Acessibilidade / Reportar erro

Perfil epidemiológico dos casos de tuberculose com coinfecção HIV em Porto Alegre, Brasil

RESUMO

Objetivo:

Descrever e comparar o perfil epidemiológico dos casos de coinfecção por Tuberculose e HIV, pela Gerência Distrital de Porto Alegre, no período de 2009 a 2013.

Método:

Coorte retrospectivo, com dados de sistemas nacionais de informação em saúde. Foram investigadas variáveis sociodemográficas, clínicas e de acompanhamento, por meio de testes de associação.

Resultados:

Foram notificados 2.419 casos de coinfecção Tuberculose e HIV, com média de idade de 38 ±9,91 anos, predominantemente brancos e com até 7 anos de estudo. A comparação entre as Gerências Distritais foi significativa quanto raça/cor (p<0,001), sexo (p<0,001), escolaridade (p<0,004), idade (p<0,003), local de origem (p<0,001), situação de entrada (p<0,001), alcoolismo (p<0,001), indicação e realização de Tratamento Diretamente Observado (p<0,001), situação de encerramento (p<0,001).

Conclusão:

Variáveis socioeconômicas e de realização do tratamento influenciam a ocorrência da coinfecção em diferentes áreas de Porto Alegre, reforçando que a soma de diferentes fatores explica os indicadores da doença.

Descritores:
Tuberculose Pulmonar; Síndrome de Imunodeficiência Adquirida; Coinfecção; Enfermagem; Saúde Pública

ABSTRACT

Objective:

To describe and compare the epidemiological profile of cases of tuberculosis and HIV coinfection of the District Administration Health Units of Porto Alegre, Brazil, from 2009 to 2013.

Method:

Retrospective cohort with data from national health information systems. Sociodemographic, clinical and follow-up variables were investigated through association tests.

Results:

2,419 cases of tuberculosis and HIV coinfection were reported, with a mean age of 38 ± 9.91 years, predominantly white and with up to 7 years of study. The comparison between the District Administration Health Units was significant in terms of race/color (p<0.001), gender (p<0.001), schooling (p<0.004), age (p<0.003), place of origin (p<0.001), (p<0.001), alcoholism (p<0.001), indication and performance of Directly Observed Therapy (p<0.001), closure (p<0.001).

Conclusion:

Socioeconomic and treatment variables influence the occurrence of coinfection in different areas of Porto Alegre, reinforcing that the sum of different factors explains the indicators of the disease.

Descriptors:
Pulmonary Tuberculosis; Acquired Immunodeficiency Syndrome; Coinfection; Nursing; Public Health

RESUMEN

Objetivo:

Describir y comparar el perfil epidemiológico de los casos de coinfección por Tuberculosis y VIH, por la Gerencia Distrital de Porto Alegre, en el período de 2009 a 2013.

Método:

Cohorte, retrospectiva, con datos de sistemas nacionales de información en salud. Se investigaron variables sociodemográficas, clínicas y de seguimiento, por medio de pruebas de asociación.

Resultados:

Se notificaron 2.419 casos de coinfección Tuberculosis y VIH, con una media de edad de 38 ± 9,91 años, predominantemente blancos y con hasta 7 años de estudio. La comparación entre las Gerencias Distritales fue significativa como raza/color (p <0,001), sexo (p <0,001), escolaridad (p <0,004), edad (p <0,003), lugar de origen (p <0,001), situación de origen (p <0,001), alcoholismo (p <0,001), indicación y realización de tratamiento directamente observado (p <0,001), situación de cierre (p <0,001).

Conclusión:

Las variables socioeconómicas y de realización del tratamiento influencian la ocurrencia de la coinfección en diferentes áreas de Porto Alegre, reforzando que la suma de diferentes factores explica los indicadores de la enfermedad.

Descriptores:
Tuberculosisi Pulmonar; Síndrome de Inmunodeficiencia Adquirida; Coinfección; Enfermería; Salud Pública

INTRODUÇÃO

A Saúde Coletiva é um campo que tem se desenvolvido no Brasil desde a década de 70, embora sua trajetória seja anterior a isso. Sua atuação abrange a saúde humana em suas múltiplas dimensões, envolvendo desde discussões epidemiológicas e práticas de cuidado até educação e gestão em saúde. A Saúde Coletiva contribui para a formação de profissionais habilitados a trabalhar no Sistema Único de Saúde (SUS) e que promovam, na sua prática cotidiana, os princípios e diretrizes da universalidade, integralidade, equidade e participação social(11 Souza KMJ, Seixas CT, David HMSL, Costa AQ. Contributions of Public Health to nursing practice. Rev Bras Enferm. 2017;70(3):543-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0401
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016...
).

Nesse sentido, a Saúde Coletiva, enquanto campo de saber, auxilia os profissionais a conhecerem os elementos que compõem os ambientes biológicos, físicos e sociais implicados no processo saúde-doença, bem como as características dos usuários e dos locais onde moram, influenciando na sua atuação de modo comprometido com os princípios do SUS. O que se buscou nessa pesquisa, vindo ao encontro do que preconiza a Saúde Coletiva, foi discutir aspectos relacionados ao perfil de adoecimento das pessoas coinfectadas por tuberculose e Human Immunodeficiency Virus (Tuberculose e HIV), considerando os territórios onde vivem.

A coinfecção Tuberculose e HIV se apresenta como um dos mais complexos quadros de adoecimento a ser enfrentado no campo da Saúde Pública. A dupla carga de doenças (Tuberculose (TB) e HIV) dificulta a adesão aos tratamentos, o que é evidenciado pelas altas taxas de abandono, contribuindo para a multirresistência aos medicamentos(22 World Health Organization (WHO). Bending the curve - ending TB: Annual report 2017[Internet]. New Delhi: WHO; 2017 [cited 2017 Jul 25]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/254762/1/978929022584-eng.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
). Estudos têm mostrado que a epidemia de HIV/aids tem contribuído para o crescimento da taxa de incidência da TB(33 Gao J, Zheng P, Fu H. Prevalence of TB/HIV co-infection in countries except China: a systematic review and meta-analysis. PLoS One. 2013;31;8(5):e64915. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0064915
https://doi.org/10.1371/journal.pone.006...
). E, pessoas vivendo com HIV/aids têm um risco anual de 3 a 15% de reativar a infecção latente pela tuberculose, em comparação com a população em geral, cujo risco é de 0,1%. Em 2015, a tuberculose foi uma das principais causas de morte de pessoas que viviam com HIV no mundo, atingindo aproximadamente 1,4 milhão de mortes, sendo 400.000 mortes resultantes da tuberculose entre pessoas vivendo com HIV(22 World Health Organization (WHO). Bending the curve - ending TB: Annual report 2017[Internet]. New Delhi: WHO; 2017 [cited 2017 Jul 25]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/254762/1/978929022584-eng.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
).

No Brasil, a região Sul é a que apresenta o maior percentual de coinfecção do país (18,2%), quase duas vezes superior à média nacional. No Brasil, a recomendação é de que a proporção de cura de casos novos de tuberculose, aliada ao abandono de tratamento baixo e boa detecção de casos, são fatores que possibilitam redução da incidência da tuberculose(44 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Detectar, tratar e curar: desafios e estratégias brasileiras frente à tuberculose. Bol Epidemiol HIV/aids. [Internet]. 2015 [cited 2017 Oct 16]; 46(9):1-48.Available from: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2015/marco/25/Boletim-tuberculose-2015.pdf
http://portalarquivos.saude.gov.br/image...
). Nesse sentido, o Ministério da Saúde preconiza a testagem e diagnóstico de todas as pessoas com tuberculose para o HIV, sendo que se destacam os estados do Paraná (82,0%), Santa Cantarina (80,5%) e as capitais Curitiba-PR (85,7%) e Porto Alegre-RS (82,6%), com os maiores percentuais de realização de testagem para HIV entre as pessoas com tuberculose. A proporção de cura ideal (85% dos casos) de tuberculose na região sul não foi atingida em nenhum dos estados, apenas o estado do Paraná (79,2%) obteve um resultado aproximado. E observa-se que a proporção de abandono de tratamento dos casos de tuberculose se encontra acima de 5,0% em diversos estados, principalmente no Rio Grande do Sul (15,1%)(44 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Detectar, tratar e curar: desafios e estratégias brasileiras frente à tuberculose. Bol Epidemiol HIV/aids. [Internet]. 2015 [cited 2017 Oct 16]; 46(9):1-48.Available from: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2015/marco/25/Boletim-tuberculose-2015.pdf
http://portalarquivos.saude.gov.br/image...
). Esses dados sugerem que a região sul tem potencialidade para diagnóstico da coinfecção, mas dificuldades para manter a adesão e a cura da tuberculose.

Porto Alegre é a segunda capital brasileira com maior incidência de TB, a primeira em incidência de HIV/aids e a que possui a maior proporção de coinfecção do país, com 25% dos casos diagnosticados com TB em pessoas vivendo com HIV(44 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Detectar, tratar e curar: desafios e estratégias brasileiras frente à tuberculose. Bol Epidemiol HIV/aids. [Internet]. 2015 [cited 2017 Oct 16]; 46(9):1-48.Available from: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2015/marco/25/Boletim-tuberculose-2015.pdf
http://portalarquivos.saude.gov.br/image...
). Esses dados epidemiológicos demonstram a importância da cidade como um cenário emblemático para o combate à coinfecção Tuberculose e HIV, no contexto nacional.

OBJETIVO

Descrever e comparar o perfil epidemiológico dos casos de coinfecção por Tuberculose e HIV, por Gerência Distrital de Porto Alegre, no período de 2009 a 2013.

MÉTODO

Aspectos éticos

O presente estudo seguiu as diretrizes da Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde(55 Ministério da Saúde (BR). Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº. 466, de 12 de dezembro de 2012. Aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília: [Internet]. 2012 [cited 2017 Jun 25]. Available from: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf
http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/...
). O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pelo Comitê de Ética da Prefeitura Municipal de Porto Alegre.

Desenho, local do estudo e período

Trata-se de um estudo de coorte retrospectivo com abordagem quantitativa, constituído pela análise do perfil epidemiológico dos casos de tuberculose com coinfecção Tuberculose e HIV, residentes no município de Porto Alegre, notificados pelo Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), no período de 2009 até 2013. Em relação à gestão da Saúde Pública, a cidade é dividida em Gerências Distritais (GD), que são as seguintes: Centro (CEN), Norte/Eixo Baltazar (NEB), Leste/Nordeste (LENO), Glória/Cruzeiro/Cristal (GCC), Sul/Centro Sul (SCS), Partenon/Lomba do Pinheiro (PLP), Restinga/Extremo Sul (RES), Noroeste/Humaitá/Navegantes/Ilhas (NHNI)(66 Prefeitura Municipal de Porto Alegre (BR). Plano Municipal de Saúde 2014 a 2017: Prefeitura Municipal de Porto Alegre[Internet]. 2013 [cited 2017 Jun 25]. Available from: http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/sms/usu_doc/pms_2014_2017.pdf
http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/pref...
).

População do estudo

Estudo de base populacional, que analisou todos os casos de coinfecção por tuberculose pulmonar e HIV em residentes no município de Porto Alegre, notificados pelo Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN). No período de cinco anos foram identificados 2.419 casos de coinfecção.

Protocolo do estudo

Como fonte de informação, utilizaram-se os casos que possuíam o agravo aids confirmado ou o resultado do exame diagnóstico para HIV positivo. Considerou-se como coinfecção Tuberculose e HIV todos os casos notificados por tuberculose pulmonar no SINAN-TB que possuíam o agravo aids confirmado ou o exame diagnóstico para HIV. Posteriormente, todos os casos com tuberculose, que na notificação apresentavam exame anti-HIV com resultado negativo ou em andamento, foram buscados na base de dados do SINAN aids para confirmar ou não a coinfecção. Foi realizada a linkage entre as bases de dados SINAN tuberculose, SINAN aids a partir do nome completo do indivíduo e, para melhorar a qualidade e a confiabilidade, posteriormente foram conferidas também as variáveis: (a) data de nascimento; e (b) nome da mãe. Os dados foram oriundos da base de dados do Serviço de Vigilância Epidemiológica de Porto Alegre. Para a conferência do banco de dados, duas pesquisadoras fizeram a checagem e a conferência das informações, solicitando, quando necessário, a conferência dos dados por uma terceira pesquisadora.

De 2009 a 2013 foram encontrados na base de dados do SINAN 8.813 casos de TB. Destes, 2.286 casos possuíam diagnóstico de aids no momento da notificação da TB (dados extraídos do campo 39 da ficha de notificação) e, portanto, foram considerados coinfectados. Haviam 6.527 casos de TB que não possuíam diagnóstico de aids pela ficha de notificação da TB e estavam com exame anti-HIV negativo em andamento ou não realizado. Estes foram procurados individualmente na base de dados do SINAN aids. Foram encontrados 133 indivíduos que possuíam notificação de aids nesta base de dados, mas que este registro não constava no SINAN TB. Após a conferência na base de dados SINAN TB e base de dados SINAN aids referente ao agravo aids, somaram-se 2.286 oriundos da base SINAN TB e os 133 casos com aids oriundos da base de dados SINAN aids, totalizando 2.419 casos de coinfecção.

Foram investigadas variáveis sociodemográficas e variáveis epidemiológicas e clínicas. As variáveis sociodemográficas incluídas, foram: origem (Gerência Distrital), idade, sexo, raça/cor e escolaridade. Tipo de entrada no SINAN, indicação de Tratamento Diretamente Observado (TDO), realização de TDO e situação de encerramento do caso foram as variáveis epidemiológicas e clínicas analisadas. O tipo de entrada foi classificado em caso novo (nunca tratou a doença), recidiva (já foi curada e foi infectado novamente por tuberculose ou pode ser a persistência de bacilos da tuberculose em pacientes curados), reingresso após abandono (abandonou o tratamento para TB e reiniciou) ou transferência (quando o indivíduo estava sendo tratado em outro serviço de saúde e foi transferido). A variável de tipo de encerramento refere-se ao ocorrido após o acompanhamento do tratamento para TB, classificada em: cura, abandono, transferência, óbito ou TB Multidroga Resistente (TB MDR).

Análise dos resultados e estatística

A análise foi realizada com o uso do softwareStatistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 18.0, e pelo software R, versão 3.2.0. A variável idade foi avaliada quanto à sua distribuição por meio de histograma e do teste de Kolmogorov-Smirnov. Esta variável apresentou distribuição normal e, portanto, foi expressa por média ± Desvio Padrão. Para as comparações entre os grupos, utilizou-se o teste do Qui-quadrado de Person ou o teste exato de Fisher, e o teste T-student para amostras independentes.

RESULTADOS

De 2009 a 2013 foram identificados 2.419 casos de pessoas coinfectadas por Tuberculose e HIV em Porto alegre, considerando as reentradas no banco de dados da tuberculose. A Tabela 1 traz as características sociodemográficas dos casos de coinfecção Tuberculose e HIV. A PLP foi a GD com o maior número de casos de coinfecção, com 557 casos (23%). Os homens representaram a maioria dos casos, totalizando 1.588 (65,6%). A média de idade no momento da notificação foi de 38±9,91 anos. Considerando o quesito raça/cor, os brancos somaram 1.357 casos (56,15%) e não brancos somaram 1.054 casos (43,6%). Quanto à escolaridade observou-se que 1.548 casos estudaram até 7 anos (64%), 629 casos estudaram de 8 a 11 anos (26%) e 59 casos estudaram mais do que 12 anos (2,4%).

Tabela 1
Características sociodemográficas dos casos de coinfecção Tuberculose e HIV, no período de 2009 a 2013, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

A Tabela 2 descreve as características epidemiológicas e clínicas dos casos de coinfecção Tuberculose e HIV. Quanto ao tipo de entrada do caso no sistema de vigilância de saúde, os casos novos totalizaram 1.389 (57,4%), seguido das recidivas com 351 casos (14,5%), dos reingressos após abandono com 622 casos (25,7%) e das transferências com 57 casos (2,4%). No encerramento dos casos na vigilância, o desfecho de cura foi verificado em 858 casos (35,5%), o abandono ao tratamento ocorreu em 861 casos (35,6%), os óbitos somaram 536 casos (22,1%), as transferências ocorreram em 88 casos (3,6%) e a TB MDR somou 63 casos (2,6%). O alcoolismo esteve presente em 622 casos (25,7%), seguido de outras doenças mentais em 99 casos (4,1%) e diabetes em 67 casos (2,8%). O Tratamento Diretamente Observado foi indicado para 627 casos (25,9%), mas foi executado em 406 (16,8%).

Tabela 2
Características epidemiológicas e clínicas dos casos de coinfecção Tuberculose e HIV, no período de 2009 a 2013, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

A Tabela 3 apresenta as características sociodemográficas dos casos de coinfecção Tuberculose e HIV nas oito GD de Porto Alegre. Quanto ao quesito raça/cor, verificou-se diferença estatisticamente significativa na comparação das proporções por gerências. Observou-se predomínio da raça branca em seis GD, sendo que este percentual variou de 51,3% até 66,7%. A exceção foi observada nas GD RES e PLP, em que os brancos representaram 46,5% e 49,8%, respectivamente (p<0,001). Em relação ao sexo, os homens somaram a maioria dos casos em todas as GD, com proporção que variou de 60% até 72,8% (p<0,001). Em todas as GD, a maioria dos casos possuía escolaridade de até 7 anos. Maiores discrepâncias foram observadas quanto à proporção de casos com até 7 anos de escolaridade que atingiu 73,9% dos casos na GD GCC; casos com 8 a 11 anos de estudo que somou 35% dos casos na GD NEB e indivíduos com mais de 12 anos de estudo que somou 5,9% dos casos na GD CEN (p=0,004). Diferenças entre médias de idade no momento da notificação de TB foram observadas (p=0,003), a variação foi de 37,29±9,32 anos na GD NHNI até média de 39,69±10,87 anos na GD SCS.

Tabela 3
Características sociodemográficas dos casos de coinfecção por Tuberculose e HIV por Gerências Distritais, no período de 2009 a 2013, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

Na Tabela 4, são apresentadas as características epidemiológicas clínicas dos casos de coinfecção nas oito GD de Porto Alegre. Quanto à situação de entrada do caso, diferenças de proporções foram evidenciadas (p<0,001). Casos novos representaram 52,4% dos casos na GD LENO, enquanto que na gerência SCS representaram 67,1%. Recidiva representou 10,1% dos casos na GD GCC, atingindo 19,7% dos casos na GD PLP. Reingresso representou 15,7% dos casos na GD NHNI, chegando a 34,2% na GD LENO. O percentual de transferências variou de 0,6% dos casos na GD RES, chegando a 3,8% dos casos nas GD NHNI e na GD PLP.

Tabela 4
Características epidemiológicas clínicas dos casos de coinfecção por Tuberculose e HIV, por Gerências Distritais, no período de 2009 a 2013, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

Quanto aos agravos associados, a ocorrência de alcoolismo variou de 15,8% dos casos na GD RES até 33,3% dos casos na GD CEN (p<0,001). A ocorrência de diabetes e doença mental não apresentou diferença estatisticamente significativa entre as GD (p=0,368 e p=0,325, respectivamente). Em relação à situação de encerramento na vigilância, diferenças significativas foram observadas (p<0,001). Cura somou 25,3% dos casos na GD LENO e chegou a 47,5% dos casos na GD NHNI. Abandono ao tratamento totalizou 20,9% dos casos na GD NHNI e 45,7% dos casos na GD LENO. O óbito ocorreu em 18,8% dos casos na GD PLP e 27,7% dos casos na GD NHNI. Enquanto que na gerência RES não ocorreu nenhum caso de transferência, na GD PLP as transferências somaram 7,4% dos casos. A TB MDR ocorreu em 1,2% dos casos na GD RES e até 5,6% na GD GCC.

A indicação de TDO apresentou diferença significativa entre as GD (p<0,001). A variabilidade foi de 16,5% dos casos na gerência NHNI, até 33% dos casos na GD CEN. A realização de TDO apresentou percentuais menores do que a indicação em todas as GD. A proporção de realização também apresentou diferença estatística entre as GD (p<0,001). Menor percentual foi observado na GD SCS com 9,5% dos casos e maior percentual foi observado na GD CEN com 20,6%.

DISCUSSÃO

A análise de indicadores estratificados permite a identificação das singularidades de cada território. Nesse sentido, foram feitas análises considerando questões de raça/cor, idade, escolaridade, gênero, local de moradia, alcoolismo e tratamento. Este estudo demonstra que quanto ao perfil epidemiológico das pessoas com coinfecção, destaca-se o sexo masculino, predomínio de raça branca, baixa escolaridade, média de idade de 38±9,91 anos, cuja situação de entrada no SINAN ocorre como caso novo, corroborando com dados de outros estudos(77 Peruhype RC, Acosta LMW, Ruffino-Netto A, Oliveira MMC, Palha PF. Distribuição da tuberculose em Porto Alegre: análise da magnitude e coinfecção tuberculose-HIV. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(6):1035-43. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000700011
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342014...
-88 Zohar M, Moche L, Daniel C, Noa C, Itamar G. HIV prevalence in the Israeli tuberculosis cohort, 1999-2011. BMC InfectDis. 2014;14(1090):1-5. doi: http://dx.doi.org/10.1186/1471-2458-14-1090
http://dx.doi.org/10.1186/1471-2458-14-1...
).

A maioria das pessoas que desenvolveram a coinfecção foram homens, o que gera questionamentos sobre como o sexo e os atravessamentos de gênero podem contribuir para que homens e mulheres adoeçam de modo diferente em cada território. Diferenças quanto ao gênero foram encontradas em outras pesquisas(99 Arenas NE, Ramírez N, González G, Rubertone S, García AM, et al. Estado de la coinfección tuberculosis/virus de la inmuno deficiencia humana en el municipio de Armenia (Colombia): experiência de 10 años. Infectio [Internet]. 2012[cited 2017 Oct 16];16(3):140-47.Available from: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0123939212700036
http://www.sciencedirect.com/science/art...
-1010 Agbor AA, Bigna JJR, Billong SC, Tejiokem MC, Ekali GL, et al. Factors associated with death during tuberculosis treatment of patients co-infected with HIV atthe Yaoundé Central Hospital, Cameroon: an 8-Year hospital-based retrospective cohort study (2006-2013). PLoSOne. 2014;9(12): 1-22. doi: http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0115211
http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0...
). Características socioculturais podem influenciar no modo como homens e mulheres cuidam de sua saúde, aderem e abandoam a tratamentos, assim como optam por determinados comportamentos e riscos em diferentes contextos(1111 Meyer DE, Klein C, Dal'Igna MC, Alvarenga F. Vulnerabilidade, gênero e políticas sociais: a feminização da inclusão social. Estud Femin [Internet]. 2014 [cited 2017 Oct 16];22(3):320-28.Available from: https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/36751
https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref...
).

A média de idade, no momento da notificação em Porto Alegre, foi de 38±9,91 anos. Este dado é semelhante a outros estudos(1010 Agbor AA, Bigna JJR, Billong SC, Tejiokem MC, Ekali GL, et al. Factors associated with death during tuberculosis treatment of patients co-infected with HIV atthe Yaoundé Central Hospital, Cameroon: an 8-Year hospital-based retrospective cohort study (2006-2013). PLoSOne. 2014;9(12): 1-22. doi: http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0115211
http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0...
,1212 Jacobson KB, Moll AP, Friedland GH, Shenoi SV. Success ful tuberculosis treatment outcomes among HIV/TB coinfected patients down-referred from a district hospital to primary health clinics in rural South Africa. PLoSOne. 2015;10(5):1-11doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0127024
https://doi.org/10.1371/journal.pone.012...
), indicando que a população mais acometida é justamente a de uma faixa etária correspondente à população economicamente ativa, e que, portanto, o adoecimento repercute em impactos importantes para a sociedade.

Neste estudo, a informação sobre renda não estava disponível e, portanto, a escolaridade foi utilizada como Proxy de condição socioeconômica. Na amostra estudada, 67,8% possuía até 7 anos de escolaridade. Embora alguns estudos apontem a renda como um indicador social importante no estabelecimento das condições de vida do indivíduo(1313 Pinheiro RS, OliveiraI GP, Oliveira EXG, Melo ECP, Coeli CM, et al. Determinantes sociais e autor relato de tuberculose nas regiões metropolitanas conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, Brasil. Rev Panam Salud Pública [Internet]. 2013 [cited 2017 Oct 16];34(6):446-51. Available from: https://scielosp.org/pdf/rpsp/2013.v34n6/446-451/pt
https://scielosp.org/pdf/rpsp/2013.v34n6...
), poucos estudos utilizam informações sobre a renda dos indivíduos, já que esse dado inexiste nos sistemas nacionais de informação sobre saúde e sua coleta é difícil(1414 Jappar SB, Low SY. Tuberculosis trends over a five-year periodat a tertiary care university-affiliated hospital in Singapore. Singapore Med J. 2015;59(9):502-05. doi: http://dx.doi.org/10.11622/smedj.2015134
http://dx.doi.org/10.11622/smedj.2015134...
). Os indivíduos com menor escolaridade, característica que frequentemente está associada a diversas outras condições sociais desfavoráveis (moradias inadequadas, alimentação insuficiente, dificuldade de acesso a transporte público, distância dos serviços de saúde) pode postergar a procura dos serviços de saúde e, consequentemente, o acesso ao diagnóstico e ao tratamento(1414 Jappar SB, Low SY. Tuberculosis trends over a five-year periodat a tertiary care university-affiliated hospital in Singapore. Singapore Med J. 2015;59(9):502-05. doi: http://dx.doi.org/10.11622/smedj.2015134
http://dx.doi.org/10.11622/smedj.2015134...
).

A distribuição de casos considerando a variável raça/cor evidenciou que a coinfecção atinge de modos diferentes brancos e não brancos, evidenciando iniquidades sociais em saúde(1515 Pereira JC, Silva MR, Costa RR, Guimarães MDC, Leite ICG. Perfil e seguimento dos pacientes com tuberculose em município prioritário no Brasil. Rev. Saúde Públ. 2015;49(6):1-12. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005304
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.201...
). Observou-se que a coinfecção atinge mais não brancos duas Gerências Distritais, PLP e RES, o que precisa ser melhor avaliado em termos de políticas públicas. Estudos têm apontado diferenças nas taxas de TB e de coinfecção considerando a raça/cor, sendo observado que, especialmente, os negros são mais atingidos(1515 Pereira JC, Silva MR, Costa RR, Guimarães MDC, Leite ICG. Perfil e seguimento dos pacientes com tuberculose em município prioritário no Brasil. Rev. Saúde Públ. 2015;49(6):1-12. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005304
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.201...
-1616 Santos Neto M, Silva FL, Sousa KR, Yamamura M, Popolin MP, et al. Clinical and epidemiologic al profile and prevalence of tuberculosis/HIV co-infection in a regional health district in the state of Maranhão, Brazil. J Bras Pneumol. 2012;38(6):724-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132012000600007
http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132012...
).

Em relação à ocorrência de outros agravos nos casos de coinfecção, o alcoolismo foi um marcador significativo para o seu desenvolvimento, similarmente a outros estudos nacionais e internacionais que já mostraram essa associação(1515 Pereira JC, Silva MR, Costa RR, Guimarães MDC, Leite ICG. Perfil e seguimento dos pacientes com tuberculose em município prioritário no Brasil. Rev. Saúde Públ. 2015;49(6):1-12. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005304
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.201...
,1717 Méda ZC, Sombié I, Sanon OW, Maré D, Morisky DE, et al. Risk factors oftu berculosis infection among HIV/AIDS patients in Burkina Faso. AIDS Res Hum Retro Virus Es. 2013;29(7):1045-55 doi: http://dx.doi.org/10.1089/AID.2012.0239
http://dx.doi.org/10.1089/AID.2012.0239...
). No presente estudo, comparando-se as GDs, destaca-se a GD Centro, com 33,3% dos casos de coinfecção com alcoolismo (p<0,001). Acredita-se que esta diferença ocorra especialmente relacionada às condições sociais, pois há uma elevada prevalência de indivíduos em situação de rua nessa GD. Em geral, estudos apontam que muitos indivíduos, que adoecem pela coinfecção, apresentam uso de álcool e outras drogas, sobretudo o crack e a maconha, gerando inclusive agravos relacionados à saúde mental(1717 Méda ZC, Sombié I, Sanon OW, Maré D, Morisky DE, et al. Risk factors oftu berculosis infection among HIV/AIDS patients in Burkina Faso. AIDS Res Hum Retro Virus Es. 2013;29(7):1045-55 doi: http://dx.doi.org/10.1089/AID.2012.0239
http://dx.doi.org/10.1089/AID.2012.0239...
-1818 Prado NT, Miranda AE, Souza FM, Dias ES, Sousa LKF, Arakaki-Sanchez D, et al. Factors associated with tuberculosis by HIV status in the Brazilian national surveillance system: a cross sectional study. BMC Infect Dis. 2014;14(415):1-8. doi: http://dx.doi.org/10.1186/1471-2334-14-415
http://dx.doi.org/10.1186/1471-2334-14-4...
).

Quanto à situação de entrada de casos de coinfecção no sistema da vigilância, estudos nacionais e internacionais mostram que o percentual de casos novos é superior a 80%(1010 Agbor AA, Bigna JJR, Billong SC, Tejiokem MC, Ekali GL, et al. Factors associated with death during tuberculosis treatment of patients co-infected with HIV atthe Yaoundé Central Hospital, Cameroon: an 8-Year hospital-based retrospective cohort study (2006-2013). PLoSOne. 2014;9(12): 1-22. doi: http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0115211
http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0...
,1212 Jacobson KB, Moll AP, Friedland GH, Shenoi SV. Success ful tuberculosis treatment outcomes among HIV/TB coinfected patients down-referred from a district hospital to primary health clinics in rural South Africa. PLoSOne. 2015;10(5):1-11doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0127024
https://doi.org/10.1371/journal.pone.012...
,1919 Hino P, Takahashi RF, Bertolozzi MR, Egry EY. Coinfecção de TB/HIV em um distrito administrativo do Município de São Paulo. Acta Paul Enferm. 2012;25(5):755-61 doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002012000500017
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002012...
). Os resultados encontrados no presente estudo demonstram que mais de 40% das entradas, em Porto Alegre, foram de casos de reingresso após abandono e recidiva. Seria necessária uma análise aprofundada dos motivos da não adesão ao tratamento da coinfecção, mensurando as variáveis assistenciais e sociais que envolvem o adoecimento pela coinfecção.

A dificuldade de tratamento é, também, expressa na situação de encerramento dos casos na vigilância epidemiológica, pois a taxa de cura foi muito baixa (35,5%), com altas taxas de abandono (35,6%), óbitos (22,2%) e TB MDR (2,6%). Os estudos demonstram taxas de abandono que variam de 7 a 14% e taxas de cura que variam de 40 a 80%(1010 Agbor AA, Bigna JJR, Billong SC, Tejiokem MC, Ekali GL, et al. Factors associated with death during tuberculosis treatment of patients co-infected with HIV atthe Yaoundé Central Hospital, Cameroon: an 8-Year hospital-based retrospective cohort study (2006-2013). PLoSOne. 2014;9(12): 1-22. doi: http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0115211
http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0...
-1111 Meyer DE, Klein C, Dal'Igna MC, Alvarenga F. Vulnerabilidade, gênero e políticas sociais: a feminização da inclusão social. Estud Femin [Internet]. 2014 [cited 2017 Oct 16];22(3):320-28.Available from: https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/36751
https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref...
,1919 Hino P, Takahashi RF, Bertolozzi MR, Egry EY. Coinfecção de TB/HIV em um distrito administrativo do Município de São Paulo. Acta Paul Enferm. 2012;25(5):755-61 doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002012000500017
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002012...
). Uma hipótese explicativa para este resultado é a de que, diferentemente de outros cenários, existe, em Porto Alegre, um expressivo número de casos na entrada da vigilância que corresponde a casos de abandono e, portanto, como já discutido anteriormente, de indivíduos com maior comprometimento do sistema imunológico e, portanto, com maior chance de desenvolver a multirresistência e ocorrência de óbito.

Outra explicação é que em Porto Alegre, cerca de 48% dos diagnósticos de casos de tuberculose ocorreram em unidades hospitalares, ou seja, quando há agravamento de sintomas(66 Prefeitura Municipal de Porto Alegre (BR). Plano Municipal de Saúde 2014 a 2017: Prefeitura Municipal de Porto Alegre[Internet]. 2013 [cited 2017 Jun 25]. Available from: http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/sms/usu_doc/pms_2014_2017.pdf
http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/pref...
). Além disso, os serviços de atenção básica e de referência de Porto Alegre tem encontrado dificuldades para acompanhar os casos de TB e de HIV/aids, dificultando a indicação e execução do TDO(2020 Hahn GV. Incluindo o Projeto Terapêutico Singular na agenda da Atenção Básica em contexto de vulnerabilidade e não adesão ao tratamento da tuberculose [Tese]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2015 [cited 2017 Oct 16]. Available from: http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/129921
http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/12...
).

A maior proporção de casos de coinfecção encontra-se na GD PLP. Essa é uma região com Índice de Condição de Vida (ICV) muito baixo e com Índice de Vulnerabilidade Social (IVS). Na região é comum a baixa escolaridade, a alta taxa de violência e de mortalidade por causas externas, a baixa longevidade, elevado número de famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza; bem como alta aglomeração populacional em vilas de grande porte, muitas vezes construídas em áreas irregulares(66 Prefeitura Municipal de Porto Alegre (BR). Plano Municipal de Saúde 2014 a 2017: Prefeitura Municipal de Porto Alegre[Internet]. 2013 [cited 2017 Jun 25]. Available from: http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/sms/usu_doc/pms_2014_2017.pdf
http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/pref...
).

O TDO foi indicado e realizado com mais frequência na GD PLP e GD CEN. Essa tem sido uma estratégia indicada pela Organização Mundial da Saúde e pelo Ministério da Saúde como uma possibilidade de garantir maior vínculo entre profissionais de saúde e usuários com coinfecção, como também maior adesão ao tratamento medicamentoso para TB. Estudos evidenciam que o TDO é eficaz para casos de TB e para casos de coinfecção Tuberculose e HIV, pois ao comparar-se casos com e sem realização de TDO, os percentuais de cura foram maiores e a mortalidade foi menor no grupo que realizou TDO(2121 Steffen R, Menzies D, Oxlade O, Pinto M, Castro AZ, et al. Patients' Costs and Cost-Effectiveness of Tuberculosis Treatment in DOTS and Non-DOTS Facilities in Rio de Janeiro, Brazil. PLoS One. 2010;5(11): e14014. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0014014
https://doi.org/10.1371/journal.pone.001...

22 Vieira AA, Leite DT, Adreoni S. Tuberculosis recurrence in a priority city in the State of São Paulo, Brazil. J Bras Pneumol. 2017;43(2):106-12.doi: http://dx.doi.org/10.1590/s1806-37562016000000002
http://dx.doi.org/10.1590/s1806-37562016...
-2323 Brand EM. Fatores associados ao tratamento diretamente observado em casos de Coinfecção Tuberculose/Hiv em Porto Alegre [Dissertação]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2017.).

Limitações do estudo

Este estudo apresenta algumas limitações inerentes ao método, referentes ao delineamento retrospectivo, que não possui controle de qualidade direta realizada pelo pesquisador. Cabe ressaltar que os dados foram extraídos de um sistema de vigilância utilizado nacionalmente. Apesar da padronização das fichas de notificação e dos manuais de orientação para o preenchimento correto dos instrumentos, foram encontradas pequenas inconsistências entre os bancos de dados que, possivelmente, ocorrem pela falta de precisão dos profissionais que preenchem as fichas de notificação que os alimentam.

Contribuições para as áreas da Saúde, da Enfermagem e de Políticas Públicas

O reconhecimento do perfil epidemiológico dos casos de coinfecção auxilia no entendimento da complexidade do problema e da necessidade de se estabelecer novas estratégias para o seu enfrentamento. Devido aos elevados índices de coinfecção em Porto Alegre, é relevante investigar possíveis territórios de intervenção que resultem na redução das desigualdades sociais e, consequentemente, na melhora dos indicadores epidemiológicos da coinfecção Tuberculose e HIV.

Destaca-se a importância do enfermeiro e dos demais profissionais da saúde em conhecerem o perfil dos casos de coinfecção nesses territórios com maior frequência e, a partir disso, propor, planejar e implementar medidas de controle/prevenção, garantindo uma adequada Atenção à Saúde às pessoas com coinfecção Tuberculose e HIV. O enfermeiro é profissional atuante em todos os cenários e serviços de saúde que realizam o cuidado ao sujeito com coinfecção, participa de forma ativa do diagnóstico, do acompanhamento e da vigilância dos casos de Tuberculose e HIV, sendo um dos responsáveis pela indicação de TDO e a administração do tratamento ao usuário. Não foi possível mensurar neste estudo a atuação de diferentes categorias profissionais na indicação e execução do TDO, sendo uma lacuna a ser explorada em próximos estudos.

Os achados do presente estudo contribuem para a prática dos profissionais de saúde, pois possibilitam uma reflexão sobre alguns marcadores, como gênero, raça/cor, escolaridade, local de moradia, uso de álcool e seus efeitos na produção de desigualdades, discriminação, exploração e opressão permitindo desvelar o cenário em que a coinfecção pela Tuberculose e HIV ocorre. Esse conhecimento pode contribuir com a resposta que a coinfecção demanda, especialmente, ao reconhecer que as propostas em saúde precisam buscar diminuir vulnerabilidades sem negligenciar o enfrentamento às desigualdades sociais.

CONCLUSÃO

Neste estudo foi possível descrever e comparar o perfil epidemiológico dos casos de coinfecção por Tuberculose e HIV, mostrando que variáveis, como a baixa escolaridade, a raça/cor, o sexo, a Gerência Distrital de origem do caso, o tipo de entrada e de encerramento do caso no SINAN, a ocorrência de alcoolismo, e a indicação e realização de TDO, são variáveis socioeconômicas e clínicas frequentes nos casos estudados e nas diferentes áreas de Porto Alegre.

São necessários outros estudos que identifiquem quais são as características desses territórios com maior proporção de casos e dos serviços que fazem o atendimento das pessoas com coinfecção, estudando-se os motivos pelos quais esses cenários apresentam os piores indicadores. Há ainda a necessidade de identificar as dificuldades de estruturação de uma rede de serviços que garanta acesso ao cuidado e resolutividade no atendimento aos casos de coinfecção, possibilitando uma análise mais aprofundada de porque o TDO é pouco indicado e executado. Há uma forte determinação das condições sociais no adoecimento, indicando que intervenções em saúde não devem se limitar à oferta de medicamentos, mas trabalhar de modo intersetorial.

REFERENCES

  • 1
    Souza KMJ, Seixas CT, David HMSL, Costa AQ. Contributions of Public Health to nursing practice. Rev Bras Enferm. 2017;70(3):543-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0401
    » http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0401
  • 2
    World Health Organization (WHO). Bending the curve - ending TB: Annual report 2017[Internet]. New Delhi: WHO; 2017 [cited 2017 Jul 25]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/254762/1/978929022584-eng.pdf
    » http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/254762/1/978929022584-eng.pdf
  • 3
    Gao J, Zheng P, Fu H. Prevalence of TB/HIV co-infection in countries except China: a systematic review and meta-analysis. PLoS One. 2013;31;8(5):e64915. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0064915
    » https://doi.org/10.1371/journal.pone.0064915
  • 4
    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Detectar, tratar e curar: desafios e estratégias brasileiras frente à tuberculose. Bol Epidemiol HIV/aids. [Internet]. 2015 [cited 2017 Oct 16]; 46(9):1-48.Available from: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2015/marco/25/Boletim-tuberculose-2015.pdf
    » http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2015/marco/25/Boletim-tuberculose-2015.pdf
  • 5
    Ministério da Saúde (BR). Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº. 466, de 12 de dezembro de 2012. Aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília: [Internet]. 2012 [cited 2017 Jun 25]. Available from: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf
    » http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf
  • 6
    Prefeitura Municipal de Porto Alegre (BR). Plano Municipal de Saúde 2014 a 2017: Prefeitura Municipal de Porto Alegre[Internet]. 2013 [cited 2017 Jun 25]. Available from: http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/sms/usu_doc/pms_2014_2017.pdf
    » http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/sms/usu_doc/pms_2014_2017.pdf
  • 7
    Peruhype RC, Acosta LMW, Ruffino-Netto A, Oliveira MMC, Palha PF. Distribuição da tuberculose em Porto Alegre: análise da magnitude e coinfecção tuberculose-HIV. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(6):1035-43. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000700011
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000700011
  • 8
    Zohar M, Moche L, Daniel C, Noa C, Itamar G. HIV prevalence in the Israeli tuberculosis cohort, 1999-2011. BMC InfectDis. 2014;14(1090):1-5. doi: http://dx.doi.org/10.1186/1471-2458-14-1090
    » http://dx.doi.org/10.1186/1471-2458-14-1090
  • 9
    Arenas NE, Ramírez N, González G, Rubertone S, García AM, et al. Estado de la coinfección tuberculosis/virus de la inmuno deficiencia humana en el municipio de Armenia (Colombia): experiência de 10 años. Infectio [Internet]. 2012[cited 2017 Oct 16];16(3):140-47.Available from: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0123939212700036
    » http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0123939212700036
  • 10
    Agbor AA, Bigna JJR, Billong SC, Tejiokem MC, Ekali GL, et al. Factors associated with death during tuberculosis treatment of patients co-infected with HIV atthe Yaoundé Central Hospital, Cameroon: an 8-Year hospital-based retrospective cohort study (2006-2013). PLoSOne. 2014;9(12): 1-22. doi: http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0115211
    » http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0115211
  • 11
    Meyer DE, Klein C, Dal'Igna MC, Alvarenga F. Vulnerabilidade, gênero e políticas sociais: a feminização da inclusão social. Estud Femin [Internet]. 2014 [cited 2017 Oct 16];22(3):320-28.Available from: https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/36751
    » https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/36751
  • 12
    Jacobson KB, Moll AP, Friedland GH, Shenoi SV. Success ful tuberculosis treatment outcomes among HIV/TB coinfected patients down-referred from a district hospital to primary health clinics in rural South Africa. PLoSOne. 2015;10(5):1-11doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0127024
    » https://doi.org/10.1371/journal.pone.0127024
  • 13
    Pinheiro RS, OliveiraI GP, Oliveira EXG, Melo ECP, Coeli CM, et al. Determinantes sociais e autor relato de tuberculose nas regiões metropolitanas conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, Brasil. Rev Panam Salud Pública [Internet]. 2013 [cited 2017 Oct 16];34(6):446-51. Available from: https://scielosp.org/pdf/rpsp/2013.v34n6/446-451/pt
    » https://scielosp.org/pdf/rpsp/2013.v34n6/446-451/pt
  • 14
    Jappar SB, Low SY. Tuberculosis trends over a five-year periodat a tertiary care university-affiliated hospital in Singapore. Singapore Med J. 2015;59(9):502-05. doi: http://dx.doi.org/10.11622/smedj.2015134
    » http://dx.doi.org/10.11622/smedj.2015134
  • 15
    Pereira JC, Silva MR, Costa RR, Guimarães MDC, Leite ICG. Perfil e seguimento dos pacientes com tuberculose em município prioritário no Brasil. Rev. Saúde Públ. 2015;49(6):1-12. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005304
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005304
  • 16
    Santos Neto M, Silva FL, Sousa KR, Yamamura M, Popolin MP, et al. Clinical and epidemiologic al profile and prevalence of tuberculosis/HIV co-infection in a regional health district in the state of Maranhão, Brazil. J Bras Pneumol. 2012;38(6):724-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132012000600007
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132012000600007
  • 17
    Méda ZC, Sombié I, Sanon OW, Maré D, Morisky DE, et al. Risk factors oftu berculosis infection among HIV/AIDS patients in Burkina Faso. AIDS Res Hum Retro Virus Es. 2013;29(7):1045-55 doi: http://dx.doi.org/10.1089/AID.2012.0239
    » http://dx.doi.org/10.1089/AID.2012.0239
  • 18
    Prado NT, Miranda AE, Souza FM, Dias ES, Sousa LKF, Arakaki-Sanchez D, et al. Factors associated with tuberculosis by HIV status in the Brazilian national surveillance system: a cross sectional study. BMC Infect Dis. 2014;14(415):1-8. doi: http://dx.doi.org/10.1186/1471-2334-14-415
    » http://dx.doi.org/10.1186/1471-2334-14-415
  • 19
    Hino P, Takahashi RF, Bertolozzi MR, Egry EY. Coinfecção de TB/HIV em um distrito administrativo do Município de São Paulo. Acta Paul Enferm. 2012;25(5):755-61 doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002012000500017
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002012000500017
  • 20
    Hahn GV. Incluindo o Projeto Terapêutico Singular na agenda da Atenção Básica em contexto de vulnerabilidade e não adesão ao tratamento da tuberculose [Tese]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2015 [cited 2017 Oct 16]. Available from: http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/129921
    » http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/129921
  • 21
    Steffen R, Menzies D, Oxlade O, Pinto M, Castro AZ, et al. Patients' Costs and Cost-Effectiveness of Tuberculosis Treatment in DOTS and Non-DOTS Facilities in Rio de Janeiro, Brazil. PLoS One. 2010;5(11): e14014. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0014014
    » https://doi.org/10.1371/journal.pone.0014014
  • 22
    Vieira AA, Leite DT, Adreoni S. Tuberculosis recurrence in a priority city in the State of São Paulo, Brazil. J Bras Pneumol. 2017;43(2):106-12.doi: http://dx.doi.org/10.1590/s1806-37562016000000002
    » http://dx.doi.org/10.1590/s1806-37562016000000002
  • 23
    Brand EM. Fatores associados ao tratamento diretamente observado em casos de Coinfecção Tuberculose/Hiv em Porto Alegre [Dissertação]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2017.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Set 2019
  • Data do Fascículo
    Sep-Oct 2019

Histórico

  • Recebido
    16 Out 2017
  • Aceito
    28 Abr 2018
Associação Brasileira de Enfermagem SGA Norte Quadra 603 Conj. "B" - Av. L2 Norte 70830-102 Brasília, DF, Brasil, Tel.: (55 61) 3226-0653, Fax: (55 61) 3225-4473 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: reben@abennacional.org.br