Conhecimento de enfermeiros responsáveis técnicos sobre competências gerenciais: um estudo qualitativo

RESUMO

Objetivo:

Identificar o conhecimento de enfermeiros responsáveis técnicos com relação às competências gerais e gerenciais necessárias para exercer esta função.

Método:

Estudo de caso qualitativo realizado com 14 enfermeiros. As entrevistas semiestruturadas foram gravadas e os dados analisados por meio da análise temática de conteúdo.

Resultados:

Duas categorias destacaram-se: Principais competências para se exercer o cargo de responsável técnico: liderança, relacionamento interpessoal e visão sistêmica e Desenvolvendo as competências: dissociação entre teoria e prática.

Considerações finais:

O fato de apenas três competências terem sido reconhecidas como necessárias para o exercício da função de responsável técnico e a percepção dos entrevistados sobre a dissociação entre teoria e prática, durante a graduação, devem ser exploradas pelas instituições de ensino e saúde, pois para exercer esse cargo, o enfermeiro deve desenvolver as competências técnico-científica, socioeducativa e ético-política, para poder conduzir à organização a resultados positivos.

Descritores:
Conhecimento; Enfermeiros; Enfermeiros Administradores; Competência Profissional; Administração de Serviços de Saúde

ABSTRACT

Objective:

To identify the knowledge of responsible technical nurses in relation to the general and management skills required to perform this function.

Method:

Qualitative case study with 14 nurses. The semi-structured interviews were recorded and the data analyzed through the thematic content analysis.

Results:

Two categories stood out: Main Responsibilities for the Position of Technical Manager: Leadership, Interpersonal Relationship and Systemic view; and Developing Skills: Dissociation between Theory and Practice.

Final considerations:

The fact that only three skills have been recognized as necessary for the exercise of the function of technical leader and the perception of the interviewees about the dissociation between theory and practice during graduation should be explored by the teaching and health institutions, because to exercise this nurses must develop the technical-scientific, socio-educational and ethical-political skills to be able to lead the organization to positive results..

Descriptors:
Knowledge; Nurses; Administrative Nurses; Professional Competence; Health Services Administration

RESUMEN

Objetivo:

Identificar el conocimiento de enfermeros responsables técnicos con relación a las competencias generales y gerenciales necesarias para ejercer esta función.

Método:

Estudio de caso cualitativo realizado con 14 enfermeros. Las entrevistas semiestructuradas fueron grabadas y los datos analizados por medio del análisis temático de contenido.

Resultados:

Dos categorías se destacaron: Principales competencias para ejercer el cargo de responsable técnico: Liderazgo, relación interpersonal y visión sistémica; y Desarrollando las competencias: Disociación entre teoría y práctica.

Consideraciones finales:

El hecho de que sólo tres competencias hayan sido reconocidas como necesarias para el ejercicio de la función de responsable técnico y la percepción de los entrevistados sobre la disociación entre teoría y práctica durante la graduación, deben ser explotadas por las instituciones de enseñanza y salud, pues para ejercer ese papel el enfermero debe desarrollar las competencias técnico-científicas, socioeducativas y ético-políticas, para poder conducir a la organización a resultados positivos.

Descriptores:
Conocimiento; Enfermeras; Enfermeros Administradores; Competencia Profesional; Administración de los Servicios de Salud

INTRODUÇÃO

A globalização, a incorporação de novas tecnologias e a busca pela qualidade dos serviços têm ocasionado importantes transformações nos processos de trabalhos das instituições de cuidado à saúde⁽¹⁾.

Considerando que para atuar nesse mercado exigente e competitivo é fundamental que os profissionais aprimorem suas competências para garantir uma assistência segura aos usuários⁽²⁾ e que dentro das instituições hospitalares a equipe de enfermagem está envolvida diretamente com a maioria das ações de cuidado à saúde⁽¹⁾, o Ministério da Educação definiu as competências que um estudante de graduação em enfermagem deve desenvolver ao longo do curso.

Por competência entende-se um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes que possibilitam a transformação positiva dos resultados^(3-4). As seis competências gerais descritas nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) compreendem: atenção à saúde; tomada de decisão; comunicação; liderança; administração e gerenciamento; e, educação permanente⁽⁵⁾.

Autores demonstram que a primeira competência a ser adquirida pelo enfermeiro é a técnico-científica, descrita como atenção à saúde nas DCN, na qual os profissionais desenvolvem ações de prevenção, promoção, proteção e reabilitação da saúde, em nível individual e coletivo, baseadas em evidências científicas^(2,5-6).

Em um segundo momento, deve ser desenvolvida a competência socioeducativa⁽⁶⁾, descrita como educação permanente nas DCN, ou seja, caracteriza a capacidade dos profissionais aprimorarem e compartilharem seus conhecimentos continuamente com o intuito de proporcionar benefícios para os demais profissionais e instituições⁽⁵⁾.

A terceira e talvez a mais desafiadora competência a ser desenvolvida pelo enfermeiro é a ético-política, que consiste na capacidade do profissional em construir processos de trabalho coletivos; gerenciar conflitos e tomar decisões compartilhadas e éticas, de forma solidária. Para isso, o enfermeiro deve incorporar no seu cotidiano de trabalho competências além das já descritas anteriormente, como: tomada de decisão, comunicação, liderança e, administração e gerenciamento⁽⁵⁾.

A exigência do desenvolvimento dessas competências é fundamental, pois cabe ao enfermeiro exercer, dentre outras atividades, a supervisão das atividades realizadas por técnicos e auxiliares de enfermagem e a organização e direção dos serviços de enfermagem que estão amparadas pela legislação que regulamenta o exercício da profissão⁽⁷⁾.

A direção do serviço de enfermagem implica na posse de uma Certidão de Responsabilidade Técnica, que configura o enfermeiro responsável técnico (RT) como interlocutor entre a instituição e o Conselho Regional de Enfermagem (COREN)⁽⁸⁾.

Além de interlocutor, o RT deve assegurar assistência de enfermagem ética e segura⁽⁸⁾, integrar as áreas assistenciais, administrativas, de ensino e pesquisa e por isso, deve conhecer a interação dos processos organizacionais para contribuir com o sucesso dos resultados da instituição⁽⁹⁾. Frente tamanha responsabilidade, espera-se que um RT seja competente nas três esferas descritas anteriormente: técnico-científica, socioeducativa e ético-política.

Considerando que o RT deve possuir competências além das descritas nas DCN, o COREN do Estado de São Paulo (SP) desenvolveu um projeto que mapeou 11 competências necessárias à atuação do enfermeiro RT. Três são comuns às DCN (liderança, comunicação, tomada de decisão) e as demais incluem: negociação, trabalho em equipe, relacionamento interpessoal, flexibilidade, empreendedorismo, criatividade, visão sistêmica e, planejamento e organização⁽¹⁰⁾. Esse conjunto de competências é um reflexo das necessidades da inter-relação da complexidade das atividades desenvolvidas por estes profissionais, demandas sociais e legais.

A identificação do conhecimento dos RT com relação às competências necessárias ao exercício do cargo, poderá contribuir para a implementação de estratégias no ensino e nos serviços onde os profissionais atuam, podendo impactar positivamente na assistência de enfermagem prestada pelos profissionais e instituições.

OBJETIVO

Identificar o conhecimento de enfermeiros responsáveis técnicos com relação às competências gerais e gerenciais necessárias para se exercer esta função.

MÉTODO

Aspectos éticos

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e foi conduzida de acordo com os padrões que regulamentam as pesquisas envolvendo seres humanos. Para garantir o anonimato, os participantes do estudo foram nomeados pela letra E, correspondente a enfermeiro, seguida pelo número da entrevista.

Tipo de Estudo

Trata-se de um estudo de caso qualitativo simples, que consiste na investigação de um fenômeno e sua relação com o contexto de vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não são claramente evidentes⁽¹¹⁾.

Cenário de estudo

Foi realizado em 14 hospitais de médio e grande porte, selecionados por conveniência, localizados em cinco municípios da região sul do Estado de Minas Gerais, sendo 10 privados e quatro públicos.

Fonte de dados

Cada hospital selecionado possuía um único RT e somente um dentre os 15, não foi incluído no estudo, pois os responsáveis pela instituição não autorizaram a coleta de dados. Para composição da amostra de 14 profissionais foram considerados os seguintes critérios de inclusão: ser enfermeiro RT e atuar na instituição há mais de seis meses.

Coleta e organização dos dados

Realizou-se a coleta de dados entre os meses de março e julho de 2015. Elaborou-se um roteiro baseado na literatura científica contendo questões sociodemográficas (sexo, idade, formação profissional e tempo de experiência) e as demais tiveram por objetivo nortear a entrevista semiestruturada, a saber: quais as competências gerenciais necessárias para se exercer o cargo de enfermeiro RT? Essas competências foram adquiridas durante o curso de graduação em enfermagem?

O roteiro foi previamente avaliado por dois pesquisadores da área de administração em enfermagem. Realizou-se o pré-teste com dois enfermeiros RT vinculados a instituições não selecionadas para a condução do estudo. Para a coleta de dados, as entrevistas foram agendadas com os RT e o entrevistador dirigiu-se às instituições de saúde. Previamente a realização da mesma, apresentou-se o objetivo do estudo e obteve-se assinatura do participante no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foi realizada uma única entrevista com cada participante, registrada em um gravador de voz e o tempo médio para realização das mesmas foi de, aproximadamente, 11 minutos. Ao término, os principais tópicos relatados foram validados entre a pesquisadora e o entrevistado com o intuito de garantir a qualidade dos dados coletados.

Análise dos dados

Os dados foram analisados por meio da análise temática de conteúdo que consistiu na leitura flutuante, constituição do corpus, formulação e reformulação de hipóteses e objetivos, exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e interpretação⁽¹²⁾.

RESULTADOS

Os 14 enfermeiros que exerciam o cargo de RT eram predominantemente do sexo feminino (92,9%), a faixa etária variou entre 20 e 50 anos, sendo que sete (50%) profissionais possuíam entre 31 e 40 anos de idade. Quanto à formação, 14 (100%) profissionais possuíam cursos de pós-graduação Lato ou Stricto sensu, sendo dez (71,4%) especialistas e quatro (28,6%) mestres. A maioria (64,2%) possuía entre um e cinco anos de formação, com variação entre um e 20 anos.

A fim de atingir o objetivo da investigação, após leitura exaustiva dos dados coletados, duas categorias foram elencadas: a primeira refere-se ao agrupamento das competências identificadas pelos RT como necessárias à sua atuação profissional e a segunda, está relacionada com o relato dos participantes sobre a dissociação entre a teoria e a prática, no que se refere ao desenvolvimento dessas competências, ou seja, a prática e a experiência profissional como formas de aprendizado.

Principais competências para se exercer o cargo de responsável técnico: liderança, relacionamento interpessoal e visão sistêmica

Considerando as competências descritas pelas DCN e pelo COREN/SP foi possível identificar, a partir da fala dos participantes, apenas três competências como sendo necessárias à prática do enfermeiro RT: "liderança", "relacionamento interpessoal" e "visão sistêmica". Essas competências foram nomeadas considerando que cada competência elencada possui uma definição operacional seguida por ações norteadoras, ou seja, ações que refletem a prática da competência descrita⁽¹⁰⁾.

Na fala de E5, percebe-se a presença da competência "liderança"^(5,10) quando é descrita a necessidade do RT possuir conhecimento técnico científico⁽¹⁰⁾; da competência "visão sistêmica", caracterizada pela capacidade em compreender a totalidade da instituição e a relação existente entre as partes e a competência "relacionamento interpessoal", definida como a capacidade de agregar e interagir com pessoas de forma cordial e profissional, com o objetivo de proporcionar um ambiente favorável ao desenvolvimento das atividades⁽¹⁰⁾:

Há o conhecimento técnico cientifico, e uma visão geral, de parte da gestão, é ter a parte de relacionamento né, acho que é fundamental, [...]. (E5)

Durante a entrevista, E12 demonstra a necessidade do enfermeiro RT possuir as competências "liderança"^(5,10) e "relacionamento interpessoal"⁽¹⁰⁾, expressas por meio de ações como a promoção e o estímulo à cooperação entre as equipes interdisciplinares e multiprofissionais e desenvolvimento da capacidade de ser acessível, respeitar e valorizar as diferenças individuais com o intuito de garantir um atendimento humanizado às pessoas⁽¹⁰⁾:

Uma questão fundamental pro RT, uma visão humanística [...] realmente essa de articulador, o RT ele é o articulador, se ele não tiver um bom relacionamento com todos os níveis né, de hierarquia, interna, dentro do hospital, se ele não tiver uma abordagem humanística, se ele não for verdadeiro, isso é notado. (E12)

Desenvolvendo as competências: dissociação entre teoria e prática

Essa categoria está relacionada com o fato de que os enfermeiros acreditam que as competências necessárias ao exercício do cargo, descritas na categoria anterior, não foram completamente desenvolvidas durante a graduação. Relataram que neste momento da formação existe uma dissociação entre o que se aprende na teoria e o que se vivencia nas atividades práticas e nos estágios. Além disso, foi possível perceber que devido a essa defasagem da formação, os profissionais acabam por aprimorar o desenvolvimento dessas competências na prática, ou seja, ao longo do exercício de suas atividades profissionais.

Na fala de E4, observou-se que um importante fator dificultador no desempenho da função está relacionado ao não desenvolvimento dessas competências durante o curso de graduação em enfermagem, pois existe uma dissociação entre a teoria e a prática:

[...] é bem assistencial, e a gente tinha aula de como fazer uma escala, mas nada de acompanhar um RT, um dia do RT, fazer um estágio com ele, isso não, a gente não teve esse contato. (E4)

Ao serem questionados a respeito do desenvolvimento das competências gerenciais, observou-se relatos que isso ocorreu ao longo do tempo, com a experiência profissional associada ao próprio desejo de buscar o conhecimento, como pode ser verificado na fala de um participante:

[...] Foi com o tempo mesmo, ninguém me pegou pela mão, ninguém me falou. É só assim, da gente buscar, da gente ir atrás, agora, vendo por esse lado, você é preparada? Pela escola não, pela vida [...]. (E2)

E9 relata a sua vivência profissional como forma de aprendizado, cita a teoria que lhe foi oferecida para aquisição de conhecimento científico, entretanto destaca que a habilidade e a atitude foram desenvolvidas durante o exercício do cargo:

[...] eu acho que isso vem de acordo com, com a vivência, tudo que a gente vivencia no ambiente, é a maturidade profissional ajuda muito, então, a graduação deu uma base pra eu colocar o pé, mas o resto partiu do próprio ambiente, das próprias pessoas pra te ajudar e ir pra frente, e você corre atrás também [...]. (E9)

E12 expressa em sua fala o despreparo oriundo da formação na graduação, no que se refere à aquisição de habilidades, apontando um exemplo comum na gestão pelo enfermeiro nos serviços de saúde:

É contraproducente, porque não me ensinou realmente, nem a gerir um serviço célula de unidade de internação, de jeito algum, é muito pobre a graduação, é muito insuficiente, e eu acho que pra falar a verdade a gente erra desde a graduação[...] como é que eu vou querer que o enfermeiro saiba fazer alguma convocação junto ao funcionário se ele não tem habilidade, ele não desenvolveu a competência. Ah, ele pode aprender, pode, é verdade, mas ele irá "ralar" muito pra isso[...]. (E12)

DISCUSSÃO

O perfil dos enfermeiros desta pesquisa em muito se assemelha a outro estudo realizado no município de São Paulo, onde a maioria dos participantes também era do sexo feminino e possuía algum curso de pós-graduação, demonstrando o cumprimento de um dever ético desses profissionais na busca da complementação da sua qualificação⁽¹³⁾.

Considerando a complexidade e a responsabilidade da função de enfermeiro RT, o ideal seria que o profissional selecionado para esta função estivesse preparado para exercê-la e um fato preocupante foi que a maioria dos participantes identificou apenas três competências, das inúmeras descritas pelo conselho que nos rege e também pelas DCN, como necessárias para o exercício da sua função.

A liderança foi a competência mais citada, seguida pelo relacionamento interpessoal e visão sistêmica. A liderança é classificada como a mais importante competência para o exercício da profissão e para exercê-la, é essencial que uma comunicação eficaz esteja presente quando se quer influenciar pessoas no alcance de objetivos comuns⁽¹⁴⁾.

Uma liderança forte contribui para o trabalho em equipe e, consequentemente, para a obtenção de melhores resultados, na medida em que diminui os conflitos, aumenta o envolvimento dos colaboradores nos processos de trabalho, melhora a utilização dos recursos e diminui a taxa de rotatividade⁽¹⁵⁾.

Um relacionamento interpessoal satisfatório envolve comunicação, autoconhecimento, empatia, cordialidade e ética, o que também contribui, significativamente, para o trabalho em equipe. O desenvolvimento dessa competência é extremamente complexo, considerando que o ser humano possui sentimentos que interferem no ambiente de trabalho e, por isso, o líder precisa, como disse E12, ser o "articulador", influenciar as partes envolvidas nos processos, com o intuito de tornar o convívio mais harmonioso possível e, dessa forma, alcançar os objetivos organizacionais^(15-16).

Com relação a terceira competência identifica pelos enfermeiros, atualmente, as instituições são interpretadas como uma soma de partes integrantes que dependem umas das outras, possuem objetivos em comum e interagem em um ambiente. Dessa forma, o agir individual não tem mais espaço e a visão sistêmica se faz cada vez mais necessária. Por isso, o líder com visão sistêmica deve possuir habilidades de negociação e saber gerenciar conflitos a fim de manter um bom relacionamento entre os membros da equipe⁽¹⁷⁾.

Um estudo realizado com gestores e gerentes de hospitais privados e acreditados classificou, por ordem de importância, as competências julgadas necessárias para o desempenho das atividades do gerente. Para ambos, a competência eleita como a mais importante foi a liderança. Em seguida, para os gestores, foram eleitos o trabalho em equipe e a tomada de decisão e para os gerentes, a visão estratégica e o trabalho em equipe. Nota-se semelhança desses resultados com os encontrados no presente estudo, onde a liderança e a visão sistêmica também foram importantes competências destacas para o desempenho da função⁽¹⁸⁾.

Foi possível notar que as três competências nomeadas pelos enfermeiros possuem uma estreita relação com inúmeras outras. A presença de uma, influencia diretamente no desempenho da outra. Entretanto, a falta de reconhecimento dessas outras competências pelos participantes nos faz refletir com relação aos critérios que estão sendo adotados para a seleção desses profissionais. Autoras relatam que a indicação foi o principal critério utilizado na seleção de gerentes de enfermagem, demonstrando que é o histórico de desempenho desse profissional dentro da instituição que contribuiu para sua ascensão. Reforçam ainda que as competências apresentadas pelo profissional até o momento da sua promoção podem ser muito diferentes das competências necessárias para o exercício de um novo cargo gerencial⁽¹³⁾. Portanto, destaca-se a importância em se utilizar avaliações de desempenho baseadas em competências e que utilizem instrumentos justos e claros, que possam, de fato, contribuir para o desenvolvimento profissional, para o alcance das metas organizacionais e sustentabilidade do sistema⁽¹⁹⁾.

Segundo os enfermeiros entrevistados, a graduação proporcionou uma sólida formação teórica, ou seja, proporcionou a aquisição do conhecimento dessas competências, porém não foi tão eficaz no que se refere ao desenvolvimento das habilidades e atitudes, que foram adquiridas somente durante o exercício da função.

Percebe-se uma contradição na fala dos participantes pois, considerando que as competências gerais apontadas pelas DCN devem ser parte integrante dos projetos pedagógicos dos cursos de graduação em enfermagem⁽⁵⁾ e que os participantes julgaram que receberam o conteúdo teórico necessário para atuação na função, por que então não souberam nomear as competências?

Uma das respostas possíveis à essa pergunta esteja no fato da amostra possuir participantes com 20 anos de formação e que, portanto, não vivenciaram essas diretrizes, entretanto, a maioria deveria ter tido contato com o tema, considerando que se formaram após a implementação da DCN e ocupam um cargo de extrema responsabilidade. Sabe-se que os projetos pedagógicos dos cursos de graduação em enfermagem devem estar alicerçados nos pressupostos constantes nas DCN. Entretanto, investigação aponta que alguns se furtam desta prática, o que suscita a reformulação e a reflexão da qualidade desses cursos, pois a idealização e o planejamento da formação profissional transcendem a postulação teórica e avança ao mercado de trabalho, influenciando a qualidade da formação e, consequentemente, da atuação do futuro profissional⁽¹³⁾.

Os Projetos Pedagógicos dos Cursos precisam estar vinculados ao Projeto Pedagógico da instituição de ensino, pois se ambos não refletirem os mesmos objetivos e continuarem empregando métodos fragmentados de ensino, deixando de transmitir o conhecimento de forma interprofissional e dissociando teoria e prática que, muitas vezes, não refletem a realidade do mercado de trabalho, o aluno terá dificuldades em sedimentar as relações fundamentais para a sua formação e futura atuação enquanto profissional⁽²⁰⁾.

Ao analisar a influência da graduação no preparo para a gerência em enfermagem os egressos de uma universidade pública, relataram dificuldades em perceber a dimensão gerencial nos seus processos de trabalho. Do mesmo modo relataram dificuldades em desenvolver competência gerencial em sua prática profissional⁽²¹⁾.

No contexto da formação do enfermeiro para o mundo do trabalho, sabe-se que o ensino da disciplina de administração em enfermagem é de relevância única na formação profissional para a atuação gerencial, nos diversos níveis de atenção à saúde⁽⁹⁾. Por outro lado, é conhecido que o ensino de competências gerenciais nos cursos de graduação não se trata de tarefa simples e, por isso, exige esforços permanentes, tanto de docentes quanto de estudantes⁽¹⁸⁾. Assim, assume importante papel a formação profissional ligada às necessidades da atuação no mundo do trabalho⁽²²⁾.

Ao assumir que a graduação não ofereceu todo o aporte necessário de habilidades e atitudes necessárias ao desempenho do cargo, foi possível notar, por meio da realização dos cursos de pós-graduação, o esforço e compromisso desses profissionais com a sua educação permanente. Entretanto, também se questiona a qualidade desses cursos de pós-graduação, pois apesar de não terem sido especificamente abordados, em nenhuma fala foi evidenciada a importância da pós-graduação no desenvolvimento das competências gerenciais.

Ressalta-se que, em geral, as disciplinas curriculares dos cursos de graduação em enfermagem abordam os conceitos básicos sobre gerenciamento e apontam as diretrizes para a realização de tais processos. Diante desse fato, é papel do professor discutir com o aluno, dentro das instituições de saúde, a relação da teoria com a prática gerencial. Dessa forma, o aluno ampliará o entendimento sobre as habilidades e atitudes necessárias ao gerenciamento dos serviços, diminuindo a dissociação entre teoria e prática, tão relatada pelos profissionais⁽²³⁾.

O docente também deve despertar no aluno a compreensão de que o pleno desenvolvimento das competências gerenciais não é possível durante a graduação, devido a duração dos cursos, interesse e maturidade do aluno pelo aprendizado e que essas competências podem ser construídas e aprimoradas de diferentes maneiras, inclusive após a entrada do profissional no mercado de trabalho, por meio da participação em discussões realizadas entre alunos e professores no local de trabalho, participação em grupos de pesquisas sobre o tema, participação em cursos de pós-graduação com reconhecida qualidade e programas de desenvolvimento profissional. É de extrema importância que a responsabilidade do profissional em se atualizar continuamente, seja sempre enfatizada pelos docentes⁽²³⁾.

Diante deste cenário, é necessário que os docentes dos cursos de graduação, pós-graduação, bem como os enfermeiros responsáveis pelos serviços de Educação Permanente das instituições de saúde, revejam os meios e métodos de ensino, lembrando que essas dificuldades podem ser superadas na medida em que exista maior interesse das partes envolvidas, o que também inclui o interesse do profissional com seu próprio desenvolvimento⁽²⁴⁾.

Além disso, é importante que as instituições estabeleçam o perfil de competências esperado para aquele que exerce a função de RT, pois dessa forma, aqueles que atuam na educação permanente terão ferramentas para embasar os treinamentos necessários para o desenvolvimento individual e coletivo desses profissionais. Aliado a isso, os centros formadores devem utilizar estratégias de ensino de modo a aproximar mais dos problemas da prática, criando situações em que, de fato, as competências requeridas para atuação do enfermeiro sejam efetivamente desenvolvidas⁽²⁵⁾.

Sugere-se que as instituições de ensino utilizem as pesquisas que abordem o tema competências gerenciais para nortear a construção e/ou a reforma dos projetos pedagógicos investindo esforços no sentido de associar o ensino teórico e prático com e as demandas do Sistema Único de Saúde e de instituições prestadoras de assistência à saúde e que as instituições de saúde mapeiem as competências necessárias ao desempenho de cada função, a fim de que possam promover capacitações que contribuam para o aprimoramento das competências dos profissionais e, consequentemente, para o alcance das metas organizacionais.

Limitações do estudo

O fato da pesquisa ter sido realizada em apenas uma macrorregião do estado brasileiro compromete a generalização dos dados para a realidade nacional e, por isso, novos estudos são necessários para que se possa divulgar o conhecimento dos enfermeiros RT no que se refere às competências necessárias ao desenvolvimento da sua prática nos mais diferentes estados brasileiros.

Contribuições para a área da enfermagem

Essa investigação contribui para estimular a reflexão crítica sobre a formação e conhecimento dos enfermeiros que, atualmente, ocupam cargos estratégicos dentro das organizações de saúde no que se refere às competências necessárias para sua atuação profissional.

Esse tema deve ser explorado pelas instituições de ensino e de saúde, pois um enfermeiro, para alcançar um cargo de RT, deve possuir desenvolvidas as competências técnico-científicas, socioeducativa e a mais desafiadora delas, a ético-política, para poder conduzir à organização a resultados positivos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar de apenas três competências (liderança, relacionamento interpessoal e visão sistêmica) terem sido relatadas pelos enfermeiros deste estudo como sendo necessárias à atuação como RT, essas competências são fundamentais para o exercício da função. Destaca-se a experiência proveniente da prática do exercício profissional como a maior facilitadora no desenvolvimento dessas competências para o cargo.

Segundo os entrevistados, os cursos de graduação em pouco contribuíram para o desenvolvimento das competências gerenciais desses profissionais, dessa forma, espera-se que esse estudo contribua para a revisão dos projetos pedagógicos e objetivos das disciplinas de administração dos cursos de graduação em enfermagem; implementação de programas de desenvolvimento institucionais e interesse dos profissionais em aprimorar e desenvolver continuamente seus conhecimentos, seja por meio de cursos de pós-graduação bem qualificados e/ou inserção em grupos de pesquisas e pesquisas sobre temas gerenciais

• FOMENTO
  Fundo de Incentivo à Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  Jan-Feb 2019

Histórico

• Recebido
  25 Out 2017
• Aceito
  12 Jul 2018