EDITORIAL
ABEn: 75 anos de democracia, ética e compromisso com a enfermagem brasileira
Eucléa Gomes Vale
Presidente
A Associação Brasileira de Enfermagem tem uma história de compromisso com a enfermagem brasileira construída e em permanente reconstrução, tendo sempre em vista seu rumo e sua marca maior, a defesa da vida e do exercício digno do trabalho de enfermagem.
Alicerçada em princípios éticos e de conformidade com suas competências, vem articulando-se com organizações da enfermagem brasileira - autárquicas, sindicais e científicas - na consolidação do desenvolvimento social, político e científico da profissão.
A ABEn desenvolve sua história política de trabalho tendo como eixo nuclear a defesa e a consolidação da enfermagem como prática social essencial na assistência à saúde e na organização e funcionamento das instituições de saúde. Consolidando seu compromisso ético, político e técnico contribui de forma significativa na proposição e defesa de políticas e programas que produzam impacto na qualidade de vida da população, maior grau de resolutividade dos seus problemas de saúde e garantia do acesso universal e eqüânime nos serviços de saúde.
Nesta perspectiva, a entidade vem buscando implementar novas estratégias visando a solução de problemas e vem lutando permanentemente, por meio de seus sócios, por uma ordem social e econômica ampla mais justa e pela solidariedade e cooperação da sociedade civil organizada.
Durante quase 50 anos a ABEn foi a única entidade de enfermagem a lutar pela categoria no Brasil. A partir da década de 80, com o processo de mudança na ABEn, a entidade passa a expressar-se como parte da sociedade, encaminhando as lutas da enfermagem no contexto das mudanças sociais.
Por meio do Movimento Participação, consolidado a partir de 1986, surge uma nova concepção da função da ABEn, buscando uma nova relação da entidade com o governo e com a sociedade, aderindo à luta dos movimentos organizados da sociedade civil, para a construção de relações sociais mais justas, igualitárias e democráticas. Nesta nova concepção, volta-se para a construção de uma enfermagem democratizada, técnica e politicamente qualificada para sua prática nos serviços de saúde, nas escolas/cursos e para dirigir suas entidades, assim como, para o desenvolvimento de pesquisas que possam mudar e/ou consolidar sua prática profissional, passando a se inserir nas lutas coletivas dos profissionais de saúde.
Em seu processo de democratização destacam-se dentre as mudanças estruturais da ABEn a criação do Conselho Nacional da ABEn (CONABEn) e dos Conselhos Estaduais da ABEn e o ingresso, na entidade, dos auxiliares de enfermagem e dos alunos de graduação e de educação profissional de nível técnico, suas ações nos âmbitos do ensino, da legislação, do exercício profissional e sua regulamentação, no posicionamento político e suas implicações e na criação e organização das demais entidades de classe da enfermagem.
Foi por iniciativa e luta da ABEn que foram criadas as associações pré-sindicais, os sindicatos, o sistema COFEN/COREN's e grande parte das sociedades de especialistas. A ABEn tem dividido seu espaço físico tanto no âmbito nacional, como nas seções com as demais entidades, proporcionando a infra-estrutura necessária ao funcionamento das mesmas.
A ABEn, cumprindo seu papel histórico na articulação nacional do processo de construção coletiva das políticas e propostas que dizem respeito à educação em enfermagem, vem participando das lutas para a implementação de ações que contribuam para uma postura ativa na conquista de espaços sociais para o desenvolvimento de um processo amplo de debate, na busca de caminhos para o constante desafio dos problemas educacionais na enfermagem.
Em parceria com a Comissão de Especialistas de Ensino de Enfermagem da SESu/MEC, vem empreendendo uma luta no sentido de aprovar as diretrizes para a educação em enfermagem consensuadas no documento proposto pela "Carta de Florianópolis" (outubro/99) ratificada no 4º SENADEN (abril/2000) e na Reunião de Cursos e Escolas de Graduação em Enfermagem (outubro/2000).
A proposta de Diretrizes Curriculares apresentada e discutida na audiência pública promovida pelo Conselho Nacional de Educação/MEC contou com a análise do Conselho Nacional de Saúde, da ABEn e da Comissão de Enfermagem dentre outras. Esta proposta mostra aderência às reivindicações e posições da enfermagem nacional que vêm sendo defendidas pela ABEn.
A ABEn, mais uma vez, demonstra a capacidade de articular movimentos de discussão que, em parceria com a Comissão de Especialistas de Ensino de Enfermagem SESU/MEC, Escolas e Cursos de Enfermagem, rede unida e entidades representativas da área da saúde, culminaram com a apresentação de um projeto pedagógico para a enfermagem que contempla medidas alternativas para a implementação de Diretrizes Curriculares para Cursos de Graduação em Enfermagem que possibilitam um processo constante de aprimoramento que viabilize a formação de verdadeiros cidadãos capazes de responder aos constantes desafios impostos pela sociedade.
Quanto à educação profissional de nível técnico vale destacar a marcante atuação da ABEn na liderança de discussões em relação a sub-área enfermagem na área de saúde junto ao Ministério de Educação e Ministério da Saúde conduzindo o processo de elaboração de referenciais curriculares. Os dispositivos legais aprovados estabelecem a necessidade de num curto espaço de tempo estarmos apoiando e fortalecendo as instituições que desenvolvem esta modalidade de educação no processo de construção de projetos pedagógicos coletivos.
Quanto à qualificação dos profissionais em cursos e programas de pós-graduação cabe ressaltar que houve avanços na modalidade lato sensu por meio do estímulo à ampliação temática de cursos de especialização tais como: enfermagem obstétrica, saúde da família, enfermagem oncológica. O stricto sensu apresenta carências que precisam ser solucionadas no que se refere tanto à distribuição geográfica dos cursos, quanto ao estabelecimento de novas parcerias que possam assegurar uma política efetiva da produção científica da enfermagem com conseqüente reflexo na qualidade de vida da população.
A ABEn, por sua história de organização e representatividade na área, tem estado à frente em todos os importantes fatos e lutas que marcaram a enfermagem brasileira. Assim, vem cada vez mais, se posicionando como articuladora e interlocutora das organizações de enfermagem frente às instâncias formuladoras de politicas de saúde, de recursos humanos e de ciência e tecnologia.
No final da década de 30, a ABEn organizou as Comissões de Educação e de Legislação. À primeira coube a tarefa de acompanhar, planejar e orientar todo o processo educacional da Enfermagem, à segunda, diretamente ligada a Comissão de Defesa de Classe, marcou de forma significativa, o compromisso da entidade na conquista da regulamentação do exercício profissional e de aparatos legais que sustentassem um projeto científico-profissional para a enfermagem brasileira.
É compromisso da ABEn, por meio de toda sua diretoria nacional e das seções, a participação em fóruns e movimentos nacionais e nos estados, buscando e garantindo representação dos trabalhadores de enfermagem em instâncias políticas e no apoio e luta pelos direitos à saúde da população, pelo exercício digno e desenvolvimento da profissão.
Neste sentido, destacam-se as atuações junto ao Conselho Nacional de Saúde, onde a ABEn representa o Fórum de Entidades Nacionais dos Trabalhadores da Saúde (FENTAS) e na Comissão Intersetorial de Recursos Humanos (CIRH) onde a representação da ABEn contribuiu na elaboração, discussão na 11ª Conferência Nacional de Saúde e sistematização das Diretrizes para Norma Operacional Básica de Recursos Humanos para o SUS. Vale ressaltar a contribuição de membros/associados da entidade em Conselhos Estaduais e Municipais de Saúde.
Junto ao Ministério da Saúde, com vistas à consolidação do SUS, aABEn tem contribuido no Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE) e no Programa de Interiorização dos Trabalhadores da Saúde (PITS). Nestes espaços, a entidade tem assumido postura crítica proativa com alguns ganhos de relevância para a categoria.
Acreditando que o potencial de desenvolvimento de uma profissão está relacionado com a autonomia conquistada pela comprometida ação de seus sujeitos e que esta autonomia depende da possibilidade de construção de conhecimento, seu consumo e permanente critica aABEn, tem oferecido à enfermagem brasileira, um periódico cientifico (REBEn) que se destaca por sua tradição e qualidade por ser uma revista acessível e de ampla circulação, de periodicidade garantida, arbitrada, indexada e citada por seus pesquisadores. A ABEn, oferece ainda, a sócios, escolas/cursos de enfermagem e outros órgãos/entidades públicas e privadas que mantém relação com ela o Boletim Informativo (BI) que atende à necessidade de informar aos associados "as notícias mais significativas da profissão".
No decorrer dos seus 75 anos, a ABEn vem contribuindo de forma significativa com publicações de interesse para a enfermagem brasileira. Destacam-se aqui as mais recentes publicações: Enfermagem no Sus, lançada em 1997, já conta com seis publicações: - Manual do pesquisador do CIPESC - BRASIL; - Uso do diagnóstico na prática de enfermagem; - A classificação internacional das práticas de enfermagem em saúde coletiva e o uso da epidemiologia social; - Classificação Internacional das Práticas de Enfermagem em Saúde Coletiva - CIPESC - com artigos de relatos do trabalho da enfermagem nos cenários pesquisados e textos relativos à pesquisa qualitativa. Congressos Brasileiros de Enfermagem: meio século de compromisso da ABEn - 2000 Enfermagem Brasileira - contribuição da ABEn -1999. Projeto Acolher - um encontro da Enfermagem com o adolescente brasileiro - Parceria ABEn-Ministério da Saúde - 2000. Coletânea de textos; numa tiragem de 20.000 exemplares para distribuição gratuita, buscando instrumentalizar os trabalhadores de enfermagem para mudanças no processo de cuidar do adolescente e jovem brasileiro, (volume 2, dedicado a protocolos de cuidados, encontra-se no prelo). Revista Brasileira de Enfermagem Número Especial - Temática Saúde da Família - Parceria ABEn - Ministério da Saúde - UNESCO- 2000. Tiragem de 20.000 exemplares para distribuição gratuita.
A ABEn, cumprindo a sua natureza e finalidades que lhe conferem caráter cultural, científico e politico, tem desenvolvido projetos que vêm contribuindo para repensar/melhorar/qualificar/a prática da enfermagem nos distintos cenários do Brasil, sempre direcionados ao desenvolvimento da enfermagem brasileira competente e qualificada com vistas a melhoria da qualidade da assistência prestada à população. Assim, tem buscado parcerias para o desenvolvimento de projetos de âmbito nacional e internacional, com o objetivo de melhorar a qualificação das(os) associadas(os); a qualidade da assistência prestada à população e estabelecer inter câmbio e transferência de tecnologia em enfermagem/saúde.
Entre os projetos desenvolvidos e em desenvolvimento, destacam-se o Projeto Internacional de Classificação das Práticas de Enfermagem, com ênfase na Saúde Coletiva, realizado em parceria com o Conselho Internacional de Enfermeiras (CIE), o que gerou a publicação de 6 livros da Série Didática: Enfermagem no SUS. O Projeto Acolher, em parceria com o Ministério da Saúde, que tem por objetivo instrumentalizar os profissionais de enfermagem para a assistência ao adolescente, resultou na coletânea de trabalhos intitulada "Um encontro da enfermagem com o adolescente brasileiro" e na elaboração de um novo livro que pretende-se consolidar como um esteio para o trabalho junto aos adolescentes. O Projeto ELOS -Educação, Liderança, Organização na Saúde em parceria com a Organização Panamericana de Saúde Liderazgo para El Cambio Brasil - Projeto de capacitação para liderança, promovido pelo Consejo internacional de Enfermeras (CIE) e financiado pela Fundação Kellogg - Fase 1 - concluído 2000. O trabalho de Cooperação ABEn/CNA - Intercâmbio entre a Canadense Nurses Association - CNA e a Associação Brasileira de Enfermagem - ABEn Nacional, por meio da ABEn-Pe. A participação na articulação para criação da rede de Editores de Enfermagem da América Latina e Caribe.
A ABEn buscando atender as necessidades de atualização e intercâmbio do saber e das idéias tem realizado os maiores eventos, de caráter nacional, regional e local da enfermagem brasileira, dos quais destacam-se: Congresso Brasileiro de Enfermagem (CBEn) - maior evento da categoria, realizado anualmente com cerca de 4.000 participantes e 2.800 trabalhos científicos apresentados. A Semana Brasileira de Enfermagem (SBEn), que ocorre anualmente, desenvolvendo atividades cientificas, politicas e culturais em comemoração a Semana de Enfermagem (12 a 20 de maio). O Seminário Nacional de Pesquisa em Enfermagem (SENPE) - mais importante fórum de discussão da pós-graduação e da pesquisa em enfermagem no Brasil. Ocorre desde 1979 a cada dois anos. O Seminário Nacional de Diretrizes para o Ensino de Enfermagem (SENADEn) - articula temáticas e profissionais envolvidos com o ensino de graduação, pós-graduação e educação profissional de nível técnico traçando diretrizes para a educação da enfermagem brasileira e buscando estratégias de articulação entre os niveis de formação. Ocorre desde 1994 a cada dois anos. O Simpósio Nacional de Diagnóstico em Enfermagem (SINADEn) - promove a discussão e desenvolvimento de sistemas de diagnóstico e classificação das práticas de enfermagem. Ocorre a cada dois anos, desde 1992 E os Encontros de Enfermagem das Regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Norte e Nordeste - ENFs, promove o debate regional de questões emergentes na saúde e na enfermagem das regiões. Ocorre desde 1981.
A ABEn mantém, atualmente, relações de caráter de cooperação, representação e/ou intercâmbio com diversos organismos, instituições e fóruns de discussão e deliberação de pautas de interesse profissional e da saúde com: a Federação Nacional de Enfermeiros -FNE, mantém uma agenda de trabalho conjunta, que inclui: luta por direitos trabalhistas e melhoria das condições de trabalho; - acompanhamento da tramitação de Projetos de Lei no Congresso Nacional. AABEN está sediando e continuará dirigindo até 2004, a Federación Panamericana de Profisionales de Enfermería (FEPPEN), contribuindo efetivamente com um trabalho de desenvolvimento científico, político, econômico e social da profissão na América Latina e Caribe. Por meio desta entidade, a ABEn participa da Fundación Iberoamericana para el desarollo de la Enfermería (FIDE). A ABEn sedia e mantém um trabalho profícuo e parceiro com a Executiva Nacional de Estudantes de Enfermagem - ENEEnf e é associada a Sociedade Brasileira para o progresso da Ciência -SBPC, participando efetivamente de reuniões, assembléias e fóruns deliberativos, bem como desenvolvendo programação cientifica em seu evento anual.
Participar, lutar, ousar em parceria com instituições e instâncias da sociedade comprometidas com a elaboração de novas práticas de saúde, com outras entidades de enfermagem do país e do mundo e com as entidades de outros profissionais da saúde e demais entidades da sociedade civil organizada, na busca por melhores condições de saúde e de vida, tem se constituido uma pauta constante no cotidiano da ABEn que tem procurado enfrentar com ética, democracia e competência todos os movimentos sociais de luta.
Por fim, a avaliação que se faz dos quase 75 anos de existência da ABEn permite considerar que trata-se de uma entidade comprometida, dedicada, disponivel, ética, democrática e cidadã, que é constituída por milhares de enfermeiras(os) que construíram sua trajetória de dignidade, representatividade, respeito e legitimidade, constituindo-se, portanto, numa sólida instituição de renome nacional e internacional nos campos da enfermagem e da saúde. Tem como principal causa de sua existência a defesa da vida. Demonstra com sua experiência, potencialidades e possibilidades que está apta para ser e estar neste novo milênio, levando consigo uma história de democracia, ética e compromisso com a enfermagem brasileira.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
15 Ago 2014 -
Data do Fascículo
Jun 2001
