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POR QUE PESQUISA EM ENFERMAGEM

Um dos tópicos mais discutidos em enfermagem atualmente é o assunto de pesquisa. O que é pesquisa em enfermagem e qual é a sua importância?

A fim de responder estas questões, talvez seja melhor, antes de tudo, considerar o que é pesquisa em geral ...

O que é pesquisa?

“Pesquisa pode ser definida como uma investigação sistemática para acrescentar ao saber corrente um conhecimento que seja comunicável e verificável”11 - MACDONALD, M. E. - Social work research: a perspective. (In: POLANSKY, N., ed. Social research. Chicago, University of Chicago Press, 1960. p. 1).. É o uso de métodos padronizados na busca do conhecimento22 - GREENWOOD, E. - Social work research: a decade of reppraisal. Social Work Review, 31: 312, sep. 1957. Assim, pesquisa é uma forma específica de procura de conhecimentos, conduzia segundo princípios lógicos.

É a “resposta a questões pela aplicação de métodos científicos”33 - SELLTIZ, C. [and others] - Research methods in social relation. New York, Henry Holt, 1959. p. 2..

Portanto, a pesquisa sempre se inicia a partir de uma pergunta ou de um problema qualquer. Por exemplo, considerando-se um fenômeno, deseja-se saber quais os fatos que o constituem para então descrevê-lo; pode-se perguntar a razão daquele fenômeno, ou seja, a sua “causa”, bem como suas consequências, isto é, seus “efeitos”, ou comparar dois fenômenos em relação a um terceiro.

Qualquer questão pode ser objeto de investigação científica, desde que obedeça a uma característica: deve ser tal que a observação ou a experimentação no mundo natural, que é a realidade empírica, forneça os dados necessários para a obtenção de uma resposta. Questões envolvendo julgamento de valores, tais como certo ou errado, bom ou ruim, objetivo e propósito são impróprias para o método de pesquisa; não podem se respondidas tão somente na base de informações de fatos porque dependem, pelo menos em parte, de uma decisão pessoal desse valor. Um exmplo de tal tipo de pergunta é: “Qual é a côr mais bonita, azul ou verde? Certamente não há fatos observados na natureza que possam responder a essa pergunta; "gosto não se discute”. Um outro exemplo envolvendo questões de valores seria: “Qual é o objetivo da enfermagem”? Uma pesquisa sobre esse assunto pode retratar o que um certo grupo, como por exemplo o das enfermeiras de São Paulo, pensa ser o objetivo da enfermagem, mas nunca será a resposta à questão geral “qual é o objetivo da Enfermagem"; isto porque as informações obtidas pela pesquisa não são baseadas somente no mundo natural. Dentro do vasto campo do bem estar social e da saúde, os limites da área de Enfermagem, como os de todas as áreas que compõem o bem estar social (medicina, enfermagem, serviço social, etc.) são estabelecidos pelo homem, como divisões mais ou menos arbitrárias de um todo, com muita superposição de funções, cujo estudo requer julgamento de valores wmente obst1rvação do mundo natural.

As questões envolvendo julgamento de valores podem ser pesquisadas até o ponto em que possam ser desdobradas, de modo a que os elementos implícitos (relacionados a fatos e não a valores) sejam tornados explícitos. Estes é que devem ser estudados. Por exemplo: se alguém tentasse examinar a rotina hospitalar de tomada de temperatura, pulso e respiração e peguntar “Qual deveria ser a rotina de TPR nesta inistituição ou serviço?”44 - GARCIA, L. [e] DAVIS, P. - A rotina hospitalar do TPR e seu papel em bons e eficientes cuidados de enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem, 19 (4): 303-319, ago. 1966. poder-se-ia desdobrar a questão “de valor” nas seguintes questões “de fato”.

  • - Qual é a atual rotina de TPR, tal como é descrita no manual, de rotinas?

  • - Qual é a atual rotina de TPR, tal como é desempenhada: Quando é executada?

    Como é executada?

    Quão precisa ela é quanto aos seguintes elementos de precisão: material usado, desempenho da técnica, anotações no prontuário?

  • - Qual é o padrão gorai dos índices de temperatura em cada unidade?

    quantas elevações de temperatura?

    quantos graus de elevação?

    quando as alterações ocorrem?

    em que pacientes (diagnóstico, tempo de permanência, etc.) poderia esta alteração de temperatura ser conhecida de alguma outra forma?

  • - Quais são os canais de comunicação usados para relatar as alterações de temperaturas?

    Estas informações são relatadas, por quem, para quem, como e quando?

    Como é tal informação usada, que reação resulta dela, por quem, por ordem de quem, quando, em que casos?

  • - Qual é o custo da rotina atual? (material usado, tempo gasto em todas as fases e por que tipo de pessoal)

  • - O que estas pessoas consideram ser a rotina preferível para sua Unidade? Por que?

Com base em tais informações e examinando a literatura dos conhecimentos científicos atuais com o TPR, a enfermeira estaria preparada para se reunir aos demais profissionais da saúde envolvidos, neste caso médicos, a fim de, realisticamente, considerar a rotina atual de TPR à luz das metas e dos propósitos estabelecidos para esta rotina, e determinar que modificações, se for o caso, são indicadas para responder à questão “Qual deve ser a atual rotina de TPR deste serviço ou instituição?”

Em resumo, podemos dizer que a finalidade da pesquisa é responder a perguntas. Qualquer pergunta fomulada ou qualquer problema, colocado de forma a que observações ou experimentação no mundo natural possam prover a informação necessária é legítima preocupação de pesquisa. Independentemente dos objetivos imediatos de cada pesquisa, a finalidade desta é adicionaJr algo mais ao conhecimento já à disposição do homem.

Trataremos agora de outra parte de nossa definição: “Pesquisa é a procura de respostas por meio de métodos científicos” Uma assertiva essêncial da perspectiva científica é que há uma ordem básica na natutlza e que esta ordem pode ser descoberta e compreendida. Por ordem na natureza quer-se dizer que há regularidade nos arranjos e sequências que fundamenta e governam as relações físicas, biológicas e sociais de objetos e acontecimentos, sendo eles relacionados entre si. Exemplos: as reações da criança hospitalizada diante da “perda’ de seus pais; os padrões de guerra das formigas; as reações da parturiente na situação de “stress” durante o parto; os efeitos do sono insuficiente sobre a faculdade de julgamento do indivíduo; as reações do átomo no bombardeamento nuclear, o ciclo vital da borboleta. A partir desta ordem básica fundamental e de sua descoberta e verificação, emergem leis, conceitos, e teorias do conhecimento científicos 55 - JORNSON, D. - Theory in nursing: borrowed and unique. Nursing Research, 17 (3): 207, may-jun., 1968..

A metodologia científica ou de pesquisa foi desenvolvida como proteção contra o erro, nas tentativas de descoberta e verificação desta ordem na natureza; foi e continua a ser desenvolvida a fim. de que seja aumentada a probabilidade de as informações recolhidas, serem:

  1. da mais alta qualidade possível, isto é, relevantes, exatas e sem viez (“bias”)* * "sem viez " : não dirigida ; coleta de dados feita de forma a que nenhuma resposta alternativa à questão seja favorecida. ;

  2. utilizadas das mais extensa e completa maneira, para delas se extrairem conclusões e recomendações a respeito da, questão formulada. A metodologia de pesquisa não diz ao pesquisador como iniciar, o que faz a seguir ou a que conclusões chegar; oferece, porém, linhas mestras, sugestões, e técnicas para as várias fases de uma especulação científica, incluindo:

  1. a formulação do problema de tal forma a poder ser sujeito a rigorosos testes;

  2. a forma (exploratória, descritiva, ou experimental) e a estratégia lógica do estudo (seus métodos e como executá-los) ;

  3. a seleção da amostra;

  4. desenvolvimento dos instrumentos de medida;

  5. o controle das observações na fase da coleta de dados, de forma tal que as informações recolhidas sejam de fato relevantes, exatas e sem viez;

  6. análises, por meio de métodos de estatística descritiva* * "sem viez " : não dirigida ; coleta de dados feita de forma a que nenhuma resposta alternativa à questão seja favorecida. , das informações obtidas a fim de descrever a amostra estudada;

  7. interpretação desses dados por meio de métodos interferenciais** ** Alguns dos métodos mais conhecidos de estatistica descrita incluem: - descrição por categoria - tabelas e gráficos de distribuição de frequência; - descrição pos abstração : - tendência central (médio, mediana, módulo); - variabilidade (extensão, variância e desvio padrão); - descrição pitórica por associação - associação linear, associação, curvilínea, independência; - descrição numérica de associação - coeficiente de correlação, momento de produto de correlação, nivel de diferença de correlação, relação de correlação, etc. , a fim de se aplicar essa descrição da amostra para um grupo maior (a população) ;

  8. conclusões e recomendações.

O objetivo ou propósito da pesquisa é, então, o de adicionar ou contribuir algo ao conhecimento corrente. Já que a pesquisa representa sempre uma jornada no desconhecido, pode ser que este desejo seja irrealizável. “Pesquisa é orientada na direção da procura de respostas, que podem ou não ser encontradas”6. Todos os métodos que têm sido e continuam a ser desenvolvidos para a proteção contra o erro não garantem os resultados. “Em outras palavras, os métodos protegem contra a obtenção de respostas erradas, mas não asseguram o encontro de respostas certas. Em verdade, a arte da investigação científica consiste em fazer a pergunta certa ou em testar a hipótese correta. Por pergunta “certa” quer-se dizer, simplesmente, aquela que leva à respostas úteis, ou respostas que adicionam algo ao saber””77 - MACDONALD, M. E. - Social work research: a perspective. (In: POLANSKY, N., ed. Social research. Chicago, University of Chicago Press, 1960. p. 2)..

Por que pesquisa em enfermagem

Por que pesquisa é importante em enfermagem? Enfermagem como profissão é repleta de questões importantes.

Para ser eficiente, para se desenvolver, até para manter sua posição como uma profissão a enfermagem precisa responder a essas questões. Enquanto o atual objetivo de enfermagem está ainda em processo de definição, pelo menos na prática, parece ser o consenso entre os vários membros do campo de saúde, incluindo a própria enfermeira, e a sociedade a que serve, de que são funções da enfermeira ajudar o paciente a satisfazer adequadamente qualquer necessidade que afete o seu estado de saúde e possibilitar a aplicação das prescrições médicas para sobrepujar a doença e manter a saúde”88 - WIEDENBACH, E. - Clínical nursing: a helping art. New York, Springer, 1964. Naturalmente, dependendo da situação e dos recursos disponíveis, pode haver outras pessoas tais como assistente social, nutricionista, educador sanitário, técnico de enfermagem, auxiliar de enfermagem, atendente, escriturária, pessoal de limpeza, voluntária, etc. capazes de ajudar o paciente em todas ou algumas destas necessidades; mas, mesmo quando a enfermeira não dá, ela mesma, completa assistência, certamente é sua a responsabilidade geral por essas assistência.

Na situação em que se encontra hoje a sociedade, com problemas de saúde maiores que os recursos disponíveis a enfermeira, em seu trabalho, está colocada numa situação cada vez mais difícil, pois, na realidade, dentro dos amplos limites do exercício da profissão, estão incluídas todas as funções envolvidas na cura da doença e na manutenção da saúde, com exceção de diagnóstico e prescrição médica. A enfermeira não somente continua a ser responsável por aquelas áreas tradicionais da profissão, relacionados a medicação, tratamento, vigilância do estado do paciente, higiene geral e bem estar, educação sanitária, manutenção de prontuários e responsabilidade pelo andamento gelral do serviço; como, também, está sendo responsável por novas funções; estas funções que aumentaram continuamente e são frequentemente muito complexas, resultantes dos avanços de novos métodos de diagnóstico e tratamento (por exemplo, cuidados do paciente de cirurgia cardíaca), bem como uma ampla área relativamente nova de prevenção. Além disso, os recentes avanços nas ciências sociais e nas ciências do comportamento humano têm colocado todas essas funções sob uma nova luz, em que as necessidades do paciente, nestas áreas de enfermagem e medicina, são agora reconhecidas como bem mais extensas e complicadas do que previamente se pensava. O homem é um sistema muito complexo de componentes interrelacionados e interdependentes, em que qualquer distúrbio, tal como a doença, afeta o todo e cada parte do todo, do mesmo modo que o todo e seus componentes ? afetam o distúrbio e sua evolução. Do que, realmente, necessitam os pacientes e como ajudá-los a satisfazer estas necessidades? É justamente para esta problemática que a enfermagem precisa encontrar respostas.

O que acontece se a enfermeira não procura tais respostas? Se ela não faz um esforço para ter em sua mente uma idéia clara do que deveria tentar conseguir, numa dada situação, e de como conseguí-la? Se ela não reexamina todas as suas atividades, planejadas em termos destas questões? Ela poderá facilmente acordar um dia e descobrir que deu o melhor de si para levar as várias rotinas consideradas “necessárias" num dia de trabalho, mas nem sempre atualizadas; que muitas vezes, ao executar um trabalho, prendeu-se a mil e um detalhes desnecessários que estavam no seu caminho; como por exemplo, guardar prontuário encontrado, procurar uma amostra gratis de medicamento, etc.; e que, no entanto, deixou de dar atenção a problemas sérios, que requeram assistência de enfermagem, tais como: a mãe preocupada ainda não sabe, depois de quatro visitas à clínica, em que tempo e qual medicamento ela deve dar ao seu filho; a Criança pequena, que se introverteu completamente depois de sua rebelião inicial, motivada pela ausência dos pais, continua introvertida; a mãe inexperiente, procurando dar de mamar ao seio para seu bebê ainda não teve sucesso; a velhinha que mora sozinha continua a retornar à clínica com curativo da semana anterior, embora devesse tê-lo trocado diariamente.

A enfermagem precisa, consciente e continuamente, procurar respostas a questões básicas da profissão.

Quais são os objetivos e os limites da profissão da enfermagem? Com base nestes objetivos, quais são as necessidades de uma determinada população em uma situação específica? Quais são os indicadores dessas necessidades? Como podem ser resolvidas?

A fim de ser eficiente a enfermeira necessita saber o que precisa realmente ser feito e como fazê-lo, decida ela delegar uma função a outra pessoa, exercê-la ela mesma, ou adiá-la para ocasião mais conveniente.

Na verdade, enfermagem não está completamente sem resposta a estas questões. Elas existem nas páginas da literatura de enfermagem, nos livros de textos, nos manuais de rotina, nos cuidados intuitivos feitos por dedicadas enfermeiras e, mais recentemente, nas pesquisas de enfermagem e nas ciências sociais. Algumas dessas respostas já foram bem testadas pelo tempo, enquanto outras, ainda muito pouco. Raramente, entaetanto, são estas informações (teoria) apresentadas em forma sucinta e testadas (métodos de pesquisa) de maneira rigorosa, a fim de se determinar o que é realmente válido e o que não é; não podem, pois, todas enfermeiras usar este conhecimento em suas atividades profisionais, estejam elas dando assistência, supervisionando ou ensinando outras pessoas a dá-la. Muitas decisões relacionadas à prática da enfermagem foram tomadas porqque parecem ser o melhor caminho para se fazer o trabalho, tendo em vista os recursos disponíveis de tempo, dinheiro, pessoal, equipamento, etc. Tais considerações são fatores necessários, a fim de se determinar quanto e como um certo objetivo pode ser realizado, mas, a menos que haja uma tentativa sistemática de estudar os problemas, os julgamentos serão feitos e as conclusões tiradas com base em observações e decisões que são frequentemente pouco acuradas ou exatas.

Sabendo que um fator importante no tratamento da criança, com uma determinada doença, é que ela recebe a dose adequada de medicamento, na hora certa, e julgando que um minuto e meio será tempo suficiente para ela explicar e a mãe entender, como e quando o medicamento devará ser ministrado, ela poderá decidir usar este tempo para dar explicações à mãe; pode entretanto acontecer que o médico já tenha dado a explicação e a mãe já tenha entendido; neste caso o tempo será demais para o fim a que ela se propôs; pode também acontecer que a mãe não esteja em condição de atender qualquer explicação e que precise ter as instruções por escrito para tê-las mais tarde; neste caso ela podetrá utilizar o seu tempo providenciando que a ordem seja dada por escrito. Pode ser que esta inabilidade para compreender e reter uma explicação seja característica somente das mães apreensivas. Assim sendo, quais são as indicações pelas quais a enfermeira reconhece que uma pessoa está apreensiva? A enfermera pode tão somente basear suas decisões nos conhecimentos que possui; sem estudar as questões pertinentes a seu trabalho, tais conhecimentos poderão ser incompletos e este trabalho poderá ser inútil.

A função primária da pesquisa de enfermagem é, pois, ajudar no desenvolvimento de guias ou fórmulas para a prática de enfermagem (teorias e conhecimentos científicos de enfermagem), mais articulados e testados, que permitirão à enfermeira alterar a realidade na direção desejada, isto é, obter o que ela planejou, numa determinada situação. Pesquisa nunca pode apresentar uma fórmula ou teoria; é uma invenção da pessoa e oriunda de seus pensamentos e observações; mas a pesquisa atua como um estimulante para a invenção da teoria, sendo também um meio principal pelo qual a mesma, uma vez inventada, pode ser testada na realidade, a fim de se avaliar a sua eficiência”99 - DICKOFF, J. [and] JAMES, P. - Researching research's role in theory development. Nursing Research, 17 (3): 204-206, mai-jun., 1963..

A pesquisa não é contudo, o único meio para testar ou estimular a teoria; a prática profissional também consegue tal objetivo. Qual é então a diferença entre as duas? Embora ambas, pesquisa e prática, sejam atividades planejadas, que se realizam no presente, com o mesmo objetivo de ajudar o paciente, a pesquisa tende a ser mais formal do que a prática.

O objetivo imediato ou a maneira pela qual a pesquisa realiza esse objetivo geral é o de examinar o material apresentado e testá-lo, à luz de suas pretenções, para produzir conhecimentos sobre cuidados de enfermagem; portanto, o plano é preconcebido e objetivamente designado para se ter em consideração e para controlar, tanto quanto possível, as variáveis pertinentes, existentes na situação de teste, a fim de proteger os resultados contra possíveis erros. Para o início de seu trabalho, o pesquisador procura inspiração onde quiser, seja nos resultados de outras pesquisas, seja no trabalho profissional, ou mesmo na experiência quotidiana. Até a fase de tirar conclusões e fazer recomendações, sua contribuição pessoal deverá ser somente na descoberta de novos caminhos, isto é, tendo determinado e comunicado seu método, seus dados deverão ser repetidos por qualquor pessoa que diligentemente siga seu plano de trabalho.

Por outro lado, a prática de campo, embora sendo uma atividade planejada, tem como objetivo imediato não a coleta de novos conhecimentos mas sim exercício de uma atividade, a fim de efetivamente ajudar o paciente; portanto, esta prática poderia e deveria, se necessário, alterar a c1rientação planejada a fim de conseguir seu objetivo imediato. Havendo, geralmente, menos esforços conscientes, por parte da enfermeira praticante, de identificar e considerar as variáveis pertinentes que estão em jogo no momento, é provável que fatores relacionados à situação e que nela atuam possam passar despercebidos, daí resultando uma avaliação menos exata da sua atividade e de seus resultados.

Nós podemos dizer, então, que tanto a pesquisa quanto a prática de campo serve como estimulante e como meio de teste de teorias ou planos de ação de enfermagem; mas que a pesquisa é um instrumento mais delicado.

Pesquisa é um instrumento para aparar as arestas de uma amostra ou testar as impurezas desta, ou investigar possíveis fontes de riqueza, como se se tratasse da amostra de um mineíral; isto, porém, depois que outro instrumento mais grosseiro porém igualmente eficiente, do ponto de vista prático, já tenha cavado e encontrado a amostra. Em enfermagem, a sabedoria prática da enfermeira pode ser esse mecanismo empírico mas igualmente essencial”99 - DICKOFF, J. [and] JAMES, P. - Researching research's role in theory development. Nursing Research, 17 (3): 204-206, mai-jun., 1963.. Teoria, oriunda da prática, é testada e refinada pela pesquisa, a fim de ser dirigida de novo à prática, possibilitando melhor assistência ao paciente”1010 - DICKOFF, J. [and others] - A theory of theories: a position paper. Nursing Research, 17 (3): 297, mai-jun., 1968..

Concluindo, podemos sumarizar nossas observações relacionadas com o lugar da pesquisa em enfermagem ou porque pesquisa em enfermagem, lembrando o conto da centopeia, encontrado no livro de Lazarsfeld”1111 - LAZARDSFELD, P. [and] ROSENBERG, M. The language of social research. GlenCoe, Free Press, 1955. p. 1. sobre métodos de pesquisa:

“Há uma história muito conhecida sobre a centopeia que perdeu sua habilidade de andar quando lhe foi perguntado em que ordem ela movia seus pés. Outros detalhes da história, entretanto, são sepultados em silêncio conspiratório. Antes de mais nada, não há menção do fato de que a pergunta tenha vindo de uma pessoa (pesquisador) que queria melhorar a eficiencia de caminhar da comunidade centípede. Também pequena atenção foi dada às outras centopeias que participaram da investigação; nem todas reagiram com efeitos tão desastrosos; algumas foram capazes de dar até respostas bem razoáveis. A partir destas, o investigador trabalhou diligentemente palra chegar aos princípios gerais de comportamento do andar das centopeias.

Quando o pesquisador finalmente publicou os achados, houve uma crítica generalizada de que ele tinha somente relatado fatos que todo o mundo conhecia. Entretanto, formulando estes conhecimentos claramente e adicionando fatos não anteriormente observados, a centopeia média da comunidade foi, eventualmente, capaz de caminhar melhor, porque, depois de uma geração estes conhecimentos foram incorporados a livros de texto e assim ficaram disponiveis para estudantes de um menor nível de conhecimentos. Em retrospecto, este foi o resultado mais notável. Certamente a grande bailarina centípede e outras artistas creativas do andar continuam a depender de seus at1ributos hereditários (em enfermagem nós diríamos compreensão intuitiva) que não podem ser produzidas pelo sistema escolar; mas, o nível geral de caminhar, caracteristico dos centípedes, foi melhorado e aqueles indivíduos com talento excepcional já começaram em nível mais alto e conseguiram relizações criativas não igualadas no passado”.

  • Artigo Transcrito da Rev. da Esc. de Enf. da USP, 4 (1-2) : 41-53 mar-set. 1970.
  • *
    "sem viez " : não dirigida ; coleta de dados feita de forma a que nenhuma resposta alternativa à questão seja favorecida.
  • **
    Alguns dos métodos mais conhecidos de estatistica descrita incluem:
    - descrição por categoria - tabelas e gráficos de distribuição de frequência;
    - descrição pos abstração :
    - tendência central (médio, mediana, módulo);
    - variabilidade (extensão, variância e desvio padrão);
    - descrição pitórica por associação - associação linear, associação, curvilínea, independência;
    - descrição numérica de associação - coeficiente de correlação, momento de produto de correlação, nivel de diferença de correlação, relação de correlação, etc.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • 1
    - MACDONALD, M. E. - Social work research: a perspective. (In: POLANSKY, N., ed. Social research. Chicago, University of Chicago Press, 1960. p. 1).
  • 2
    - GREENWOOD, E. - Social work research: a decade of reppraisal. Social Work Review, 31: 312, sep. 1957.
  • 3
    - SELLTIZ, C. [and others] - Research methods in social relation. New York, Henry Holt, 1959. p. 2.
  • 4
    - GARCIA, L. [e] DAVIS, P. - A rotina hospitalar do TPR e seu papel em bons e eficientes cuidados de enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem, 19 (4): 303-319, ago. 1966.
  • 5
    - JORNSON, D. - Theory in nursing: borrowed and unique. Nursing Research, 17 (3): 207, may-jun., 1968.
  • 6
    - SELTTIZ, C. [and others] - Research methods in social relations., New York, Henry Holt 1959. p. 4.
  • 7
    - MACDONALD, M. E. - Social work research: a perspective. (In: POLANSKY, N., ed. Social research. Chicago, University of Chicago Press, 1960. p. 2).
  • 8
    - WIEDENBACH, E. - Clínical nursing: a helping art. New York, Springer, 1964.
  • 9
    - DICKOFF, J. [and] JAMES, P. - Researching research's role in theory development. Nursing Research, 17 (3): 204-206, mai-jun., 1963.
  • 10
    - DICKOFF, J. [and others] - A theory of theories: a position paper. Nursing Research, 17 (3): 297, mai-jun., 1968.
  • 11
    - LAZARDSFELD, P. [and] ROSENBERG, M. The language of social research. GlenCoe, Free Press, 1955. p. 1.
  • 12
    - DICKOFF, J. [and others] - Pratice oriented research. Nursing Research, 17 (6): 545, nov.-dez., 1968.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 1973
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