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Qualificação da assistência de enfermagem paliativista no uso da via subcutânea

RESUMO

Objetivos:

descrever a experiência da realização de oficinas para o ensino da terapia de infusão de fluidos por via subcutânea em pacientes em cuidados paliativos.

Métodos:

relato de experiência baseado em quatro oficinas com carga horária de nove horas cada, abordando o ensino, a execução da técnica e o manejo na utilização da terapia de infusão de fluidos por via subcutânea em pacientes em cuidados paliativos. A instituição sediadora foi um hospital privado, que contava com duas unidades assistenciais no estado do Rio de Janeiro.

Resultados:

identificou-se pouco conhecimento acerca da temática. Pela dinâmica utilizada, as oficinas possibilitaram qualificar os participantes a executarem e a manejarem a via subcutânea em ambientes de cuidados paliativos.

Conclusões:

as oficinas foram importante meio de formação, qualificação e divulgação do cuidado de enfermagem em ambiente de cuidados paliativos. Os recursos utilizados possibilitam a qualificação na execução e no manejo da técnica apresentada.

Descritores:
Enfermagem Geriátrica; Cuidados Paliativos; Cuidados de Enfermagem; Vias de Administração de Medicamentos; Hipodermóclise

ABSTRACT

Objectives:

to describe the experience of conducting workshops for teaching the subcutaneous fluid infusion therapy in palliative care patients.

Methods:

experience report based on four workshops with a workload of nine hours each, addressing the teaching, implementation of the technique, and management in the use of subcutaneous fluid infusion therapy in patients in palliative care. The host institution was a private hospital, which had two care units in the state of Rio de Janeiro.

Results:

we identified little knowledge about the theme. Due to the dynamics used, the workshops made it possible to qualify the participants to perform and manage the subcutaneous route in palliative care environments.

Conclusions:

the workshops were an important means of training, qualification, and dissemination of nursing care in a palliative care environment. The resources used to enable the qualification in the execution and management of the presented technique.

Descriptors:
Geriatric Nursing; Palliative Care; Nursing Care; Drug Administration Routes; Hypodermoclysis

RESUMEN

Objetivos:

describir la experiencia de la realización de talleres para la enseñanza de la terapia de infusión de fluidos por vía subcutánea en pacientes en cuidados paliativos.

Métodos:

relato de experiencia basado en cuatro talleres con carga horaria de nueve horas cada, abordando la enseñanza, la ejecución de la técnica y el manejo en la utilización de la terapia de infusión de fluidos por vía subcutánea en pacientes en cuidados paliativos. La institución acogedora ha sido un hospital privado, que ha contado con dos unidades asistenciales en el estado de Rio de Janeiro.

Resultados:

se identificó poco conocimiento acerca de la temática. Por la dinámica utilizada, los talleres posibilitaron calificar los participantes a ejecutaren y a manejaren la vía subcutánea en ambientes de cuidados paliativos.

Conclusiones:

Los talleres han sido importante medio de formación, cualificación y divulgación del cuidado de enfermería en ambiente de cuidados paliativos. Los recursos utilizados posibilitan la cualificación en la ejecución y en el manejo de la técnica presentada.

Descriptores:
Enfermería Geriátrica; Cuidados Paliativos; Cuidados de Enfermería; Vías de Administración de Medicamentos; Hipodermóclisis

INTRODUÇÃO

Os cuidados paliativos compreendem abordagens com foco na qualidade de vida de pacientes e familiares, quando considerados os problemas associados às doenças que colocam a vida em risco(11 Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). Vamos falar de Cuidados Paliativos [Internet]. Rio de Janeiro: SBGG, 2015 [cited 2018 Jun 21]. Available from: https://sbgg.org.br//wp-content/uploads/2015/05/vamos-falar-de-cuidados-paliativos-vers--o-online.pdf
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). Nesse contexto, a enfermagem, partícipe da equipe interdisciplinar, deve se orientar pela avaliação precisa e pelo reconhecimento precoce, no sentido de prevenir e aliviar sofrimento. Deve reconhecer e tratar a dor, bem como outros sintomas, sem desconsiderar as questões de natureza psicossocial e espiritual(11 Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). Vamos falar de Cuidados Paliativos [Internet]. Rio de Janeiro: SBGG, 2015 [cited 2018 Jun 21]. Available from: https://sbgg.org.br//wp-content/uploads/2015/05/vamos-falar-de-cuidados-paliativos-vers--o-online.pdf
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), o que, não raras vezes, envolve medidas farmacológicas para o controle de sintomas.

No cotidiano de cuidados paliativos, enfermeiros e técnicos de enfermagem têm utilizado a via subcutânea para a administração de fármacos e soluções, objetivando tais medidas. O termo “hipodermóclise” é adequado quando são utilizadas infusões contínuas de soluções, em volumes maiores, no tecido subcutâneo. Quando há infusão em bólus de um fármaco em que um pequeno volume é administrado, descreve-se essa prática como utilização da via subcutânea(22 Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). O uso da via subcutânea em geriatria e cuidados paliativos [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: SBGG, 2017 [cited 2018 Jun 21]. Available from: http://sbgg.org.br/wp-content/uploads/2014/11/SBGG_guia-subcutanea_2aedicao.pdf
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)e não como hipodermóclise. Ela tem sido utilizada comumente em serviços de geriatria e de cuidados paliativos, por suas consideráveis vantagens, em detrimento das possíveis complicações(33 Nunes PM, Souza RC. [Adverse effects of hypodermoclysis in adult patients: an integrative review]. Rev Min Enferm [Internet]. 2016 [cited 2018 Jun 21]; 20:e951. Available from: http://www.reme.org.br/artigo/detalhes/1084 Portuguese.
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).

O conhecimento sobre essa técnica ainda é incipiente. Estudo recente, que buscou publicações sobre a temática, identificou poucos artigos que versam sobre ela, a saber: quatro produzidos no Brasil; quatro, nos Estados Unidos; um, na Alemanha; um, em Cuba; e um, na Suíça(44 Brito WA, Chibante CL, Espírito Santo FH. Hipodermóclise: ferramenta terapêutica para o cuidado de enfermagem e saúde. Rev Cubana Enferm [Internet]. 2017 [cited 2018 Jun 21];33(4). Available from: http://revenfermeria.sld.cu/index.php/enf/article/view/1182
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). Destes, apenas três tiveram enfermeiros como autores. Emerge, assim, a justificativa desta discussão, bem como a apresentação da estratégia de ensino.

A terapia de infusão de fluidos por via subcutânea constitui via alternativa quando existe dificuldade de se obter um acesso venoso ou quando da vigência de dificuldade de ingestão de líquidos por via oral, se presentes, por exemplo, náuseas e vômitos incoercíveis, diarreia, sonolência e confusão mental, entre outros sintomas. Essa terapia passa a ser, então, alternativa para a reposição de eletrólitos, soluções e administração de medicamentos(55 Oliveira SS, Sousa JA, Silva SdF, Jeremias WJ. Infusão subcutânea de analgésicos em pacientes oncológicos sob cuidados paliativos: uma revisão de literatura. e-Scientia. 2014;7(1).), que devem ser administrados de forma lenta no espaço subcutâneo, já que esse fluido é transferido para a circulação sanguínea por ação combinada entre difusão de fluidos e perfusão tecidual(66 Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Medidas de Prevenção de Infecção Relacionada à Assistência à Saúde [Internet]. 2ª ed. Brasília, DF: Anvisa, 2017 [cited 2018 Jun 21]. Série Segurança do Paciente e Qualidade em Serviços de Saúde. Available from: http://portal.anvisa.gov.br/documents/33852/3507912/Caderno+4+-+Medidas+de+Prevenção+de+Infecção+Relacionada+à+Assistência+à+Saúde/a3f23dfb-2c54-4e64-881c-fccf9220c373
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).

Quanto ao local de escolha para a punção, recomenda-se optar por regiões com maior quantidade de tecido subcutâneo(33 Nunes PM, Souza RC. [Adverse effects of hypodermoclysis in adult patients: an integrative review]. Rev Min Enferm [Internet]. 2016 [cited 2018 Jun 21]; 20:e951. Available from: http://www.reme.org.br/artigo/detalhes/1084 Portuguese.
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). Ao inserir um cateter, deve-se sempre buscar a preservação do conforto, da mobilidade e da independência do paciente. As regiões mais elegíveis são a torácica e a parede abdominal — esta última para volumes maiores. A região do tórax deve ser evitada para pacientes com caquexia, pelo risco de pneumotórax. Além disso, como sítio secundário, podem-se utilizar para punção os membros superiores, na região do deltoide; e os membros inferiores, na região anterolateral da coxa e, também, na região subclavicular(22 Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). O uso da via subcutânea em geriatria e cuidados paliativos [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: SBGG, 2017 [cited 2018 Jun 21]. Available from: http://sbgg.org.br/wp-content/uploads/2014/11/SBGG_guia-subcutanea_2aedicao.pdf
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).

A atividade em tela foi desenvolvida após exaustiva busca, à época, por formação e aperfeiçoamento especializados na utilização da terapia de infusão de fluidos por via subcutânea em ambientes formais de ensino. No estado do Rio de Janeiro, a inexistência de oportunidade de aprendizado surpreendeu os autores deste relato, visto ter o estado um serviço de referência nacional para clientes com câncer. A técnica era utilizada, porém com conhecimento adquirido junto aos pares e na literatura científica disponível, sem formação específica para o manejo e para sua utilização.

OBJETIVOS

Descrever a experiência da realização de oficinas para o ensino da terapia de infusão de fluidos por via subcutânea em paciente em cuidados paliativos.

MÉTODOS

Trata-se de um relato de experiência com base em quatro oficinas realizadas em um hospital privado, que possuía duas unidades assistenciais em duas cidades do estado fluminense, Niterói e Rio de Janeiro. Cada oficina foi organizada em níveis de complexidade crescente de conteúdo e conhecimento, sendo iniciada pelos aspectos teóricos e culminando com execução simulada da técnica por cada participante. As oficinas foram estruturadas a partir da redação e da apresentação de um projeto à diretoria da instituição e da gerência de enfermagem. A divulgação destas deu-se por mídias sociais.

Este relato de experiência dispensa a exigência de submissão a Comitê de Ética em Pesquisa, visto que não focalizou os participantes nem a utilização de suas falas. De igual modo, apenas caracterizou-se o local em que a atividade ocorreu, sem sua identificação. O relato concentrou-se na descrição da atividade e na experiência de ensino, objetivando o aprofundamento teórico da atividade relatada. Por fim, entende-se que este trabalho não fere nenhum preceito ético em pesquisa, considerando as resoluções específicas que tratam do tema.

RESULTADOS

No ano de 2017, foram ministradas quatro oficinas: uma no mês de maio, com 18 alunos; uma em junho, com 13 alunos; a terceira em agosto, com dez alunos; e a última em dezembro, com 16 alunos — totalizando, assim, entre enfermeiros, acadêmicos e técnicos de enfermagem, 57 alunos qualificados para execução e manejo da técnica. Participaram das oficinas tanto profissionais externos, que não atuavam na instituição, como internos, desdobrando-se este em um momento de atualização e capacitação dos profissionais dessa unidade. Isso constituiu importante estratégia de educação permanente e contribuiu para o aumento da qualidade assistencial, pela aquisição de base teórica consistente, aliada à prática diária.

Buscou-se a anuência para a atividade junto à chefia de enfermagem e à direção médica institucional. Esta se deu pela redação e pela apresentação de projeto em reunião na qual houve discussão sobre os detalhes da proposta e sobre os recursos que seriam utilizados. Ainda, foram realizadas reuniões com outros setores do hospital, como hotelaria, tecnologia da informação (TI) e nutrição, a fim de discutir a logística e a estruturação da oficina, visto que foram oferecidas vagas de estacionamento, lanches e almoço no próprio local para os participantes. Após a autorização, operacionalizou-se a proposta.

Para divulgação, utilizaram-se as mídias sociais institucionais e dos facilitadores, ou seja, dos enfermeiros que atuavam na instituição. Foi elaborado um cartaz com a seguinte chamada: “Curso teórico e prático, com a execução da técnica de inserção de cateter não agulhado (jelco) ou cateter agulhado (scalp), em tecido subcutâneo. A prática simulada será em um manequim, abordando a instalação, administração de medicamentos e soluções, bem como o manejo da terapia de infusão de fluidos por via subcutânea. Objetiva-se qualificar o participante para o desempenho das funções básicas e de baixa complexidade, independentemente de conhecimentos técnicos adquiridos anteriormente e experiências profissionais prévias, proporcionando atualização relacionada às indicações, contraindicações, principais complicações e aos cuidados de enfermagem envolvidos na utilização da via subcutânea em clientes adultos e idosos.”

O curso teve duração de um dia, com nove horas de carga horária, divididas em quatro horas teóricas e cinco horas de atividades práticas simuladas em manequim, além de uma hora de intervalo para almoço. Foi repetido em mais três datas, totalizando quatro oficinas. Outra estratégia foi a utilização de cortes de peito de frango em descongelamento (Gallus gallus domesticus) destinados à realização da prega cutânea para execução da técnica. A realização das atividades de ensino aconteceu na sala de treinamentos do hospital. Ressalta-se que a técnica, em todas as oportunidades, foi realizada em um manequim, não sendo realizada in vivo.

Elaborou-se um plano de aula, que se trata de um recurso efetivo na estruturação do conhecimento teórico. A estratégia de ensino foi como aula expositiva e utilização do diálogo circular. Além disso, utilizou-se, como recurso para a simulação prática, um kit de punção contendo um cateter agulhado (scalp) 21G, um cateter não agulhado (jelco) 24G, uma seringa de 5 mL e uma agulha 40×12 para aspiração, um flaconete de 10 mL de soro fisiológico 0,9% e um extensor de duas vias. Foi usada cobertura transparente e fita microporosa(22 Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). O uso da via subcutânea em geriatria e cuidados paliativos [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: SBGG, 2017 [cited 2018 Jun 21]. Available from: http://sbgg.org.br/wp-content/uploads/2014/11/SBGG_guia-subcutanea_2aedicao.pdf
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) para demonstrar a fixação do dispositivo e da proteção do local puncionado.

Dessa forma, o conteúdo programático foi planejado para, no horário da manhã, trabalhar a construção das bases teóricas do conhecimento e os compartilhamentos de experiências, a saber: breve histórico da utilização da terapia de infusão de fluidos por via subcutânea; doenças crônicas e cuidados paliativos; usos da via subcutânea; regulamentação; legislação sobre o tema; via subcutânea: aspectos anatômicos e fisiológicos; relação com parâmetros farmacológicos; indicações/contraindicações; vantagens/desvantagens; soluções, fármacos e antibioticoterapia; compatibilidades e incompatibilidades; procedimento, que incluiu material necessário, escolha do local de punção; manejo na utilização da terapia de infusão de fluidos por via subcutânea; e registro profissional (anotações e evolução). No período da tarde, foi realizada visita técnica nas dependências do hospital com todos os alunos participantes das quatro edições, com o objetivo de conhecer a estrutura física e a filosofia de trabalho, permitindo o compartilhamento de saberes e de práticas entre os profissionais.

Com o feedback de turmas anteriores, foi elaborado um produto técnico, confeccionando-se um material ilustrado, com a sequência de passos para a execução da técnica, tendo sido captadas fotos de cada momento, desde os materiais dispostos individualmente até a bandeja montada. Ainda, um dos autores serviu de modelo para a execução da técnica in vivo, em que foram sequenciadas as imagens. Essa estratégia foi útil na projeção das imagens para a exposição do conteúdo teórico.

Foi realizada a demonstração de todo o material que seria utilizado, como a montagem da bandeja para a execução da técnica. Também se fez um apanhado das diversas vivências, construindo as possibilidades de realização da técnica tanto no setor hospitalar privado quanto no público, já que, entre os participantes, foram percebidos diversos cenários de atuação e realidades variadas quanto ao recurso disponível, mas sempre com embasamento teórico, sem ferir os preceitos de uma técnica asséptica. Houve, ainda, demonstração passo a passo da realização do procedimento no manequim ou no peito de frango.

Em seguida, os participantes tinham a oportunidade de realizar a prática simulada supervisionada em manequim pelo menos duas vezes, com execução da técnica bem como capacitação e assessoramento individual pelos enfermeiros facilitadores responsáveis pela oficina, fazendo uso do kit de punção recebido. Apesar de a proposta ter desenvolvido questões referentes à técnica, foram abordados os atributos cabíveis ao cuidado expressivo.

Ao final da atividade prática, os participantes foram divididos em grupos de quatro participantes para discussão de um caso clínico simulado, no qual deveriam apontar os diluentes para o fármaco em questão, o sítio de punção mais indicado de acordo com o volume e, por fim, quantos sítios de punção seriam pertinentes à utilização da terapia de infusão de fluidos por via subcutânea e como abordar as famílias em casos de mais de um sítio de punção. Ainda foram consideradas a assistência no manejo e a utilização da técnica — os cuidados de enfermagem.

DISCUSSÃO

Os conteúdos e os objetivos deste relato encontram harmonia com outro estudo, que teve por foco, em atividade semelhante, informações sobre o conceito de hipodermóclise, indicações, contraindicações, vantagens, sítios de punção, execução da técnica, medicamentos utilizados, diluição, formas de diluição, além de cuidados de enfermagem na punção, manejo e monitoramento do dispositivo(77 Rodrigues FS, Pedra MC, Santos JL, Rumor PC, Girondi JB, Oliveira MC. Continuing education on hypodermoclysis with the nursing team of a hospital surgical unit. Rev Enferm UFPE [Internet]. 2015 [cited 2018 Jun 21];10(3):1562-70. Available from: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/view/11098
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). Assim, inferem-se quais seriam os conhecimentos mínimos necessários para a execução e o manejo adequados da técnica com segurança.

Ao longo de suas edições, as oficinas possibilitaram a apresentação da técnica, comumente desconhecida entre a maioria dos participantes, os quais, não raras vezes, questionavam: “Essa é uma técnica nova?” Esse achado, identificado pela dinâmica inicial de apresentação de cada participante, no início da atividade, foi ressaltado por haver, entre os alunos, grande número de graduandos e enfermeiros com pouco tempo de formação. A técnica se mostrou comum entre os participantes residentes em oncologia. Poucos foram os que afirmaram tê-la executado, com destaque para os residentes em oncologia. Tal achado quanto ao desconhecimento da técnica é corroborado em outros estudos(33 Nunes PM, Souza RC. [Adverse effects of hypodermoclysis in adult patients: an integrative review]. Rev Min Enferm [Internet]. 2016 [cited 2018 Jun 21]; 20:e951. Available from: http://www.reme.org.br/artigo/detalhes/1084 Portuguese.
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,88 Bruno VG. Hypodermoclysis: a literature review to assist in clinical practice. Einstein (Sao Paulo). 2015;13(1):122-8.-99 Gomes NS, Silva AMBD, Zago LB, Silva ÉCLE, Barichello E. Nursing knowledge and practices regarding subcutaneous fluid administration. Rev Bras Enferm. 2017; 70(5):1096-105. doi: 10.1590/0034-7167-2016-0424
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).

Deve-se repensar quais conteúdos têm sido ministrados em ambientes formais de ensino, de modo que os apresentados neste relato de experiência deveriam ser discutidos ainda no âmbito da formação profissional, seja ela superior ou técnica. Formar recursos humanos que atendam à realidade das necessidades de saúde é um desafio a ser enfrentado pelas instituições de ensino, que, no ensino, devem extrapolar as técnicas de administração de fármacos mais tradicionais.

Foi apresentado o protocolo institucional, em que os participantes tiveram a oportunidade de visualizar como os facilitadores da oficina vivenciavam a prática profissional diária no uso da técnica. O protocolo apresentado foi resultado das dificuldades experienciadas pelos enfermeiros facilitadores, sendo abertos, em cada ocasião, momentos de discussões entre eles e os participantes. Estes expressaram a realidade local de seus serviços e questionaram como poderiam viabilizar a proposta de protocolo em sua instituição. Assim, cada participante visualizou de forma clara a padronização da utilização da técnica, tendo sido sanadas suas dúvidas — por exemplo, “Como vocês uniformizaram a técnica?”.

Os participantes das oficinas foram entendidos como recursos humanos qualificados no tocante à execução e ao manejo da técnica, adquirindo conhecimento com vistas ao desenvolvimento de práticas assistências seguras, o que se entende como diminuição de riscos assistenciais e de eventos adversos. Adquiriram, portanto, competência para sua realização em um “agir responsável que é reconhecido pelos outros, numa dinâmica que implica saber mobilizar, integrar e transferir recursos, conhecimentos e habilidades num contexto profissional determinado”(1010 Sousa JM, Alves ED. Nursing competencies for palliative care in home care. Acta Paul Enferm [Internet]. 2015 [cited 2018 Jun 21];28(3):264-9. Available from: https://www.scielo.br/pdf/ape/v28n3/en_1982-0194-ape-28-03-0264.pdf
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).

Quanto aos volumes máximos depositados no tecido subcutâneo, alguns participantes citaram que a técnica apresentada contrariava o aprendido em aulas de fundamentos de enfermagem. Desmistificou-se tal construção, sinalizando-se que se tratava de uma técnica com indicações específicas de utilização. Os volumes máximos, quando se utiliza a terapia de infusão de fluidos por via subcutânea, variam conforme o sítio e a proposta terapêutica. Para maiores volumes, seriam considerados os sítios anterolateral da coxa (até 1.500 mL/24 horas), abdominal (até 1.000 mL/24 horas) e interescapular (até 1.000 mL/24 horas); quando são infundidos menores volumes, consideram-se as regiões subclavicular (até 250 mL/24 horas) e deltóidea (até 250 mL/24 horas)(22 Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). O uso da via subcutânea em geriatria e cuidados paliativos [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: SBGG, 2017 [cited 2018 Jun 21]. Available from: http://sbgg.org.br/wp-content/uploads/2014/11/SBGG_guia-subcutanea_2aedicao.pdf
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).

Outro estranhamento reconhecido durante a oficina foi quando equipamentos, como os cateteres agulhados e não agulhados, foram apresentados, pois, até então, grande parte dos participantes associava ao subcutâneo apenas a administração de insulinas e heparina de baixo peso molecular com agulhas de baixo calibre (13×4,5 mm). Nos primeiros momentos, foi apresentada a literatura pertinente, com a indicação de cada dispositivo(22 Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). O uso da via subcutânea em geriatria e cuidados paliativos [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: SBGG, 2017 [cited 2018 Jun 21]. Available from: http://sbgg.org.br/wp-content/uploads/2014/11/SBGG_guia-subcutanea_2aedicao.pdf
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) bem como sua utilização na terapia de infusão de fluidos por via subcutânea.

Em função do menor custo, a literatura aponta o cateter agulhado (scalp) como de uso comum(99 Gomes NS, Silva AMBD, Zago LB, Silva ÉCLE, Barichello E. Nursing knowledge and practices regarding subcutaneous fluid administration. Rev Bras Enferm. 2017; 70(5):1096-105. doi: 10.1590/0034-7167-2016-0424
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), mas, nas oficinas, optou-se por indicar o uso regular do cateter não agulhado. Isto porque tal indicação se assenta na maior possibilidade de tempo de permanência e, ainda, pela possibilidade de ocorrer desprendimento do filme protetor que fixa o dispositivo por conta de sudorese intensa ou mesmo por mobilização frequente dos clientes. Ainda, pode ocorrer retirada acidental do dispositivo no momento da realização de cuidados, potencializando acidentes ocupacionais ou ainda com o próprio paciente.

Os participantes exibiram dificuldade na formação da prega cutânea e avaliação da qualidade desta, para a qual a literatura indica espessura de tecido subcutâneo entre 1,0 e 2,5 cm(22 Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). O uso da via subcutânea em geriatria e cuidados paliativos [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: SBGG, 2017 [cited 2018 Jun 21]. Available from: http://sbgg.org.br/wp-content/uploads/2014/11/SBGG_guia-subcutanea_2aedicao.pdf
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), quando considerada a terapia de infusão de fluidos por via subcutânea. A estratégia adotada pelos facilitadores foi a de cada participante executar a prega cutânea simulada em cortes de peito de frango em descongelamento.

A apresentação de cada passo necessário à execução da técnica seguiu uma ordem lógica, desde a montagem da bandeja até a replicação da técnica em manequim. Isso possibilitou sistematizar a aprendizagem, o que foi referido pelos alunos como facilitador à compreensão global do conteúdo, integrando conhecimentos teóricos e práticos.

O correto manejo da punção foi enfatizado nos cuidados essenciais para minimização de ocorrências indesejáveis. Foram discutidos com os participantes os seguintes cuidados de enfermagem: higienização das mãos antes de cada manuseio do cateter; realização de assepsia da via de acesso sempre que abrir o sistema, bem como fricção do óstio do lúmen de acesso com gaze embebida em álcool a 70%; troca da tampa Luer Lock a cada manipulação, se estiver em ambiente hospitalar; orientação de pacientes, familiares e equipe quanto à possibilidade de ocorrência de discreta hiperemia e edema no local de inserção do cateter logo após a punção; e proteção da punção na hora dos cuidados de higiene e conforto(22 Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). O uso da via subcutânea em geriatria e cuidados paliativos [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: SBGG, 2017 [cited 2018 Jun 21]. Available from: http://sbgg.org.br/wp-content/uploads/2014/11/SBGG_guia-subcutanea_2aedicao.pdf
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).

Outro ponto de destaque da atividade desenvolvida foi a discussão sobre a técnica ser de baixa complexidade e, portanto, poder ser executada também pelo técnico de enfermagem, desde que delegado e supervisionado por enfermeiro e que o técnico possua treinamento e habilidade técnica. Esse dado é pertinente, pois a oficina foi procurada por profissionais de nível médio, com o discurso da qualificação profissional, destacando que o domínio dela seria um diferencial para o currículo.

Para potencializar a aprendizagem e avaliar a compreensão dos participantes, eles foram organizados em pequenos grupos e lhes foram apresentados casos clínicos em texto impresso, tendo por base o conteúdo teórico trabalhado no período da manhã. Em cada caso, eram realizadas perguntas que estimulavam o raciocínio clínico e a problematização do conteúdo — por exemplo: “Qual o diluente indicado para cada fármaco no caso em questão? Quantos sítios de punção seriam necessários, considerando-se a prescrição médica? Existiriam drogas incompatíveis no caso apresentado? Se sim, como proceder?” Essa dinâmica permitiu identificar conteúdos a serem discutidos em maior profundidade, considerando-se a resolução dos casos.

As dúvidas suscitadas pelos participantes quanto às medicações, principalmente sobre quais os fármacos seriam indicados e como deveriam ser diluídos e administrados, estiveram presentes em todas as quatro oficinas. Ponderou-se sobre a importância de discutir com os participantes o que a literatura considera para administrar um fármaco por esta via, a saber: pH, estabilidade, volumes de diluição e diluentes apropriados(88 Bruno VG. Hypodermoclysis: a literature review to assist in clinical practice. Einstein (Sao Paulo). 2015;13(1):122-8.). Como estratégia para minimizar dúvidas, sugeriu-se a elaboração de protocolo na utilização da terapia de infusão de fluidos por via subcutânea, no qual devem constar os fármacos mais utilizados, os diluentes e a forma de administração, em tabelas elaboradas com tais informações(22 Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). O uso da via subcutânea em geriatria e cuidados paliativos [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: SBGG, 2017 [cited 2018 Jun 21]. Available from: http://sbgg.org.br/wp-content/uploads/2014/11/SBGG_guia-subcutanea_2aedicao.pdf
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,88 Bruno VG. Hypodermoclysis: a literature review to assist in clinical practice. Einstein (Sao Paulo). 2015;13(1):122-8.).

Grande parte das dúvidas dos participantes era sobre o local de inserção do cateter, o que foi trabalhado pela execução da técnica, reforçando a informação de que o dispositivo deve ser inserido na prega, e não em sua base, fato que poderia potencializar o posicionamento do dispositivo fora do sítio indicado — por exemplo, em um músculo.

As dúvidas referentes aos volumes de infusão por sítio foram dirimidas ao se demonstrar cada marco topográfico no manequim. A diluição dos fármacos foi discutida tendo por orientador uma tabela confeccionada no programa Word, que foi impressa e entregue aos participantes das oficinas. Nela, constavam nome do medicamento, dose habitual e diluição. Quanto à formação e à avaliação da prega cutânea, os participantes simularam sua formação nos cortes de peito de frango em descongelamento.

Um momento importante para reflexão ética da assistência de enfermagem se deu em relação à abordagem das famílias, que passam por um processo de sofrimento — o que está além do domínio de uma técnica. Dessa forma, além do fazer técnico especializado, abordou-se o contexto no qual a técnica é executada — nesse caso, o ambiente de cuidados paliativos. Sendo a via subcutânea um instrumento de promoção de conforto minimamente invasivo, a finalidade do cuidado de enfermagem para promoção do conforto com o mínimo de invasão do corpo do cliente foi considerada para essa discussão. Os enfermeiros devem desempenhar as competências de cuidados nesse cenário, com destaque para avaliação, manejo e controle de sinais e sintomas, sem desconsiderar um plano assistencial que abarque as dimensões física, psicológica, social e espiritual, impactando a qualidade de vida(99 Gomes NS, Silva AMBD, Zago LB, Silva ÉCLE, Barichello E. Nursing knowledge and practices regarding subcutaneous fluid administration. Rev Bras Enferm. 2017; 70(5):1096-105. doi: 10.1590/0034-7167-2016-0424
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) dos clientes em cuidados paliativos.

Limitações do estudo

O modelo de oficina aplicada com as características teóricas e práticas adotadas atendeu aos objetivos da atividade. Entretanto, a utilização de manequim e dos cortes de peito de frango em descongelamento foi entendida como modelos de prática simulada que se aproximavam, mas não reproduziam fielmente o ambiente real. Igualmente, o número de vezes que cada participante praticou a técnica possibilitou a apreensão do como executá-la; todavia, podem surgir inseguranças na hora de praticá-la em ambientes reais de cuidados. Os resultados apresentados e discutidos suscitam questionamentos que carecem de mais estudos e evidências práticas em ensino em enfermagem.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde ou política pública

Este relato de experiência contribuiu para qualificação da prática profissional de enfermeiros e técnicos de enfermagem, ou mesmo de profissionais em formação, no cuidado aos clientes em cuidados paliativos e medidas de conforto. O domínio de técnicas fundamentais se traduz no fazer prático crítico, de qualidade e orientado por resultados — nesse caso, promover um cuidado minimamente invasivo e com o manejo adequado. Embora seja uma técnica de baixa complexidade, requer prática especializada na instalação e manejo adequado da utilização da via subcutânea, resultando em um cuidado especializado, além de assegurar a qualidade assistencial.

CONCLUSÕES

Este relato, evidenciado na atuação do ensino para qualificação, contribuiu com a formação teórica e prática de enfermeiros, técnicos e estudantes de enfermagem, ora apresentando a técnica como primeiro contato, ora possibilitando aprofundamento aos que já a utilizavam. A atividade consistiu em um momento de aprendizado e troca de experiências, visto que a proposta de oficinas emergiu da vivência dos enfermeiros facilitadores, sendo orientadas para a prática.

As oficinas cumpriram o objetivo de apresentar os conhecimentos necessários ao manejo da técnica e possibilitar sua execução, auxiliaram na construção de bases teóricas para uma assistência autônoma e de qualidade, o que repercute na divulgação e na consolidação do conhecimento disciplinar especializado, dando maior visibilidade ao fazer do enfermeiro e da equipe em ambientes de cuidados paliativos. Ao capacitar mais de 50 participantes para a utilização da via subcutânea em clientes adultos e idosos, elas contribuíram para a formação de recursos humanos especializados de enfermagem, mais aptos à oferta de um cuidado de qualidade e seguro.

AGRADECIMENTO

Agradecemos ao Hospital Placi Cuidados Extensivos.

REFERENCES

Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Aparecida Barbosa
EDITOR ASSOCIADO: Margarida Vieira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    19 Jul 2018
  • Aceito
    10 Dez 2019
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