Transmissão vertical e COVID-19: revisão de escopo

RESUMO

Objetivo:

analisar as evidências disponíveis acerca da temática infecção pelo SARS-CoV-2 e transmissão vertical.

Métodos:

Revisão de escopo, conforme o Institute Joanna Briggs e o PRISMA-ScR. Foram feitas buscas em cinco bases de dados eletrônicas de publicações sobre a temática infecção pelo coronavírus e transmissão vertical. Os dados foram extraídos, analisados e sintetizados por três pesquisadores independentes de forma descritiva.

Resultados:

A busca resultou em 76 publicações. Após etapas seletivas, 15 artigos foram analisados, todos no idioma inglês, descritivos retrospectivos ou estudos de casos. Para rastreamento da infecção, foram adotadas a coleta de swab nasal no neonato e a análise de proteína C-reativa do leite materno, do sangue do cordão, do líquido amniótico, da placenta e da secreção vaginal. Houve pequena porcentagem de neonatos que testaram positivo para COVID-19, porém esses casos não foram atribuídos à transmissão vertical.

Conclusão:

A transmissão vertical não pôde ser comprovada. Protocolo de pesquisa registrado na Open Science Framework (https://osf.io/fawmv).

Descritores:
Transmissão Vertical de Doença Infecciosa; Infecções por Coronavírus; Revisão; Recém-Nascido; Enfermagem Obstétrica

ABSTRACT

Objective:

Analyze available evidence related to SARS-CoV-2 infection and vertical transmission.

Methods:

Scoping review, according to the Joanna Briggs Institute and PRISMA-ScR. Searches were conducted in five electronic databases to find publications about coronavirus infection and vertical transmission. Data were extracted, analyzed and synthesized by three independent researchers using a descriptive approach.

Results:

The search resulted in 76 publications. After selective steps, 15 articles – retrospective descriptive or case studies – were analyzed, all in English. In order to track the infection, specimens were collected from neonates through nasal swabs and C-reactive protein from breast milk, cord blood, amniotic fluid, placenta and vaginal secretion was analyzed. A small percentage of neonates tested positive for COVID-19, but these cases were not attributed to vertical transmission.

Conclusion:

Vertical transmission could not be demonstrated. Research protocol registered with the Open Science Framework (https://osf.io/fawmv).

Descriptors:
Infectious Disease Transmission, Vertical; Coronavirus Infections; Review; Infant, Newborn; Obstetric Nursing

RESUMEN

Objetivo:

Analizar las evidencias disponibles sobre infección por SARS-CoV-2 y transmisión vertical.

Métodos:

Revisión de alcance, conforme el Institute Joanna Briggs y PRISMA-ScR. Se realizó búsqueda en cinco bases de datos digitales de publicaciones sobre la temática infección por coronavirus y transmisión vertical. Datos extraídos, analizados y sintetizados descriptivamente por tres investigadores independientes.

Resultados:

La búsqueda rescató 76 publicaciones. Luego de etapas de selección, 15 artículos fueron analizados, todos en inglés; descriptivos, retrospectivos o estudios de caso. Para rastrear la infección se adoptaron la recolección de swab nasal en el neonato y el análisis de proteína C reactiva de la leche materna, sangre del cordón, líquido amniótico, placenta y secreción vaginal. Hubo un pequeño porcentaje de neonatos cuyos tests dieron positivo de COVID-19, aunque tales casos no fueron atribuidos a la transmisión vertical.

Conclusión:

La transmisión vertical no pudo ser comprobada. Protocolo de investigación registrado en Open Science Framework (https://osf.io/fawmv).

Descriptores:
Transmisión Vertical de Enfermedad Infecciosa; Infecciones por Coronavirus; Revisión; Recién Nacido; Enfermería Obstétrica

INTRODUÇÃO

Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) do início de julho de 2020 apontavam mais de 10 milhões de casos de infecção pelo SARS-CoV-2 (causador da COVID-19) e 500 mil óbitos⁽¹⁾. O vírus, detectado pela primeira vez na China, no final de dezembro de 2019, propagou-se globalmente e, em 11 de março, a OMS decretou a pandemia pela COVID-19⁽²⁾. Nesse contexto, as gestantes foram classificadas como grupo de risco e consideradas prioritárias na assistência e na testagem para a doença^(3-4).

Alterações fisiológicas da gestação predispõem as gestantes a infecções virais e a formas mais graves da COVID-19⁽³⁾. As manifestações clínicas dessa infecção são pouco descritas^(3,5), e essa dificuldade se dá pela própria condição gestacional, sobretudo do sistema respiratório⁽³⁾. Dados pós-epidemia do coronavírus da síndrome respiratória aguda grave (SARS-CoV) e da síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS-CoV), em 2012, apontaram que todas as gestantes/puérperas tiveram necessidade de intubação, internação em Centros de Terapia Intensiva (CTI) e casos de falência renal, sendo que 25% evoluíram a óbito⁽³⁾.

A Transmissão Vertical (TV) pode ocorrer por meio da passagem transplacentária de microrganismos durante a gestação, do contato com sangue e secreções vaginais no momento do parto e pelo leite materno. A membrana placentária separa o sangue materno e fetal e atua como barreira protetora, mas alguns vírus e bactérias, por mecanismos desconhecidos, conseguem transpô-la. Como se sabe, a imunidade materna, a carga viral placentária⁽⁶⁾ e as condições obstétricas, como trabalho de parto prematuro, rotura prematura das membranas amnióticas, baixo peso no nascimento, malformações fetais, aborto e óbito fetal, estão intrinsecamente relacionadas e aumentam o risco de TV^(7-8).

De forma geral, as infecções congênitas associam-se a alto risco de morbimortalidade neonatal, e a TV da COVID-19 está em franca investigação. São desconhecidos os efeitos teratogênicos da febre, sintoma comum da COVID-19, no produto conceptual, mas descrevem-se a correlação entre pneumonias maternas e aumento de partos prematuros, a ocorrência de baixo peso ao nascer e os baixos escores de Apgar no quinto minuto de vida⁽³⁾.

Diante dessa nova doença, pouco explorada em relação a seus efeitos para gestantes/puérperas e recém-nascidos, e dos desfechos graves em gestantes de pandemias anteriores por viroses respiratórias, justifica-se a realização deste estudo.

OBJETIVO

Analisar as evidências disponíveis na literatura acerca da temática infecção pelo SARS-CoV-2 e transmissão vertical.

MÉTODOS

Desenho, período e local do estudo

Trata-se de um estudo de revisão de escopo, o qual é utilizado para mapear evidências sobre um determinado fenômeno e identificar as lacunas existentes. Difere-se das demais revisões, uma vez que lista critérios de seleção pautados na relevância para o tema/fenômeno^(9-12). O protocolo de pesquisa foi registrado na Open Science Framework (https://osf.io/fawmv).

A coleta dos dados foi realizada em maio de 2020. As investigações foram realizadas nas bases de dados US National Library of Medicine National Institutes of Health (PubMed), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), SciVerse Scopus (Scopus), Web of Science e Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL). A escolha das bases de dados foi devida ao quantitativo de indexação de artigos primários da área da saúde.

Amostra, critérios de inclusão e exclusão

Na revisão, incluíram-se estudos acerca da temática infecção pelo coronavírus e TV publicados nos idiomas português, espanhol e inglês, datados de 2020. Foram excluídos estudos de revisão, editoriais e opiniões de especialistas. O nível de evidência não foi considerado critério de exclusão por ser uma temática nova. Dessa forma, identificaram-se 76 artigos nas cinco bases de dados. A metodologia Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analysis (PRISMA) foi adotada para sistematizar o processo de inclusão dos estudos⁽¹¹⁾, apresentado nas Figuras 1 e 2.

Figura 1
Fluxograma, segundo os Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analysis, para selecionar estudos

Figura 2
Fluxo da seleção dos artigos e motivos de exclusão da revisão, segundo as diretrizes dos Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses

Protocolo do estudo

Para elaboração da questão norteadora e da estratégia de buscas, percorreram-se as cinco etapas recomendadas pelo Institute Joanna Briggs (JBJ)^(10-11), iniciando-se pela identificação da questão de pesquisa (Quais são as evidências disponíveis na literatura acerca da temática infecção pelo SARS-CoV-2 e TV?) e passando-se para a busca por estudos relevantes, a seleção de estudos, a extração dos dados, o agrupamento, o resumo e, por fim, a apresentação dos resultados. Utilizou-se o acrômio ‘PCC’, sendo P para população (gestantes, feto e neonatos), C para conceito (TV) e C para contexto (infecção pelo SARS-CoV-2/pela COVID-19).

Dois revisores, ambos com título de doutor, realizaram independentemente as pesquisas por meio de descritores controlados do Medical Subject Headings (MeSH), do CINAHL Headings e dos Descritores em Ciências da Saúde, com os termos “COVID-19”, “Infectious Disease Transmission Vertical” e “Coronavirus Infections”, no dia 26 de maio de 2020.

Os descritores foram combinados de diferentes maneiras, objetivando ampliar as buscas. Ressalta-se que as variações terminológicas nos diferentes idiomas bem como os sinônimos foram utilizados na pesquisa sensibilizada, com o uso dos operadores booleanos AND, para ocorrência simultânea de assuntos, e OR, para ocorrência de seus respectivos sinônimos.

Análise e tratamento dos dados

Na primeira etapa, para a escolha dos artigos, realizou-se análise do título e do resumo, seguida de leitura na íntegra para a seleção final, sendo extraídos 15 estudos. As fontes das bases de dados analisadas foram: PubMed®, CINAHL, LILACS, Web of Science^TM e Scopus. Foram excluídos artigos repetidos, em idiomas não estabelecidos, fora do tema, de revisão da literatura e pesquisa qualitativa/opinião de especialista/editorial.

As informações dos estudos foram extraídas utilizando-se o instrumento de coleta de dados proposto e validado por Ursi e Galvão⁽¹³⁾, o qual contempla identificação do artigo, ano e local do estudo, características metodológicas, avaliação do rigor metodológico, nível de evidência⁽¹⁴⁾, principais resultados e discussões relacionadas à questão investigada⁽¹³⁾. Para avaliação da qualidade metodológica e do risco de viés dos estudos incluídos, utilizaram-se as ferramentas Joanna Briggs Institute Appraisal Tools⁽¹⁵⁾.

Os dados foram sintetizados por três pesquisadores independentes, e as inconsistências encontradas foram discutidas, chegando-se a um consenso. As informações extraídas foram tabuladas para a síntese dos dados, e a classificação, segundo o método de estudo, foi baseada em conceitos de estudiosos de metodologia científica⁽¹⁶⁾. A análise dos resultados deu-se de maneira descritiva, tendo sido apresentada uma síntese de cada um dos estudos primários incluídos na presente revisão.

RESULTADOS

Foram incluídos 15 artigos científicos, todos publicados no ano de 2020, no idioma inglês. São estudos descritivos retrospectivos pautados na análise dos prontuários^(17-18) ou estudos de casos de gestantes infectadas com COVID-19^(19-31). A aplicação de ferramentas para avaliação da qualidade metodológica e do risco de viés do Joanna Briggs Institute Appraisal Tools possibilitou identificar moderado risco de viés (escores entre 50% e 70%) em quatro estudos (26,7%) e baixo risco de viés (escores acima de 70%) em 11 estudos (73,3%). Dentre os artigos com risco moderado, identificaram-se lacunas na história gestacional, que se apresentava incompleta, e estudos em que não havia comprovação laboratorial da doença materna pelo padrão de referência (reação em cadeia da polimerase – PCR). O item mais negligenciado foi a descrição completa dos tratamentos maternos, sendo citados ou ignorados. Apesar das limitações metodológicas encontradas, optou-se pela não exclusão dos artigos, por se tratar de temática recente. A maioria dos estudos (12; 80%) foi realizada na China Itália, Peru e Turquia tinham uma produção cada (Quadro 1).

Quadro 1
Síntese dos artigos selecionados (n=15)

País	Objetivos	Delineamento/ participantes	Procedimento metodológico e desfechos	Risco de viés (JBI)*(14)
Itália(17)	Avaliar tipo de parto e resultados neonatais imediatos em mulheres infectadas pela COVID-19 antes ou até 36 horas após o parto.	Estudo transversal com dados retrospectivos/n=42	Revisados prontuários de 42 binômios. Três neonatos apresentaram infecção pelo SARS-CoV-2 (COVID-19). Dois estavam em aleitamento materno exclusivo, com mães sem máscara que foram diagnosticadas com COVID-19 pós-parto; o outro foi o caso de RN nascido de parto vaginal, separado da mãe imediatamente após o nascimento, em virtude de a mãe apresentar quadro de hemorragia pós-parto. Nesse caso, o RN apresentou diarreia no primeiro dia de vida e, no terceiro, sintomas respiratórios e foi encaminhado ao CTI, onde ficou em VM por 1 dia. Apresentou PCR positivo apenas no sétimo dia de vida.	89%
China(18)	Avaliar características clínicas e resultados de gestações de mulheres com pneumonia por COVID-19 e o potencial risco de TV.	Estudo transversal com dados retrospectivos (séries de estudos de caso)/n=116	Analisados registros de gestantes com pneumonia por COVID-19 em 25 hospitais. Oito casos ocorreram antes de 24 semanas gestacionais e, destes, um resultou em aborto espontâneo (infecção que cursou com febre por 5 semanas). Todos os casos tinham morfologia fetal normal (ao ultrassom). De 10 casos entre 24 e 33 semanas, 20% evoluíram para trabalho de parto prematuro, sendo uma gestação com 28 semanas e outra gestação de gemelar de 31 semanas. De 24 casos entre 34 e 36 semanas, 79% evoluíram para parto prematuro e 27,3% para rotura prematura de membranas. Não houve TV constatada pelo resultado de PCR dos RNs.	50%
China(19)	Analisar características clínicas de uma gestante com COVID-19 e os desfechos da gestação.	Estudo de caso/n=1	Descrição do estudo de caso de gestante, primigesta, 22 anos, 38 semanas. Durante o trabalho de parto, não apresentou sintomatologia identificável para COVID-19; movimentos fetais estavam presentes, parâmetros vitais estavam normais, ultrassom fetal com morfologia e desenvolvimento normal. Histórico de contato com pessoas com COVID-19 (marido e irmã). Mantida em isolamento e administrada oxigenoterapia em cateter (2L/minuto), em razão de diagnóstico de pneumonia. Evoluiu com febre, no segundo dia após parto, com melhora e alta no 25o dia. Não houve TV constatada pelo resultado de PCR do RN.	100%
China(20)	Apresentar e discutir um caso de neonato cuja mãe foi diagnosticada com COVID-19.	Estudo de caso/n=1	Descrição do estudo de caso de gestante, primigesta, 25 anos. Infecção adquirida no terceiro trimestre gestacional. Não houve TV constatada pelo resultado de PCR do RN.	87,5%
Peru(21)	Descrever um caso de infecção por COVID-19 em gestante cujo neonato foi positivo para COVID-19.	Estudo de caso/n=1	Descrição de caso de gestante, terceira gestação, sem abortos prévios, 41 anos, 33 semanas de gestação, admitida com quadro de insuficiência respiratória. Histórico de diabetes gestacional, em uso de insulina e metformina, obesa. Parceiro e dois filhos sintomáticos para COVID-19 há 14 dias. RN nascido de parto cesáreo, com 2.970g, Apgar 6 e 8 no primeiro e quinto minutos de vida. RN apresentou PCR positivo, 16 e 48 horas pós-parto. No sexto dia de vida, evoluiu com tosse e desconforto respiratório, resolvidos com oxigenoterapia nasal (cateter).	87,5%
China(22)	Relatar características clínicas dos RNs de mães infectadas com SARS-CoV-2.	Estudo de caso/n=7	Descrição de sete estudos de casos de mães infectadas com SARS-CoV-2 na gestação, sendo que 85,7% tiveram diagnóstico de um a seis dias antes do parto. Todos os RNs nasceram de parto cesáreo e obtiveram escore de Apgar maior que 8 no quinto minuto de vida; 57,1% tinham entre 36 e 37 semanas gestacionais. Os neonatos foram encaminhados para CTI, para isolamento respiratório, e dois necessitaram de ventilação não invasiva por CPAP, em virtude da prematuridade. Todos os PCRs foram negativos, e os RNs receberam alta em bom estado.	50%
China(23)	Investigar as características clínicas de neonatos nascidos de mães com infecção por SARS-Cov-2.	Estudo de caso/n=19	Os neonatos tinham idade gestacional média de 38 semanas; 94,7% dos partos foram cesáreos, e todos os RNs foram separados da mãe imediatamente após o parto. Não foram encontradas evidências clínicas e/ou laboratoriais de infecção SARS-CoV-2 nos RNs avaliados. Considerou-se importante o afastamento dos RNs imediatamente após o parto, para evitar a contaminação deles.	50%
China(24)	Relatar um caso de uma mulher grávida convalescente diagnosticada com infecção por COVID-19, 37 dias antes do parto, no terceiro trimestre.	Estudo de caso/n=1	Realizado estudo de caso de RN de mãe diagnosticada com COVID-19 na 33a semana de gestação. Os exames de PCR e dosagem de imunoglobulinas (IgM e IgG) do RN e placenta foram negativos. Resultado do exame anatomopatológico da placenta também foi negativo para a infecção.	75%
China(25)	Identificar todos os RNs infectados por COVID-19 e descrever suas características clínicas, tratamento, resultados e potencial de transmissão.	Estudo de caso/n=4	Foram avaliados quatro RNs, com idades entre 30 horas e 17 dias de vida, diagnosticados com COVID-19 cujas mães apresentaram diagnóstico confirmado de COVID-19 (exames clínicos, laboratoriais e de imagem). Foram verificados dados retrospectivos de prontuários. Dos quatro RNs diagnosticados, dois apresentaram febre, um, dispneia, um, tosse e um era assintomático. Os RNs receberam tratamento de suporte, sem necessidade de tratamento intensivo ou VM. Os RNs receberam alta entre 16 e 30 dias de internação. Não foi possível descartar se a infecção foi transmitida por profissionais de saúde durante o período de internação.	50%
China(26)	Descrever caso clínico de quatro RNs de mães diagnosticadas com infecção por COVID-19.	Estudo de caso/n=4	Foram descritos quatro casos de RNs de mulheres com COVID-19, isolados da mãe imediatamente após o parto. Dois apresentaram erupções cutâneas de etiologia desconhecida, e um apresentou ulceração facial que desapareceu espontaneamente. Um RN evoluiu com taquipneia e foi necessária VM por três dias, com alta hospitalar ao sexto dia de vida. A erupção cutânea foi considerada consequência da toxina inflamatória materna. Não houve TV constatada pelo resultado de PCR dos RNs.	75%
Turquia (27)	Relatar um caso de achados positivos da ultrassonografia pulmonar compatíveis com COVID-19 em uma mulher com resultado negativo de PCR.	Estudo de caso/n=1	Descrito caso de gestante, 35 semanas de gestação, afebril, que apresentou tosse, dispneia e náuseas, com resultado de PCR negativo. Possuía traço de talassemia, não anêmica. Apresentou piora do quadro dois dias após resultado negativo do PCR. Na ultrassonografia pulmonar, apresentou aumento das linhas grossas do pulmão (seguimentos basais posteriores). Recusou nova realização do exame. Dois dias após, apresentou piora da dispneia, redução da movimentação fetal e edema de membro inferior. Realizada TC e novo swab de orofaringe. A paciente apresentou TC condizente com infecção viral e swab positivo para a infecção por SARS-CoV-2. Não houve TV constatada pelo resultado de PCR do RN.	87,5%
China(28)	Relatar 2 casos clínicos de RNs de mães infectadas com SARSCoV- 2 no terceiro trimestre de gestação.	Estudo de caso/n=2	Caso 1: segundigesta, 34 anos, 37 semanas, sem comorbidades. Apresentou congestão nasal e rash abdominal, exposta a caso de COVID-19. No 11º dia da infecção, RN nasceu com 3.400g, Apgar 9 e 10 no 1o e 5o minutos de vida, separado da mãe ao nascer. No 3º dia de vida, RN apresentou distensão abdominal e linfopenia. No 4º dia, CT de tórax indicou pneumonia, PCR de swab nasal negativo para COVID-19, assim como nos espécimes: sangue de cordão umbilical, placenta, líquido amniótico, swab de secreção vaginal e no leite materno. Apresentou boa resposta com antibioticoterapia. Recebeu alta com 8 dias de vida Caso 2: primigesta, 29 anos, 36 semanas, sem comorbidades. Apresentou calafrios, febre, congestão nasal, dor de garganta e pequeno sangramento vaginal, liberada após ser examinada. Dois dias após, esposo recebeu resultado positivo de COVID-19. No terceiro dia de sintomas, apresentou PCR positivo para COVID-19 e imagem sugestiva pela TC no quinto dia de sintomas. Nesse mesmo dia, RN nasceu com 2.980g, Apgar 9 e 10 no primeiro e quinto minutos de vida, separado da mãe ao nascer. RN apresentou pneumonia e linfopenia com boa resposta à antibioticoterapia em dois dias. Não houve TV constatada pelo resultado de PCR dos RNs, nos casos.	100%
China(29)	Relatar um caso neonatal de infecção pela COVID-19 36 horas após o nascimento.	Estudo de caso/n=1	Secundigesta, com abortamento anterior, 34 anos, sem contatos domiciliares, 15 casos confirmados para COVID-19 na comunidade onde residia, sem comorbidades. Com 40 semanas, apresentou sangramento vaginal e dor abdominal. Evoluiu com febre (37,8ºC), TC de tórax sugestiva de COVID-19, linfopenia, neutrofilia e PCR elevado. Não houve contato com RN pós-parto. Colhido PCR do neonato com 36 horas de vida, com resultado positivo. O RN estava assintomático, porém com TC de tórax sugestiva. PCR negativo com 14 dias. Recebeu alta com 15 dias de vida.	87,5%
China(30)	Descrever características clínicas de 10 neonatos nascidos de mães com diagnóstico de pneumonia por COVID-19.	Estudo de caso/n=10	Idade média das mães: 30 anos. Diagnóstico: de um a seis dias de sintomas. Quatro RNs nasceram a termo e seis prematuramente; dois tinham extremo baixo peso e um era grande para idade gestacional; seis tiveram desconforto respiratório; quatro, sintomas gastrintestinais, dois, febre e um, aumento da frequência respiratória; sete tinham TC de tórax sugestiva de COVID-19. Os escores de Apgar variaram de 7 a 10 no primeiro minuto e de 8 a 10 no quinto. Nenhum recebeu antiviral; cinco obtiveram alta; quatro permaneciam internados em bom estado e um foi a óbito por falência de múltiplos órgãos (decorrência da prematuridade). Não houve TV constatada pelo resultado de PCR dos RNs.	100%
China(31)	Avaliar características clínicas de gestantes com COVID-19 e potencial de TV.	Estudo de caso/n=9	Todas as gestantes tiveram infecção no terceiro trimestre. Idade materna variou de 26 a 40 anos; idade gestacional de 36 a 39 semanas e 4 dias. Uma paciente tinha hipertensão gestacional, e oito não apresentavam comorbidades. Todas estavam estáveis no momento do parto. Sintomas mais comuns: febre, dor de garganta e mialgia. Houve dois casos de hipoxemia fetal e dois casos de rotura prematura de membranas. Foi colhida amostra de líquido amniótico, cordão umbilical, swab neonatal e amostra de leite de seis neonatos com resultados de PCR negativos	87,5%

• ^*
  Risco de viés calculado pelo Joanna Briggs Institute Appraisal Tools⁽¹⁴⁾
• Nota - COVID-19: doença pelo coronavírus 2019; RN: Recém-nascido; CTI: Centro de Terapia Intensiva; VM: Ventilação mecânica; PCR: reação em cadeia da polimerase; TV: transmissão vertical; CPAP: pressão positiva contínua nas vias aéreas; TC: tomografia computadorizada.

No Quadro 2, estão descritas as informações relacionadas a tipo de estudo, parto, clínica das parturientes, sintomatologia, diagnóstico, tratamento e características do neonato.

Quadro 2
Caracterização dos estudos quanto a tipo de parto, clínica e sintomatologia das parturientes, diagnóstico, tratamento e características do neonato

Variáveis	Referência/participantes
Parto	(17) (42)	(18) (116)	(19) (1)	(20) (1)	(21) (1)	(22) (7)	(23) (19)	(24) (1)	(25) (4)	(26) (4)	(27) (1)	(28) (2)	(29) (1)	(30) (10)	(31) (9)
Vaginal	57,1	14,1	-	-	-	-	5,3	Sim	-	25	-	-	-	30	-
Cesáreo	42,9	85,9	Sim	Sim	Sim	100	94,7	-	100	75	Sim	100	Sim	70	100
Clínica das parturientes
Pneumonia admissão	45,2	77,8	Sim	Sim	Sim	85,7	100	Sim	-	100	Sim	100	Sim	100	100
Oxigenoterapia	36,8	5,2	Sim	Sim	Sim	-	-	Não	-	25	Sim	-	-	-	100
Intubação	-	1,7	Não	Não	Sim	-	-	Não	-	-	Sim	-	-	-	Não
Internação em CTI	21,1	6,9	Não	Não	Sim	-	-	Não	-	-	Sim	-	-	-	-
Óbito materno	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não
Sintomatologia
Febre	Sim	50,9	Sim	Sim	Sim	Sim	57,9	Sim	Sim	75	Não	100	Sim	90	78
Tosse	Sim	28,4	Sim	-	-	Sim	26,3	Sim	Sim	50	Sim	-	-	40	44
Fadiga	-	12,9	Sim	Sim	Sim	-	-	-	-	50	-	-	-	-	22
Dispneia	Sim	7,8	Sim	Sim	Sim	-	26,3	-	-	50	Sim	-	-	-	11
Diarreia	Sim	0,9	Sim	-	-	Sim	10,5	-	-	25	-	-	-	10	11
Diagnóstico
Antes do parto	23,8	37,9	Não	Sim	Não	85,7	68,4	Sim	75	-	Sim	100	-	50	88
Na admissão	64,3	-	Sim	Não	Sim	Não	10,5	-	-	-	-	-	Sim	20	-
Pós-parto	11,9	-	Não	Não	Não	14,3	21,1	-	25	-	-	-	-	30	22
PCR positivo	Sim	56,0	Sim	Sim	Sim	Sim	52,9	Sim	100	100	Sim	100	Sim	80	100
Tomografia indicativa	-	96,3	Sim	Sim	Sim	85,7	100	Sim	100	100	Sim	100	Sim	100	100
Líquido amniótico	-	Sim-	-	Sim-	-	Sim-	Sim-	Sim-	-	-	-	Sim-	-	-	67(-)
Sangue cordão	-	Sim-	-	Sim-	-	Sim-	Sim-	-	-	-	Sim-	Sim-	Sim-	-	67(-)
Leite materno	-	Sim-	Sim-	Sim-	-	-	Sim-	Sim-	-	-	Sim-	Sim-	Sim-	-	67(-)
Placenta	-	-	-	Sim-	-	-	-	Sim-	-	-	Sim-	Sim-	Sim-	-	-
Swab vaginal	-	Sim-	-	Sim-	-	-	-	Sim-	-	-	-	Sim-	-	-	-
Tratamento
Antiviral	-	54,3	Sim	Sim	Sim	-	31,6	Sim	-	-	Sim	100	Sim	50	67
Interferon	-	-	Sim	Sim	-	-	-	-	-	-	-	-	Sim	10	-
Corticoide	-	31,9	Não	Sim	Sim	-	Não	Sim	-	-	Sim	50	Sim	-	-
Antibiótico	-	94,0	Não	Sim	Sim	-	-	-	-	-	Sim	100	Sim	-	100
Hidroxicloroquina	-	-	-	-	Sim	-	-	-	-	-	Sim	-	-	-	-
Neonato
Infecção COVID-19	7,1	Não	Não	Não	Sim	Não	Não	Não	Sim	Não	Não	Não	Sim	Não	Não
Amamentação	26,2	-	Não	Não	Não	-	Não	-	25	Não	Sim	-	Não	-	-
Swab de orofaringe	Sim	86	Sim	Sim	Sim	Sim	Sim	Sim-	Sim+	75-	Sim-	Sim-	Sim+	Sim-	Sim-
Prematuridade	26,2	21,2	Não	Sim	Sim	57,1	10,5	Não	Não	Não	Sim	50	Não	60	44
Óbito neonatal	0	0,9	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	Não	10	Não
CTI neonatal	7,1	47,0	Sim	Sim	Sim	71,4	Sim	Não	Não	25	Não	50	Sim	-	-

• Resultados expressos como %
• Nota - CTI: Centro de Terapia Intensiva; PCR: reação em cadeia da polimerase; COVID-19: doença pelo coronavírus 2019.

Quanto à via de parto, a taxa de cesáreas em mulheres com COVID-19 variou de 42,9 a 100%, e as indicações foram descompensação respiratória materna, hipoxemia fetal ou gestação gemelar.

Na admissão hospitalar, de 45,2% a 100% das parturientes apresentavam quadro de pneumonia. O uso de oxigênio através de cateter foi necessário entre 5,2% e 100% dos casos, embora, em seis estudos, essa variável não tenha sido avaliada. A taxa de intubação foi de 1,7% em estudo com 116 gestantes. Houve descrição de dois casos que necessitaram de ventilação mecânica, mas, em oito estudos, esse relato não foi descrito. Dois estudos avaliaram o percentual de admissão em CTI, que variou de 6,9% a 21,1% dos casos, e, em dois estudos de casos, as gestantes intubadas foram assistidas em CTI, porém 11 estudos não avaliaram a necessidade de internação nesses centros. Nos trabalhos avaliados, não houve a descrição de óbito materno entre as gestantes com COVID-19.

Em relação à sintomatologia da COVID-19 entre as gestantes, a mais frequente foi a febre (de 50,9% a 100%), seguida de tosse (de 26,3% a 50%), fadiga (de 12,9% a 50%), dispneia (de 7,8% a 50%) e diarreia (de 0,9% a 25%). O momento do diagnóstico da infecção pelo SARS-CoV-2 foi variável, sendo mais prevalente antes do parto (de 23,8% a 100%) e seguido da admissão do trabalho de parto (de 20% a 64,3%) e do puerpério (de 11,9% a 30%).

Para o tratamento medicamentoso da infecção, foi descrito o uso de antivirais (de 50% a 100%) e de antibióticos (de 94% a 100%). Interferon e hidroxocloroquina foram utilizados em quatro e em dois casos, respectivamente. Nos quadros de gravidade ou mediante a necessidade de maturação pulmonar, usaram-se corticoesteroides. O diagnóstico da infecção foi realizado, em sua maioria, por tomografia torácica (de 85,7% a 100%) e PCR (de 52,9% a 100%). Todas as gestantes apresentavam resultado de tomografia sugestivo ou confirmação laboratorial.

Quanto à TV, verificou-se que não há consenso nas instituições quanto à coleta de espécimes. A maioria dos neonatos foi testada pelo PCR em amostra de swab de nasofaringe (75%). Em estudo que descreveu quatro RNs de mães com COVID-19⁽²⁷⁾, os pais de um RN não consentiram a testagem, pois estava assintomático. Em outro estudo com 116 gestantes⁽¹⁸⁾, não foi descrito o motivo pelo qual 14% dos RNs não foram testados.

Em nove ensaios (60%), realizou-se a técnica de PCR para detecção viral em amostras de leite materno; em oito (53,3%), em sangue de cordão umbilical e, em sete (46,7%), no líquido amniótico. Cinco placentas foram avaliadas anatomopatologicamente, tendo sido colhidas amostras de sangue para PCR (33,3%). Em quatro estudos (26,7%), coletou-se secreção vaginal. A não realização de exames de PCR no leite materno, líquido amniótico, sangue de placenta, anatomopatológico de placenta e amostra de sangue de cordão umbilical foi considerada limitação de alguns estudos. Em todos os espécimes testados, o PCR para COVID-19 foi negativo. No estudo realizado na Turquia⁽²⁷⁾, a amostra de líquido amniótico foi contaminada com sangue materno, sendo descartada. Estudo que avaliou nove casos na China⁽³¹⁾ não apresentou coleta do líquido amniótico em 33,3% dos casos, pois o diagnóstico de COVID-19 foi no puerpério.

Em relação aos neonatos, estudo da Itália⁽¹⁷⁾ com 42 gestantes com COVID-19 apresentou prevalência de infecção de 7,1%. Dos três neonatos que apresentaram resultado positivo, dois estavam em aleitamento materno exclusivo com mãe sem máscara, diagnosticadas com COVID-19 no período pós-parto. Os autores atribuíram a infecção do RN ao contato com a mãe, e não ao aleitamento materno, apesar de não terem dados relacionados à análise do leite. Em estudo realizado no Peru⁽²⁷⁾, o RN apresentou PCR positivo 16 e 48 horas pós-parto e evoluiu com desconforto respiratório. O RN não foi amamentado no seio materno, mas não foram colhidas amostras de diferentes espécimes que comprovassem a TV.

Ensaio chinês com quatro RNs com COVID-19⁽²⁵⁾ observou que eles não tiveram necessidade de tratamento intensivo ou VM e receberam alta hospitalar. Não foram colhidas amostras de diferentes espécimes para comprovação da TV, e não foi possível descartar a infecção, durante o período de internação, transmitida por profissionais de saúde (Infecção Relacionada à Assistência à Saúde - IRAS). No estudo que descreveu um caso neonatal de infecção pelo SARS-CoV-2, 36 horas após o nascimento⁽²⁹⁾, o RN não teve contato pós-parto com a mãe. Nesse caso, colheram-se amostras de sangue de cordão umbilical, placenta e leite materno, sendo todas negativas para COVID-19.

Somando-se os 219 neonatos dos estudos, a prevalência de infecção neonatal pela COVID foi de 4,1%.

O impacto da infecção na ocorrência da prematuridade variou de 10% a 60%. Em relação à necessidade de internação em CTI neonatal, a taxa foi de 7,1% a 71,4%. Em dois estudos chineses, com um⁽¹⁹⁾ e 19 casos⁽²³⁾, os neonatos permaneceram na CTI apenas para isolamento (dos outros RNs e do contato materno), pois estavam assintomáticos e sem necessidade de suporte intensivo.

Foram descritos dois óbitos neonatais, com PCR negativo para COVID-19. Acredita-se que os óbitos ocorreram pela imaturidade fisiológica (prematuridade), em razão da idade gestacional de 35 e 34 semanas e 5 dias, respectivamente.

DISCUSSÃO

Resultados acerca da temática TV do vírus SARS-CoV-2 revelam conhecimento ainda muito limitado.

As recomendações internacionais apontam que a infecção por SARS-CoV-2 não é indicação para parto cesáreo, que deve ser justificado pelas condições clínicas da gestante, idade gestacional e condições/viabilidade fetal^(3,32-33), devendo ser avaliado individualmente⁽³⁴⁾. No entanto, os resultados da presente revisão apontaram altas taxas de cesárea em gestantes infectadas pelo coronavírus, em virtude das condições maternas e/ou fetais. Os dados são corroborados por outros estudos que apontam predomínio de cesáreas, com taxas que variam de 78% a 100%^(35-40).

Na admissão da parturiente para assistência ao parto, os estudos indicaram que algumas gestantes apresentavam pneumonia. Estudos apontam que de 91,8% a 100% dos casos de gestantes infectadas pelo coronavírus evoluíram com pneumonia^(37,41). As pneumonias virais em gestantes podem cursar com quadros mais graves, elevando a morbimortalidade, com índices superiores aos quadros de infecção bacteriana⁽⁴¹⁾. Em casos de pneumonia por COVID-19, orienta-se internação hospitalar, suporte multi e interdisciplinar, hidratação adequada (balanço hídrico rigoroso), monitorização não invasiva, oxigenoterapia, preferencialmente em CTI e retaguarda de CTI neonatal. Quando a saturação materna for inferior a 95%, recomenda-se intubação precoce e VM (ou uso de membrana extracorpórea), para evitar insuficiência respiratória materna e hipoxemia fetal^(3,32-33).

Os resultados desta análise apontaram ampla variação de frequência de uso de oxigenoterapia por cateter nasal e baixas taxas de internação em CTI e de VM entre as gestantes acometidas pela infecção. Na literatura, as taxas de VM variaram entre zero e 26,3% das gestantes^(37-38,42). Não há relatos dos índices de uso de oxigenoterapia por cateter para fins de comparação.

O índice de internação de gestantes com COVID-19 em CTI variou de 2,7% a 34,1% dos casos^(37-40). Estudo de infecções pelo coronavírus SARS-CoV (2002-2003) apontam que 25% das gestantes necessitaram de VM, e 54,5% das gestantes acometidas pelo MERS-CoV (2012) requereram suporte intensivo de CTI⁽⁴¹⁾. Comparando as evidências das duas epidemias de coronavírus (SARS-CoV e MERS-CoV) com as da pandemia atual, verificaram-se índices inferiores de necessidade de VM e admissão em CTI. A COVID-19 tem se mostrado menos letal⁽³⁹⁾.

Em relação ao tratamento medicamentoso, ainda não há consenso nos casos de infecção de gestantes com COVID-19. Recomendações apontam que a associação de lopinavir/ritonavir, utilizada no tratamento do vírus da imunodeficiência humana (HIV), drogas seguras na gestação, apresentou resultados positivos, principalmente se associada às inalações com interferon (proteína que impede replicação viral)^(32,43). Os medicamentos remdesivir (antiviral), cloroquina e hidroxicloroquina (utilizados para o tratamento da malária e doenças autoimunes) apresentaram resultados promissores in vitro, ou seja, na fase 3 de testagem, mas recomenda-se uso individualizado e com cautela^(32,42).

Antibióticos são preconizados em 100% dos casos de gestantes com pneumonia viral para prevenção de infecção bacteriana secundária^(3,32,34). Corticosteroides reduzem o clearance viral no organismo materno e devem ser utilizados em casos de hipoxemia materna severa, por períodos curtos (de 3 a 5 dias)⁽³²⁾, e na prematuridade, para maturação pulmonar fetal⁽⁴³⁾. Essa conduta deve ser individualizada^(3,40), pois, refratariamente, aumenta a glicemia e pode levar à imunossupressão⁽⁴⁰⁾. Ainda não há consenso sobre o uso de corticoesteroides em gestantes.

Não houve descrição de óbito entre as gestantes infectadas pelo SARS-CoV-2 nos estudos avaliados, semelhante a resultados de outros estudos^(39,42,44), contrapondo-se a uma revisão de casos que apontou que 6,4% de gestantes infectadas pelo SARS-CoV-2 evoluíram a óbito⁽⁴⁵⁾.

Semelhantemente aos resultados da presente revisão, a febre apresentou-se como o sintoma mais comum nas gestantes com COVID-19, variando de 68% a 89% dos casos^(36,38,40), seguido da tosse, com índices que variaram de 28% a 57,1%^(37-38,40), e da dispneia, que manifestou-se entre 12% e 27% das gestantes^(37-38,40). Um estudo apontou que 89,2% dos diagnósticos de COVID-19 ocorreram antes do parto; 5,4%, no momento do parto e 5,4%, no puerpério⁽⁴⁰⁾ – semelhante aos dados dessa casuística quando antes do parto, mas superiores no parto e puerpério.

Para avaliação diagnóstica, recomenda-se a testagem por meio da análise de PCR para todas as gestantes sintomáticas^(3,32-33,43) e para as assintomáticas que tenham contato positivo^(3,22-33). Nas contactantes assintomáticas, deve ser coletado swab nasal e orofaringe⁽³⁾, e, nas gestantes sintomáticas, devem ser colhidas amostras de escarro, aspirado endotraqueal e/ou lavado broncoalveolar⁽³⁾. Além disso, ressalta-se a necessidade de dois resultados negativos para descartar a infecção⁽³⁾. Na análise dos estudos, verificou-se que, em alguns casos, não foi realizada a análise de PCR materno, contrariando a recomendação de prioridade de testagem.

Nesta revisão, houve predomínio de diagnósticos de COVID-19 pela tomografia computadorizada de tórax. As recomendações apontam que esse exame é uma ferramenta diagnóstica que deve ser associada à coleta de PCR, principalmente para casos que evoluem com pneumonia e para acompanhamento clínico^(3,32). Recomenda-se que a gestante submetida à tomografia computadorizada seja orientada e assine Termo de Consentimento para sua realização, uma vez que envolve radiação. Deve-se esclarecer que a radiação em uma tomografia computadorizada torácica varia de 0,01mGy a 0,66mGy, e a radiação capaz de causar malformação fetal deve ser superior a 610mGy, sendo considerada procedimento seguro⁽³⁾.

Quanto ao diagnóstico de possível TV, não há consenso em relação à coleta de amostras. A análise do líquido amniótico permite identificar a infecção no ambiente intrauterino. Amostras de sangue de cordão umbilical podem indicar a passagem de anticorpos maternos. Swab de secreção vaginal deve ser coletado em casos de partos vaginais, para avaliar risco associado ao tipo de parto. A análise do leite materno pode indicar a transmissibilidade pelo aleitamento⁽⁴⁶⁾. Estudo revelou que a SARS-CoV-2 liga-se a receptores placentários⁽²⁴⁾, sendo indicados a análise placentária por PCR e o anatomopatológico, nos casos de mães infectadas.

A coleta de PCR nos neonatos de mães infectadas foi o método mais utilizado para detectar a possível TV, similarmente a outros estudos^{(35-37,40,42,44)}. A ausência de consenso em relação aos espécimes coletados para avaliar a possível TV é considerada uma limitação de todos os estudos apresentados até o momento.

O PCR é o método diagnóstico mais confiável para detecção da COVID-19, com sensibilidade de 98,6%. Pode apresentar resultado positivo a partir do primeiro dia de sintoma, com o pico na primeira semana. Falsos-negativos devem-se ao tempo inadequado para a coleta (antes ou após o período descrito), e os falsos-positivos, a erro técnico na coleta ou contaminação da amostra⁽⁴⁷⁾. Já os anticorpos IgM são produzidos a partir de duas semanas após a infecção, declinam o título na quinta semana e desaparecem do soro sanguíneo cerca de sete semanas após infecção, quando ativa a IgG. Apresenta sensibilidade de 51,9% e especificidade de 95%. Os anticorpos podem ser positivos para outros coronavírus, resultando em falso-positivo, e a confiabilidade depende da qualidade dos testes utilizados. Assim, preconiza-se a associação de testes para o diagnóstico. Os autores apontam que o curso temporal da positividade e a soroconversão de PCR podem variar em neonatos e crianças, e assintomáticos podem não ser diagnosticados⁽⁴⁷⁾.

Encontrou-se baixa prevalência de infecção neonatal pelo SARS-CoV-2 na análise dos casos apresentados. Esse comportamento é semelhante ao de outras infecções respiratórias detectadas por painel viral RNA (SARS-CoV, MERS-CoV, parainfluenza, metapneumovírus, vírus sincicial respiratório e influenza) na gestação, em que há baixa TV⁽⁴⁸⁾. Não se pode afirmar que a transmissão, nesses casos, foi vertical, pois não há confirmação diagnóstica em todos os espécimes, podendo-se tratar de IRAS. A maioria dos estudos não aponta evidências de TV do SARS-CoV-2 até o momento^{(36-37,39,41-42,44-45)}.

A taxa de prematuridade apresentou ampla variação, semelhante à de outros estudos que apontaram variação de 18,9% a 66% dos nascimentos^{(36-38,41,44-45)}. A alta prevalência de nascimentos prematuros pode ser explicada pelos quadros de pneumonia materna, que comprometem o fluxo placentário⁽⁴¹⁾.

Assim como o índice de prematuridade, a taxa de internação em CTI neonatal apresentou ampla variação. Estudo apontou necessidade de permanência em CTI neonatal em 8% dos nascimentos de neonatos cujas mães tiveram infecção pela COVID-19⁽³⁷⁾. Em virtude dos resultados de aumento nos índices de prematuridade e vislumbrando alta taxa de ocupação de CTI neonatal no Reino Unido, onde estima-se que 80% da população foi contaminada pelo SARS-CoV-2, optou-se por separar imediatamente o RN da mãe, até o resultado do PCR⁽³⁹⁾.

A fim de evitar possível contaminação pós-parto, recomendam-se: realizar clampeamento imediato^(3,32) ou oportuno do cordão umbilical^(33,49), evitar contato entre mãe e RN após o nascimento e avaliar a possibilidade de aleitamento materno, em mães com sintomas leves, desde que com uso de máscara e higienização frequente das mãos. Não é recomendada a amamentação em mães com sintomas graves da doença, mas deve ser estimulada a ordenha para início e manutenção do aleitamento após a resolução da infecção^(3,32-33,49). O leite ordenhado pode ser ofertado ao neonato, desde que atenda aos critérios de segurança biológica (uso de máscara e higiene rigorosa das mãos)⁽⁵⁰⁾.

Em relação aos óbitos neonatais, a prevalência descrita na literatura varia de zero a 7%^(36-42), mas em nenhum caso foi possível determinar a associação com a COVID-19, uma vez que todos os casos de óbito foram relacionados à prematuridade.

Destaca-se que a maioria das infecções reportadas nos estudos ocorreu no terceiro trimestre gestacional^{(35,39,41-42)}, o que dificulta o esclarecimento se a COVID-19 poderia ser uma possível causa de abortamento⁽²⁴⁾.

Embora não existam evidências sobre a TV do SARS-CoV-2, verifica-se que o conhecimento sobre a infecção ainda é muito limitado e os fatores de risco não estão elucidados. Apontam-se como questionamentos e aspectos a serem explorados em futuras pesquisas⁽⁵¹⁾ as seguintes questões: O momento (idade gestacional) da exposição viral pode ter influência nos resultados obstétricos? Quais são os efeitos dos tratamentos maternos para o feto? Quais são os tratamentos preconizados na gestação? Como se dá a resposta imune da gestante e do feto aos diferentes tipos de tratamentos? As condições clínicas preexistentes aumentam ou predispõem à infecção pela COVID-19 em gestantes?

Em razão das limitações dos estudos e por esta ser uma temática em que várias questões ainda estão por ser respondidas, é de extrema importância que os casos sejam acompanhados, e novas pesquisas sejam realizadas para que evidências mais sustentadas embasem condutas e prática clínica. O detalhamento dos casos e o rastreio diagnóstico nos estudos, inclusive temporal, devem contribuir para avanços na discussão acerca da TV do vírus SARS-CoV-2.

As evidências até o presente momento não comprovam a TV e recomendam fortemente a adoção de medidas preventivas rigorosas de higiene pelos profissionais e pelas mães para evitar o risco de infecção neonatal.

Limitações do estudo

Por se tratar de uma doença nova e pelo fato de que as pesquisas sobre a temática são ainda incipientes, foram inclusos, nas análises, artigos com risco moderado de viés. Não houve padronização dos métodos diagnósticos nos estudos apresentados. Além disso, com rápida atualização da literatura e aumento do número de casos, podem surgir resultados divergentes a respeito do tema.

Contribuições para a área da enfermagem e saúde

Conhecer o perfil da TV a partir das evidências pode embasar condutas para a prática clínica. Diante do cenário epidemiológico mundial, esta revisão torna-se essencial, pois, a partir do mapeamento da literatura, podem-se estabelecer medidas preventivas, nortear cuidados de enfermagem, além de servir de ponto de partida para novas pesquisas sobre a temática.

CONCLUSÃO

Foram encontrados 15 estudos que avaliaram casos de gestantes com COVID-19 e seus desfechos. Detectou-se infecção por SARS-CoV-2 em 4,1% dos neonatos, mas a infecção não pode ser concluída como transmissão vertical por causa da presença de fatores intervenientes na transmissão, como o contato materno ou com profissionais de saúde.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa

EDITOR ASSOCIADO: Ana Fátima Fernandes

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  21 Maio 2021
• Data do Fascículo
  2021

Histórico

• Recebido
  27 Jul 2020
• Aceito
  06 Dez 2020