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Significados atribuídos por familiares acerca do diagnóstico de doença crônica na criança

RESUMO

Objetivos:

compreender os significados atribuídos por familiares cuidadores acerca do diagnóstico de doença crônica na criança.

Métodos:

estudo qualitativo, que utilizou como referencial teórico o Interacionismo Simbólico, e metodológico, a Teoria Fundamentada nos Dados. Realizou-se em uma unidade pediátrica no Sul do Brasil, em 2016, mediante entrevistas submetidas à análise aberta e axial, com a participação de 20 familiares cuidadores de crianças internadas.

Resultados:

familiares, ao interagirem com a equipe de enfermagem/saúde, percebem a doença da criança ao nascimento. Recebem o diagnóstico de doença crônica pelo médico e o nega. Posteriormente, o aceita e buscam informações para o cuidado.

Conclusões:

os resultados apontaram os estágios que os familiares vivenciam, ao atribuir significados ao diagnóstico de doença crônica na criança. Esses significados fornecem subsídios para a atuação do enfermeiro, que precisa estar atento às necessidades da criança e da família, tendo em vista o oferecimento de uma assistência integral e humanizada.

Descritores:
Doença Crônica; Família; Criança Hospitalizada; Enfermagem Pediátrica; Pesquisa Qualitativa

ABSTRACT

Objectives:

to understand the meanings assigned by family caregivers about children’s chronic disease diagnosis.

Methods:

qualitative study, which used as theoretical framework the Symbolic Interactionism, and methodological, the Grounded Theory. It was held in a pediatric unit in Southern Brazil, in 2016, through interviews submitted to open and axial analysis, with the participation of 20 family caregivers of hospitalized children.

Results:

relatives, interacting with the nursing/health staff, perceive children’s disease at birth. They are diagnosed with chronic disease by the physician and deny it. Subsequently, they accept and seek information on care.

Conclusions:

the results pointed out the stages that relatives experience by assigning meanings to about children’s chronic disease diagnosis. These meanings provide subsidies for nurses’ actions, which need to be aware of children’s and family’s needs in order to offer comprehensive and humanized care.

Descriptors:
Chronic Disease; Family; Hospitalized Child; Pediatric Nursing; Qualitative Research

RESUMEN

Objetivos:

comprender los significados atribuidos por los cuidadores familiares sobre el diagnóstico de enfermedades crónicas en los niños.

Métodos:

estudio cualitativo, que utilizó como referencia teórica el interaccionismo simbólico, y metodológico, la Teoría Basada en Datos. Se llevó a cabo en una unidad pediátrica en el sur de Brasil, en 2016, a través de entrevistas sometidas a análisis abiertos y axiales, con la participación de 20 cuidadores familiares de niños hospitalizados.

Resultados:

los miembros de la familia, cuando interactúan con el equipo de enfermería / salud, perciben la enfermedad del niño al nacer. El médico les diagnostica una enfermedad crónica y lo niegan. Más tarde, lo aceptan y buscan información para recibir atención.

Conclusiones:

los resultados señalaron las etapas que experimentan los miembros de la familia, atribuyendo significados al diagnóstico de enfermedades crónicas en los niños. Estos significados brindan subsidios para las acciones de las enfermeras, que deben ser conscientes de las necesidades del niño y la familia, a fin de ofrecer una atención integral y humanizada.

Descriptores:
Enfermedad Crónica; Familia; Niño Hospitalizado; Enfermería Pediátrica; Investigación Cualitativa

INTRODUÇÃO

A hospitalização na infância caracteriza-se como um período de medo e incertezas para a criança e sua família que necessita do auxílio dos profissionais de enfermagem, especialmente quando se trata do enfrentamento de uma doença crônica(11 Hamall KM, Heard TR, Inder KJ, McGill KM, Kay-Lambkin F. The child illness and resilience program (CHIRP): a study protocol of a stepped care intervention to improve the resilience and wellbeing of families living with childhood chronic illness. BMC Psychol. 2014;2(1):5. doi: 10.1186/2050-7283-2-5
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). Essa acompanha a pessoa por um longo período de tempo, comprometendo sua condição física, emocional ou mental e que, muitas vezes, impede a criança de frequentar a escola regularmente e/ou desenvolver suas atividades rotineiras da infância(22 Kish AM, Newcombe PA, Haslam DM. Working and caring for a child with chronic illness: a review of current literature. Child Care Health Dev. 2018;44(3):343-54. doi: 10.1111/cch.12546
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). Podem ser comuns constantes visitas ao médico, uso de medicações e necessidade de hospitalizações da criança, trazendo mudanças na rotina familiar, por afetar o desenvolvimento da criança e suas relações sociais(33 Khangura SD, Karaceper MD, Trakadis Y, Mitchell JJ, Chakraborty P, Tingley K, et al. Scoping review of patient and family oriented outcomes and measures for chronic pediatric disease. BMC Pediatr. 2015;15:7. doi: 10.1186/s12887-015-0323-x
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).

O número de crianças convivendo com doenças crônicas, atendidas nos hospitais e demais serviços de saúde, torna-se crescente, tendo em vista o manejo clínico geral e o acesso a esses recursos nos serviços públicos de saúde. No Brasil, o índice de doenças crônicas é de 9,1% em crianças de zero a cinco anos, 9,7% de seis a 13 anos e 11% de adolescentes de 14 a 19 anos(44 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios: um panorama da saúde no Brasil, acesso e utilização dos serviços, condições de saúde e fatores de risco e proteção à saúde, 2008 [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [cited 2018 Sept 10]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pnad_panorama_saude_brasil.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
). Estudo epidemiológico global, realizado com 500 mil crianças, com idades entre seis e 14 anos, entrevistadas em 31 países, ratificou o dado nacional, revelando que o consumo de fastfood contribui para o desenvolvimento da asma, rinite, eczema, sobrepeso, diabetes e obesidade, com aumento de 39% no risco de asma grave para os adolescentes e 27% para as crianças(55 Ellwood P, Asher MI, García-Marcos L, Williams H, Keil U, Robertson C et al. Do fast foods cause asthma, rhinoconjunctivitis and eczema? Global findings from the international study of asthma and allergies in childhood (ISAAC) phase three. Thorax. 2013;68(4):351-60. doi: 10.1136/thoraxjnl-2012-202285
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).

As doenças crônicas na infância, por serem incuráveis, causam, ao longo do tempo, sequelas, impondo limitações na criança, requerendo habilidades e competências especiais de cuidado de seus familiares cuidadores para sua reabilitação, necessitando de capacitação, supervisão e observação do cuidado. Nesse sentido, percebe-se que a família, ao interagir com a equipe de enfermagem, busca compartilhar sentimentos e percepções diante da finitude e da fragilidade da condição humana que uma doença crônica e severamente grave impõe(66 Grossoehme D, Filigno SS, Bishop M. Parent routines for managing cystic fibrosis in children. J Clin Psychol Med Settings. 2014;21(2):125-35. doi: 10.1007/s10880-014-9396-1
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). Considera-se um compartilhamento interativo, quando o ser humano não apenas reage às ações do outro, mas compreende o contexto, no qual se encontra, o que pode influenciar positivamente em modos de viver saudável(77 Swallow V, Smith T, Webb NJ, Wirz L, Qizalbash L, Brennan E, et al. Distributed expertise: qualitative study of a British network of multidisciplinary teams supporting parents of children with chronic kidney disease. Child Care Health Dev. 2015;41(1):67-75. doi: 10.1111/cch.12141
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).

A família sofre quando percebe o diagnóstico incurável da criança, principalmente, por ter dificuldade em lidar com essa realidade. O familiar cuidador passa a conviver com a incerteza, insegurança, desordem e contínua necessidade de reorganização, visto que a família é a unidade básica na construção e desenvolvimento dos indivíduos que a compõem, de valores que transmitem regras, costumes e ideias para as gerações, além de modelos e padrões de comportamento(88 Brock KE, Wolfe J, Ullrich C. From the child's word to clinical intervention: novel, new, and innovative approaches to symptoms in pediatric palliative care. Children (Basel). 2018;5(4). pii: E45. doi: 10.3390/children5040045
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).

Ao se organizar no hospital, a família busca aporte da equipe de saúde/enfermagem para promover ações que favoreçam um melhor desempenho no controle da doença crônica e na prevenção de complicações na criança. Por ser uma interação dinâmica e complexa, a família precisa construir uma relação de satisfação, que permita se sentir interdependente e cooperativa no cuidado, com esses profissionais para desenvolver uma prática dialógica e promotora de um cuidado autônomo(99 Rostami F, Hassan STS, Yaghmai F, Ismaeil SB, Suandi TB. Effects of family-centered care on the satisfaction of parents of children hospitalized in pediatric wards in a pediatric ward in Chaloos in 2012. Electron Physician. 2015;7(2):1078-84. doi: 10.14661/2015.1078-1084
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). Trata-se do compartilhamento de ações que favorecem as vivências entre indivíduos que buscam a solução de seus problemas, no ambiente onde atuam(77 Swallow V, Smith T, Webb NJ, Wirz L, Qizalbash L, Brennan E, et al. Distributed expertise: qualitative study of a British network of multidisciplinary teams supporting parents of children with chronic kidney disease. Child Care Health Dev. 2015;41(1):67-75. doi: 10.1111/cch.12141
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).

O enfermeiro deve apoiar a família, e contribuir para sua instrumentalização, estimulando práticas participativas de cuidado, para que ela consiga transpor seus medos e anseios de cuidar a criança com doença crônica. A compreensão, a compaixão e o respeito constituem-se em atribuições eficientes e eficazes na interação com a família, no intuito de resgatar valores, possibilitando apoio moral. Além disso, o processo interacional inclui a partilha de informações para que a família possa fazer e atuar sobre as escolhas, a flexibilidade profissional e a capacidade de resposta a pedidos da família(1010 Mead GH. Mind, self and society: from a standpoint of a social behaviorist. Chicago: The University of Chicago Press; 1972.).

No Interacionismo Simbólico (IS), o conhecimento se processa por meio da interação entre os sujeitos e o ambiente. Assim, o conhecimento se desenvolve pela ação dos indivíduos em relação às coisas, baseando-se nos seus significados próprios. São significados resultantes da interação social e modificados pela interpretação individual das pessoas que se interligam e interagem socialmente(77 Swallow V, Smith T, Webb NJ, Wirz L, Qizalbash L, Brennan E, et al. Distributed expertise: qualitative study of a British network of multidisciplinary teams supporting parents of children with chronic kidney disease. Child Care Health Dev. 2015;41(1):67-75. doi: 10.1111/cch.12141
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,1111 Blumer H. Symbolic Interactionism: perspective and method. Berkeley: University of California Press; 1969.).

Nessa interação, a equipe de enfermagem contribui para o estabelecimento de vínculos com os familiares cuidadores e as crianças com doença crônica, no contexto em que estão inseridos, promovendo um cuidado recíproco. Esse cuidado partilhado entre a equipe de enfermagem e o familiar cuidador pode ser fonte de apoio e suporte à assistência e tratamento de crianças com doenças crônicas em âmbito hospitalar(1212 Holm M, Carlander I, Fürst CJ, Wengström Y, Årestedt K, Öhlen J, et al. Delivering and participating in a psycho-educational intervention for family caregivers during palliative home care: a qualitative study from the perspectives of health professionals and family caregivers. BMC Palliat Care. 2015;14:16. doi: 10.1186/s12904-015-0015-1
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).

No decorrer do período de internação hospitalar da criança, ocorre a proximidade entre a equipe de enfermagem e seus familiares cuidadores. Torna-se o momento ao qual a família avalia o cuidado de enfermagem prestado(1313 Jensen PT, Karnes J, Jones K, Lehman A, Rennebohm R, Higgins GC, et al. Quantitative evaluation of a pediatric rheumatology transition program. Pediatr Rheumatol O J. 2015;13:17. doi: 10.1186/s12969-015-0013-0
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). Acredita-se, desse modo, que compreender os significados atribuídos por familiares cuidadores acerca de suas interações com os profissionais de enfermagem no cuidado à criança com doença crônica no hospital, contribui para que esses profissionais visem uma assistência participativa focada no cuidado à criança com doença crônica e sua família, pactuada em consonância com as necessidades da criança. Assim, tem-se a questão norteadora deste estudo: Qual o significado atribuído por familiares acerca do diagnóstico de doença crônica da criança?

OBJETIVOS

Compreender os significados atribuídos por familiares acerca do diagnóstico de doença crônica da criança.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Foram respeitados os princípios éticos da pesquisa envolvendo seres humanos, conforme as preconizações da Resolução 466/12(1414 Ministério da Saúde (BR). Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2012 [cited 2018 Sept 15]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html
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). O projeto de pesquisa aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal do Rio Grande/FURG. Os familiares cuidadores das crianças com doenças crônicas aceitaram participar do estudo mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Referencial teórico-metodológico

Esta pesquisa teve como referencial teórico o Interacionismo Simbólico (IS). O referencial metodológico utilizado foi a Grounded Theory (GT), a qual permite gerar teorias ao descrever e interpretar fenômenos, possibilitando aprofundar o conhecimento, dentro da multidimensionalidade da experiência do ser humano no seu cotidiano(1515 Glaser B, Strauss A. The discovery of grounded theory: strategies for qualitative research. New Brunswick: Aldine; 1967.).

Tipo de estudo

Trata-se de uma pesquisa exploratório-descritiva, com abordagem qualitativa.

Procedimentos metodológicos

Cenário do estudo

Foi desenvolvido em uma Unidade Pediátrica de um Hospital Universitário, localizado no extremo sul do Brasil, no período de janeiro a julho de 2016. Essa se destina ao atendimento de pacientes de zero a doze anos incompletos, sendo certificada como Hospital Amigo da Criança e referência no atendimento materno-infantil, no âmbito do Sistema Único de Saúde. É constituída por 18 leitos, assim, distribuídos: um leito de isolamento, uma enfermaria com cinco leitos e quatro enfermarias com três leitos, que funcionam com sistema de alojamento conjunto. Pressupõe um ambiente favorável à interação do cuidado e ao vínculo entre familiar cuidador e profissionais de saúde/enfermagem, com ênfase na valorização dos significados advindos das crenças e valores culturais das famílias, com vistas a um planejamento assistencial de saúde interrelacionado, integrado e alinhado com as necessidades de crianças e cuidadores.

Fonte dos dados

Os participantes foram definidos por meio da técnica da amostragem por conveniência. Sendo assim, foram convidados a participar todos os familiares de doenças crônicas que internaram, no período da coleta de dados. Utilizaram-se como critérios de inclusão: ser cuidador frequente da criança e prestar-lhe cuidados diretos no hospital e ter 18 anos ou mais. Excluíram-se os familiares que cuidavam eventualmente da criança no hospital. Foram entrevistados 20 familiares. Esse total assegurou a saturação teórica do conteúdo dos dados, justificada pelo não alcance de dados novos(1515 Glaser B, Strauss A. The discovery of grounded theory: strategies for qualitative research. New Brunswick: Aldine; 1967.).

Coleta e organização dos dados

A coleta dos dados foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas, nas quais os familiares foram questionados acerca de como compreenderam o diagnóstico de doença crônica da criança. Os encontros para a coleta dos dados foram previamente agendados com os participantes. As entrevistas tiveram duração média de 30 minutos, foram realizadas na sala de internação da unidade, garantindo a privacidade dos participantes e a confidencialidade dos dados. Ainda, foram gravadas em áudio, por meio de aparelhos de mp3, e transcritas para posterior análise.

Análise dos dados

Os dados foram analisados de acordo com a codificação substantiva e codificação teórica de Glaser e Strauss(1515 Glaser B, Strauss A. The discovery of grounded theory: strategies for qualitative research. New Brunswick: Aldine; 1967.). A codificação substantiva tem por objetivo a constituição de conceitos. Para isso, subdivide-se em codificação aberta e codificação seletiva dos dados(1515 Glaser B, Strauss A. The discovery of grounded theory: strategies for qualitative research. New Brunswick: Aldine; 1967.). Na codificação aberta, foi realizada a análise minuciosa, linha a linha, dos dados brutos, de forma a explorar as impressões, sentimentos, pensamentos e crenças revelados pelos participantes.

Já na codificação seletiva, os códigos iniciais, identificados por meio da codificação aberta, foram agrupados em categorias, a partir das similaridades, repetição de padrões e relações que surgiram. Para consolidar os resultados da pesquisa e imprimir rigor científico ao estudo, as categorias formuladas foram apresentadas individualmente a cada familiar, com o objetivo de confirmarem os dados obtidos, complementarem ou modificarem as informações que representam a realidade investigada, validando o estudo. As falas dos participantes foram identificadas pela letra F, seguida do número da entrevista.

RESULTADOS

A análise dos dados evidenciou a caracterização das famílias participantes do estudo e as categorias representadas, conforme Figura 1.

Figura 1
Diagrama representativo das relações entre as categorias que compõem este estudo

Caracterização das famílias participantes do estudo

Participaram do estudo 20 familiares de crianças com doenças crônicas, sendo a mãe a principal cuidadora. A idade dos participantes variou de 19 a 44 anos de idade. No que se refere ao grau de escolaridade, cinco possuíam ensino fundamental incompleto, oito ensino fundamental completo, seis ensino médio completo e um ensino superior em andamento.

Quanto à ocupação, 15 participantes nunca haviam exercido atividades remuneradas fora do lar, sendo o pai da criança o provedor da renda familiar. Os outros cinco, exerciam atividades profissionais fora do lar (um balconista, uma cuidadora de crianças, uma cabeleireira, uma costureira e uma faxineira). A renda das famílias variou entre R$ 800,00 e R$ 2.500,00, sendo o salário mínimo, no momento da coleta de dados, de R$ 880,00. Dez mães que participaram do estudo compartilhavam o cuidado dos filhos com seus cônjuges, cinco com avós da criança e cinco cuidavam sozinhas da criança.

No tocante ao perfil das crianças com doenças crônicas, as idades variaram entre um ano incompleto e seis anos de idade, sendo 11 do sexo masculino e nove do sexo feminino. Onze crianças apresentavam como doenças crônicas a encefalopatia/paralisia cerebral, duas bronquite asmática, duas osteogênese imperfeita, duas diabete mellitus, uma câncer, uma síndrome do intestino curto e uma imperfuração anal.

Com relação ao ambiente de cuidado dessas crianças, em geral, 20 passavam por internações hospitalares frequentes; cinco frequentava a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) e duas a pré-escola. As demais eram cuidadas exclusivamente no domicílio. Trata-se de crianças portadoras de necessidades especiais, sendo 17 usuárias de medicações contínuas e 15 de tecnologias de cuidado, incluindo nebulizadores, bolsas de colostomia, cateteres nasais, sonda de gastrostomia e cadeira de rodas.

Percebendo os problemas de saúde da criança ao interagir com a equipe de enfermagem/saúde

Vários foram os sinais identificados por algumas famílias, após o contato com a equipe de saúde no nascimento da criança. Algumas famílias perceberam a criança pequena ao nascer e dispneica, devido à sua prematuridade.

Achava ele muito pequeno, eu vi que não era normal. Quando eu perguntava, o médico me dizia que era porque ele era prematuro. Que era coisa de prematuro. Eu ficava muito desconfiada. (F2)

Ele, para mim, era pequeno e tinha dificuldade para respirar. Me disseram na enfermaria que era pela prematuridade. (F7)

Outras crianças apresentaram icterícia neonatal, cianose, estado de coma, tremores e convulsões. Esses sintomas foram identificados no exame médico, sendo as famílias informadas do risco de possíveis sequelas irreversíveis.

Achei ele muito amarelinho. Quando entrou na UTI o médico pediu para realizar a transfusão de sangue e disse que ele iria ficar com sequelas. (F20)

Ele é muito agitado e ficava roxinho. O neurologista identificou pelo exame que ele tinha as convulsões, em função das sequelas. (F15)

Entrei em desespero, pois ela entrou em coma no hospital. Ela tinha falta de ar e tremia muito. Após os exames, a pediatra me disse que poderia ter problemas mentais que podem afetar o aprendizado dela. (F18)

Após a alta da criança na UTI Neo, a família receou que o bebê poderia não ser normal como as outras crianças. A equipe de saúde as informou de que poderiam aparecer alguns problemas de saúde.

Quando ele saiu da UTI Neo, achei que ele mamava muito pouco, mesmo com uso do leite na seringa. Aqui não usam mamadeira. Fiquei preocupada, antes de irmos embora da unidade, quando a enfermeira e o médico disseram que eu tinha que vir às consultas regularmente, devido à possibilidade de problemas neurológicos. (F2)

Foi um horror saber, antes de dar alta da UTI Neo, que meu filho poderia ter dificuldades para se movimentar, falar e aprender. Eu fiquei com medo! (F3)

Sendo informado e recebendo o diagnóstico de doença crônica da criança pela equipe de enfermagem/saúde

A maioria dos participantes foi informada do diagnóstico de doença crônica da criança pelo médico.

Quando recebi o diagnóstico de paralisia cerebral pelo médico me senti muito mal. Ele foi grosseiro para dar a informação. Saber da gravidade da doença da minha filha e da possibilidade de ela não sobreviver me fez entrar em desespero ao receber essa terrível notícia. (F17)

O diagnóstico de paralisia cerebral foi dado pelo pediatra. Ele nasceu com parte do pulmão apenas. Teve que ficar na UTI Neo. (F1)

Dependendo da patologia da criança, o diagnóstico foi informado por profissionais de diversas especialidades, como pediatra, neurologista, traumatologista, cirurgião e hematologista.

Meu filho nasceu com o ânus fechado e teve que fazer colostomia. O diagnóstico foi dado pelo pediatra. (F15)

O diagnóstico de encefalopatia foi dado com dois dias de vida, pelo pediatra e neurologista. (F7)

Ele tem paralisia cerebral desde o nascimento. Ficou na UTI Neo quando nasceu. Foi o pediatra quem deu o diagnóstico. (F14)

Foi dado o diagnóstico de osteogênese imperfeita logo após o nascimento pelo traumatologista. (F8)

Meu filho teve volvo intestinal e ficou com a síndrome do intestino curto depois da cirurgia de retirada de quase todo o intestino há dois anos. O diagnóstico foi dado pelo cirurgião. (F12)

Consideraram traumático saber que a criança tem uma doença que não tem cura, sentindo-se aterrorizadas ao saber que a criança não iria caminhar ou falar, e amedrontadas frente às consequências da doença e de lidar com a criança.

Ela estava muito doente. Estava com a glicose muito alterada. Levamos ela ao médico e ganhamos as medicações para começarmos o tratamento. Foi um terror saber que ela terá que se cuidar toda a vida. (F18)

Quando o doutor chegou e deu o resultado de encefalopatia, eu aceitei, embora com receio de lidar com ele por se mexer pouco. Foi aos nove meses de idade que fiquei sabendo. O médico começou a desconfiar porque ele quase não se movimentava. Eu me critiquei porque podia ter forçado o médico a pedir uns exames detalhados dele. Após alguns exames, soube também que ele tinha paralisia cerebral infantil e epilepsia. Foi quando ele ficou uma hora desacordado. (F19)

Algumas famílias referiram ter chorado bastante frente ao diagnóstico da doença criança, apresentando depressão logo após seu nascimento.

Quando eu soube do diagnóstico de diabetes chorei bastante. Queria estar no lugar dela. O dia que me falaram do diabetes me veio um monte de coisas na cabeça. Perdi meu avô materno por causa do diabetes. Tenho medo das consequências da doença, como a cegueira. (F18)

Quando ele nasceu, fiquei depressiva. Fiquei desanimada. Nasceu de seis meses e foi direto para a UTI Neo. (F9)

Outras referiram sentimentos de culpa ao receberem o diagnóstico de doença da criança.

Mudou tudo, não conto com ninguém, fiquei presa. Pergunto para Deus o que eu fiz? Eu me sinto culpada. (F3)

Coloco-me no lugar do meu filho, como ele sofre. Me culpo pela doença dele. (F4)

Não aceitando o diagnóstico de doença crônica da criança recebido pela equipe de enfermagem/saúde

Os familiares referiram que a principal dificuldade para a aceitação do diagnóstico da doença é em relação a sua cronicidade. A incurabilidade da doença na criança remete à necessidade de tratamento e acompanhamento contínuos, podendo estender-se por toda a vida.

Tenho dificuldade em aceitar que ele com seis anos é cego e anda com a ajuda do andador. Vive no colo. O médico não quer que use cadeira de rodas, evitando assim que ele pare de caminhar. Mas é difícil aceitar tudo isso. Já faz seis anos e continua difícil. (F13)

Tudo bem! Eu sei que tenho que me acostumar que ela tem diabete mellitus. Ainda não me acostumei com a doença dela. Parece mentira. Ela tem sete anos e eu não aceito que ela não vai ficar boa, que não tem cura e que irá fazer insulina todos os dias. (F18)

Alguns familiares referiram ficarem revoltadas frente às limitações impostas pela doença da criança.

Fico revoltada por ela ter o intestino curto. É uma síndrome que faz ele, às vezes, sentir fome. Não posso dar tudo que ele gosta de comer. Fica enjoado e enche a bolsa de colostomia de ar e líquidos. (F12)

Me revolto com frequência. Parece que sou uma mãe ruim, porque não posso dar qualquer alimento para ela comer. Eu ainda não aceito o diagnóstico dela, por ver os outros comendo doces e ela não poder. Às vezes ela fica calma, oferecem para ela e ela diz: meu açúcar está alto. Quando faço a medida está em 300 ou 400 o açúcar dela. A enfermeira já havia me dito que um pouco do aumento da glicemia é emocional. (F18)

Aceitando o diagnóstico de doença crônica da criança recebido pela equipe de enfermagem/saúde

Após algum tempo do recebimento do diagnóstico, as algumas famílias referiram estar aprendendo a conviver com essa nova situação de vida e aceitar a condição de cronicidade da criança.

Tenho que aceitar e ir me adaptando, por isso hoje ela está bem, frequenta a APAE. Não tenho vergonha dela. Ela tem contato social com outras crianças. Ela tem problemas, mas tem o nosso carinho. O pai não dá tanta atenção, mas mesmo assim ela adora o pai. (F10)

Ele foi bem aceito na família. Aprendi a aceitar a doença dele e cuidar de acordo com o que ele precisa. (F11)

Vamos aprendendo cada coisa no seu momento a lidar com a doença. Estou aprendendo a superar as dificuldades com ele. (F4)

Referiram a necessidade de serem fortes e guerreiras frente à criança com doença crônica que possuem, mudando sua visão em relação à doença e não tendo vergonha do filho.

Por ele ser especial costuma ter dificuldades quando caminha, mas faz tudo sozinho. Precisa que cuide dele apenas para que não se machuque. Não precisa de tantos cuidados, mas estou sempre junto com ele. Me sinto mais forte vendo ele bem. (F6)

Meu cotidiano mudou muito. Mudei minha visão em relação à paralisia cerebral e epilepsia em uma criança. Achava que tinha que ser tratada isolada. Hoje eu percebo que não e que ele pode ter uma convivência com as pessoas como uma criança normal. Para mim foi uma lição de vida que eu tive. Acho que aprendi mais com ele do que com uma criança normal. (F19)

Buscando informações com a equipe de enfermagem/saúde acerca da doença crônica da criança

Após a aceitação do diagnóstico, as famílias buscam informações que as habilitem para o cuidado da criança.

Busco informações acerca da doença dela, dos problemas de saúde e da necessidade de tomar medicações. Pergunto, também, para a enfermeira, gravidade e dos riscos da minha filha morrer. (F17)

Para cuidar dela fomos ao médico. Como ela estava muito debilitada saímos do consultório com os remédios para o tratamento. O médico nos explicou que ele teria que tomar medicação sempre. (F18)

Buscaram informações acerca da necessidade da criança ser assistida em serviços especializados como a APAE.

O preparo para o cuidado dele foi realizado mais por mim. A princípio o médico disse que deveria colocar ele na APAE. Meu marido rejeitou a sugestão. Disse que ele não é louco para estar na APAE. Estou pensando! Acho que irei tentar parte do tratamento dele lá. (F19)

Colocar ele na APAE foi uma decisão difícil. Perguntei para o médico e ele disse que era a melhor forma de socialização que ele teria. Acredito, mas estou ainda pensando e conversando com mães que já tem seus filhos na instituição. Todas me disseram que vale a pena. (F5)

Além disso, procuraram profissionais de saúde especializados, de acordo com as limitações de cada doença crônica, para enfrentar e lidar com as mesmas.

A fisioterapeuta mostra todos os movimentos que ela pode fazer. Com o passar do tempo, ela cresce e fica mais propensa a ter luxação no quadril. A osteogênese imperfeita é uma doença que limita sua locomoção, mas aos pouquinhos ela está aprendendo. (F8)

O médico neurologista disse que se começarmos a deixar ele convulsionar todos dias irá começar a perder parte dos neurônios. Acaba prejudicando o avanço que conquistamos na saúde dele. (F19)

DISCUSSÃO

A família atribui significados ao descobrir o diagnóstico de doença crônica do filho ao interagir com os com os profissionais de enfermagem/saúde. A partir desse processo interativo, a mesma passa a perceber os problemas de saúde da criança, antes mesmo de receber o diagnóstico clínico definitivo. Ao recebê-lo passa pela fase de negação do diagnóstico médico, até conseguir aceitar a situação vivenciada e buscar ajuda dos profissionais de saúde para restaurar o equilíbrio de saúde da criança.

No nível simbólico, a família procura entender e interpretar os problemas de saúde da criança, na qual emite um significado relacionado à percepção de uma criança com problemas de saúde, constatada, a partir da percepção de um bebê que nasce prematuro e que necessita de suporte tecnológico avançado em unidades de terapia intensiva. Estudos realizados na Índia(1616 Bhide P, Gund P, Kar A. Prevalence of congenital anomalies in an indian maternal cohort: healthcare, prevention, and surveillance implications. PLoS One. 2016;11(11):e0166408. doi: 10.1371/journal.pone.0166408
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) e Estados Unidos(1717 Collaco JM, Dadlani GH, Nies MK, Leshko J, Everett AD, McGrath-Morrow SA. Risk factors and clinical outcomes in preterm infants with pulmonary hypertension. PLoS One. 2016;11(10):e0163904. doi: 10.1371/journal.pone.0163904
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) revelam que o caráter simbólico das interações que garantem a significação, para a maioria das famílias, é que a descoberta da doença crônica no filho resultou do nascimento de uma criança pré-termo. Essa prematuridade simboliza um descompasso entre o nascimento de um bebê idealizado como saudável e o bebê real, ou seja, o que nasceu com uma doença crônica que desequilibra o ideal simbolizado para um filho que nasce. Torna-se uma realidade difícil de ser interpretada pelas famílias, principalmente quando as mães, realizam o acompanhamento completo no pré-natal e a realização de exames de ultrassonografia para o monitoramento do crescimento fetal, que fizeram toda uma simbologia de segurança para o nascimento de uma criança sem desequilíbrios clínicos e crônicos.

Com a simbologia do ideal afetado pelo nascimento de uma criança com doença crônica, a família diante do processo comunicativo interacional, abala-se emocionalmente e socializa suas dificuldades em lidar com o desconhecido, o novo e o diferente, ao interagir com a equipe de enfermagem/saúde na UTI Neonatal, onde costuma perceber os problemas de saúde da criança. Estudos realizados no Brasil(1818 Vargas RM, Maldonado DM, Scheeren MC, Brazuna JM, Spigolona MFM, Maldonado MJM et al. Resiliência familiar no contexto da encefalopatia crônica infantil. Ensaios Cienc Cienc Biol Agrar Saúde [Internet]. 2014 [cited 2018 Sept 17]; 18(3):131-5. Available from: http://www.redalyc.org/pdf/260/26042165003.pdf
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) e Estados Unidos(1919 Gupta RS, Singh AM, Walkner M, Caruso D, Bryce PJ, Wang X et al. Hygiene factors associated with childhood food allergy and asthma. Allergy Asthma Proc. 2016;37(6):e140-e146. doi: 10.2500/aap.2016.37.3988
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) mostraram que a criança com doença crônica possui um caráter simbólico representado, principalmente, por características anatômicas e fisiológicas que a predispõe ao desenvolvimento de doenças que, na maioria das vezes, estão relacionadas a distúrbios crônicos do sistema respiratório ou neurológico. Entre as principais evidencias estão: a língua do lactente ser menor em relação a orofaringe e a mandíbula menor; a respiração é, geralmente, nasal até o período de quatro a seis meses de idade; as vias aéreas possuem menor diâmetro e são mais curtas; a epiglote do lactente é mais longa e flácida; a caixa torácica é mais complacente e as vias de ventilação colateral alveolar são menos desenvolvidas.

A família frente à necessidade de obter um consenso da equipe de saúde, estrutura seu processo interativo comunicacional, com o objetivo autodeterminado em receber o diagnóstico médico acerca da doença da criança. Estudos(77 Swallow V, Smith T, Webb NJ, Wirz L, Qizalbash L, Brennan E, et al. Distributed expertise: qualitative study of a British network of multidisciplinary teams supporting parents of children with chronic kidney disease. Child Care Health Dev. 2015;41(1):67-75. doi: 10.1111/cch.12141
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,1111 Blumer H. Symbolic Interactionism: perspective and method. Berkeley: University of California Press; 1969.,1818 Vargas RM, Maldonado DM, Scheeren MC, Brazuna JM, Spigolona MFM, Maldonado MJM et al. Resiliência familiar no contexto da encefalopatia crônica infantil. Ensaios Cienc Cienc Biol Agrar Saúde [Internet]. 2014 [cited 2018 Sept 17]; 18(3):131-5. Available from: http://www.redalyc.org/pdf/260/26042165003.pdf
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,2020 Eccleston C, Fisher E, Law E, Bartlett J, Palermo TM. Psychological interventions for parents of children and adolescents with chronic illness. Cochrane Database Syst Rev. 2015;(4):CD009660. doi: 10.1002/14651858.CD009660.pub3
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-2121 Arber A. How do nurses "think family" and support parents diagnosed with cancer who have dependent children? Asia Pac J Oncol Nurs. 2016;3(3):214-7. doi: 10.4103/2347-5625.189809
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) enfatizam que a família sente receio, mas visa receber o diagnóstico de doença do filho pelo médico ou outros profissionais de saúde, com vínculos no cuidado, a fim de instrumentalizar-se para o seu cuidado e o suprimento das demandas advindas do diagnóstico de condição crônica. Nelas estão incluídos, os cuidados com a alimentação e higiene e tratamento medicamentoso, além da adaptação da família no ambiente em que vive, a partir de um processo interacional com a criança, familiares e equipe de saúde que modifique suas relações em vínculos sociais estáveis.

Como o caráter simbólico das relações sociais não se trata de transferência de regras sociais fixas, ocorre, por outro lado, instabilidades emocionais da família ao receber o diagnóstico clínico do filho. Estudo acerca do recebimento do diagnóstico de câncer na criança revela o impacto emocional da família frente ao saber da doença crônica da criança. Sendo assim, algumas relataram ter chorado, entrado em choque, ficando sem saber o que fazer e resistentes diante da notícia, porém, outras relataram que, devido ao desespero, ficaram paralisadas e sem reação(2222 Miller AR, Rosenbaum P. Perspectives on "disease" and "disability" in child health: the case of childhood neurodisability. Front Public Health. 2016;4:226. doi: 10.3389/fpubh.2016.00226
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).

As famílias ao receberem o diagnóstico de doença crônica da criança, comumente, não o interpretam como uma doença de longa duração ou incurável. Os sentimentos de luta, batalha, sacrifício e culpa podem estar presentes nas exposições das famílias, caracterizando o modo como elas percebem o momento que vivem. Assim, o diagnóstico da condição crônica da criança pode trazer significantes mudanças no comportamento familiar, modificando as relações familiares e sua própria estrutura(2323 Namachivayam SP, Alexander J, Slater A, Millar J, Erickson S Tibballs, J et al. Five-year survival of children with chronic critical illness in Australia and New Zealand. Crit Care Med. 2015;43(9):1978-85. doi: 10.1097/CCM.0000000000001076
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).

No caso do presente estudo, no decorrer do processo de recebimento do diagnóstico de doença crônica do filho, algumas famílias não aceitam ou aceitam, sentindo-se revoltadas. Estudo acerca da criança com doença crônica revelou que a família não aceita e nega a doença crônica do filho por se deparar com uma realidade significada como fora dos padrões de normalidade em saúde(2424 Kieckhefer GM, Trahms CM, Churchill SS, KratzL, Uding N, Villareale N. A randomized clinical trial of the building on family strengths program: an education program for parents of children with chronic health conditions. Matern Child Health J. 2014;18(3):563-74. doi: 10.1007/s10995-013-1273-2
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). Há uma quebra da projeção de sonhos e expectativas de uma criança saudável na família. A possibilidade de mudança no cotidiano familiar e da criança que poderá necessitar de diversas medicações, podendo ser, frequentemente, submetida a hospitalizações para exames e tratamento, manuseio de bolsas de colostomia, administração de insulina, sondas, cateteres de oxigênio, além de enfrentar limitações físicas, psíquicas e sociais, sequer é simbolizada pela família(2525 Sahoo K, Sahoo B, ChoudhuryAK, SofiNY, Kumar R, Bhadoria AS. Childhood obesity: causes and consequences. J Family Med Prim Care. 2015;4(2):187-92. doi: 10.4103/2249-4863.154628
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).

Todavia, a família, na tentativa de sua reorganização e integração, adapta-se ao cuidado da criança doente e passa a aceitar o seu diagnóstico. Gradativamente, a família aceita e aprende conviver com a condição crônica da criança e a resignar-se, dando continuidade à vida, emergindo sentimentos que pareciam adormecidos, como alegria, ânimo e força para viver e cuidar(2626 Geense WW, van Gaal BG, Knoll JL, Cornelissen EAM, Schoonhoven L, Kok G. Online support program for parents of children with a chronic kidney disease using intervention mapping: a development and evaluation protocol. JMIR Res Protoc. 2016;5(1):e1. doi: 10.2196/resprot.4837
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). A vivência dos fatos pelas famílias serve como fonte de significados que serão manipulados, modificados e aceitos, a partir de um processo interpretativo que guie suas ações de cuidado no ambiente em que se encontra, conforme as necessidades da criança(77 Swallow V, Smith T, Webb NJ, Wirz L, Qizalbash L, Brennan E, et al. Distributed expertise: qualitative study of a British network of multidisciplinary teams supporting parents of children with chronic kidney disease. Child Care Health Dev. 2015;41(1):67-75. doi: 10.1111/cch.12141
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).

Para alguns familiares, a busca por informações acerca da doença da criança, torna-se um recurso necessário para conhecer o tipo de doença do filho, habilitando-se para seu cuidado. Estudo italiano acerca das crianças com doença renal crônica enfatiza que a família, ao ter conhecimento sobre a patologia da criança, suas manifestações e implicações, poderá desenvolver um cuidado com qualidade e autonomia, prevenindo recidivas e agravos à saúde da criança. Nesse sentido, ressaltou a importância dos profissionais de saúde e dos serviços de atenção especializados, como reforço à compreensão familiar acerca do estado de saúde da criança, suas limitações, tratamento adotado, cuidados específicos e sua importância no processo de cuidar de forma instrumentalizada(2727 Becherucci F, Roperto RM, Materassi M, Romagnani P. Chronic kidney disease in children. Clin Kidney J. 2016;9(4):583-91. doi: 10.1093/ckj/sfw047
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).

Limitações do estudo

Destaca-se como limitação o foco da discussão ter sido doença crônica da criança no geral, sem considerar a grande diversidade dos agravos e/ou comorbidades associadas. Assim, reduziu-se a singularidade de cada doença apresentada pelas crianças, participantes do estudo, a uma categoria única e geral, “doença crônica”, sem problematizar as peculiaridades de cada uma. Além disso, salienta-se a impossibilidade de generalização dos dados, devido ao estudo ter sido realizado no contexto hospitalar, o que dificultou o aprofundamento da temática no contexto familiar, principalmente, envolvendo questões de gênero, pelo cuidado ter sido realizado por mulheres, predominantemente, centrado na figura materna.

Contribuições para a área da enfermagem

Como subsídios para a prática de enfermagem, considera-se a necessidade de interação entre os profissionais de enfermagem/saúde e a família no acompanhamento do pré-natal, principalmente com risco obstétrico, visando minimizar os riscos ao recém-nascido. Muitas dessas crianças, após o nascimento, ficam internadas na UTI Neonatal, sendo importante o amparo da família para a vivência desse período. O enfermeiro pode exercer importante papel no auxílio da família no manejo do regime terapêutico dessas crianças, na participação efetiva no processo de transição para o domicílio e posterior acompanhamento, com atenção prioritária às crianças com regime terapêutico complexo, em especial o medicamentoso.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo objetivou compreender os significados atribuídos por familiares cuidadores acerca do diagnóstico de doença crônica na criança. Verificou-se que a família, ao interagir com a equipe de enfermagem/saúde, muitas vezes, percebe a existência de uma doença na criança, quando nasce prematura, ou apresenta sequelas no nascimento, necessitando internar na UTI Neonatal. Recebem o diagnóstico de doença crônica da criança pelo médico. Sentem-se despreparadas, angustiadas e culpadas pela doença incurável da criança, não a aceitando. No entanto, a partir da aceitação do diagnóstico, passam a buscar informações acerca da doença e a se organizar para o cuidado à criança.

O diagnóstico da criança deve ser dado à família por profissional habilitado, visando oferecer suporte diante do impacto da notícia ao familiar, contribuindo para sua instrumentalização para o cuidado, transmitindo-lhes informações acerca da doença, além de apoio emocional no preparo do enfrentamento cotidiano. O fornecimento de informações sobre a doença, cuidados e tratamento devem ser efetivados entre enfermeiros e família de modo claro, de acordo com sua compreensão, no ambiente no qual se encontram e interagem.

Concluiu-se que a interação da família com a equipe de enfermagem/saúde contribui para a significação atribuída pelo familiar ao diagnóstico de doença crônica da criança. O planejamento da assistência de enfermagem, tanto à criança quanto à família permite ir além do atendimento das suas necessidades de saúde, ampliando-a em direção à conquista da confiança mútua, pautada na busca efetiva do sucesso terapêutico almejado. Para isso, o enfermeiro precisa estar atento às necessidades da criança e da família, tendo em vista o oferecimento de uma assistência integral e humanizada, visando impactar positivamente o processo de cuidado familiar.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Aparecida Barbosa
EDITOR ASSOCIADO: Fátima Helena Espírito Santo

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Mar 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    21 Set 2018
  • Aceito
    18 Dez 2018
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