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A contribuição teórica de Carl Schmitt para o direito nazista

Carl Schmitt’s teorethical contribution to Nazy law

Resumo

Este artigo analisa como a produção teórica de Carl Schmitt, especialmente o “pensamento da ordem concreta”, influenciado pelo institucionalismo, contribuiu para as transformações nazistas do direito alemão. Por meio de análise bibliográfica, demonstro que a combinação entre institucionalismo e decisionismo na obra de Schmitt ofereceu sustentação à ordem jurídica nazista e conferiu um papel de destaque aos métodos de interpretação jurídica antiformalistas e antipositivistas como instrumentos para a nazificação do direito.

Palavras-chave:
Carl Schmitt; Nazismo; Institucionalismo

Abstract

This article analyzes how Carl Schmitt’s theoretical work, especially the “concrete order thought”, influenced by institutionalism, contributed to the Nazi transformations of German law. Through a bibliographic analysis, I demonstrate that the combination of institutionalism and decisionism in Schmitt’s work supported the Nazi legal order and gave a prominent role to anti-formalist and anti-positivist methods of legal interpretation as instruments for the nazification of law.

Keywords:
Carl Schmitt; Nazism; Institutionalism

Introdução

Em janeiro de 1933, um dia após a nomeação de Hitler para o cargo de chanceler da República de Weimar, na Alemanha, Carl Schmitt deu uma entrevista no rádio para Veit Rosskopf, na qual disse: “Eu sou um teórico”, e complementou: “um puro acadêmico e nada mais que um acadêmico” (BENDERSKY, 1983BENDERSKY, Joseph W. Carl Schmitt: theorist for the Reich. New Jersey: Princeton University Press, 1983.: 201)1 1 No original, na biografia sobre Carl Schmitt, Bendersky relata que ele teria dito na entrevista: “I am a theorist”, “a pure scholar and nothing but a scholar”. . Também em 1933, após uma série de expurgos realizados por Hitler em universidades alemãs, Schmitt se filiaria ao Partido nazista e se tornaria professor da Universidade de Berlim, em substituição a Hermann Heller, cargo que ocupou até o término da Segunda Guerra Mundial. No mesmo ano, Schmitt foi nomeado Conselheiro de Estado para a Prússia e se tornou presidente da União de Juristas Nacional-Socialistas.

Não é possível analisar a obra de Schmitt durante o período nazista descolada do seu contexto e da sua atividade política e profissional como jurista. Carl Schmitt é conhecido como um grande crítico da ordem jurídica liberal e do normativismo formal e abstrato a ela subjacente, que haviam se tornado dominantes no século XIX. Durante os anos de Weimar, dedicou-se a expor as falhas e as inconsistências do liberalismo e a buscar modelos alternativos capazes de equacionar as crises enfrentadas pelo Estado alemão. Essas crises envolviam, para Schmitt, os riscos de fragmentação política e de paralisia decisória do Parlamento, que estaria dominado pela atuação de grupos de interesse, fruto do pluralismo social de uma democracia de massas.2 2 A esse respeito, ver o trabalho de Bernardo Ferreira sobre o pensamento antiliberal de Schmitt: (FERREIRA, 2004). Nesse sentido, as escolhas políticas de Schmitt, durante a República de Weimar e após a sua queda, estão ligadas aos ataques que ele dirigia ao pensamento liberal (SCHEUERMAN, 1999SCHEUERMAN, William E. Carl Schmitt: the end of law. Boston: Rowman & Littlefield Publishers, Inc, 1999.: 17).

Na medida em que perspectivas teóricas contemporâneas, situadas politicamente à esquerda, buscam reativar concepções schmittianas para fundamentar críticas à democracia liberal e seus limites3 3 É o caso, por exemplo, de Chantal Mouffe, que se apropria dos referenciais de Schmitt críticos à democracia liberal para resgatar a relação entre política e conflito, em defesa da ideia de pluralismo agonístico. Diferentemente de Schmitt, Mouffe não entende que democracia e liberalismo são incompatíveis, mas que se relacionam na forma de um paradoxo necessário (MOUFFE, 2000: 9). Andrea Kalyvas também se propõe a investigar as contribuições do pensamento de Schmitt à teoria democrática. Amenizando os rótulos a ele atribuídos de conservador, niilista e anti-normativista, Kalyvas ressalta o papel central que Schmitt confere ao povo como soberano, sujeito do poder constituinte e núcleo da legitimidade democrática (KALYVAS, 2008: 97). , é preciso reforçar a necessidade de compreender a obra de Carl Schmitt no seu tempo e a partir de seus objetivos e conflitos. É valiosa, a esse respeito, a observação de Gilberto Bercovici:

O grande problema dessa “recepção” de Schmitt é a tendência em amenizar ou ignorar sua atividade política anterior e, especialmente, em meio ao nazismo. Não se pode ignorar o fato de que sua obra foi toda elaborada visando justificar certas correntes político-ideológicas, bem como as suas próprias posições em relação à turbulenta conjuntura histórica e política da Alemanha do século XX. Isso sem esquecer que, como jurista, Carl Schmitt era voltado também para a solução de problemas concretos e conjunturais, não podendo ter sua obra compreendida isoladamente da sua atuação política e pessoal no decorrer de sua vida (BERCOVICI, 2002BERCOVICI, Gilberto. “Entre Institucionalismo e Decisionismo”, Novos Estudos nº 62, março de 2002. pp. 191-193.: 193).

Levando em conta essa advertência metodológica, o objetivo do presente artigo é analisar a contribuição teórica de Carl Schmitt para o direito nacional-socialista, com foco no chamado pensamento da ordem concreta. Desenvolvido a partir da influência institucionalista que Schmitt recebeu de autores como Maurice Hauriou e Santi Romano, o pensamento da ordem concreta é apresentado por ele como uma terceira via em relação ao normativisimo e ao decisionismo e pretende servir de base para a superação do modelo liberal e para a construção da nova ordem jurídica nazista.

O tema suscita questões controversas que são objeto de debates ainda atuais sobre a obra de Carl Schmitt. Peter Caldwell demonstra que interpretações contraditórias sobre o autor muitas vezes se baseiam nas mesmas fontes para sustentar argumentos opostos, que caracterizam Schmitt como: um típico liberal do século XIX, um fascista, um revolucionário conservador, um bom crítico de Marx, um antissemita ou um brilhante teórico da democracia (CALDWEL, 2005CALDWELL, Peter C. “Controversies over Carl Schmitt: a review of recent literature”. The Journal of Modern History, Vol. 77, No. 2 (June 2005), pp. 357-387. Disponível em: http://www.jstor.org/stable/10.1086/431819. Acesso em 22 fev. 2016.
http://www.jstor.org/stable/10.1086/4318...
: 357-358).

Mais especificamente, os comentaristas de Schmitt discutem se a sua conversão ao nazismo e ao institucionalismo representaria uma ruptura com seu pensamento anterior, particularmente com o decisionismo. Ingeborg Maus chama atenção para o fato de que o próprio Schmitt viria a defender a ideia de que não haveria continuidade entre o seu pensamento antes e depois de 1933. Com isso, no entanto, buscava se eximir de responsabilidade pelas posições adotadas, ao sugerir que sua teoria seria mero reflexo da situação constitucional, primeiro de Weimar, e depois do Nacional-Socialismo (MAUS, 1997MAUS, Ingeborg. “The 1933 ‘Break’ in Carl Schmitt’s theory”. Canadian Journal of Law and Jurisprudence, Vol. X, No.1 (January 1997), pp. 125-140.: 128).

Outra controvérsia divide interpretações a respeito da própria adesão de Schmitt ao nazismo: alguns autores, como Joseph Bendersky e George Schwab, entendem que ela decorreu fundamentalmente do seu oportunismo político; outros, a exemplo de William E. Scheuerman, consideram que tal escolha política era consistente com as linhas doutrinárias já defendidas pelo jurista.

Essa discussão também impacta no tratamento dado à produção de Schmitt durante o período nacional-socialista, que pode se orientar, por um lado, para desconsiderá-la como mero artifício de legitimação do Terceiro Reich ou, por outro, para reconhecer nela um valor teórico merecedor de uma investigação séria, ainda que não possa ser dissociada dos objetivos de justificação e de sustentação jurídica de um domínio político totalitário. Uma terceira chave de leitura propõe, ainda, que Schmitt teria se movido pelo intuito de exercer uma influência sobre Hitler e, com isso, moderar a radicalidade das transformações nazistas à ordem jurídica e política alemã.

Partindo desses questionamentos, busco analisar como o chamado pensamento da ordem concreta de Schmitt contribuiu para as transformações nazistas do direito alemão. O texto está estruturado em três partes: a primeira se dedica a traçar a influência institucionalista e a adesão de Schmitt ao nazismo; a segunda parte aborda a formulação do jurista sobre o pensamento da ordem concreta e sua relação com o decisionismo; por fim, o terceiro tópico trata dos métodos de interpretação apresentados por Schmitt a partir da concepção do direito como ordem concreta e tendo em vista a nazificação do sistema jurídico alemão.

1. A influência institucionalista e a adesão de Schmitt ao nazismo

No contexto da crise final da República de Weimar, até 1933, Schmitt não apoiava a ascensão nazista ao poder, mas defendia, em outra linha, uma solução autoritária de direita que envolvia o fortalecimento do presidente do Reich e a manutenção das instituições. Após o golpe do Estado alemão contra a Prússia, em 1932, Schmitt participou ao lado do governo do processo que analisava a legitimidade da intervenção estatal, atuando no sentido de justificar as medidas de exceção que tinham sido adotadas. Não obstante, ainda que manifestasse até então a preferência por uma via mais conservadora para enfrentar a crise, tão logo o Partido Nacional-Socialista ascendeu ao poder4 4 Dois decretos marcaram a consolidação nazista no poder. O primeiro chamado Decreto do Incêndio do Reichstag foi aprovado pelo presidente, sob a pressão de Hitler, em 28 de fevereiro de 1933, em resposta ao incêncio do prédio do Parlamento, prevendo, entre outras medidas, a suspensão de diversos direitos e garantias. O segundo é conhecido como a Lei de Concessão de Plenos Poderes de 1933 ou Lei habilitante de 28 de março de 1933, que conferiu plenos poderes a Hitler. , Schmitt se tornou um filiado e ativo colaborador. Schmitt também contou com influentes “padrinhos políticos” que ajudaram na sua projeção como jurista e na sua indicação para cargos públicos, a exemplo de Johannes Popitz, então Ministro de Finanças da Prússia, Hans Frank, que era Secretário de Justiça no Terceiro Reich, e Hermann Göring, que ocupava o posto de Ministro-Presidente da Prússia (DRAGHICI, 2001DRAGHICI, Simona. “Preface”. In: SCHMITT, Carl. State, Movement, People: the triadic structure of the political unity (1933); The question of legality (1950). Edited, translated and with a preface by Simona Draghici. Corvallis: Plutarch Press, 2001.: XII).

A publicação de Estado, Movimento, Povo em 1933 constitui o marco na produção de Schmitt que consolida a sua adesão ao nacional-socialismo. De acordo com Bendersky, o texto é fruto das ideias apresentadas por Schmitt em palestras e em artigos escritos durante o verão e o outono de 1933 (BENDERSKY, 2004BENDERSKY, Joseph W. “Introduction: The Three Types of Juristic Thought in German Historical and Intellectual Context”. In: SCHMITT, Carl. The Three Types of Juristic Thought. Londres: George Schwab, Series Editor, 2004.: 18). Daí se percebe o propósito de intervenção política da obra, voltada não apenas para o mundo acadêmico, mas para alcançar um público mais amplo. Alguns aspectos do estilo da escrita também chamam atenção na obra. No prefácio à edição inglesa, Simona Draghici caracteriza o texto como “um exercício na técnica de persuasão de massa” e acrescenta:

A fórmula técnica por trás deste ensaio pode ser descrita brevemente como: a. repetição contínua para alcançar a saturação, para além do teto de tolerância esperado da audiência; b. linguagem simples para que o homem comum (…) pudesse entender, e ainda; c. o conteúdo deveria ser interessante o suficiente para que todos dessem uma atenção cuidadosa (DRAGHICI, 2001DRAGHICI, Simona. “Preface”. In: SCHMITT, Carl. State, Movement, People: the triadic structure of the political unity (1933); The question of legality (1950). Edited, translated and with a preface by Simona Draghici. Corvallis: Plutarch Press, 2001.: VI)5 5 Tradução livre do original: “The technical formula behind this essay may be described briefly as: a. a continuous repetition to reach saturation, past the audience’s expected ceiling of endurance; b. simple wording so that the ordinary man (...) could understand, and yet, c. the contente should de interesting enough so as to make everytbody else give it careful atention”.

A obra faz diversas referências e citações a personalidades do regime, como o “Dr.” Hans Frank, e incorpora conceitos nazistas como identidade étnica e liderança, raça e povo. Ao caracterizar a situação constitucional daquele momento, Schmitt afirma que a Constituição de Weimar não estava mais em vigor e que todo o direito público do Estado alemão tinha passado a se estruturar em suas próprias bases. Em suas palavras: “o texto da Constituição de Weimar não pode ser considerado como continuamente válido nas condições do novo direito público e constitucional do Estado Nacional-Socialista” (SCHMITT, 1933SCHMITT, Carl. State, Movement, People: the triadic structure of the political unity (1933); The question of legality (1950). Edited, translated and with a preface by Simona Draghici. Corvallis: Plutarch Press, 2001.: 5). Para Schmitt, a chamada Lei Habilitante ou Lei de Concessão de Plenos Poderes de 1933 tinha fundado uma nova ordem jurídica e política que reconhecia Hitler como o líder do povo alemão e substituía a divisão política pluralista de Weimar pelo formato de um partido único.

A ideia central do texto é apresentar a estrutura triádica da unidade política alemã, organizada entre Estado, Movimento e Povo, que rompe com a divisão liberal binária entre Estado e sociedade civil. Para Schmitt, essa nova estrutura refletiria não apenas a superação da ordem liberal-democrática, adequando-se às novas realidades sociais e políticas do século XX, mas também “corresponde às grandes tradições da teoria do Estado alemã, iniciada por Hegel” (SCHMITT, 1933SCHMITT, Carl. State, Movement, People: the triadic structure of the political unity (1933); The question of legality (1950). Edited, translated and with a preface by Simona Draghici. Corvallis: Plutarch Press, 2001.: 13). É interessante observar a combinação do realismo político, em Schmitt, com argumentos baseados na tradição, que buscam identificar no passado os elementos então defendidos para o Estado alemão, como se tivessem estado sempre presentes. Essa lógica argumentativa também é empregada na formulação do pensamento da ordem concreta, como será visto adiante.

Na divisão proposta por Schmitt, o Estado é considerado a parte política estática, composto essencialmente pela burocracia e pelo Exército. O Movimento é representado pelo Partido Nacional-Socialista e constitui o elemento politicamente dinâmico da estrutura. Como consequência, o Estado perde o monopólio do político e passa a ser reconhecido como apenas uma parte da unidade política. Já o povo se caracteriza como a esfera apolítica da vida pública, mantida “sob a proteção e na sombra das decisões políticas” (SCHMITT, 1933SCHMITT, Carl. State, Movement, People: the triadic structure of the political unity (1933); The question of legality (1950). Edited, translated and with a preface by Simona Draghici. Corvallis: Plutarch Press, 2001.: 12). O povo é formado pelas esferas profissionais e sociais, que são auto-administradas e despolitizadas, sendo chamado a participar dos processos decisórios apenas de uma forma aclamatória, por meio da convocação de plebiscitos.

Dentro da estrutura triádica, o Movimento, ou seja, o Partido nazista assume o papel de liderar e de carregar o Estado e o povo, conduzindo de forma autoritária tanto as duas séries, formadas pelo aparato estatal e pela ordem social e econômica, como a unidade política como um todo (SCHMITT, 1933SCHMITT, Carl. State, Movement, People: the triadic structure of the political unity (1933); The question of legality (1950). Edited, translated and with a preface by Simona Draghici. Corvallis: Plutarch Press, 2001.: 14). Nesses termos, Schmitt consagra o princípio da liderança política do Führer, que encabeça o Estado e o partido e tem a função de garantir a identidade entre líder e seguidores. Identidade que assume um conteúdo étnico e racial e é considerada uma condição da existência e da fundação da unidade política do Estado alemão (SCHMITT, 1933SCHMITT, Carl. State, Movement, People: the triadic structure of the political unity (1933); The question of legality (1950). Edited, translated and with a preface by Simona Draghici. Corvallis: Plutarch Press, 2001.: 48).

A respeito da incorporação do vocabulário nacional-socialista, é importante notar que, até então, a obra de Schmitt não continha referências explicitamente nazistas ou de adesão à doutrina racial. No entanto, a própria concepção de política de Schmitt, baseada na oposição entre amigo/inimigo, já se orientava a partir de uma lógica de exclusão que entendia a democracia como pertencimento a um povo segundo critérios substantivos. A democracia exigiria uma homogeneidade social de base para possibilitar a construção da identidade entre governantes e governados que, por sua vez, seria essencial para a unidade política. Nesse sentido, Schmitt afirmaria, em 19236 6 Ano da primeira edição do seu livro “Crise da democracia parlamentar”. , que a “democracia requer (...) primeiro homogeneidade e segundo - se a necessidade surgir - eliminação ou erradicação da heterogeneidade” (SCHMITT, 1994SCHMITT, Carl. The Crisis of Parliamentary Democracy. Trad. de Ellen Kennedy. Cambridge, Massachusetts e Londres: Mit Press, 1994.: 9). É razoável, portanto, entender que a tomada de posição em apoio ao nazismo foi coerente com as teses que Schmitt já defendia e que, portanto, a sua adesão envolvia também afinidade teórica, mais do que mero oportunismo político (BERCOVICI, 2002BERCOVICI, Gilberto. “Entre Institucionalismo e Decisionismo”, Novos Estudos nº 62, março de 2002. pp. 191-193.: 192).

A produção de Schmitt no período nazista, lançada a partir da formulação da estrutura triádica Estado, Movimento, Povo, se desdobra na sua concepção do pensamento da ordem concreta. Em 1934, no prefácio à segunda edição da obra Teologia Política, Schmitt passa a distinguir, não apenas dois, mas três tipos de pensamento jurídico: para além do normativismo e do decisionismo, reconhece também o pensamento institucional. Segundo explica, tal entendimento resulta de suas reflexões sobre as “garantias institucionais” no direito alemão e de seus estudos sobre a teoria das instituições de Maurice Hauriou (SCHMITT, 1934bSCHMITT, Carl. “Preface to the second edition (1934b)”. Political Theology: four chapters on the concept of sovereignty. Translated by George Schwab; foreword by Tracy Strong. Chicago: The University of Chicago Press, 2005.: 2). Percebe-se, assim, que a influência institucionalista sobre o pensamento de Schmitt já estava presente na sua produção desde o período de Weimar, sendo possível identificar, como afirma Bercovici, mais continuidade do que ruptura na passagem para os anos 1930 (BERCOVICI, 2002BERCOVICI, Gilberto. “Entre Institucionalismo e Decisionismo”, Novos Estudos nº 62, março de 2002. pp. 191-193.: 191).

De fato, na obra Teoria da Constituição, publicada em 1928, Schmitt já estabelecia uma distinção entre direitos fundamentais e garantias institucionais, sendo que estas últimas faziam referência à proteção constitucional conferida a certas instituições “com a finalidade de tornar impossível uma supressão pela via legislativa ordinária” (SCHMITT, 1982SCHMITT, Carl. Teoría de la Constitución. Madrid: Alianza, 1982.: 175). A distinção contrapõe, portanto, as garantias institucionais à noção liberal de direitos individuais oponíveis ao Estado. Para Schmitt, ainda que envolvesse direitos subjetivos, a essência da garantia institucional não era a defesa desses direitos, mas a proteção da instituição.

Alguns exemplos de instituições juridicamente protegidas são citados no texto, como a administração municipal autônoma, a família e a burocracia estatal. Entre elas, Schmitt destaca a proteção da burocracia como “um exemplo autêntico de garantias institucionais” (SCHMITT, 1982SCHMITT, Carl. Teoría de la Constitución. Madrid: Alianza, 1982.: 177). Nesse sentido, a Constituição de Weimar previa a manutenção de uma burocracia estatal que servisse à comunidade e fosse assegurada contra investidas do Parlamento. Tal previsão abarcava direitos dos servidores públicos, desde pretensões econômicas até garantias de progressão na carreira. No entanto, segundo Schmitt, esses direitos não estavam “a serviço do interesse privado do funcionário, mas sim da instituição da burocracia profissional enquanto tal” (SCHMITT, 1982SCHMITT, Carl. Teoría de la Constitución. Madrid: Alianza, 1982.: 177).

A partir dessas reflexões iniciais de Schmitt, é possível depreender o caráter antiliberal e anti-individualista das garantias institucionais, que buscam proteger as instituições, e não as pessoas. Há também um forte elemento conservador de manutenção do status quo presente na proteção jurídica voltada a resguardar as instituições, suas práticas e estruturas, contra a ação política e as eventuais mudanças por ela promovidas. Além disso, como demonstra Bercovici, uma vez que os direitos subjetivos ficam protegidos apenas se, e na medida em que estiverem ligados a alguma instituição, as garantias institucionais prevalecem sobre as garantias de liberdade. Assim segue o raciocínio do autor:

Ao separar os direitos fundamentais em três categorias (direitos de liberdade, garantias institucionais e garantias de instituto), fazendo prevalecer as duas últimas sobre a primeira, Schmitt deixa muito claro o que ele considera objeto de proteção na Constituição de Weimar: as instituições mais tradicionais e conservadoras do sistema jurídico-político, em detrimento dos direitos fundamentais propriamente ditos (BERCOVICI, 2002BERCOVICI, Gilberto. “Entre Institucionalismo e Decisionismo”, Novos Estudos nº 62, março de 2002. pp. 191-193.: 192).

Voltanto ao prefácio à 2ª edição do livro Teologia Política, Schmitt aponta algumas diferenças fundamentais entre os tipos de pensamento normativista, decisionista e institucional, no que toca a sua estutura e o seu funcionamento:

Enquanto o puro normativista pensa em termos de regras impessoais, e o decisionista implementa o bom direito da situação política corretamente reconhecida por meio de uma decisão pessoal, o pensamento jurídico institucional se desdobra em instituições e organizações que transcendem a esfera individual. E enquanto o normativista, na sua distorção, torna o direito um mero modo de operação da burocracia estatal, e o decisionista, focando no momento, sempre corre o risco de perder o conteúdo estável inerente a todo grande movimento político, um pensamento institucional isolado leva ao pluralismo característico de um crescimento feudal-corporativo que é desprovido de soberania (SCHMITT, 1934bSCHMITT, Carl. “Preface to the second edition (1934b)”. Political Theology: four chapters on the concept of sovereignty. Translated by George Schwab; foreword by Tracy Strong. Chicago: The University of Chicago Press, 2005.: 3).7 7 Tradução livre do original: “Whereas the pure normativist thinks in terms of impersonal rules, and the decisionist implements the good law of the correctly recognized political situation by means of a personal decision, institutional legal thinking unfolds in institutions and organizations that transcend the personal sphere. And whereas the normativist in his distortion makes of law a mere mode of operation of a state bureaucracy, and the decisionist, focusing on the moment, always runs the risk of missing the stable content inherent in every great political movement, an isolated institutional thinking leads to the pluralism characteristic of a feudal-corporate growth that is devoid of sovereignty”.

A partir do trecho transcrito, fica clara a influência de Hauriou sobre Schmitt, tendo em vista a afirmação do caráter supra-pessoal das instituições e do conteúdo estável que elas buscam resguardar. Vale lembrar que, para Hauriou, o sistema jurídico não era fruto da vontade (do soberano ou das partes contratantes), mas de um fato social, entendido como a organização de um poder em torno de uma ideia. As instituições representam o elemento de duração e de continuidade, funcionando como uma obra ou um empreendimento que se realiza juridicamente no meio social e, para isso, organiza um poder, cria regras e busca os órgãos necessários (HAURIOU, 1968HAURIOU, Maurice. La Teoria de la Institucion y de la Fundacion: ensayo de vitalismo social. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1968.: 39).

Também é possível depreender da citação a resistência de Schmitt em relação a um “pensamento institucional isolado” que poderia conduzir a um pluralismo “desprovido de soberania”. Nas reflexões que desenvolve daí em diante sobre o pensamento da ordem concreta, especialmente no texto Sobre os três tipos de pensamento jurídico, de 1934, Schmitt apresenta a sua versão do institucionalismo como fórmula capaz de superar os paradigmas normativista e decisionista e de atender às necessidades da realidade jurídica alemã. Não obstante, o pensamento da ordem concreta não rejeita o cerne do decisionismo, como será visto em seguida.

2. O pensamento da ordem concreta e sua relação com o decisionismo

De acordo com o próprio Schmitt, o texto Sobre os três tipos de pensamento jurídico serviu de fundamento para discursos que ele proferiu, nos meses de fevereiro e março de 1934, perante organizações de juristas nacional-socialistas, especificamente a Sociedade Imperador Guilherme para o Fomento das Ciências e a Federação de Juristas Alemães Nacional-Socialistas (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 132). O público-alvo ao qual Schmitt se dirigia e os objetivos políticos concretos que estavam em jogo são de importância central para compreender o texto. Sabe-se que Schmitt buscava, então, tornar-se um jurista influente e intervir na elaboração de um projeto constitucional para o sistema político nazista. Outro aspecto relevante é que o livro foi publicado em 1934 pela Hanseatische Verlagsanstalt, editora conhecida pela orientação nacionalista de direita e por contar com uma clientela de escritores e leitores nazistas. A obra também foi lançada como uma publicação da Academia Nazista de Direito Alemão, sob a responsabilidade editorial do Ministro Hans Frank, um dos principais juristas de sustentação do regime (BENDERSKY, 2004BENDERSKY, Joseph W. “Introduction: The Three Types of Juristic Thought in German Historical and Intellectual Context”. In: SCHMITT, Carl. The Three Types of Juristic Thought. Londres: George Schwab, Series Editor, 2004.: 2).

No período pós-Segunda Guerra, este e outros textos de Schmitt, produzidos na fase nazista, foram ignorados em bloco ou condenados como uma mera tentativa de legitimação e de manipulação política, e por isso considerados como intrinsecamente suspeitos. Somente com a retomada dos estudos sobre o autor na década de 1980 é que se renovou o interesse pela sua obra também durante o nacional-socialismo. Passou-se a reconhecer, então, a necessidade de uma investigação séria para entender tanto o percurso do pensamento de Schmitt, como suas relações com o nazismo (BENDERSKY, 2004BENDERSKY, Joseph W. “Introduction: The Three Types of Juristic Thought in German Historical and Intellectual Context”. In: SCHMITT, Carl. The Three Types of Juristic Thought. Londres: George Schwab, Series Editor, 2004.: 3).

Em linhas gerais, o texto Sobre os três tipos de pensamento jurídico se dedica a expor as diferenças entre os pensamentos normativista, decisionista e da ordem concreta, este último apresentado como superação aos dois primeiros. Em particular, Schmitt busca relacionar os tipos de pensamento jurídico com determinados povos e momentos históricos. Argumenta, assim: que o sistema medieval se estruturava a partir de ordens concretas; que o decisionismo encontrou a sua expressão mais autêntica na teoria da soberania de Hobbes e permitiu a superação do pluralismo jurídico e a construção de uma ordem monista na passagem para a Idade Moderna; e que o normativismo típico da ordem constitucional liberal se tornou predominante no século XIX e, combinando-se ao pensamento decisionista, deu origem ao positivismo jurídico (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 156-157).

Tratando especificamente do caso alemão, Schmitt afirma que o pensamento da ordem concreta nunca deixou de existir, embora tenha sido combatido pelo positivismo legalista no século XIX. Ordenamentos concretos como a família, o matrimônio e a igreja não teriam sido eliminados pelo normativismo abstrato, mas continuariam a definir a realidade da vida jurídica na Alemanha (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 157). Diante da tentativa das ideias liberais de dissolver o pensamento da ordem concreta, Schmitt invoca a resistência “do espírito do povo alemão” e seus representantes no campo teórico, como Fichte, Schelling, Savigny e - no patamar de síntese dessas correntes - Hegel. Esses autores defenderiam um conceito alemão de Estado que se apartaria fundamentalmente do conceito de Estado de Direito liberal.

Para além do embate teórico, Schmitt nota que, na prática, o positivismo nunca teria se fixado na realidade alemã, a não ser na superfície. Particularmente, ele destaca como o pensamento da ordem concreta permaneceu vivo na práxis da Administração Pública e do exército prussiano, uma vez que “eram em si mesmas formações e ordenamentos demasiado firmes e plenos de vitalidade a ponto de deixarem desnaturar o seu direito próprio interno por um pensamento legalista de matriz normativista ou positivista” (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 164). De fato, para Schmitt, os conceitos relativos ao poder de organização, de serviço e de prestação, na Administração Pública, e a ligação entre os conceitos de liderança, disciplina e honra na estrutura militar, teriam um papel tão central na ordem concreta das duas instituições que elas não seriam possíveis sem contar com essas construções conceituais, incabíveis na lógica do pensamento normativista abstrato.

Fica evidente como Schmitt busca localizar, na história das ideias e da prática jurídica alemã, provas do enraizamento de uma compreensão e do funcionamento do direito como ordem concreta. Sua estratégia argumentativa passa pela apropriação de autores e exemplos do passado a fim de reforçar a tese de que a influência institucionalista sempre esteve presente na história do direito na Alemanha. Aproveita-se, assim, para conciliar a nova ordem jurídica nazista com o caráter conservador das concepções institucionalistas “por parecerem reconhecer o caráter natural, a dignidade e a intangibilidade da família, da Igreja, da propriedade e da empresa” (SEELAENDER, 2009SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite. “Juristas e ditaduras: uma leitura brasileira”. In: FONSECA, Ricardo Marcelo; SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite (Org.). História do Direito em Perspectiva: do Antigo Regime à Modernidade. Curitiba: Juruá Editora, 2009. pp. 415-432.: 426).

O texto também incorpora algo que está no cerne do institucionalismo e que diz muito sobre a virada de Schmitt para o pensamento da ordem concreta. Institucionalistas rejeitam a separação entre ser x dever-ser porque pensam o direito dentro da realidade social, já mediada e construída juridicamente, ou seja, no interior das instituições que influenciam e determinam o próprio funcionamento e a reprodução do direito (MACEDO JR, 2011MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 80). Como consequência, não são as normas que criam as instituições, mas as instituições que produzem suas regras, o que implica em uma normatização do factual que visa extrair o dever-ser do ser (SEELAENDER, 2009SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite. “Juristas e ditaduras: uma leitura brasileira”. In: FONSECA, Ricardo Marcelo; SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite (Org.). História do Direito em Perspectiva: do Antigo Regime à Modernidade. Curitiba: Juruá Editora, 2009. pp. 415-432.: 428). Ou seja, inverte-se o elemento contrafactual do direito para afirmar, ao contrário, que as coisas devem ser da forma como elas são e porque sempre foram assim.

Para Schmitt, tal raciocínio diferencia normativismo e pensamento da ordem concreta, na medida em que: “Todo e qualquer ordenamento, também o ‘ordenamento jurídico’, está vinculado a conceitos normais concretos que não são derivados de normas genéricas, mas geram tais normas a partir de seus própios ordenamentos e com vistas a ele” (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 143). Schmitt assimila, neste ponto, as lições de Santi Romano, que caracterizava o ordenamento jurídico como uma entidade que, acima de mover-se segundo as regras, movia as próprias regras. Por isso, “uma alteração da norma é mais consequência do que causa de uma alteração do ordenamento” (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 144).

Na sua análise sobre o pensamento decisionista, Schmitt observa que suas primeiras formulações, pré-modernas, não apresentavam uma decisão pura, mas “limitada e integrada pelo pensamento do ordenamento; ela emana de um ordenamento pressuposto” (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 145). Somente com Hobbes é que se desenvolve o decisionismo puro e autêntico, caracterizado por uma decisão soberana que “nasce de um nada normativo e de uma desordem concreta” e que funda tanto a norma como o ordenamento porque representa o início absoluto (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 147).

Tendo percorrido a evolução do pensamento e da prática jurídica, Schmitt conclui, com apoio nas teorias de Maurice Hauriou e Santi Romano, que “o mero restabelecimento de um conceito de ‘instituição’ supera tanto o normativismo até o momento presente quanto o decisionismo, e com eles também o positivismo composto por ambos” (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 168). Embora pareça indicar um afastamento em relação ao decisionismo, logo em seguida, Schmitt confere ao Estado um papel superior perante as demais ordens concretas, atuando como a “instituição das instituições”:

Para o modo de pensar do institucionalismo, o próprio Estado não é mais uma norma ou um sistema de normas, também não mera decisão soberana, mas a instituição das instituições, em cujo ordenamento numerosas outras instituições, independentes entre si, encontram a sua proteção e ordem (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 168).

Na medida em que o Estado, encabeçado pelo Führer, é responsável pela preservação e equilíbrio das demais instituições, o pensamento da ordem concreta parece se conciliar com a teoria da decisão e da soberania em Schmitt. Neste ponto, é preciso compreender melhor como vai se organizar, no pensamento de Schmitt, a tensa relação entre o pluralismo institucionalista, de um lado, e o monismo decisionista, do outro (MACEDO JR, 2001: 106).

Alguns autores discordam que se possa falar em pluralismo jurídico na versão institucionalista de Schmitt. É o entendimento de Mariano Croce, para quem, ao incluir o elemento decisionista no pensamento da ordem concreta, Schmitt teria adotado uma versão identitária e ética do paradigma institucionalista, caracterizada pela lógica monista e incompatível com o pluralismo de modelos normativos que coexistem no meio social. Ao contrário de Schmitt, para Croce, a teoria de Santi Romano conectaria institucionalismo e pluralismo ao identificar cada instituição como uma ordem legal autônoma (CROCE, 2011CROCE, Mariano. “Does legal institutionalism rule out legal pluralism? Schmitt’s institutional theory and the problem of the concrete order”. Utrecht Law Review. Volume 7, Issue 2 (April) 2011, pp. 42-59.: 53-55). No presente artigo, entendo, em outra linha, que Schmitt concilia institucionalismo e decisionismo sem abrir mão de dar vida própria às ordens concretas como campos de normatização autônomos, ou seja, como fontes do direito. A reforçar a possibilidade de conjugação, a teoria do ordenamento jurídico de Santi Romano também considera o Estado como a “instituição das instituições” e, sob um discurso de defesa do pluralismo, legitima o poder e o autoritarismo dentro das instituições (SEELAENDER, 2009SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite. “Juristas e ditaduras: uma leitura brasileira”. In: FONSECA, Ricardo Marcelo; SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite (Org.). História do Direito em Perspectiva: do Antigo Regime à Modernidade. Curitiba: Juruá Editora, 2009. pp. 415-432.: 427).

Como visto, o pensamento institucionalista parte da ideia de que determinadas instituições pré-existentes representam campos autônomos de normatização que devem ser protegidos contra a política. O reconhecimento de diversas fontes do direito está ligado à preocupação em manter-se o status quo a partir da identificação do direito com a ordem e da busca pela preservação de certas estruturas contra transformações políticas. Para Seelaender, Schmitt percebeu a utilidade do institucionalismo para o regime nazista na “possibilidade de exorcizar as inseguranças do voluntarismo legislativo democrático predefinindo a família, o Estado e a empresa como instituições dotadas de vida própria e normatividade concreta” (SEELAENDER, 2009SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite. “Juristas e ditaduras: uma leitura brasileira”. In: FONSECA, Ricardo Marcelo; SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite (Org.). História do Direito em Perspectiva: do Antigo Regime à Modernidade. Curitiba: Juruá Editora, 2009. pp. 415-432.: 426). Desse modo, o jurista pôde apoiar a implantação do regime nacional-socialista sem abrir mão dos elementos conservadores anti-Weimar.

Isso não significa que a versão institucionalista de Schmitt tivesse a pretensão de moderar o regime nazista ou que partilhasse da crença de que o Führer ficaria limitado ou controlado pelo povo e pelas instituições. Essa é a interpretação de importantes comentaristas da obra de Schmitt, como Joseph Bendersky e George Schwab, em certa medida compartilhada por Ronaldo Macedo Jr. quando indica que Schmitt acreditava que o institucionalismo poderia conter o Führer e não previa a barbárie nazista (MACEDO JR., 2001: 15).

Não obstante, é importante lembrar que Schmitt buscou legitimar os atos mais atrozes praticados por Hitler, como o extermínio na chamada “Noite das Facas Longas” e as leis de Nuremberg, que legalizavam a doutrina racial e foram chamadas por Schmitt como a “Constituição da Liberdade” (SCHMITT, 1935). Além disso, no campo teórico, o pensamento da ordem concreta se mostra compatível com o decisionismo, uma vez que cabe à decisão soberana o papel de fundar a unidade política e de estabelecer a normalidade sob a qual se organizam as instituições. Como demonstra a passagem citada acima, para Schmitt, o Estado detém a prerrogativa de garantir o equilíbrio entre as ordens concretas, podendo, para tanto, intervir a qualquer momento na ordem jurídica. Ou seja, cabe ao Estado unir e subordinar “as demais instituições, estabelecendo uma relação de hierarquia entre elas” (MACEDO JR., 2001: 105).

Como consequência, as ordens concretas parciais ficam submetidas e referenciadas à ordem total. Ou seja, embora fossem reconhecidas como campos autônomos de normatização, as ordens concretas retiram seu significado de uma totalidade superior, que poderia ser “a visão de mundo nacional-socialista, a ordem global do povo [völkisch] ou ainda a comunidade popular racial” (ROQUES, 2006ROQUES, Christian. “Interprétation de la loi et perversion du droit”, Astérion [En ligne], 4 | 2006, mis en ligne le 24 avril 2006, consulté le 15 janvier 2016. URL : http://asterion.revues.org/650
http://asterion.revues.org/650...
: § 45)8 8 No original: “Or cette totalité supérieure est la vision du monde national-socialiste, l’ordre global völkisch ou encore la communauté populaire raciale”. .

Para Ronaldo Macedo Jr., a partir do pensamento da ordem concreta, a posição de Schmitt teria se convertido em um tipo de decisionismo “mitigado” ou institucionalista (MACEDO JR, 2001: 99). Nesse tipo de “decisionismo institucionalista”, segundo ele, “O pensamento do ordenamento concreto de Schmitt combina instituição à decisão de maneira sincrética, coerente e sistemática” (MACEDO JR., 2001: 104). A despeito dessa versão atenuada, Gilberto Bercovici observa que não há propriamente uma ruptura entre o decisionismo e o pensamento da ordem concreta, inclusive porque a condição de existência das ordens concretas sob o domínio nazista teria sido a decisão tomada em 1933, responsável por superar a ordem jurídica de Weimar e o seu normativismo positivista e por fundar uma nova unidade política. Assim argumenta Bercovici:

a ditadura decisionista aparece como conseqüência inevitável do pensamento do “ordenamento concreto”, pois a condição necessária para que este exista como assegurador da unidade política é a decisão política incontestável. (…) A “decisão” (…) ansiada pelo autor em todo o período weimariano, foi tomada em 1933. O fim da República de Weimar foi o fator que deu origem ao “ordenamento concreto” defendido por Schmitt em 1934 (BERCOVICI, 2002BERCOVICI, Gilberto. “Entre Institucionalismo e Decisionismo”, Novos Estudos nº 62, março de 2002. pp. 191-193.: 192-193).

Nesses termos, a decisão instaura a ordem e define o fundamento de validade do sistema jurídico e da unidade política na qual se estruturam as instituições. Com base nessa definição, as ordens concretas ganham autonomia e passam a atuar como fontes normativas próprias, mas o soberano permanece como árbitro da normalidade jurídica. Como defende Schmitt no texto O Führer protege o Direito, retomado mais à frente, a necessidade extrema constitui o princípio último da ordem jurídica e autoriza o Führer a criar o direito “sem mediações”, no exercício da liderança política em momentos de crise ou de exceção (SCHMITT, 1934aSCHMITT, Carl. “O Führer protege o direito” (1934a). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 179).

Diante dessa estruturação do pensamento da ordem concreta, parece correto concluir que, para Schmitt, “as instituições, a despeito de terem vida própria e autônoma, não se constituem num contrapeso ao poder do Estado” (MACEDO JR., 2001: 108). Isso ocorre não só porque o Estado mantém um papel superior, mas também porque, no domínio nazista, as ordens concretas deveriam ser lidas a partir da visão de mundo nacional-socialista. Pode-se imaginar, nesse sentido, que as instituições dignas de proteção seriam, por exemplo, a empresa ariana e a família ariana. Por sua vez, a possibilidade de tais construções remete à adoção de métodos de interpretação jurídica que, afastando perspectivas positivistas e formalistas, permitiriam uma politização ou ideologização do direito, colocado a serviço dos objetivos de dominação nazista.

3. Métodos de interpretação e nazificação do direito

O pensamento da ordem concreta representa, para Schmitt, a superação do positivismo no direito alemão também no campo da interpretação legal. No lugar da ficção da segurança jurídica e da previsibilidade, Schmitt observa que todas as esferas da vida jurídica tinham sido invadidas por cláusulas gerais e conceitos vagos (SCHMITT, 1933SCHMITT, Carl. State, Movement, People: the triadic structure of the political unity (1933); The question of legality (1950). Edited, translated and with a preface by Simona Draghici. Corvallis: Plutarch Press, 2001.: 49). Assim ele retrata essa situação jurídica:

Na Alemanha, pode-se reconhecer hoje mais nitidamente em que medida o tempo do positivismo jurídico está encerrado. De todos os lados e em todas as áreas da vida jurídica as assim chamadas cláusulas gerais avançam em um volume que suspende toda e qualquer “segurança” positivista: conceitos indeterminados de toda e qualquer espécie, remissões a critérios de aferição e representações extralegais, tais como bons costumes, boa-fé, exigibilidade e não exigibilidade, justa causa etc (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 170).

Para Schmitt, tais cláusulas gerais poderiam ser utilizadas como mecanismos para a nazificação do direito alemão por meio de um processo de reinterpretação das leis, dispensando modificações legislativas e permitindo a afirmação de um novo tipo de pensamento jurídico, que ele identifica como o pensamento da ordem concreta:

H. Lange reconheceu essas cláusulas gerais como veículos do direito natural, portadoras de novas ideias, “ovos de cuco” no sistema jurídico liberal, intepretando-as como sinais da superação do pensamento jurídico positivista surgido no séc. XIX. No momento em que conceitos como “boa-fé”, “bons constumes” etc não são referidos à sociedade contratualista burguesa, caracterizada pelo individualismo, mas aos interesses da totalidade do povo [Volksganze], todo o direito se transforma efetivamente, sem que se faça necessário alterar uma única lei “positiva”. Por isso sou da opinião que nessas cláusulas gerais um novo modo de pensamento jurídico se pode afirmar. Mas elas não devem então ser usadas como mero corretivo do positivismo até agora existente, mas como meios específicos de um novo tipo de pensamento na ciência do direito (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 170-171) (grifos acrescidos).

O trecho citado começa com uma referência a Heinrich Lange, outro jovem jurista ligado ao nazismo que, em 1933, tinha publicado o texto “Liberalismo, Nacional-socialismo e Direito Burguês”9 9 No original: Liberalismus, Natinalsozialismus und bürgerliches Recht, Tübingen, 1933. , no qual sustentava que as cláusulas gerais serviriam para colocar os “ovos de cuco” nazistas no direito alemão (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 170). Para Schmitt, esses “ovos de cuco” podiam ser colocados em todos os ramos do direito.

No direito penal, por exemplo, tipos penais indeterminados “tais como infidelidade, traição contra o povo e contra a economia nacional” introduziam apreciações valorativas e políticas na interpretação das normas. No direito tributário, por sua vez, o código alemão de 1919 determinava a interpretação das leis tributárias de acordo com “a sua finalidade, o seu significado econômico e o desenvolvimento das relações [sociais e econômicas]”. Esses conceitos, para Schmitt, “se referem sem mediações à realidade concreta de uma relação vital” e “conduzem necessariamente a uma nova espécie de pensamento que faz justiça aos ordenamentos dados ou novos crescentes da vida” (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 173). Os princípios genéricos permitiriam, assim, interpretar as normas jurídicas de acordo com a realidade das ordens concretas que tinham suas disciplinas próprias impregnadas pelas concepções nazistas.

Outros ramos do direito também sofreram mudanças com a introdução de princípios e conceitos abertos, suscetíveis de interpretação segundo os preceitos do nacional-socialismo. Assim, “o novo Direito Público e Direito Administrativo impuseram o princípio da liderança [Führergrundsatz], com ele conceitos como fidelidade, obediência [Gefolgschaft], disciplina e honra, que só podem ser compreendidos a partir de um ordenamento e uma comunidade concretos” (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 174).

O legislador nacional-socialista alterou, ainda, a legislação trabalhista, para romper com uma visão jusprivatista e individualista do direito do trabalho. A própria nomenclatura adotada é significativa nesse sentido: no lugar de “contrato coletivo de trabalho”, a lei passa a falar de “ordenamento salarial”; ao invés de empregadores e empregados, refere-se a “líderes e seguidores” da empresa, que “trabalham conjuntamente para fomentar as finalidades da empresa e em benefício comum do povo e do Estado” (SCHMITT, 1934SCHMITT, Carl. “Sobre os três tipos do pensamento jurídico” (1934). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 175). Essa nova regulamentação reflete uma concepção institucionalista de empresa, como explica Airton Seelaender:

No campo do direito do trabalho, essa concepção institucionalista de empresa logo se refletiu na jurisprudência alemã, fazendo com que se impusesse a idéia de uma “ordem concreta da empresa”, comunidade de colaboração regida por um pequeno “Fuhrer empresarial”. Comunidade, aliás, inspirada em uma concepção “germânica” supostamente inacessível aos judeus, que não poderiam invocá-la para exercer todos os direitos da legislação trabalhista (SEELAENDER, 2009SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite. “Juristas e ditaduras: uma leitura brasileira”. In: FONSECA, Ricardo Marcelo; SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite (Org.). História do Direito em Perspectiva: do Antigo Regime à Modernidade. Curitiba: Juruá Editora, 2009. pp. 415-432.: 426-427).

Outros exemplos de cláusulas gerais também podiam ser encontrados, ainda, no direito civil. Segundo Curran, refletindo sobre a obra de Bernd Rüthers, algumas cláusulas contratuais foram utilizadas para privar os judeus de direitos, por exemplo, por considerar uma ofensa aos “bons costumes” ou uma violação da “boa-fé” caracterizada pelo simples fato de a parte ser judia (CURRAN, 2001CURRAN, Vivian Grosswald. “Fear of Formalism: Indications from the Fascist Period in France and Germany of Judicial Methodology's Impact on Substantive Law”. Cornell International Law Journal, Vol. 35, (Nov. 2001-Feb. 2002), pp. 101-187.-2002: 173).

Ao associar conceitos amplos e imprecisos à realidade concreta do povo e do Estado alemão, Schmitt abria espaço para a incorporação da ideologia nazista pela via da intepretação das normas, antigas e novas. A nazificação do direito ocorreria, por excelência, no momento de aplicação, quando a situação concreta é considerada para fixar o entendimento das normas. Por isso o papel de juízes e dos tribunais nesse processo é determinante e não se limita a uma aplicação mecânica das leis. Ao contrário, os órgãos julgadores deveriam preencher o conteúdo das cláusulas e princípios de acordo com a visão de mundo nazista (STOLLEIS, 2007STOLLEIS, Michael. “Law and Lawyers preparing the Holocaust”. Annu. Rev. Law Soc. Sci. 2007. 3: pp. 213-231.: 221).

Por isso também não é fortuita a referência de Schmitt ao Führer como “juiz supremo” ao justificar a legalidade do ato de Hitler que determinou o expurgo e a execução de diversos membros do partido nazista, no episódio que ficou conhecido como “Noite das facas longas”. No texto “O Führer protege o Direito”, Schmitt legitima o ato de Hitler como “o exercício de uma autêntica judicatura”, que não está sujeito à justiça porque “ele mesmo foi a justiça suprema”. Em suas palavras:

O Führer protege o direito do pior abuso, quando ele, no instante do perigo, cria o direito sem mediações, por força da sua liderança [Führertum] e enquanto Juiz Supremo. (…) O verdadeiro líder [Führer] sempre é também juiz. Da liderança [Führertum] emana a judicatura [Richtertum] (…).

A judicatura do Führer brota da mesma fonte do direito da qual brota também todo e qualquer direito de qualquer povo. Na necessidade suprema, o direito supremo prova o seu valor [bewährt sich] e manifesta-se o grau mais elevado da realização judicantemente vingativa desse direito (SCHMITT, 1934aSCHMITT, Carl. “O Führer protege o direito” (1934a). In: MACEDO JR. Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. 2a ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.: 178-179).

O recurso a cláusulas gerais e princípios deveria permitir a assimilação da visão nacional-socialista para alinhar a atuação dos tribunais à vontade do Führer, enquanto intérprete último e encarnação dos “interesses do povo alemão” e do “espírito nacional” (KAUFMANN, 1988KAUFMANN, Arthur. “National Socialism and German Jurisprudence from 1933 to 1945”. Cardozo Law Review, Vol. 9:1629, 1988, pp. 1629-1649.: 1640-41). Nesse ponto, Schmitt apoiava a declaração do secretário de Estado, “Dr.” Freisler, no sentido de que a consolidação do direito nazista não demandava uma reforma da justiça, mas sim uma reforma dos juristas.10 10 No original: “Disregard of original legislative intent by ideologically guided judges became far more significant in the ev-eryday legal life of National Socialism than injustice directly commanded by the law-maker”. Como explica Michel Stolleis: “A desconsideração da intenção legislativa original por juízes ideologicamente guiados se tornou bem mais relevante no dia-a-dia da vida jurídica do nacional-socialismo do que a injustiça diretamente comandada pelo legislador” (STOLLEIS, 2007STOLLEIS, Michael. “Law and Lawyers preparing the Holocaust”. Annu. Rev. Law Soc. Sci. 2007. 3: pp. 213-231.: 221). Em particular, na interpretação e aplicação do direito alemão, Schmitt argumentava que os juízes deveriam demonstrar compromisso com o princípio da identidade étnica, que está na base das doutrinas nazistas de superioridade racial (SCHMITT, 1933SCHMITT, Carl. State, Movement, People: the triadic structure of the political unity (1933); The question of legality (1950). Edited, translated and with a preface by Simona Draghici. Corvallis: Plutarch Press, 2001.: 50).

De forma mais ampla, a respeito da formação das carreiras jurídicas segundo o espírito nacional-socialista, em texto de 1936 sobre o direito no Terceiro Reich, Karl Loewenstein enfatiza:

O treinamento de jovens juristas foi centralizado e tornado uniforme. Nenhum candidato a serviços judiciais é aceito a não ser que passe por um curso específico de educação em um “campo de treinamento”, não sobre matérias jurídicas, mas sobre o espírito do Nacional Socialismo. Antes da admissão, ele é submetido a uma investigação profunda quanto à devida fidelidade e subserviência (LOEWENSTEIN, 1936LOEWENSTEIN, Karl. “Law in the Third Reich”. Yale Law Journal, Vol. 45, 1936, pp. 779-815.: 794)11 11 No original: “the training of young jurists was centralized and made uniform. No applicant for judicial service is accepted unless he undergoes a specified course of education in a ‘training camp’, not in legal matters, but in National Socialist spirit. Before admission, he is subjected to a searching investigation as to proper allegiance and subservience”. .

A centralidade da interpretação e da atuação dos juristas no processo de nazificação do direito desconstroi a tese, dominante por muitos anos, de que o positivismo jurídico teria sido responsável por colocar o direito a serviço dos objetivos totalitários do regime nacional-socialista. Esta tese foi sustentada, logo após o final da Segunda Guerra Mundial, por Gustav Radbruch, que tinha sido perseguido e afastado da universidade pelo regime nazista. Para Radbruch, ao obrigar o cumprimento de leis manifestamente injustas e criminosas, o positivismo não só teria conferido uma aparência de legalidade aos atos nazistas, como teria tornado “impotente toda defesa possível contra os abusos da legislação nacional-socialista” (RADBRUCH, 2006RADBRUCH, Gustav. “Statutory Lawlessness and Supra-Statutory Law” (1946). Oxford Journal of Legal Studies, Vol. 26, No. 1 (2006), pp. 1-11.: 8). Com isso, tal entendimento, por um lado, culpava o positivismo e, por outro, inocentava os juristas.

Somente após vinte anos, especialmente a partir da publicação do livro “Interpretação Ilimitada” de Bernd Rüthers, em 1968, é que avançaram os estudos sobre a relação entre direito e regime totalitário.12 12 Sobre as razões da demora desses estudos e, entre elas, a resistência dos próprios juristas para encarar seus posicionamentos no passado, ver (STOLLEIS, 2001). A obra de Rüthers foi precursora em demonstrar que o principal mecanismo para a nazificação da ordem jurídica não tinha sido a mudança das leis, mas a reinterpretação do direito existente à luz do espírito nacional-socialista (STOLLEIS, 2007STOLLEIS, Michael. “Law and Lawyers preparing the Holocaust”. Annu. Rev. Law Soc. Sci. 2007. 3: pp. 213-231.: 221; SEELAENDER, 2009SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite. “Juristas e ditaduras: uma leitura brasileira”. In: FONSECA, Ricardo Marcelo; SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite (Org.). História do Direito em Perspectiva: do Antigo Regime à Modernidade. Curitiba: Juruá Editora, 2009. pp. 415-432.: 427). Inclusive porque não seria possível alterar de imediato todas as leis herdadas da República de Weimar, a proposta de “renovação do direito” deveria “fornecer a metodologia que permitiria aos juízes utilizar o corpo jurídico antigo em um sentido favorável ao novo regime” (ROQUES, 2006ROQUES, Christian. “Interprétation de la loi et perversion du droit”, Astérion [En ligne], 4 | 2006, mis en ligne le 24 avril 2006, consulté le 15 janvier 2016. URL : http://asterion.revues.org/650
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: §11).

Em uma análise minuciosa sobre a obra de Bernd Rüthers, Christian Roques explica que haveria um dualismo metodológico no campo da interpretação jurídica durante o nazismo. De um lado, os juízes deviam reinterpretar o direito anterior de acordo com a visão de mundo nacional-socialista. Do outro lado, no caso de aplicação de normas criadas pelo regime nazista, os juízes estariam vinculados à letra da lei (ROQUES, 2006ROQUES, Christian. “Interprétation de la loi et perversion du droit”, Astérion [En ligne], 4 | 2006, mis en ligne le 24 avril 2006, consulté le 15 janvier 2016. URL : http://asterion.revues.org/650
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: §30). No mesmo sentido Loeweinstein argumenta que, no primeiro momento, os juízes foram incentivados a se afastar do direito legislado para fazer valer os valores nazistas. Posteriormente, recuperou-se o ideal de obediência cega da lei, uma vez que a lei representava o comando infalível do Führer (LOEWENSTEIN, 1936LOEWENSTEIN, Karl. “Law in the Third Reich”. Yale Law Journal, Vol. 45, 1936, pp. 779-815.: 803).

Nesse ponto, um institucionalismo de cunho nazista seria útil para orientar a atividade de interpretação e de aplicação do direito pelos juízes, como explica Airton Seelaender:

Tendencialmente conservador, o institucionalismo podia, contudo, ser instrumentalizado pelo projeto nazista, desde que se nazificasse a própria compreensão da instituição. Como os demais institucionalistas, os adeptos da versão schmittiana dessa corrente ("konkretes Ordnungsdenker”) partiam da idéia de que certos âmbitos da vida social (a família, a empresa, o funcionalismo, o exército etc.) tinham uma ordem interna e uma substância jurídica própria, que o juiz tinha de observar ao aplicar o anterior direito legislado. Os jurisconsultos do nazismo se esmeraram, porém, em reconceber as próprias instituições, remoldando conceitos jurídicos ao sabor da ideologia e dos interesses do regime (SEELAENDER, 2009SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite. “Juristas e ditaduras: uma leitura brasileira”. In: FONSECA, Ricardo Marcelo; SEELAENDER, Airton Cerqueira Leite (Org.). História do Direito em Perspectiva: do Antigo Regime à Modernidade. Curitiba: Juruá Editora, 2009. pp. 415-432.: 428).

As cláusulas gerais abriam espaço, portanto, para que os conteúdos das ordens concretas fossem determinados de forma decisionista e interpretados de acordo com os preceitos do nacional-socialismo. Para Schmitt, tal abertura no campo da aplicação do direito permitia que fossem dadas respostas concretas para situações concretas. Ao mesmo tempo, como afirma Ingeborg Maus, cláusulas como “boa-fé” ou “bons-costumes” já não se referiam à ordem jurídica individual burguesa, mas eram ressignificadas sob a nova ordem nazista (MAUS, 1997MAUS, Ingeborg. “The 1933 ‘Break’ in Carl Schmitt’s theory”. Canadian Journal of Law and Jurisprudence, Vol. X, No.1 (January 1997), pp. 125-140.: 135).

4. Considerações finais

A importância de análises sobre o papel de juristas e de teorias e métodos jurídicos na sustentação de regimes autoritários ou totalitários não se limita a aprofundar o conhecimento sobre determinados autores/atores ou sobre o funcionamento do direito nesses períodos. Este tipo de investigação histórica também se liga a preocupações do presente e pode contribuir para se desenvolver uma consciência mais crítica na resposta a problemas atuais. Ao mesmo tempo, a tarefa de se historicizar ideias e conceitos jurídicos pode ajudar a desnaturalizá-los e a questionar determinados sentidos que são atribuídos a eles como essências.

O objetivo do presente artigo foi analisar parte da produção teórica de Carl Schmitt na sua chamada fase nazista. Algumas questões que moveram o texto diziam respeito a aspectos internos ao pensamento de Schmitt: em que medida suas ideias durante e após a queda da República de Weimar são conciliáveis; de que modo a matriz institucionalista serviu para a construção do pensamento da ordem concreta; o que resta do decisionismo dentro deste novo entendimento. O resultado, no entanto, seria pouco consistente se a pretensão de examinar os textos de Schmitt não fosse acompanhada da consideração do seu contexto, seus objetivos políticos, suas estratégias discursivas e seus interlocutores.

Nesse sentido, a atuação de Schmitt como jurista ligado ao regime nacional-socialista tem impacto nas teses por ele desenvolvidas. No entanto, se algumas publicações possuem um conteúdo marcadamente panfletário, não é possível desconsiderar toda a sua produção como mero artifício para a legitimação da nova ordem ou como expressão de seu oportunismo político. Seguindo a linha de autores como Gilberto Bercovici, este artigo reforça a conclusão de que, embora não fosse necessária, a adesão de Schmitt ao nazismo foi coerente com as ideias já defendidas por ele. Haveria, portanto, mais continuidade do que ruptura na passagem do pensamento de Schmitt para a década de 1930.

Particularmente, a influência institucionalista remonta a concepções antiliberais e anti-individualistas que Schmitt já partilhava ao propor, em escritos do período de Weimar, que certas instituições mereciam uma proteção constitucional contra possibilidades de mudança legislativa e acima da garantia de direitos e liberdades individuais. Ao desenvolver essa ideia para conceber o pensamento da ordem concreta, Schmitt adapta a sua postura conservadora anti-Weimar à nova realidade jurídica do nacional socialismo.

Ao mesmo tempo, Schmitt concilia sua versão do institucionalismo com a perspectiva decisionista, seja porque as ordens concretas se organizam dentro de uma unidade política fundada a partir de uma decisão, que tinha sido tomada em 1933, seja porque essas ordens concretas parciais estavam referenciadas a uma totalidade superior. Com isso, ainda que as ordens concretas tivessem uma disciplina interna e normas próprias, elas deveriam ser lidas pela lente da visão de mundo nacional-socialista. A partir desta leitura, a introdução de cláusulas gerais em todos os ramos da ordem jurídica tornou-se um mecanismo de nazificação do direito pela via interpretativa.

Mesmo que as ideias de Schmitt não tenham se tornado fielmente a realidade jurídica do Terceiro Reich, a combinação entre o institucionalismo do pensamento da ordem concreta e os métodos de interpretação antiformalista e antipositivista constituiu um terreno fértil para a instrumentalização nazista do direito. Atentar para a construção dessas ideias, levando em conta o contexto político e os objetivos concretos que moviam o jurista, parece um exercício particularmente profícuo tendo em vista a influência que, tanto concepções institucionalistas do direito, como modelos principiológicos de interpretação legal - com forte carga axiológica e teleológica - continuaram a exercer no pensamento e na prática jurídica do pós-guerra.

  • 1
    No original, na biografia sobre Carl Schmitt, Bendersky relata que ele teria dito na entrevista: “I am a theorist”, “a pure scholar and nothing but a scholar”.
  • 2
    A esse respeito, ver o trabalho de Bernardo Ferreira sobre o pensamento antiliberal de Schmitt: (FERREIRA, 2004FERREIRA, Bernardo. O Risco do Político: crítica ao liberalismo e teoria política no pensamento de Carl Schmitt. Belo Horizonte: Editora UFMG; Rio de Janeiro: IUPERJ, 2004.).
  • 3
    É o caso, por exemplo, de Chantal Mouffe, que se apropria dos referenciais de Schmitt críticos à democracia liberal para resgatar a relação entre política e conflito, em defesa da ideia de pluralismo agonístico. Diferentemente de Schmitt, Mouffe não entende que democracia e liberalismo são incompatíveis, mas que se relacionam na forma de um paradoxo necessário (MOUFFE, 2000MOUFFE, Chantal. The Democratic Paradox. Londres, Nova York: Verso, 2000.: 9). Andrea Kalyvas também se propõe a investigar as contribuições do pensamento de Schmitt à teoria democrática. Amenizando os rótulos a ele atribuídos de conservador, niilista e anti-normativista, Kalyvas ressalta o papel central que Schmitt confere ao povo como soberano, sujeito do poder constituinte e núcleo da legitimidade democrática (KALYVAS, 2008KALYVAS, Andrea. Democracy and the politics of the extraordinary: Max Weber, Carl Schmitt and Hannah Arendt. Cambridge: Cambridge University Press, 2008.: 97).
  • 4
    Dois decretos marcaram a consolidação nazista no poder. O primeiro chamado Decreto do Incêndio do Reichstag foi aprovado pelo presidente, sob a pressão de Hitler, em 28 de fevereiro de 1933, em resposta ao incêncio do prédio do Parlamento, prevendo, entre outras medidas, a suspensão de diversos direitos e garantias. O segundo é conhecido como a Lei de Concessão de Plenos Poderes de 1933 ou Lei habilitante de 28 de março de 1933, que conferiu plenos poderes a Hitler.
  • 5
    Tradução livre do original: “The technical formula behind this essay may be described briefly as: a. a continuous repetition to reach saturation, past the audience’s expected ceiling of endurance; b. simple wording so that the ordinary man (...) could understand, and yet, c. the contente should de interesting enough so as to make everytbody else give it careful atention”.
  • 6
    Ano da primeira edição do seu livro “Crise da democracia parlamentar”.
  • 7
    Tradução livre do original: “Whereas the pure normativist thinks in terms of impersonal rules, and the decisionist implements the good law of the correctly recognized political situation by means of a personal decision, institutional legal thinking unfolds in institutions and organizations that transcend the personal sphere. And whereas the normativist in his distortion makes of law a mere mode of operation of a state bureaucracy, and the decisionist, focusing on the moment, always runs the risk of missing the stable content inherent in every great political movement, an isolated institutional thinking leads to the pluralism characteristic of a feudal-corporate growth that is devoid of sovereignty”.
  • 8
    No original: “Or cette totalité supérieure est la vision du monde national-socialiste, l’ordre global völkisch ou encore la communauté populaire raciale”.
  • 9
    No original: Liberalismus, Natinalsozialismus und bürgerliches Recht, Tübingen, 1933.
  • 10
    No original: “Disregard of original legislative intent by ideologically guided judges became far more significant in the ev-eryday legal life of National Socialism than injustice directly commanded by the law-maker”.
  • 11
    No original: “the training of young jurists was centralized and made uniform. No applicant for judicial service is accepted unless he undergoes a specified course of education in a ‘training camp’, not in legal matters, but in National Socialist spirit. Before admission, he is subjected to a searching investigation as to proper allegiance and subservience”.
  • 12
    Sobre as razões da demora desses estudos e, entre elas, a resistência dos próprios juristas para encarar seus posicionamentos no passado, ver (STOLLEIS, 2001STOLLEIS, Michael. “Reluctance to glance in the mirror: the changing face of german jurisprudence after 1933 and post-1945”. Fulton lectures, 2001.).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    13 Jun 2020
  • Aceito
    22 Dez 2020
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