, Vol. 22, No. 1, January 2016, pp. 92–126.
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Além do seu papel para a promoção do ‘direito e desenvolvimento’, do ‘estado de direito’ e de outros paradigmas que se tornaram relevantes na formulação de políticas e na ajuda humanitária externa no rescaldo da Guerra Fria, bem como de outros fatores como a proliferação de fóruns jurídicos regionais e internacionais que oferecem novas oportunidades para litígios de direitos humanos.
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Cinco fundações (Atlantic Philanthropies, Ford Foundation, MacArthur Foundation, Oak Foundation, and Open Society Foundations) investiram cerca de USD $138 million em apoio a litígio estratégico de 2006 a 2015. Foundation Center Maps, disponível em: http://foundationcenter.org/gain-knowledge/foundation-maps
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Em 2014 a filantropia de direitos humanos contava com 729 financiadores de 50 países. Do total de 637 doações realizadas em 2015, no valor de USD 2.4 bilhões, USD 96.5 milhões foram investidos em litigio e apoio legal. Ver: http://humanrightsfunding.org/strategies/legal/year/2015/
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A pesquisa, coordenada pelo Human Rights Funders Network e Foundation Center, mapeia o estado evolutivo da filantropia de direitos humanos para ajudar os financiadores e defensores a entender o contexto/quadro e aumentar sua eficácia, apoiando, em última análise, um campo de direitos humanos mais sustentável. http://humanrightsfunding.org/strategies/
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Para o Human Rights Funders Network, esta estratégia busca “A adoção de medidas legais para estabelecer uma jurisprudência progressiva de direitos humanos, instigar a reforma das leis nacionais que não cumpram os padrões internacionais de direitos humanos, permitir que indivíduos e comunidades busquem soluções para violações dos direitos humanos e garantir que todas as pessoas tenham acesso equitativo à assistência legal e representação”. Ver http://humanrightsfunding.org/strategies/legal/year/trends/
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Esse é o caso, por exemplo, da África do Sul e do Brasil. Open Society Foundations. Strategic Litigation Impacts: Insights from Global Experience. OSF, New York: 2018, nota 104. No caso do
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Por exemplo, a Open Society Justice Initiative e Stanford University Law School Policy Lab Practicum, elaboraram um conjunto de questões dirigidas a aprofundar a análise sobre os fatores que atuam para maior probabilidade de impacto do litígio estratégico. Ver: Open Society Foundations. Strategic Litigation Impacts: Insights from Global Experience, OSF, New York, 2018, p.111.
Referências bibliográficas
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- DUGARD, Jackie. Choice from No Choice; Rights for the Left? The state, law and the struggle against prepayment water meters in South Africa in MOTTA, S. and NIELSEN A. (Orgs). Social Movements in the Global South: Dispossession, Development and Resistance. London: Palgrave MacMillian, 2011.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Jan-Mar 2019 -
Data do Fascículo
Mar 2019
Histórico
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Recebido
04 Jan 2019 -
Aceito
12 Jan 2019