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Ensino de relacionamento terapêutico em enfermagem psiquiátrica dificuldades e perspectivas

Resumos

As autoras relatam o modelo de ensino de relacionamento terapêutico adotado na disciplina Enfermagem Psiquiátrica. O estudo tem como objetivo principal divulgar a tentativa de adaptar os princípios de relacionamento terapêutico às questões específicas da realidade da assistência da enfermagem a pacientes psiquiátricos hospitalizados e às dificuldades inerentes ao aluno iniciante nesta área. Além da revisão de literatura, o estudo traz o relato de um caso, assim como discorre sobre as dificuldades percebidas na vivência de seis anos de ensino; contém uma análise dos resultados e das limitações do modelo e propõe medidas para tornar a intervenção de enfermagem mais efetiva para o paciente considerando o contexto sócio-econômico, político e familiar de sua internação.


The authoress relate the teaching model of therapeutic relation adapted in the discipline psychiatric nursing. The study has as main purpose to divulge the attempt to fit questions of the reality of the nursing assistance to psychiatrics patients hospitalized and difficulty inherents to the student in the beginning this field. Beyond the revision of the literature, the study brings the report of a case, as though it exsatiates on the difficulty perceived in the live liness of sex years of teching; it contains an analysis of the results and it proposes measures in order to become the nursing intervention more actual for the patient considering the social-economical, political and familiar context of his internment


ARTIGO DE ATUALIZAÇÃO

Ensino de relacionamento terapêutico em enfermagem psiquiátrica dificuldades e perspectivas

Maria de Nazaré de Oliveira FragaI; Raimunda Nobre DamascenoII; Maria de Lourdes Gomes CalixtoIII

IDocente do Departamento de Enfermagem da U.F.C Mestra em Enfermagem Psiquiátrica

IIDocente do Departamento de Enfermagem da U.F.C Aluna do Curso de Mestrado em Psicologia Social da U.F.Pb

IIIAluna do Curso de Habilitação em Enfermagem de Saúde Publicada U.F.C Monitora da disciplina Enfermagem Psiquiátrica

RESUMO

As autoras relatam o modelo de ensino de relacionamento terapêutico adotado na disciplina Enfermagem Psiquiátrica. O estudo tem como objetivo principal divulgar a tentativa de adaptar os princípios de relacionamento terapêutico às questões específicas da realidade da assistência da enfermagem a pacientes psiquiátricos hospitalizados e às dificuldades inerentes ao aluno iniciante nesta área. Além da revisão de literatura, o estudo traz o relato de um caso, assim como discorre sobre as dificuldades percebidas na vivência de seis anos de ensino; contém uma análise dos resultados e das limitações do modelo e propõe medidas para tornar a intervenção de enfermagem mais efetiva para o paciente considerando o contexto sócio-econômico, político e familiar de sua internação.

ABSTRACT

The authoress relate the teaching model of therapeutic relation adapted in the discipline psychiatric nursing. The study has as main purpose to divulge the attempt to fit questions of the reality of the nursing assistance to psychiatrics patients hospitalized and difficulty inherents to the student in the beginning this field. Beyond the revision of the literature, the study brings the report of a case, as though it exsatiates on the difficulty perceived in the live liness of sex years of teching; it contains an analysis of the results and it proposes measures in order to become the nursing intervention more actual for the patient considering the social-economical, political and familiar context of his internment.

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ANEXO 1

GUIA DE ORIENTAÇÃO PARA O PROCESSO DE COMUNICAÇÃO E RELACIONAMENTO TERAPÊUTICO

01. APRESENTAÇÃO:

O presente instrumento destina-se a obter informações e detectar problemas do paciente para propor alternativas de solução.

Este instrumento será utilizado pelos alunos, invidualmente, durante as atividades práticas da disciplina Enfermagem Psiquiátrica. Será desenvolvida em uma instituição psiquiátrica previamente escolhida pelos professores responsáveis pela disciplina.

A escolha do paciente será feita pelo aluno após uma semana de atividades práticas. O aluno deverá manter o relacionamento terapêutico com o paciente até o final do período de atividades práticas.

02. OBJETIVOS:

Ao concluir a aplicação do presente instrumento, o aluno deverá ter alcançado os seguintes objetivos:

• Utilizar os princípios de comunicação e relacionamento terapêutico na abordagem ao paciente escolhido .

• Identificar os possíveis fatores pessoais e familiares que desencandearam o desequilíbrio do paciente .

• Identificar as principais necessidades do paciente.

• Identificar suas próprias dificuldades na abordagem e assistência ao paciente psiquiátrico.

• Demonstrar respeito pela pessoa do paciente, aceitando sua dependência momentânea enquanto oferece condições para recuperação.

• Planejar a assistência de enfermagem ao paciente, executá-la e avaliá-la.

03. INSTRUMENTO:

3.1. Identificação:

• Nome

• Idade

• Estado Civil

• Grau de Instrução

• Procedência

• Ocupação e Profissão

• Residência

3.2. Antecedentes pessoais e familiares:

• Condições de vida (hábitos, intoxicações por fumo, álcool, sono, com quem reside, etc.)

• Condições sócio-econômicas.

• Situação do paciente dentro da família antes e depois da internação.

• Comportamento do paciente que acarretou a internação e quem decidiu trazê-lo para o hospital.

• Informações relativas à saúde dos pais, avós, irmãos, tios etc, se faleceram, de que faleceram e com que idade.

3.3. Outras informações:

• Comportamento do paciente dentro do hospital, e suas condições físicas e mentais até o início da interação com o aluno.

• Diagnóstico médico e sintomas que o justificaram, tratamento a que foi submetido em internações anteriores.

3.4. Dados complementares sobre a interação:

• Incidentes ocorridos no dia anterior ou durante as horas que precederam a entrevista.

• Comportamento do paciente no hospital durante as horas que precederam a entrevista.

• Descrição do ambiente em que se deu a entrevista.

• Condições emocionais do paciente e do aluno no início da entrevista.

• Descrição da comunicação aluno + paciente.

3.5. Plano de interação:

O plano de interação deverá ser traçado diariamente atentando para:

a. Problemas detectados - relacionar problemas tanto da paciente quanto do aluno.

b. Elaborar o plano de interação formulando os objetivos para a resolução dos problemas surgidos, verificando e determinando o que precisa ser modificado no comportamento do paciente e aluno.

c. As estratégias - definição de recursos a serem utilizados para resolução dos problemas identificados.

3.6. Avaliação

Será efetuada diariamente descrevendo:

• Os objetivos que foram ou não atingidos;

• Os fatores que impediram a consecução dos objetivos;

• Os progressos que foram ou nâo conseguidos na interação aluno x paciente até a presente data.

ANEXO 2

ESTUDO DE CASO

Para exemplificar a metodologia usada, fez-se um extrato do relacionamento terapêutico alunopaciente. O que aqui é apresentado são os dados da primeira e última interação e um Plano de Interação.

1. IDENTIFICAÇÃO:

M. F. S., casada, 42 anos, alfabetizada, natural de Quixadá, sem trabalhar há 4 anos, internou-se nesta instituição em 06 de setembro de 1984.

2. ANTECEDENTES PESSOAIS E FAMILIARES:

2.1. Condições de vida (hábitqs, intoxicação por fumo, álcool, sono, com quem reside, condições sócio-econômicas).

A paciente mora com o esposo e o filho. Estes andam à procura de emprego. A família depende exclusivamente da pensão que a paciente recebe do INPS (cerca de 60 mil cruzeiros). A casa tem 2 cômodos, é feita de tijolo, com piso de barro batido, coberta de telha, não tem local certo para o lixo e não há sanitário. Cria galinha e porco no pequeno quintal. A paciente demonstra ter bons hábitos de higiene ambiental e corporal. Refere não ter vícios, dorme pouco, tem muitos pesadelos e acorda assustada durante a noite. Religião Católica.

2.2. Situação do paciente dentro da família antes e depois da internação:

Refere ter ficado doente desde quando trabalhava em fábrica de castanha, porque usava as duas mãos e os dois pés ao mesmo tempo, tinha que descascar no mínimo 20 quilos de castanha por dia. Antes da primeira internação mantinha bom relacionamento com a vizinhança e com todos de sua casa. Refere não ter, atualmente, ninguém da família que possa lhe ajudar.

2.3. Comportamento do paciente que acarretou a internação e quem decidiu trazê-la para o hospital.

Refere ter vindo para o hospital, às 3 horas da manhã, sozinha. Sentia uma forte dor de cabeça, chorava, e agredia os que dela se aproximassem, (sic). A paciente refere ter agredido seu marido com uma pedra de calçamento. Devido ao incidente, o marido disse que não a levaria ao hospital. Relata, ainda, ter tentado suicídio três vezes.

2.4. Informações relativas à saúde dos pais, avós, irmãos, tios, se faleceram, de que faleceram e com que idade.

O pai e o padrasto morreram de problemas cardíacos. A mãe e irmãos, já falecidos, tinham problemas mentais. Não sabe informar que idade faleceram.

3. OUTRAS INFORMAÇÕES:

3.1. Comportamento da paciente dentro do hospital, e suas condições físicas e mentais até o início da interação com o aluno.

Paciente mostrava-se sociável, ajudava as companheiras mais desorientadas, colaborava com a limpeza da enfermaria. Apresentava boa aparência física apenas com pele ressequida. Mostrava-se inquieta, queixando-se de dormir pouco e reclamando apenas do barulho de uma paciente que chegara no início da noite.

3.2. Diagóstico médico e sintomas que o justificaram, tratamento a que foi submetida em internações anteriores.

Internada com diagnóstico de neurose histérica, na guia de internação constam como sintomas: labilidade de sentimentos, irritabilidade, crises de choro, dor de cabeça e tontura. A paciente queixa-se ainda de moleza, tremores e coisa ruim na cabeça (sic). Não sabe dizer a que tratamentos foi submetida anteriormente.

4. DADOS COMPLEMENTARES SOBRE A INTERAÇÃO:

4.1. Incidentes ocorridos no dia anterior ou durante a manhã que possam influenciar o relacionamento com o aluno no presente dia

Paciente no dia que antecedeu à 1ª Interação, mandou a visita (sua vizinha) ir embora. Esta trouxe-lhe um recado do marido, ele mandou dizer que não viria visitá-la porque estava doente, devido à pedra que ela havia jogado em suas costas. Mandou ainda avisá-la que se ela não voltasse logo para casa, ele iria para a casa de uma amante (sic).

4.2. Comportamento da paciente que prececeu a entrevista.

Mostrava-se chateada, deprimida, referindo não ter dormido bem, com pesadelos e ter tomado vários banhos durante a noite e estar com dor de cabeça. Falou que não queria conversar muito naquele dia.

4.3. Descrição do ambiente em que se deu a entrevista

O ambiente estava tranqüilo sem a presença de pacientes. O local escolhido foi um banco debaixo da mangueira, perto da cantina. Horário: 9:45 às 10:15 horas.

4.4. Condições emocionais da paciente e do aluno no início da entrevista.

A paciente mostrava-se apreensiva, inquieta, inibida, sem vontade de falar, respondendo apenas o que se perguntava.

O aluno mostrava-se calmo, firme, motivador, compreensivo.

4.5. Descrição da comunicação aluno x paciente.

ALUNA: Sou estudante de enfermagem e meu nome é L, estou aqui neste hospital fazendo estágio da Faculdade de Enfermagem.

PACIENTE: É?

ALUNA: Eu gostaria de poder lhe ajudar se a senhora quiser conversar comigo.

PACIENTE: Tá, eu quero, mas eu não posso conversar muito tempo não, que fico toda me tremendo e com dor de cabeça e tonta.

ALUNA: Nós conversaremos cerca de uma hora?

PACIENTE: Tá certo, pois vou lhe contar desde o começo da minha história.

ALUNA: A senhora ajudará muito, falando de sua vida, pois só assim vou fazer alguma coisa pela senhora.

PACIENTE: Pois sim! Eu morava na Serra Azul quando era pequena e vim morar aqui com uma tia. Minha mãe casou duas vezes, eu filha do 1º marido, a caçula. Meus parentes morreram todos lá na Serra Azul.

ALUNA: Seus parentes faleceram de que?

PACIENTE: Quase todos do coração. Não gosto de relatar o meu passado. Tenho um irmão e uma irmã que tambe'm são nervosos assim como eu.

ALUNA: E tem mais alguém na sua família que sofre dos nervos?

PACIENTE: Minha mãe. Pois sim, eu fiquei assim quando fui trabalhar na fábrica de castanha em que a gente usava as duas mãos e os dois pés e tinha que descascar 20 quilos de castanha por dia senão dava prejuízo e caía fora do emprego. Depois eu saí de lá e fui trabalhar de engomadeira numa fábrica de confecções, aí então é que eu só vivia de licença e acabei saindo de lá.

ALUNA: O que é que a senhora sente?

PACIENTE: Minha filha, eu fico fora de mim, doida, correndo, com o destino de sair de casa e me jogar debaixo dos carros, com dor de cabeça muito forte, já tive vontade de me jogar dentro da cacimba. O meu marido e o vizinho me amarram e acham que invento tudo isso e não entendem que estou doente.

ALUNA: Mas quando é que a senhora sente isto?

PACIENTE: Eu não posso ter "preocupação". Esta semana eu fui na casa da minha irmã, na véspera de eu vir para cá, e quando eu ia chegando lá o carro atropelou e matou um menino dela e eu vi tudo e fiquei com uma dor de cabeça que não aguentava.

ALUNA: E o que foi que levou a senhora a procurar o hospital?

PACIENTE: Foi esta dor de cabeça, que eu estava já para morrer, e vim sozinha. Meu marido não quis vir comigo e meu filho fica com desgosto quando me vê assim e sai logo de casa.

ALUNA: E como é seu marido? Faz tempo que a senhora é casada?

PACIENTE: Meu marido é ruim. Olhe eu já sofri tanto. Ele já chegou a me bater. Meu filho fica chorando, faz 20 anos que casei.

ALUNA: Qual a idade de seu filho?

PACIENTE: Ele é um rapaz de 18 anos. Não quero mais conversar por que estou cansada e com dor de cabeça e tontura, vou me deitar senão vou cair aqui.

ALUNA: Hoje só fiz ouvir o que a senhora estava dizendo, amanhã se a senhora quiser a gente pode continuar, eu tenho muito o que conversar para lhe ajudar. Até amanhã às 9:30 horas neste mesmo local.

PACIENTE: Até amanhã.

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SÚMULA DA 12ª INTERAÇÃO

Data: 05/10/84

Horário: 8:00 às 8:30 horas

Local: A cama da paciente, pois esta foi ao encontro da aluna para dizer que o portão que dá acesso ao local pré-escolhido estava trancado . Daí a paciente escolheu seu leito .

A paciente mostrou-se re ceptiva, bem humor ada e chamou o alun a para ir à sua cama fazer a interação pois já tinha percebido que o portão estava fechado.

A aluna mostrou-se bem humorada, comunicativa e receptiva.

A paciente começou a interação contando que havia sonhado durante à noite e não lembrava .

Referiu estar com dor de cabeça devido a ter desaparecido um dinheiro de uma das companheiras de sua enfermaria.

Continua sentindo tremores quando algo diferente acontece no seu dia-a-dia (sic).

A aluna interferiu dizendo que ela tinha que exercitar a reagir de outra maneira diante destes pe quenos incidentes da vida . A paciente referiu ter pedido à São Francisco para sair de alta.

A aluna fez uma síntese de todas as interações, mostrando os pontos positivos e negativos das interações anteriores e no que havia melhorado . Ficou em aberto para a cliente também fazer um a avaliação . Esta apenas referiu que não tinha nada para dizer e que agradecia tudo o que tinham feito por ela.

A aluna referiu que ela não tinha nada para agradecer porque foi ela quem fez tudo.

  • 1. ARANTES, E. C. O ensino de relacionamento terapêutico em enfermagem psiquiátrica. Rev. Bras, Enf., Rio de Janeiro, 26(6): 438-46, out./dez. 1973.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Mar 2015
  • Data do Fascículo
    Set 1986
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