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ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM A PACIENTES EXTERNOS* * Tema livre — XXXI CBEn — Fortaleza - Ceeará — 1979.

INTRODUÇÃO

A Atenção à Saúde é considerada como o conjunto de ações preventivas, curativas e restauradoras prestadas ao indivíduo, isoladamente, ou em grupo, desenvolvida por pessoal profissional, técnico ou auxiliar.

A Assistência de Enfermagem é reconhecida atualmente como um dos componentes básicos dessa Atenção à Saúde prestada ao indivíduo e à comunidade, em todas as etapas do ciclo vital no processo saúde x doença.

Assistir, em enfermagem, significa atender às necessidades do indivíduo incorporada nos 3 níveis de prevenção: primária, secundária e terciária, visando a promoção, proteção, recuperação e reabilitação de sua saúde.

A assistência de enfermagem engloba várias atividades e tarefas que variam de acordo com o grau de complexidade do assistido, as condições da Instituição (recursos humanos e materiais) indo da mais elementar à mais sofisticada.

Destas atividades daremos enfoque principal à consulta de enfermagem,que, em planejamento de saúde é considerada como uma atividade final, passível de mensuração, dado de grande valor para e programação das ações de saúde e, conseqüentemente, para a avaliação das mesmas.

No presente trabalho, citamos a experiência da assistência de enfermagem em Saúde Comunitária do Ambulatório do Hospital Ana Nery do INAMPS desenvolvido com 3 tipos de pacientes: gestantes, diabéticos e hipertensos. Pretendemos enfocar a consulta de enfermagem, com uma análise teórica da mesma, baseada na vivência do trabalho acima referido.

1. Consulta de Enfermagem — sua conceituação

1.1 Retrospecto Histórico

A consulta de enfermagem, para atingir seu estágio atual vem passando por etapas evolutivas consideradas marcantes. Baseada em estudos realizados por CASTRO (4CASTRO, I.B. e — 'Estudo Exploratório sobre Consulta de Enfermagem — Rev. Bras. Enf., R.S., 28: 76-64, 1975.) e em outras experiências citaremos alguns dados significativos para a atividade em pauta:

Em 1925 — no Manual elaborado por enfermeiras americanas para enfermeiras brasileiras de Saúde Pública na parte referente a doenças venéreas — foi inserido como atribuição da enfermeira, realizar entrevista pós-consulta para paciente novo,interpretando diagnóstico e tratamento como meio de prevenção de doença.

— No Relatório Anual do Departamento Nacional de Saúde constava que foi incrementada a ação de enfermeiras de Saúde Pública nos consultórios de Higiene Infantil, e na Inspetoria de Tuberculose foi adotado em 2 Dispensários a utilização de enfermeiras como educadoras dos casos novos matriculados, após consulta, orientando quanto à higiene individual e profilaxia.

1958 — A Comissão de Peritos em Enfermagem da OMS, reunida em Genebra, incluiu na descrição de funções de Enfermeira de Saúde Pública, o atendimentocomo "função médica delegada", cuja escolha ficaria a critério de cada necessidade local.

1966 — A FSESP (Fundação Serviço de Saúde Pública) colocou no Manual de Rotinas, o atendimento de Enfermagem a gestante sadia.

1968 — no 2.º Curso de Planejamento de Saúde da Fundação de Ensino Especializado de Saúde Pública (Presidente Castelo Branco), profissionais participantes do curso concluíram ser o atendimento de Enfermagem uma das atividades finais da Unidade Sanitária. A partir desse fato, surgiu a denominação de consulta de enfermagem, principalmente no que se referia ao atendimento à gestante e criança sadia. Antes, era considerada como componente da consulta médica.

Ainda em 1968 — no Seminário Nacional sobre Currículo do Curso de Graduação em Enfermagem organizado pela Escola de Enfermagem da USP sob o patrocínio da OPAS, ao ser estudado o conteúdo do currículo, foram consideradas as funções desempenhadas pelas enfermeiras no Brasil; no campo da Saúde Comunitária, foi identificada a consulta de enfermagem como atividade final e exclusiva da enfermeira.

No Brasil já existem várias experiências de inclusão da consulta de enfermagem nos Manuais de Normas e Rotinas de Serviços.

1969 — Seção Técnica de Enfermagem da FSESP em Araraquara, já havia implantado a consulta de Enfermagem na área materno-infantile no seguimento de doenças crônicas de adultos.

Em uma Unidade Sanitária da UFBa, em convênio com a Secretaria de Saúde da Bahia, a consulta de enfermagem é aplicada à gestante e criança sadia, com amnese, exame físico e orientação.

1972 — O Hospital de Clínicas de Porto Alegre instituiu a Consulta de Enfermagem à criança.

1973 — A Secretaria de Estado de Saúde do Ceará oficializou a Consulta de Enfermagem.

A Secretaria de Saúde do Estado da Bahia colocou na Programação Materno-infantil — a Consulta de Enfermagem como atividade final.

1974 — Também a Secretaria do Estado de Santa Catarina previu a realização da Consulta de Enfermagem a gestantes e crianças sadias com menos de 1 ano.

Em Salvador, Bahia, numa Comunidade do bairro de Pau da Lima, uma docente da Escola de Enfermagem da UFBa, realiza Consulta de Enfermagem utilizando o método do Processo de Enfermagem à gestante, como experiência para campo de estágio, com resultados altamente positivos .

1.2 Conceito Atual

Atribuindo apenas uma conotação teórica, conceituaríamos o termo consulta como "ação de informar-se sobre algo, de observar, examinar, procurar conhecer, avaliar antes de decidir, dar conselho, opinião".

Na consulta de Enfermagem, estas ações significam muito quando são efetuadas no sentido de produzir as mudanças favoráveis à saúde.

A Consulta de Enfermagem pode ser conceituada como: atividade sistemática e contínua que obedece a uma metodologia; é independente, isto é, não necessita de encaminhamento médico.

Segundo HORTA, W. (1010 ______ — Consulta de Enfermagem — Rev. Esc. Enf., USP, 9(3):53-57, 1975.)Consulta de Enfermagem é "aplicação do Processo de Enfermagem ao indivíduo sadio ou em tratamento ambulatorial".

A Consulta de Enfermagem é indelegável, só pode ser realizada por enfermeira, difere da orientação de enfermagem desde quando considera-se a orientação como: atividade interdependente, sempre associada à consulta médica ou de enfermagem, não tem base científica, geralmente se restringe a orientar o paciente quanto à terapêutica, realização de exames, verificações de sinais vitais, etc. Pode ser realizada por pessoal auxiliar.

A Consulta de Enfermagem, considerada como atividade a fim de saúde, depende dos objetivos esperados. O produto desta atividade, é um serviço destinado a atender à necessidade de saúde da população.

Segundo ANDRADE (3ANDRADE, O.B. de — A Consulta de Enfermagem em sistema de programa de Saúde — Rev. Bras. Enf. — Equipamentos e Serv. Hospitalares. 1:(8-12), abril 1979.) a "Consulta de Enfermagem inclui técnicas, normas e procedimentos que orientam e controlam a realização das ações destinadas à obtenção, análise e interpretação de informações sobre as condições de saúde da clientela e as decisões quanto à orientação e outras medidas que possam influir na adoção de práticas favoráveis à saúde.

É importante reconhecer-se que a Consulta de Enfermagem por seu embasamento científico, fornece os dados que servem como informações para controle de produção e avaliação dos dados obtidos, não só da enfermagem em si, como do sistema de saúde.

A Consulta de Enfermagem, como atividade final de saúde, tem atributos mensuráveis, tais como volume (número de consultas realizadas em determinado período) concentração (quantas consultas são realizadas para um indivíduo durante um período determinado; cobertura — relação de percentual entre pessoas atendidas dentro de uma certa programação; e outros.

2. Aspectos situacionais que envolvem a Consulta de Enfermagem

Segundo LAMBERTESN, a enfermagem é "um processo dinâmico, terapêutico e educativo em satisfazer as necessidades de saúde da sociedade. Sua função distinta refere-se às respostas fisiológicas e psicossociais à saúde que podem ou fazem resultar em um estado de dependência de outras para satisfazer necessidades que estão, normalmente, dentro do potencial do indivíduo ou família. Em um relacionamento terapêutico e educativo, o enfermeiro assiste o indivíduo e ou família em alcançar seu potencial de auto-direção de saúde".

Um relacionamento terapêutico só é eficaz mediante uma comunicação efetiva, e, para tal, temos de considerar o emissor, a mensagem e os meios pelos quais a mensagem alcançará o receptor. A captação dessa mensagem, depende do receptor, isto é, sua capacidade de percepção; da mensagem em si, para que seja adequada ao nível do receptor; e do transmissor, considerando-se sua capacidade de transmitir.

"A inter-relação enfermeira x paciente, deverá ser considerada desta forma, modelo de comunicação terapêutica".

A Consulta de Enfermagem, para ter validade prática, deve proporcionar mudanças favoráveis na saúde do indivíduo. Mister se faz o estabelecimento da comunicação terapêutica entre enfermeiro x paciente; para que isto se efetue, há que se levar em conta três fatores relacionados com:

  1. ambiente físico;

  2. capacidade do enfermeiro;

  3. estado psicológico e físico do paciente.

a) Em relação ao ambiente físico:

Há que se observar instalações que propiciem a interação enfermeiro x paciente, desde sua recepção, que constitui no primeiro contato entre ambos e durante o desenvolvimento da consulta. É necessária uma sala apropriada, onde seja respeitada a privacidade do paciente, ficando livre de interrupções de terceiros, que venham cortar o elo da comunicação que se está estabelecendo.

No caso de gestante, há necessidade de exame físico mais cuidadoso, que depende de mobiliário adequado.

b) Em relação ao enfermeiro:

O cliente de Ambulatório do INAMPS não está ainda acostumado a esse tipo de relacionamento com o enfermeiro, pois a figura desse profissional sempre foi mais voltado para os aspectos administrativos, ou o "enfermeiro" (auxiliar de enfermagem ou atendente) que faz curativos e aplica injeções. Para essa nova imagem do enfermeiro, exige-se muito de sua atitude e segurança profissional ao lado de grande habilidade para se impor ao paciente como um profisisonal que tenha condições de lhe acrescentar algo para a resolução de seu problema.

c) Em relação ao paciente.

Seu estado psicológico é um fator importante a considerar, desde quando o paciente de Ambulatório sempre está apressado em voltar para casa, para o emprego, precisando ir ao médico ou marcar exames; sendo do sexo feminino, e tendo filhos, está preocupada com a situação das crianças em casa, ou quando não as trazem consigo para a consulta, o que dificulta sobremaneira o desenvolvimento do processo.

O estado físico também interfere; ex.: a descompensação do diabético geralmente provoca um estado de apatia que dificulta o diálogo.

3. Estudo do "Processo de Enfermagem" Aplicado a Pacientes Externos

Muitos estudos, reflexões e experiências se tem feito do Processo de Enfermagem em pacientes internados em Unidades Hospitalares. Porém, em relação ao paciente externo, a experiência da aplicação desta metodologia, assim como, publicações teóricas acerca do assunto, ainda são muito rudimentares.

As bases científicas são as mesmas, o que difere é a maneira como é empregado pelo fato do atendimento ao paciente externo ter características peculiares.

Como já sabemos, o "Processo de Enfermagem" é o método de assistir o Ser Humano centrado nas suas necessidades básicas, e compreende as seguintes fases:

  • Histórico

  • Diagnóstico de Enfermagem

  • Plano Assistencial

  • Plano de Cuidados

  • Evolução

Histórico — "é o roteiro sistematizado para levantamento de dados importantes para a enfermagem sobre o paciente, família e comunidade a fim de tornar possível a identificação de seus problemas" HORTA (9______ — O Processo de Enfermamagem — fundamentação e aplicação — Rev. Enf. Novas Dimens., 1(1):10-15, 1975.).

O Histórico é de fundamental importância para o conhecimento do paciente como um todo, pois é nessa fase que são coletados os dados relativos ao paciente, sua identificação, hábitos de vida, situação sócio-econômica, etc.

No paciente externo, conforme já foi citado anteriormente há uma série de fatores que implicam no bom desenvolvimento da Consulta de Enfermagem. Insistimos quanto à habilidade do enfermeiro em conduzir a entrevista, estimulando os introvertidos, controlando os prolixos, para que se consiga o maior número de informações em um curto espaço de tempo. Outras exigências profissionais devem ser observadas, tais como: conhecimento científico, capacidade de comunicação, empatia, anotações fidedignas, poder de síntese, boa redação, saber utilizar termos técnicos apropriados.

Não se pode adotar uma atitude informal, conforme é indicado no método, por ser a consulta em si, uma atividade que implica em um comportamento formal.

Para o paciente internado "recomenda-se a leitura dos documentos do paciente existentes no prontuário antes de se iniciar a conversa. Qualquer conhecimento sobre seu estado e sobre sua pessoa permite mais facilmente a aquisição de sua confiança (AMORIM) (2AMORIM, M.S.A. e NUNEZ, R.S. — Modelo de Assistência de Enfermagem — Aplicação no Hospital Ana Nery — Salvador — Escola Gráfica N.S. de Loreto, 1979.). Para o paciente externo tal recomendação não é viável, desde quando só tomamos conhecimento do mesmo ao nos chegar com o diagnóstico médico firmado, tendo que se iniciar a consulta imediatamente, pelo histórico, considerando-se que sendo o cliente de baixo poder aquisitivo, não se deve solicitar que retorne outro dia, sob o risco de perdê-lo; tem que se aproveitar o momento. No caso do paciente internado, a aplicação do histórico pode ser adiada para o turno seguinte, ou dia subseqüente, a depender do seu estado geral ou de outras intercorrências.

Também em Ambulatório não se pode planejar o número de consultas novas diárias, por não se ter a previsão de quantos clientes virão para o atendimento. Há dias em que se tem 4 a 5 indivíduos necessitados de consulta, em detrimento de outros dias, em que o número é bem menos, e, às vezes é nenhum.

Algumas enfermeiras têm sentido dificuldade em abordar assuntos relacionados com a parte sócio-econômica de certos pacientes, por sentirem que se retraem, talvez considerando uma intromissão indevida, pelo pouco relacionamento existente entre ambos. Há mais facilidade em se obter informações dessa parte, quando do seu retorno para outra consulta.

Quanto ao local onde é aplicado o histórico, não sofre a flexibilidade do paciente internado; só pode ser no consultório da enfermeira.

Um histórico onde a coleta de dados seja bem feita, tornará mais fácil o Diagnóstico, e, principalmente, o Plano Assistencial e o de Cuidados; isso só é possível com o conhecimento pleno do paciente.

Diagnóstico de Enfermagem — é a indentificação das necessidades básicas do indivíduo (família ou comunidade) que precisam de atendimento pela Enfermagem, do grau de dependência deste atendimento em natureza e extensão" (HORTA) (9______ — O Processo de Enfermamagem — fundamentação e aplicação — Rev. Enf. Novas Dimens., 1(1):10-15, 1975.).

Para o diagnóstico de enfermagem é fundamental a identificação das necessidades básicas afetadas. Segundo AMORIM (2AMORIM, M.S.A. e NUNEZ, R.S. — Modelo de Assistência de Enfermagem — Aplicação no Hospital Ana Nery — Salvador — Escola Gráfica N.S. de Loreto, 1979.), "as necessidades encontram-se latentes em estado de equilíbrio, mas surgem com maior ou menor intensidade, dependendo do desequilíbrio instalado. São comuns a todos os homens porém sua manifestação, assim como a maneira de satisfazê-la, varia de indivíduo para outro". Dentre os fatores que interferem na manifestação e atendimento encontrar-se individualidade, idade, sexo, cultura escolaridadee nível sócio-econômico". * Os grifos são da autora do presente trabalho.

Esta é uma das fases mais difíceis do Processo, pois sendo um paciente ambulatorial muitas de suas necessidades básicas afetadas estão relacionadas com fatores externos, sobre os quais a enfermagem nem sempre pede atuar. Além disso há que se considerar curto espaço de tempo de contato enfermeira x paciente.

O grau de dependência em natureza relacionado com o conceito de Assistir em Enfermagem é: "fazer pelo indivíduo, família, comunidade tudo aquilo que ele não pode fazer por si mesmo; ajudar quando parcialmente impossibilitado de se auto-cuidar, orientar ou ensinar, supervisionar e encaminhar a outros profissionais" (HORTA)(9______ — O Processo de Enfermamagem — fundamentação e aplicação — Rev. Enf. Novas Dimens., 1(1):10-15, 1975.).

Em sendo externo, o FAZER pelo paciente, não é muito freqüente; pois ele pouco depende das ações de enfermagem para satisfazer suas necessidades; devido ao tempo escasso da consulta, não se determina o grau de dependência em extensão.

Plano Assistencial "é a determinação global da Assistência que o ser humano deve receber diante do diagnóstico estabelecido" (HORTA) (9______ — O Processo de Enfermamagem — fundamentação e aplicação — Rev. Enf. Novas Dimens., 1(1):10-15, 1975.). Dependendo dos problemas identificados e necessidades afetadas do paciente e do grau de dependência. O Plano Assistencial consiste em 5 ações: Fazer, Ajudar, Orientar, Supervisionar e Encaminhar.

O Plano Assistencial depende inteiramente da qualidade de emprego do Histórico. Segundo VIEIRA (1515 ______ — O Processo da Comunicação na Enfermagem— Universidade Federal da Bahia — Centro Editorial e Didático — Salvador — Ba., 1978.) "os indivíduos querem estar incluídos nas decisões que são tomadas, para resolver seus problemas de saúde". É nesta fase do Processo onde se verifica a maior distinção relativa ao paciente externo. É que o Plano Assistencial é sempre desenvolvido pelo paciente no seu meio ambiente ou por familiares. Quando a enfermagem faz pelo paciente, é visando ajudar e orientar para uma posterior supervisão. Muitas vezes a ajuda que a enfermeira pode dar, é fazer o paciente aceitar a viver com seu problema.

Ex.: paciente diabético; ele tem que ser esclarecido sobre sua doença, que é incurável porém compatível com a vida, desde que certos cuidados sejam observados. A enfermeira deve preparar o paciente a se auto-cuidar e tornar-se independente da equipe. Quando se ministra a insulina, objetiva-se ensinar o paciente a se auto-aplicar; se ele não tem condições, quer por deficiência mental ou física (pouca acuidade visual), idade avançada ou muito jovem, necessário se torna convocar um membro de família ou da comunidade para assumir este cuidado.

O Plano Assistencial deve ser elebarado em conjunto com o paciente, para que seja real e exeqüível.

Outra característica digna de nota relacionda com o paciente externo, é que ele sofre as influências do ambiente sócio-cultural onde vive. De acordo com seu nível de cultura, muita vez a opinião ou orientação recebida de um líder de sua comunidade (pai e mãe de santo, "curiosa") ou mesmo de um vizinho, tem mais validade para ele do que a emitida pela enfermeira.

A Supervisão é quase sempre indireta, pois a enfermeira tem que se basear nas informações trazidas pelo doente no seu retorno; excetuam-se alguns casos de hipertensos, cujo controle da TA pode ser feito em Ambulatório, mas assim mesmo, por vezes não há a baixa da TA esperada, se ele seguisse a orientação recebida quanto ao uso da terapêutica médica e da dieta; apesar da sua afirmação enfática da fiel observância desta orientação, como termos a certeza da veracidade da informação?

O Encaminhar deve também ser adequado à situação do paciente e aos recursos da comunidade e muito especialmente do próprio INAMPS. Queremos ressaltar, que deve-se evitar fazer certos encaminhamentos, quando houver um mínimo de probabilidade de solucionar seu caso .

Plano de Cuidados — "é o roteiro diário (ou em período aprazado segundo o serviço onde é aplicado), que coordena a ação da equipe de enfermagem nos cuidados adequados ao atendimento das necessidades básicas e específicas do ser humano" (HORTA) (9______ — O Processo de Enfermamagem — fundamentação e aplicação — Rev. Enf. Novas Dimens., 1(1):10-15, 1975.). Este conceito teórico não se aplica "in totum" ao paciente externo: ele não é diário e sim periódico, e não é desenvolvido pela equipe de enfermagem e sim pelo próprio paciente em seu meio. Conforme já nos referimos no item Plano Assistencial, quando a enfermagem faz pelo doente é no sentido de ajuda e orientação. Há casos de exceção, por ex. realização de curativos, aplicação de medicação parenteral prescrita pelo médico (isso no caso do paciente poder vir com freqüência ao Ambulatório).

No Plano de Cuidados Periódicos é feita a prescrição de Enfermagem que é entregue ao paciente. Este Plano de Cuidados deve ser redigido com muita clareza e objetividade; ao contrário do Histórico, deve ser evitado o emprego de termos técnicos para que seja de fácil compreensão do paciente. Outra característica é a exeqüibilidade, desde quando vai ser desenvolvido por leigos, compatível com seu nível sócio-econômico-cultural. Um cuidado a ser observado é procurar saber do paciente se há condições do mesmo executar prescrição. É preferível omitir uma orientação se sabemos de antemão da impossibilidade de sua execução. Ex.: problems sociais ou relacionados a saneamento do meio.

Um ponto importante e vital para a enfermagem, relativo à prescrição, é que, ao lado da mesma auferir um status profissional, implica, numa grande responsabilidade desde quando ao ser entregue ao paciente, a prescrição vai para a comunidade e se torna pública. Minter se faz muita segurança profissional e cuidado em não cometer falhas, pois a possibilidade de conserto é remota, visto que o retorno de paciente se dá a longo prazo.

No plano periódico de cuidado o aprazamento tanto pode se referir a horário de executar as ações propostas, como a data de realização de exames de laboratório ou retorno à consulta. Ex.: paciente diabético


Obs.: Em nosso serviço o paciente recebe requisição da glicemia no dia da consulta médica, para uma perfeita avaliação de seu estado físico.

Evolução — "é o relato diário (no hospital) ou periódico, das mudanças sucessivas que ocorrem no ser humano enquanto estiver sob assistência profissional (HORTA) (9______ — O Processo de Enfermamagem — fundamentação e aplicação — Rev. Enf. Novas Dimens., 1(1):10-15, 1975.).

A evolução no paciente externo é também periódica e a longo prazo, visto que seu retorno tanto pode ser de 1 semana, como de, 2, 3 meses ou mais.

A evolução é baseada em dados informativos obtidos através o paciente, quando não se dispõe de serviço de visitação domiciliar. Excetuam-se os dados observáveis diretamente, como por exemplo: regressão de edemas nas gestantes, redução de taxa de glicemia do diabético, baixa da TA dos hipertensos.

Essa supervisão indireta ao qual já nos referimos, torna difícil a evolução, pois muitas vezes, os dados observados não coincidem com a informação do paciente.

Ex.: paciente diabético descompensado, que, é orientado quanto aos cuidados, ensinado a fazer sua glicosuria e auto-aplicar a insulina. No seu retorno, verifica-se a não redução de taxa de glicemia. Como pode-se comprovar se ele está utilizando a técnica certa de glicosuria e de dosagem de insulina, se está seguindo a dieta prescrita pela nutricionista? Por vezes, é solicitado que ele repita a técnica e ele o fez certo; mas há casos de pacientes rebeldes que, ao se saberem observados, o fazem corretamente mas no seu ambiente, não ocorre o mesmo.

II PARTE

1. Experiência da Assistência de Enfermagem no Ambulatório Ana Nery

Desde 1973 havia um atendimento individual e de grupo a pacientes diabéticos, graças à abnegação e entrosamento entre um médico e uma enfermeira. Estes profissionais se preocupavam em prestar esclarecimentos aos seus pacientes a respeito de sua doença e do procedimento que eles deveriam adotar para minorar seu sofrimento ou diminuir suas internações sucessivas em virtude de descompensações motivadas por falta de orientação.

Em 1975, com a admissão de novas enfermeiras no Hospital Ana Nery, houve aumento quantitativo deste profissional no Ambulatório; estas começaram a se preocupar com o tipo de assistência que se poderia dar ao segurado, de um modo mais amplo. Houve assim um despertar de consciência profissional, que levou as enfermeiras deste Ambulatório a tentarem realizar um trabalho compatível com sua formação qualificada.

Nesta mesma época, o ex-INPS passou a disciplinar as ações de Saúde Comunitária, pela OS-SAM 339.58 e foi criada uma Comissão de Coordenação Regional de Saúde Comunitária. Em decorrência desse fato, passou-se a manter um relacionamento, a nível de Orientação técnica com a referida Comissão.

Inicialmente se visava atender aos pacientes, em grupos, através de sessões educativas.

Após os diabéticos, passou-se a atender os hipertensos e posteriormente às gestantes.

Em termos cronológicos, o início dos Programas se deu, respectivamente:

  • Diabéticos — 1973

  • Hipertensos — 1976

  • Gestantes — 1977

Em todos os 3 Programas, a atividade da enfermeira consistia em participar de sessões educativas onde a mesma, junto com outros profissionais da equipe de Saúde (nutricionista, assistente social, médico e dentista), ministrava aulas aos pacientes, obedecendo a uma programação pré-estabelecida.

Com o prosseguimento desta programação, o atendimento individual foi surgindo como uma imposição da própria dinâmica do serviço, pela necessidade de uma atenção individualizada a certos tipos de pacientes.

Exemplos: demonstração de técnicas de glicosuria e aplicação de insulina a pacientes diabéticos que tinham dificuldade em aprender no grupo;

— percepção de sinais de problemas relevantes dos pacientes, durante as sessões;

— pacientes que procuravam a enfermeira após as sessões educativas em busca de esclarecimentos sobre assuntos mais íntimos (gestantes, principalmente relativos a problemas sexuais);

— pacientes do interior do Estado ou que tivessem qualquer impossibilidade de freqüentar as aulas.

Foi-se desenvolvendo a idéia de se ver o paciente como ser unitário e que dependia do atendimento de suas necessidades, de forma individualizada.

Assim é que, começou-se a fazer um atendimento individual, porém de uma maneira empírica, sem nenhuma formação metodológica; não havia registro dos dados colhidos nem das orientações fornecidas.

Após estudos e reflexões feitas pelo grupo de enfermeiras, com a participação das estudantes de enfermagem da E.E.UFBa (que estagiavam na Unidade) foi elaborada uma Ficha de Registro e Ocorrência de Enfermagem e posta em prática. Esta mesma ficha sofreu uma adaptação para o atendimento dos pacientes hipertensos e diabéticos.

Em março de 1978, atendendo a uma solicitação da Chefia Geral do Serviço de Enfermagem do Hospital Ana Nery, começou-se a aplicar a Consulta com base na metodologia do Processo de Enfermagem, o qual já vinha sendo utilizado no Setor de Internação desde o ano de 1976, passando-se a usar o. mesmo impresso para todos.

Contudo, devido à grande demanda de pacientes, não era possível atender a todos, individualmente; assim é que, foram estabelecidos critérios de prioridades para aplicação da Consulta de Enfermagem, e considerados como "grupos alvo":

  • diabéticos e hipertensos descompen-sados ou rebeldes

  • gestantes de alto risco.

O fato de se escolher as gestantes de alto risco foi proporcionado pela total impossibilidade de atender individualmente às sadias, pelo elevado número de clientes e insuficiência de enfermeiras. Para as sadias, utiliza-se a educação em grupo.

Também os hipertensos e diabéticos, bem como as gestantes de alto risco, são carentes de uma atenção e cuidados especiais, merecendo por parte da enfermagem uma assistência integral, baseada numa metodologia científica que proporcione meios para atender, na medida do possível, às suas necessidades básicas afetadas.

Foram elaborados roteiros para aplicação do Histórico, um para gestantes, outro para diabéticos e hipertensos.

CONSIDERAÇÕES GERAIS

Como nos referimos que desenvolvemos a Programação com 3 tipos distintos de pacientes: gestantes, diabéticos e hipertensos, a experiência tem mostrado que os diabéticos e hipertensos são mais fáceis de ser trabalhados, talvez pelo instinto de sobrevivência, eles sintam a necessidade de aprender a viver com sua patologia clínica, tornando-os susceptíveis aos ensinamentos. Note-se que o diabético ao qual é aplicada a consulta, na sua maioria, está descompensado, predominando um estado de apatia, ou rebeldia.

O hipertenso desenvolve uma "neurose" de ser tomada sua TA, o que muitas vezes é usado como motivação para seu retorno.

A gestante de alto risco principalmente, a multípara, encara o fato da gestação como normal, apesar de apresentar complicações, e se torna difícil, não só a abordagem, como o seguimento da prescrição e o retorno para consultas subseqüentes. Ainda não é elevada a procura de gestantes no início da gravidez. Geralmente ela aparece no 8.º mês para adquirir o atestado de auxílio natalidade. Nosso trabalho tem sido realizado por vezes, com vistas a melhores cuidados em outra gestação.

Um outro problema sério é o abandono do paciente do Programa sem que tenhamos condição de fazê-lo retornar ao serviço.

Também este fato observado é mais freqüente entre as gestantes.

Durante a aplicação do Processo, o enfermeiro deve ter em mente as diversas alternativas que pode ter ao defrontar-se com certos problemas aparentemente insolúveis.

Tem ficado patente que nem todas as informações devem ser pesquisadas no primeiro contato enfermeira x paciente, principalmente se este é de natureza reservada. Muitos dados vão sendo fornecidos após a 2.ª ou 3.ª consulta, o que pode favorecer a modificação do Plano Assistencial, e, conseqüentemente, do Plano de Cuidados.

Mas, tal atitude é característica do aspecto dinâmico e flexível do método, e, compete ao enfermeiro ter o devido discernimento para agir nessas ocasiões de maneira coerente.

CONCLUSÕES

Concluindo, queremos afirmar que, apesar de todas as dificuldades por nós sentidas e, neste trabalho, apontadas, consideramos o método válido, e pretendemos fazer uma avaliação para afirmar sua eficácia, levando em conta nossa realidade.

Se não podemos agir sob certos aspectos do problema do paciente, por fugir à nossa competência, o levantamento de informações obtidas na ocasião de aplicação do Histórico, nos serve para c conhecimento do paciente como um todo. suas dificuldades, carências e aspirações.

Com apenas 1 ano de experiência sentiu-se a necessidade de modificar o formulário para melhor adequação ao tipo de paciente, cujo estudo foi iniciado e que será posteriormente divulgado, após verificação de sua validade.

É óbvio a necessidade dos serviços desse tipo contar com enfermeiras em número suficiente e com habilidade profissional para desenvolver esta atividade.

Com o presente trabalho não tivemos a pretensão de trazer uma verdade, apenas informar o que temos realizado, os entraves encontrados, o que temos observado, desejando que sirva de algum estímulo para outros, na esperança de receber subsídios que nos ajudem a melhorar e empreender uma atividade criteriosa, compatível com nossa formação universitária, tendo em mente a atenção devida que o paciente, seja ele do INAMPS, indigente ou de Clínica particular, merece receber, como ser humano.

SUGESTÕES

— Que os serviços de Enfermagem de Ambulatórios e Postos de Saúde procurem implantar e/ou incentivar a realização da Consulta de Enfermagem em pacientes que necessitem de atenção individualizada;

— Que esta atividade seja concomitante com trabalho de grupo e de visitação domiciliar; esta, para propiciar uma supervisão de realização dos cuidados prescritos;

— Que sejam lotados nesses serviços, enfermeiros em número suficiente e com habilidade para desenvolver essa atividade;

— Que serviços dessa natureza desenvolvidos em Instituições, sejam divulgados a fim de possibilitar intercâmbio de experiências, com vistas e acertos, e, cada vez mais, propiciar o posicionamento do enfermeiro na equipe de saúde.

  • ARAUJO, E.C. - Assistência de enfermagem a pacientes externos. Rev. Bras. Enf.; DF, 32 : 385-395, 1979.
  • *
    Tema livre — XXXI CBEn — Fortaleza - Ceeará — 1979.
  • Os grifos são da autora do presente trabalho.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 1979
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