Open-access Tendências do trabalho doméstico remunerado no Brasil sob um contexto de crises

Trends in paid domestic work in Brazil in a context of crises

Resumos

RESUMO  O trabalho doméstico remunerado é uma atividade de grande importância para a força de trabalho feminina no Brasil. O perfil dessas trabalhadoras é caracterizado pela intersecção entre gênero, raça e classe, sendo uma ocupação historicamente exercida por mulheres negras e pobres, com baixa remuneração. O período entre meados dos anos 1990 e o ano de 2014 foi marcado por importantes transformações no perfil e nas condições do trabalho doméstico no Brasil, com melhorias em termos de remuneração e de duração do trabalho. Antevia-se, inclusive, uma mudança de ainda maior fôlego, alicerçada na aprovação da “Lei das Domésticas”, em 2015. Entretanto, nos anos de 2015 a 2022, marcados por crises políticas, econômicas e sanitárias, além de importantes reformas institucionais, ocorreu uma deterioração no mercado geral de trabalho, a qual também atingiu o trabalho doméstico. O objetivo deste artigo é analisar a dinâmica do trabalho doméstico remunerado no Brasil sob esse contexto de sucessivas crises, contrastando suas principais tendências com aquelas observadas nos dois decênios precedentes. A metodologia inclui pesquisa documental e análise quantitativa descritiva com base nos dados da PNAD, PNAD Contínua e PED. Conclui-se que, a par da continuidade de certas tendências do período anterior, os efeitos das crises superaram os avanços legislativos e agravaram a vulnerabilidade das trabalhadoras domésticas.

PALAVRAS-CHAVE:
Trabalho doméstico remunerado. Mercado de trabalho. Relações de gênero; raça e classe


ABSTRACT  Paid domestic work is a highly significant activity for the female workforce in Brazil. The profile of these workers is characterized by the intersection of gender, race, and class, being historically carried out by black and low-income women, often earning low wages. Between the mid-1990s and 2014, there were significant changes in the profile and conditions of domestic work in Brazil, marked by improvements in wages and working hours. Moreover, the approval of the “Domestic Workers’ Law”, in 2015, anticipated a broader transformation. However, between 2015 and 2022, a series of political, economic, and sanitary crises, along with major institutional reforms, led to a deterioration of the labor market, which also affected domestic work. This paper aims to analyze the dynamics of paid domestic work in Brazil within the context of successive crises by contrasting its main trends with those observed in the two preceding decades. The methodology includes documentary research and a descriptive analysis based on PNAD, PNAD Contínua, and PED data. The study concludes that, in addition to the continuity of some trends observed in the previous period, the effects of the crises have outweighed legislative advancements and exacerbated the vulnerability of domestic workers.

KEYWORDS:
Paid domestic work. Labor market. Gender; race; and class relations


1. INTRODUÇÃO

O Brasil ocupa a segunda posição em número absoluto de trabalhadores e trabalhadoras domésticas remuneradas no mundo (Organização Internacional do Trabalho, 2021). Estimativas da OIT alcançavam um contingente mundial de 75,6 milhões de pessoas inseridas numa relação de trabalho doméstico remunerado em 2021. O país com a maior participação era a China, que respondia por 29,1% do total, ao passo que a parcela brasileira equivalia a 8,3%, sendo imediatamente seguida em importância por Índia (6,3% do total), Arábia Saudita (4,9%), México (3,1%), Filipinas (2,6%) e Estados Unidos (2,5%). No caso brasileiro, o número de postos de trabalho doméstico representava 6,8% do total da ocupação na economia nacional à época do estudo, o que lhe conferia a 20ª posição nesse indicador num ranking liderado por Arábia Saudita (27,4%) e Kuwait (25,4%).

Estatísticas do mercado de trabalho brasileiro, apuradas pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do IBGE (PNAD Contínua), estimavam o total de trabalhadores e trabalhadoras domésticas em 5,8 milhões de pessoas na média do ano de 2022. Conquanto sua participação relativa venha declinando desde o início da década anterior, numa tendência que acelerou no contexto da pandemia da covid-19, o trabalho doméstico remunerado ainda mantinha posição relevante na estrutura ocupacional do país, respondendo por 5,9% do total de postos de trabalho.

A ocupação doméstica no Brasil se relaciona, principalmente, à trajetória de mulheres e meninas pobres no mercado de trabalho, além da configuração das relações raciais e sociais no país, sendo exercida majoritariamente por mulheres negras. Guarda relação, ainda, com um modo importante de satisfazer a demanda por trabalhos de cuidados, haja vista a insuficiente oferta de serviços públicos e a tendência de crescente participação das mulheres no mercado de trabalho, o que pressiona a demanda por trabalhadoras domésticas, dadas as normas sociais de gênero e a divisão sexual do trabalho (Hirata; Kergoat, 2007; Organização Internacional do Trabalho, 2018). Em 2018, conforme estudo de Guerra, Santos e Fusaro (2021), as famílias contratantes de domésticas representavam 19,5% do número total de famílias brasileiras e 21,8% dentre as contratantes nas zonas urbanas. A renda monetária das famílias empregadoras de trabalho doméstico era 3,4 vezes superior à das famílias não empregadoras.

As condições do trabalho doméstico remunerado e o perfil de seus ocupantes vêm passando por importantes mudanças no Brasil desde a última década do século XX. Num contexto de melhoria contínua das condições do mercado de trabalho, que se prolongou por cerca de 15 anos no início do século XXI, ocorreram uma reversão na tendência anterior de crescimento relativo e absoluto no número de domésticas e uma melhora nas condições da atividade e alterações de vulto no perfil das pessoas que prestam serviços domésticos remunerados. Não obstante, características como a massiva presença de mulheres e uma maioria de pessoas negras permaneceram como traços distintivos dessa atividade. O ciclo de mudanças progressivas para os trabalhadores e trabalhadoras domésticas atingiu seu ápice com a aprovação de projeto de emenda à constituição (“PEC das Domésticas”, de 2013) e de legislação complementar sobre o emprego doméstico (Lei Complementar n. 150, de 2015), que lhes estendeu inúmeros direitos assegurados a empregados do setor privado em geral.

No entanto, esse processo de transformações favoráveis ao lado da oferta de força de trabalho doméstica perdeu momento a partir de 2015 em consequência de crises políticas e econômicas de largo alcance. No terreno da política, esse ano corresponde ao início do segundo governo da Presidente Dilma Roussef, o qual veio a não se completar em face do afastamento sofrido pela chefe do governo em 2016. Dilma foi substituída por seu Vice-Presidente, Michel Temer, ocasionando, assim, o encerramento do ciclo de governos liderados pelo PT que havia se iniciado em 2003. Durante o curto governo Temer, importantes mudanças regulatórias da economia e das relações de trabalho foram implementadas com o apoio do Congresso Nacional. Nas eleições gerais de 2018, uma nova força política alinhada à extrema direita, sob liderança do Deputado Federal Jair Bolsonaro, conseguiu romper o dualismo partidário de PSDB e PT que havia gravado os pleitos presidenciais desde 1994, levando Bolsonaro à chefia do governo. O mandato de Bolsonaro se estendeu de 2019 a 2022, sendo caracterizado por constantes ataques às instituições democráticas do país e por uma condução insatisfatória no contexto da crise da covid-19. No segundo semestre de 2022, novas eleições gerais resultaram na derrota do candidato à reeleição e no retorno de Luís Inácio Lula da Silva, principal candidato da oposição, à presidência do Brasil.

No campo da economia, o biênio 2015-16 corresponde ao aprofundamento da recessão econômica, quando um forte choque fiscal levou à retração significativa da atividade e ao aumento explosivo do desemprego. A partir de 2017, iniciou-se uma recuperação tímida da produção e do emprego, a qual se estendeu até o ano de 2019, mas foi incapaz de superar inteiramente os danos advindos da recessão. Com a crise sanitária, o país mergulhou em nova recessão no ano de 2020, a qual foi seguida por uma recuperação no biênio 2021-22. Nesse último ano, todavia, vários indicadores da atividade econômica ainda permaneciam em patamar pior do que o observado no ano de 2014.

Assim, tendo a mudança normativa na regulamentação do trabalho doméstico e o contexto de sucessivas crises políticas e econômicas como pano de fundo, examinamos, neste artigo, a dinâmica do trabalho doméstico remunerado no Brasil entre 2015 e 20221. Nosso propósito é apresentar um panorama das principais linhas de continuidade e mudança na atividade doméstica remunerada, contrastando-as com as tendências observadas nos 20 anos anteriores. Para tanto, na seção 1, é realizada uma breve revisão bibliográfica sobre o trabalho doméstico no Brasil, situando-o como uma forma de oferta de trabalho marcada por interseccionalidade de gênero, raça e classe. Na seção 2, sistematizam-se as mudanças havidas no trabalho doméstico remunerado entre o fim do século XX e o ano de 2013, utilizando estatísticas sobre as condições da ocupação e os atributos dos trabalhadores. Em seguida, na seção 3, apresenta-se a análise dessa dinâmica no contexto das crises de 2015-22. Finalmente, uma seção de considerações finais reúne os pontos principais da investigação, elencando, ainda, sugestões de políticas públicas voltadas a essa categoria de trabalhadores.

2. COLONIZAÇÃO, INTERSECCIONALIDADE E A FORMAÇÃO DO TRABALHO DOMÉSTICO NO BRASIL

O trabalho doméstico remunerado é uma atividade historicamente exercida por mulheres, principalmente negras e pobres. Os marcadores de gênero, raça e classe que configuram a atividade são determinantes para identificá-la como um exemplo de interseccionalidade entre diferentes formas de opressão (Bernardino-Costa, 2015). Para além dos marcadores que se entrecruzam para definir o local de exclusão de direitos das trabalhadoras domésticas remuneradas no Brasil, é importante também localizar a atividade como produto histórico do sistema colonial e escravocrata, cujos reflexos permanecem na atualidade (Quijano, 2005; Haddad, 2023; Vieceli; Wünsch; Steffen, 2017).

O termo interseccionalidade foi cunhado pela jurista estadunidense Kimberlé Crenshaw e ilustra as diferentes formas de exclusão às quais são submetidas as mulheres negras e racializadas. Para Crenshaw (1989), as mulheres negras estão submetidas à opressão de gênero, raça e classe, de forma concomitante, o que as relega às piores formas de trabalho e diferentes estruturas de discriminação. O emprego doméstico é ilustrativo dessas relações que se perpetuam por meio de um sistema de dominação racial.

Outro aspecto importante da formação da força de trabalho doméstico no Brasil, além da interseccionalidade, é a história da colonização do território americano, que definiu os conceitos de raça e os espaços a serem ocupados pelos indivíduos considerando os marcadores de cor e outras características fenotípicas. As relações de poder colonial definiram espaços no mercado de trabalho relegados a pessoas consideradas menos racionais, mais próximas a um estado de natureza, justificando a utilização do trabalho escravizado das populações negra africana e indígena americana por parte dos colonizadores europeus, que se consideravam portadores da modernidade e da racionalidade (Quijano, 2005).

O discurso racista e colonizador se perpetua por meio de símbolos, palavras e legislações, configurando um sistema de opressão e poder. Segundo Kilomba (2019, p. 130), o “[...] racismo não é biológico, mas discursivo. Ele funciona através de um regime discursivo, uma cadeia de palavras e imagens que por associação se tornam equivalentes: africano-África-selva-selvagem-primitivo-inferior-animal-macaco”. A autora portuguesa descreve situações cotidianas que ilustram como o racismo se pereniza na sociedade. Uma dessas situações foi enfrentada por ela mesma aos 12 anos de idade: menina negra, ao ser atendida por um médico branco para ser tratada de uma gripe, recebeu uma proposta para trabalhar como doméstica na residência do médico. Kilomba assim conclui:

Esse encontro revela como “raça” e gênero são inseparáveis. “Raça” não pode ser separada do gênero, nem o gênero pode ser separado da “raça”. A experiência envolve ambos porque construções racistas baseiam-se em papeis de gênero e vice-versa, e o gênero tem impacto na construção de raça e na experiência do racismo. O mito da mulher negra disponível, o homem negro infantilizado, a mulher muçulmana oprimida, o homem muçulmano agressivo, bem como o mito da mulher branca emancipada ou o homem branco liberal, são exemplos de como as construções de gênero e de raça interagem (Kilomba, 2019, p. 94).

Lélia Gonzalez (2020) [1979] destaca a dificuldade enfrentada pela população negra para encontrar bons espaços no mercado de trabalho no período de formação do capitalismo brasileiro pós-escravidão. Tal cenário decorreria tanto da estrutura produtiva do país, marcada pela concentração industrial e por grande contingente de força de trabalho desempregada, como no sistema de dominação racial que se estabeleceu durante o período de colonização e se perpetuou, dentre outros modos, pelo discurso da democracia racial. Essa situação impôs à mulher negra uma tripla penalização, já que se somaram às discriminações de gênero e classe. Segundo Gonzalez (2020 [1979], p. 51):

[E}m termos de superpopulação relativa, é importante ressaltar que ocorre na constituição deste sistema não somente um exército industrial de reserva, mas uma massa marginal crescente, em face do mercado de trabalho do setor hegemônico. Ora, na medida em que existe uma divisão racial e sexual do trabalho, não é difícil concluir sobre o processo de tríplice discriminação sofrido pela mulher negra (enquanto raça, classe e sexo), assim como sobre seu lugar na força de trabalho.

A antropóloga brasileira, ao relatar sobre as condições das mulheres negras no Brasil, identificou a questão da interseccionalidade antes mesmo de Crenshaw, ainda que não tenha citado o termo. Segundo Gonzalez, em função da tripla penalização, os trabalhos que restavam para a população feminina negra eram principalmente os da atividade doméstica remunerada, semelhantes aos que realizavam as escravas domésticas no período da escravidão. Nessa condição, a mulher negra “sofre um processo de reforço quanto à internalização da diferença, da subordinação e da inferioridade, que lhe seriam peculiares” (Gonzalez, 2020 [1979], p. 58). A autora aponta três formas principais de trabalho exercidas pelas mulheres negras no Brasil: trabalhadora doméstica, em serviços de baixa remuneração, trabalhando como servente, e, ainda, como mulatas, neste caso, ilustrando a sexualização do corpo feminino negro e corporificando a falsa democracia racial do país.

Ainda a respeito das raízes coloniais e características interseccionais do trabalho doméstico no Brasil, Teixeira (2021) traça um paralelo entre os maus tratos recebidos pelas domésticas pós-escravidão, a hipersexualização dos corpos das mulheres e a continuação do tratamento que recebiam quando eram escravizadas. A autora também ressalta o caráter interseccional da atividade e como a figura da trabalhadora doméstica negra integra o imaginário da população branca empregadora, de tal forma que uma mulher negra passa a ter “cara de empregada”. Teixeira (2021) também chama a atenção para as práticas cotidianas de violência e segregação que se traduzem, por exemplo, nos espaços destinados às trabalhadoras domésticas, como os elevadores de serviço. Outro exemplo envolve os quartos de empregada nas residências de empregadores, que normalmente são espaços muito pequenos, mal iluminados e mal arejados.

Alguns dos reflexos da interseccionalidade e da colonialidade sobre o emprego doméstico no Brasil são sua história de exclusão da legislação trabalhista e a negação do seu reconhecimento como trabalho. Os avanços nos direitos das domésticas foram conquistados a partir da organização e luta dessas trabalhadoras, que levaram à aprovação da “Lei das Domésticas” em 2015. No entanto, o contexto de crises econômicas e políticas que lhe seguiu parece ter impedido resultados mais efetivos na relação de trabalho doméstico, o que exploramos mais adiante.

3. UMA ATIVIDADE EM TRANSFORMAÇÃO: O TRABALHO DOMÉSTICO REMUNERADO ENTRE O FIM DO SÉCULO XX E O ANO DE 2014

3.1. CONTINGENTE E PARTICIPAÇÃO NA ESTRUTURA OCUPACIONAL BRASILEIRA

A incidência do trabalho doméstico remunerado na estrutura ocupacional brasileira ilustrou uma trajetória de “U invertido” entre as últimas décadas do século XX e o ano de 2014. O número de pessoas ocupadas evidenciou uma tendência de crescimento até o fim da primeira década do século XXI, ocorrendo uma mudança no sinal da variação a partir de então e uma consequente redução numérica. Segundo levantamentos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2023), houve um acréscimo acumulado de 77,0% (média de 3,4% a.a.) no número de trabalhadoras domésticas2 entre 1992 e 2009, ao qual se seguiu uma redução acumulada de 14,0% (média de -3,7% a.a.) até o ano de 20143. Já o ponto de reversão do indicador da proporção de domésticas no total da ocupação, por sua vez, aconteceu alguns anos antes e coincidiu com a virada do século. O Gráfico 1 ilustra a evolução numérica do trabalho doméstico, tanto em números absolutos, quanto em sua participação na estrutura ocupacional do país.

Gráfico 1
Índice do número absoluto de trabalhadoras domésticas e participação das domésticas no total de ocupados, Brasil e Região Metropolitana de São Paulo, 1988/2014. Notas: 1. Índice base 100 = 2009. 2. Dados da PNAD para pessoas de 15 anos e mais; PNAD Contínua, pessoas de 14 anos e mais; e PED, pessoas de 10 anos e mais. Fonte: Elaboração própria com base em Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2023) e Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua); Fundação SEADE e DIEESE e Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED).

3.2. TENDÊNCIAS RELACIONADAS AO PERFIL DAS TRABALHADORAS DOMÉSTICAS

No Brasil, o trabalho doméstico remunerado é realizado, em esmagadora maioria, por mulheres. No ano de 2014, 92,0% das pessoas ocupadas como domésticas pertenciam ao sexo feminino, um percentual levemente inferior ao registrado no ano de 1992 (94,1%). Tais dados contrastam com a participação feminina na estrutura da ocupação total em 2014 (43,1% vis-à-vis 38,8% em 1992), realçando o viés de participação das mulheres na atividade doméstica remunerada. A predominância feminina no trabalho doméstico também implica que essa atividade absorve uma proporção considerável das mulheres trabalhadoras. Em 1992, ela representava 16,1% da ocupação das mulheres, elevando-se até 18,0% em 2001. Nos anos seguintes, contudo, houve uma inversão na tendência e a participação do trabalho doméstico na ocupação das mulheres recuou para 13,9% em 2014 (PNAD). Essa perda relativa da importância do trabalho doméstico indica que a presença crescente das mulheres na estrutura ocupacional, dado o cenário de aumento virtualmente contínuo da ocupação e de redução da taxa de desemprego observado entre o início do século e o ano de 2014, teria ocorrido em outros setores de atividade, notadamente no comércio e em outras atividades de serviços.

A composição do trabalho doméstico remunerado no Brasil se caracteriza também por um viés de raça, segundo o qual a presença de mulheres negras ocorre de maneira mais do que proporcional à sua inserção na população ocupada. Não obstante, o viés de participação por raça – medido pela diferença absoluta entre a proporção de pessoas negras no total de trabalhadoras domésticas e a proporção de pessoas negras no total de ocupados em qualquer atividade – oscilou entre 12,2 p.p. e 22,2 p.p. em meados da década de 1990, conforme a área metropolitana investigada pela Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED)4, para o intervalo entre 6,5 p.p. e 15,5 p.p. em 2013.

Nos dois decênios que antecederam a recessão econômica de 2015-16, a principal mudança no perfil das trabalhadoras domésticas se refere à sua composição etária, tendo ocorrido um intenso processo de envelhecimento da força de trabalho doméstica, cujo ritmo foi bastante superior àquele observado no total dos ocupados. A Tabela 1 mostra a distribuição etária das trabalhadoras domésticas e dos ocupados em geral nos anos de 1996 e 2013.

Tabela 1
– Distribuição do total de ocupados e de trabalhadoras domésticas (%), por faixas etárias, Regiões Metropolitanas e Distrito Federal, 1996/2013

Outra mudança notável ocorrida entre meados da década de 1990 e os anos que antecederam a recessão econômica de 2015-16 foi o rápido aumento da escolarização da força de trabalho brasileira, sendo que, no caso das trabalhadoras domésticas, essa mudança se deu em maior intensidade. As trabalhadoras domésticas se concentram em faixas de menor escolaridade, mas houve uma redução acentuada da proporção de pessoas nessas faixas. Segundo os dados da PED, cerca de oito em cada dez trabalhadoras domésticas eram analfabetas ou possuíam o ensino fundamental incompleto em 1996, uma proporção que caiu para cinco ou seis em cada dez, conforme a área metropolitana, no ano de 2013. Nesse período, a forte redução do número relativo de trabalhadoras domésticas analfabetas ou com ensino fundamental incompleto foi acompanhada pelo incremento na proporção das trabalhadoras com ensino fundamental completo ou médio incompleto e, inclusive, por algum registro estatístico positivo de domésticas com ensino médio completo ou superior incompleto em todas as regiões (Horn; Vieceli, 2017).

Ainda no período entre 1996 e 2013, segundo dados da PED, também ocorreu uma mudança no perfil das domésticas segundo sua condição no domicílio de residência, registrando-se aumento da presença de domésticas que são, respectivamente, “chefes de domicílio” – neste caso, em ritmo bem maior do que se observou dentre os ocupados em geral – e “cônjuges”, ao mesmo tempo em que ocorreu uma contração substancial na proporção de domésticas na condição de “filhas”. Em certa medida, essa mudança está correlacionada ao mais rápido envelhecimento das trabalhadoras domésticas, ratificando a principal tendência do período, que também correspondeu a uma mudança no “destino” dos filhos, notadamente das filhas, das famílias de trabalhadoras domésticas. Diferentemente de suas mães, estas deixaram de se dirigir à ocupação doméstica, num contexto de crescente escolarização da força de trabalho, aumento dos postos formais no comércio e em outros serviços, além da forte diminuição na taxa de desemprego (Horn; Vieceli, 2017).

3.3. TENDÊNCIAS RELACIONADAS ÀS CONDIÇÕES DO TRABALHO DOMÉSTICO REMUNERADO

Há duas formas principais de prestação do serviço doméstico remunerado. A primeira forma consiste em uma típica relação de emprego assalariado, em que a trabalhadora coloca seu tempo à disposição para o serviço em domicílio familiar, conforme jornada contratada com o empregador, recebendo salário e eventuais adicionais em contrapartida. Nessa forma de prestação do serviço, a relação de emprego pode ser objeto de um contrato formal registrado em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), caso denominado de “mensalista com carteira”. No entanto, se o contrato não for registrado na CTPS, a relação é dita de “mensalista sem carteira”. De acordo com a legislação vigente antes de 2015, considerava-se empregado doméstico “[...] aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas” (Brasil, 1972, art. 1°; Brasil, 1973, art. 3°, I). A legislação obrigava o empregador doméstico a anotar na CTPS as cláusulas básicas do ajuste contratual. O fato de um empregador não fazer essa anotação e lançar a relação empregatícia na informalidade constituía uma ilegalidade. Já na nova legislação do emprego doméstico, que emanou da “PEC das Domésticas” (Brasil, 2013, 2015), o empregado doméstico é aquele que “presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana”.

A segunda forma de prestação de serviços não caracteriza uma relação de emprego perante a legislação. Ela se dá pela atividade da trabalhadora doméstica numa residência em frequência máxima de dois dias por semana. Mesmo que essa trabalhadora preste o serviço de forma contínua e com expectativa de assim permanecer por longo tempo num mesmo domicílio – por exemplo, com trabalho realizado uma vez por semana em todas as semanas, sem previsão de descontinuidade –, não há enquadramento no tipo legal da relação de emprego, especialmente após a aprovação da nova legislação em 2015. Tal forma de inserção, bastante comum para as domésticas que realizam serviços de limpeza nas residências, é denominada de “diarista”.

Entre meados dos anos 1990 e o período que antecedeu a recessão de 2015-16, as duas principais tendências quanto à forma de contratação do trabalho doméstico foram uma forte redução da proporção de mensalistas – e, consequentemente, um aumento da parcela das diaristas – e uma propensão à formalização do contrato das mensalistas, com aumento da participação daquelas que possuíam registro na CTPS. Ao mesmo tempo, houve um aumento da proporção de domésticas que contribuíam para a previdência social (Horn; Vieceli, 2017).

A par da maior formalização dos contratos das mensalistas e da crescente participação das diaristas, ocorreu também uma redução da proporção de vínculos curtos, com menos de um ano, e o aumento da proporção de vínculos mais longos, com tempo de permanência no mesmo posto de trabalho superior a cinco anos. A proporção dos vínculos com menos de um ano se reduziu entre 7 p.p. (Recife) e 24,3 p.p. (Belo Horizonte) entre 1996 e 2013. Houve, ainda, uma diminuição generalizada na carga horária semanal de trabalho das mensalistas, entre uma hora (Porto Alegre) e 12 horas (Salvador), ao passo que as diaristas mantiveram constante ou experimentaram um leve aumento da duração semanal média conforme a área metropolitana.

No mesmo período, com exceção das diaristas na RM São Paulo, houve uma elevação do rendimento real das trabalhadoras domésticas, a qual ocorreu em ritmo superior ao do rendimento dos ocupados em geral. A variação acumulada no rendimento médio real por hora das mensalistas oscilou entre 38,0% (Porto Alegre) e 155,0% (Belo Horizonte e Salvador). Esse crescimento na remuneração se acelerou particularmente entre os anos de 2006 e 2013. Dentre os fatores explicativos dessa tendência, podem-se mencionar o aumento do grau de escolaridade das domésticas, a elevação no tempo de permanência no mesmo emprego, a redução continuada da taxa de desemprego observada no mercado geral de trabalho e o aumento do valor real do salário-mínimo nacional. O fator escolaridade merece algum apontamento, uma vez que não opera, nesse segmento, de modo semelhante ao que ocorre no mercado geral de trabalho, em que se associa com maior produtividade e redução de custos unitários nas empresas, criando espaço para alta salarial sem pressionar preços. Cabe assinalar, no entanto, que a barganha no mercado de trabalho doméstico é estritamente individual. Assim, não parece incorreto conjecturar que o aumento no grau de escolaridade também tenha melhorado a capacidade pessoal para a barganha, dadas as condições mais favoráveis do período, como a queda geral no desemprego e a elevação do salário-mínimo. Isso requer uma habilidade de apresentar pleitos ao empregador, de modo direto ou sugerido, sem romper a relação de emprego, a qual pode ser afetada, também, pela escolaridade.

O Quadro 1 oferece uma síntese das principais tendências do perfil das domésticas e das condições de seu trabalho entre 1996 e 2013. Nesse período, os contingentes absoluto e relativo das trabalhadoras domésticas ilustraram uma trajetória em “U invertido”, de modo que a atividade perdeu importância na estrutura ocupacional brasileira na primeira metade da década de 2010. Essa diminuição se manifestou, sobretudo, numa quebra no “destino” das filhas de trabalhadoras domésticas: mais escolarizadas e diante de um mercado de trabalho com baixo desemprego, em lugar de se inserirem na atividade das mães, dirigiram-se a ocupações no comércio e em outras atividades de serviços.

Quadro 1
– Principais tendências do perfil das domésticas e das condições do trabalho doméstico remunerado, Brasil, 1996/2013

4. O TRABALHO DOMÉSTICO REMUNERADO SOB UM CONTEXTO DE CRISES POLÍTICAS E ECONÔMICAS

A partir do ano de 2015, modificaram-se as condições de contexto para a inserção dos indivíduos na força de trabalho no Brasil. A combinação de sucessivas crises de naturezas política e econômica, em processo de retroalimentação, colocou um freio à trajetória contínua de redução do desemprego e de aumento dos rendimentos reais do trabalho que vinha ocorrendo desde fins do século XX. Essa nova conjuntura afetou as tendências do trabalho doméstico, que, inclusive, havia se beneficiado de importante mudança regulatória ao término do ciclo anterior. Nesta seção, tratamos de detalhar essa mudança normativa e, na sequência, identificar as principais tendências no contingente ocupado, no perfil das domésticas e nas condições do trabalho doméstico remunerado entre 2015 e 2022.

4.1. MUDANÇA NA REGULAMENTAÇÃO DO TRABALHO DOMÉSTICO (2013-2015)

O trabalho doméstico tem impressas em si relações de interseccionalidade de gênero, raça e classe (Bernardino-Costa, 2007), característica esta que demarca tanto a configuração da atividade e das pessoas nela ocupadas, quanto a trajetória histórica do acesso aos direitos legais (Vieceli et al., 2017). As trabalhadoras domésticas foram contempladas parcialmente nos mais importantes marcos legais brasileiros, como na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943, e, posteriormente, na Constituição Federal de 1988, em que lhes foram assegurados apenas nove dos 34 direitos trabalhistas elencados no parágrafo único do artigo 7º (Brasil, 1988).

Alguns direitos básicos, tais como o registro formal de contrato (carteira assinada) e a inclusão no sistema de previdência social, foram assegurados somente em 1972 em virtude da aprovação da Lei n. 5.859, de 11 de dezembro. Na Constituição Federal de 1988, houve nova ampliação de direitos, e, uma vez mais em 2013, quando foi aprovada a Emenda Constitucional n. 72, a partir da chamada “PEC das Domésticas”. Os direitos inscritos nessa emenda à Constituição foram regulamentados dois anos depois na Lei Complementar n. 150, de 1° de junho de 2015, que ficou conhecida como “Lei das Domésticas” (Vieceli et al., 2017).

A aprovação da “PEC das Domésticas” foi precedida de mudanças econômicas e sociais nos anos 1990 e 2000 que impactaram positivamente na qualidade do emprego doméstico e provocaram transformações no perfil das domésticas, como examinamos na seção anterior. A promulgação da “Lei das Domésticas” se inscreveu nesse cenário de melhorias na configuração do emprego e de mudanças no perfil da categoria doméstica. Historicamente, a lei representou uma conquista dos movimentos sindicais das trabalhadoras domésticas, que haviam se organizado junto aos movimentos negro e feminista pela melhoria das condições de trabalho e a igualdade de direitos para as empregadas domésticas (Bernardino-Costa, 2007).

A Lei Complementar n. 150 assegurou novos direitos e ratificou direitos previstos em legislação anterior (Vieceli et al., 2017). Dentre as principais mudanças normativas, incluem-se a regulamentação da jornada de trabalho, inclusive para as trabalhadoras por tempo parcial, a obrigatoriedade do registro em livro ponto e o recolhimento obrigatório de contribuição patronal ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). O novo arcabouço protetivo da empregada doméstica dispôs sobre os seguintes tópicos:

  1. Vedação do trabalho doméstico para menores de 18 anos, em consonância com a Convenção n. 182, de 1999, da Organização Internacional do Trabalho, e com o Decreto n. 6.841, de 12 de junho de 2008;

  2. Regulamentação da jornada de trabalho;

  3. Remuneração do trabalho noturno em valor superior ao diurno;

  4. Regulamentação da prestação do serviço em viagem;

  5. Previsão para negociação de banco de horas, com acréscimo no pagamento por horas extras em valor 50% superior ao da hora normal. Porém, diferentemente dos demais assalariados, o acordo pode ser feito por negociação individual, não exigindo a presença de um sindicato;

  6. Possibilidade de fixar regime de escalonamento de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso mediante acordo individual. Para as demais categorias, o regime de escalonamento nesse formato está sujeito a acordo coletivo de trabalho;

  7. Regulamentação de intervalos interjornada;

  8. Gozo de férias (previsto na Lei n. 11.324, de 19 de julho de 2006). A novidade é que a legislação assegurou o gozo de férias, conforme norma específica, às trabalhadoras em regime de tempo parcial ou que não excedam 25 horas semanais de trabalho;

  9. Repouso semanal remunerado (previsto na Lei n. 11.324, de 19 de julho de 2006);

  10. Gratificação natalina ou 13º salário (previsto na Constituição Federal de 1988);

  11. Recebimento de vale-transporte, conforme a Lei n. 7.218, de 16 de dezembro de 1985;

  12. Recolhimento ao FGTS em valor equivalente a 8% da remuneração, acrescidos de 3,2%, que servirá como fundo para o pagamento da multa compensatória de 40% nos casos de despedida imotivada. Em caso de dispensa por justa causa, o empregador poderá movimentar os valores no FGTS;

  13. Licença-maternidade de 120 dias e estabilidade provisória às trabalhadoras gestantes (prevista na Constituição Federal de 1988 e na Lei n. 11.324, de 19 de julho de 2006);

  14. Previsão do sistema “Simples Doméstico” para facilitar o pagamento de tributos, contribuições e demais encargos pelos empregadores. A contribuição previdenciária permaneceu com alíquotas na faixa de 8% a 11% por parte da trabalhadora doméstica e de 8% pelo empregador. Os encargos ainda incluem o valor de 0,8% do salário como contribuição por acidente de trabalho e de 3,2% para indenização compensatória;

  15. Criação do Programa de Recuperação Previdenciário dos Empregados Domésticos (REDOM), que permitiu aos empregadores parcelarem suas dívidas com a seguridade social (INSS);

  16. Acesso ao seguro-desemprego por período máximo de três meses, limitado a um salário-mínimo. Os demais trabalhadores contribuintes para o sistema de seguridade social podem gozar do seguro-desemprego por até cinco meses e com valor proporcional ao tempo de contribuição, calculado pela média dos três últimos salários; e

  17. Regulamentação da fiscalização no local de trabalho. A lei prevê o agendamento prévio por parte do fiscal e que a visita tenha caráter basicamente disciplinador.

Uma das principais críticas dirigidas à nova legislação se refere à exclusão das trabalhadoras domésticas diaristas da proteção legal. Assim, deixaram de ser protegidas as trabalhadoras que exerçam a atividade doméstica até duas vezes na semana na residência do mesmo empregador. A exclusão dessa forma de inserção das trabalhadoras se mostra ainda mais lesiva ao se considerar a tendência de crescimento da demanda por diaristas no mercado brasileiro. Quanto àquelas empregadas contempladas pela nova legislação, vale assinalar que, além dos diferenciais de contribuição previdenciária e de acesso ao auxílio-doença e ao seguro-desemprego, outras normas de relevo que alcançam os trabalhadores assalariados em geral permaneceram, todavia, fora do escopo da legislação das domésticas. São exemplos dessa discriminação: a ausência de pagamento de adicionais de remuneração por periculosidade e insalubridade e de garantia de estabilidade acidentária provisória/por acidente de trabalho e a falta de previsão de recolhimento da contribuição sindical como mecanismo de financiamento dos sindicatos.

A aprovação da Lei Complementar n. 150 ensejou um debate acerca de suas possíveis consequências. Uma expectativa otimista sustentava que poderia haver uma melhora na qualidade do emprego doméstico, com ampliação dos direitos assegurados em lei e do número de domésticos com carteira, ou seja, com maior formalização dos vínculos. Tal previsão, todavia, não se materializou nos anos imediatamente seguintes sob a pressão de crises políticas e econômicas, como tratamos de evidenciar adiante.

4.2. CONTINGENTE E PARTICIPAÇÃO NA ESTRUTURA OCUPACIONAL BRASILEIRA

As estimativas da PNAD Contínua indicam que no ano de 2022, o número médio de trabalhadores e trabalhadoras domésticas no Brasil foi de 5.796 mil pessoas. Esse contingente era menor do que o estimado para o ano de 2013, 52 mil pessoas. Podemos decompor a trajetória do contingente ocupado no trabalho doméstico nos anos recentes em dois períodos com distintas características. O Gráfico 2 permite identificar que o primeiro período corresponde à recessão econômica (2015-16) e ao triênio de fraca retomada da atividade (2017-19), quando houve uma pequena oscilação positiva no número de trabalhadoras domésticas, revertendo a tendência de queda observada nos anos anteriores. Em 2019, esse número era 3,8% maior do que na base comparação de 2013. Já o segundo período está diretamente associado à pandemia da covid-19. Assim, em 2020, ocorreu uma forte contração do trabalho doméstico remunerado, à qual foi seguida por insuficiente recuperação nos anos 2021-22. No último ano, o contingente de pessoas de 14 anos ou mais que trabalhavam como domésticas era 4,5% menor do que antes da pandemia e quase 1% menor do que o nível apurado no ano de 2013.

Gráfico 2
Índice do número absoluto de trabalhadoras domésticas e participação das domésticas no total de ocupados, Brasil, 2013-2022. Notas: 1. Dados relativos a pessoas de 14 anos ou mais. 2. Índice base 100 = 2014. Fonte: Elaboração própria com base em Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2023).

Os resultados da conjuntura recessiva de 2015-16 estão em conformidade com a hipótese de que uma piora no mercado geral de trabalho tende a aumentar a participação do emprego doméstico na estrutura ocupacional. Nesse sentido, Vieceli, Schneider e Monteiro (2017), em estudo transversal com dados de 228 países, encontram associação positiva e significante entre a taxa de desemprego e a participação do trabalho doméstico. Em análise sobre a dinâmica do emprego doméstico na recessão de 2015-16, Vieceli, Furno e Horn apresentam a seguinte síntese:

A variação positiva no contingente de pessoas ocupadas nos serviços domésticos e em sua participação na estrutura ocupacional durante a recessão alinha-se à hipótese do comportamento anticíclico. Dessa forma, a crise impôs um freio à tendência de queda na importância da ocupação doméstica observada ao longo dos anos 2000. É provável que, numa conjuntura de dinamismo econômico negativo, maiores taxas de desemprego e desestruturação do mercado de trabalho, o emprego doméstico sirva como um desaguadouro ocupacional para pessoas afetadas pela precarização geral do trabalho, especialmente as mulheres negras. A reentrada de trabalhadoras no emprego doméstico ocorrerá, majoritariamente, na condição de diaristas e com rendimento real menor do que o registrado antes da crise (Vieceli; Furno; Horn, 2017, p. 52).

Já o contexto posterior à crise econômica associada à pandemia de covid-19 é de natureza diferente. A contração no nível geral da ocupação se deu em consequência de medidas de contenção da disseminação do vírus, o que impactou a economia de modo transversal, mas destacadamente nos setores de serviços. No auge dos efeitos da pandemia, entre março e agosto de 2020, houve uma diminuição de 12,8% no número total de postos de trabalho no Brasil e de 27,8% no número de trabalhadoras domésticas, segundo os dados da PNAD Contínua. Com isso, a participação dessas trabalhadoras na estrutura ocupacional caiu para seu menor patamar em 30 anos, situando-se na marca de 5,6% do total dos ocupados em 2020.

Quando a campanha de ampla vacinação ancorada no SUS logrou obter resultados positivos na contenção da pandemia, houve aceleração na recuperação do mercado de trabalho. Entre o vale atingido em agosto de 2020 e o fim do ano de 2022, o número total de ocupados aumentou em 20,3% e o de domésticas em 33,8%. No caso das domésticas, entretanto, esse maior ritmo de crescimento foi insuficiente para recuperar o total de postos de trabalho e a participação na ocupação registrada no ano que antecedeu à pandemia.

4.3. TENDÊNCIAS RELACIONADAS AO PERFIL DAS TRABALHADORAS DOMÉSTICAS

O trabalho doméstico remunerado manteve sua característica estrutural de ampla predominância feminina em sua composição. Não obstante, entre 2013 e 2022, registrou-se um pequeno acréscimo na participação masculina, a exemplo do que já ocorrera nos primeiros anos deste século. Os dados da PNAD Contínua evidenciam uma oscilação na parcela feminina de 93,5% em 2013 para 91,4% em 2022. Também a exemplo do que se observara em anos anteriores, diminuiu a importância da atividade doméstica remunerada na composição do trabalho das mulheres. Enquanto a proporção de mulheres ocupadas como domésticas era de 14,2% em 2013, essa proporção caiu para 12,5% em 2022.

O trabalho doméstico remunerado se relaciona ao passado escravocrata do país, fazendo com que outra característica estrutural resida na maior participação de mulheres negras vis-à-vis sua presença relativa na população feminina. Essa participação manteve sua tendência de crescimento nos últimos dez anos, passando de 63,9% do serviço doméstico feminino remunerado, em 2013, para 67,3% em 20225. Não obstante, também houve perda de importância da atividade doméstica na composição ocupacional das trabalhadoras negras. Em 2013, essa atividade respondia por 18,4% do total das trabalhadoras negras; em 2022, a participação havia diminuído para 16,0%.

A tendência ao envelhecimento da força de trabalho doméstica prosseguiu sob o cenário instável de 2015-22 e mesmo diante das melhoras normativas que poderiam servir como fator de atração para jovens trabalhadoras, ainda que o ritmo desse processo tenha aparentemente diminuído vis-à-vis o turbilhão dos anos anteriores. O aumento da idade das domésticas mulheres se mostrou mais intenso do que o do total das mulheres ocupadas, uma vez que a média de idade das domésticas cresceu de 40 para 44 anos entre 2013 e 2022, ao passo que a variação para o total das trabalhadoras foi de 37 para 39 anos no mesmo período. A Tabela 2 apresenta a distribuição ocupacional por faixas etárias nesses anos.

Tabela 2
– Composição das domésticas mulheres e do total das mulheres ocupadas (%) e variação absoluta acumulada das participações (p.p.), por faixa etária, Brasil, 2013/2022

Ainda, a tendência anterior de aumento dos níveis de escolaridade das domésticas prosseguiu depois de 2015, observando-se variações positivas na proporção de trabalhadoras nos estratos de “ensino médio incompleto e equivalente” e superiores, bem como variações negativas em estratos inferiores de escolaridade. Mesmo com base em levantamentos diferentes, vale o registro da profundidade da mudança revelada nos seguintes dados: em 1996, a proporção de domésticas analfabetas ou com ensino fundamental incompleto oscilava entre 79,5% e 88,6% nas áreas metropolitanas pesquisadas na PED; em 2013, essa proporção caíra para 56,4% no país, segundo a PNAD Contínua, numa tendência que se manteve nos anos seguintes até atingir 41,5% em 2022. As domésticas “sem instrução”, especificamente, correspondiam a tão somente 3,3% do total no último ano.

O processo de envelhecimento das trabalhadoras domésticas observado antes de 2015 foi acompanhado de mudanças no seu perfil quanto à posição no domicílio. Por exemplo, conforme a região investigada pela PED, a participação de “chefes de domicílio” no total das domésticas passou do intervalo entre 12,8% e 19,3% em 1996 para a faixa de 32,7% a 37,9% em 2013. Essa tendência altista prosseguiu nos anos seguintes. Assim, segundo os dados da PNAD Contínua, a categoria “responsável pelo domicílio”, que abarcava 38,4% das domésticas mulheres em 2013, atingiu o expressivo patamar de 52,9% em 2022. Já a segunda categoria em importância, que é a de “cônjuge”, trilhou o caminho inverso, com significativa redução, de 42,8% para 29,5%, em sua parcela relativa no trabalho doméstico remunerado. Uma mudança semelhante aconteceu no total das mulheres ocupadas. Essas variações podem indicar a existência de um importante processo de mudança na composição das famílias no Brasil, em que crescem as famílias uniparentais (normalmente, de responsabilidade das mulheres) e as famílias chefiadas por mulheres trabalhadoras.

Por fim, investigamos também o perfil das domésticas segundo a condição de pobreza. O cenário de crises políticas e econômicas de 2015-22 impactou fortemente os grupos sociais mais marginalizados. A redução da atividade ou o baixo crescimento econômico, a elevação das taxas de desemprego e o enfraquecimento das políticas públicas voltadas à população de baixa renda levaram ao aumento do número de domésticas mulheres em situação de pobreza e extrema pobreza6. Em 2013, pouco mais de uma em cada quatro domésticas era considerada pobre e 8,8% se encontravam em situação de extrema pobreza. Nos anos que se seguiram, ocorreu uma elevação de 5 p.p. dentre as domésticas na pobreza e de 4,6 p.p. na extrema pobreza até 2021. Essa alta na incidência da pobreza e da extrema pobreza também ocorreu, porém de forma menos profunda, dentre a totalidade das mulheres trabalhadoras. Em 2013, uma parcela igual a 15,8% das mulheres ocupadas se encontrava em situação de pobreza ou extrema pobreza. Esse contingente aumentou para 19,1% em 2021.

4.4. TENDÊNCIAS RELACIONADAS ÀS CONDIÇÕES DO TRABALHO DOMÉSTICO REMUNERADO

Desde fins do século XX, uma mudança na estrutura da ocupação doméstica apontou para a queda na participação das empregadas mensalistas e uma elevação na parcela das diaristas. Essa tendência prosseguiu sob o contexto das crises econômicas e políticas depois de 2015. Ainda que a PNAD Contínua não identifique, de modo direto, a forma de inserção de cada trabalhadora sob a ótica de mensalistas e diaristas, é possível obter uma aproximação a esses contingentes mediante uma combinação de dados da pesquisa. Assim, para fins de mensuração, enquadramos como diaristas as trabalhadoras domésticas que prestam serviços em mais de um domicílio ou em apenas um domicílio com jornadas semanais de até 16 horas, sendo mensalistas aquelas que não se encontram nessas condições. De acordo com esse critério, haveria uma parcela de 62,5% de domésticas em condição de mensalistas e de 37,5% na condição de diaristas em 2013. Quase dez anos mais tarde, em 2022, a participação das mensalistas caíra para 56,4%, enquanto a das diaristas se elevara a 43,6%.

O crescimento na proporção de diaristas é um dos fatores explicativos da redução do percentual de domésticas cujo contrato de trabalho é registrado (“trabalhadoras com carteira”). Considerando a totalidade das domésticas, a participação das trabalhadoras com registro do contrato em carteira ainda chegou a aumentar marginalmente, de 30,9% para 33,2%, entre 2013 e 2016 (PNAD Contínua). A partir de então, essa proporção diminuiu ano a ano até atingir o patamar de 25,2% das domésticas em 2022. Uma trajetória semelhante de informalização também foi constatada para a composição do emprego assalariado no setor privado no mesmo período. Paralelamente, o percentual de domésticas que contribuem para a previdência social também sofreu redução: após atingir 42,3% das trabalhadoras domésticas em 2015, declinou para 35,5% em 2022.

O aumento estimado da participação das diaristas na estrutura ocupacional das domésticas também ajuda a explicar a mudança no que tange ao número de domicílios em que as trabalhadoras prestam serviços. Assim, enquanto uma proporção de 25,3% das domésticas trabalhava em mais de um domicílio em 2013, essa fração aumentou para 31,0% em 2022. Nesse mesmo intervalo, houve um pequeno aumento do número relativo de domésticas com maior tempo de permanência no mesmo emprego, o que está em conformidade com o crescimento na idade média das domésticas. Em 2013, 32,1% das domésticas trabalhavam para o mesmo empregador há cinco ou mais anos; em 2022, esse percentual era de 34,1%. Dado que o percentual das domésticas com vínculos curtos, menores que um ano, se manteve estável, foi a redução da parcela na faixa intermediária (entre um e cinco anos) que sofreu uma diminuição proporcional nesse período.

Ao longo dos dois decênios que antecederam a conjuntura de crises políticas e econômicas virtualmente contínuas, a duração semanal do trabalho das domésticas mensalistas registrou mudanças expressivas, com redução do número médio de horas variando entre uma e 12 horas conforme a área metropolitana investigada pela PED. Para as diaristas, com exceção da RM Salvador, ocorreu o contrário, pois a duração média do trabalho semanal aumentou entre uma e três horas. Essas tendências, todavia, não parecem ter prosseguido na conjuntura de 2015-22, a qual se caracterizou por certa estabilidade na duração do trabalho. A variação mais saliente parece ter ocorrido entre 2013 e 2017, quando a duração média do trabalho das domésticas que não prestam serviço em mais de um domicílio (indicador de mensalistas) diminuiu em duas horas e impactou na média geral com redução de uma hora. No restante do período, esse segmento manteve sua duração do trabalho semanal na média de 32 horas. Já as domésticas mulheres que prestam serviço em mais de um domicílio (indicador de diaristas) registraram oscilações sem tendência definida em torno de 30 horas semanais de trabalho.

Por fim, o contexto de crises impôs um freio ao aumento dos rendimentos reais das domésticas, tanto para os rendimentos absolutos, quanto para sua relação com o rendimento do conjunto dos trabalhadores. O rendimento real médio habitualmente recebido no trabalho doméstico foi de R$ 1.050 no último trimestre de 2022, ficando aquém dos valores registrados em 2013 (R$ 1.063) e no pico de 2017 (R$ 1.090)7. A razão entre o rendimento médio das domésticas e o total das mulheres ocupadas se reduziu de 47,6% em 2013 para 44,9% em 2022.

Em geral, as tendências observadas no perfil das trabalhadoras domésticas sob o contexto de crises se assemelharam às verificadas entre meados da década de 1990 e o ano de 2013, ao passo que as tendências relacionadas às condições do trabalho doméstico registraram evidente piora na comparação entre esses períodos. O Quadro 2 oferece uma síntese das principais tendências no período 2013-22.

Quadro 2
– Principais tendências do perfil das domésticas e das condições do trabalho doméstico remunerado, Brasil, 2013-2022

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo procurou identificar as principais tendências do perfil das trabalhadoras domésticas e das condições de seu trabalho no Brasil entre 2015 e 2022. O período foi marcado por sucessivas crises políticas e econômicas, que alteraram o contexto do mercado de trabalho geral, impactando igualmente no mercado do trabalho doméstico remunerado. Interessou-nos contrastar as tendências do período recente com aquelas observadas nos dois decênios que o antecederam, uma vez que houve mudanças salientes no perfil das domésticas e melhoria nas condições de seu trabalho na longa conjuntura entre meados dos anos 1990 e o ano de 2013. Adicionalmente, ao findar a conjuntura anterior, ocorreu a aprovação de uma nova legislação trabalhista aplicada ao emprego doméstico, no qual inúmeros direitos assegurados a trabalhadores assalariados foram estendidos à relação de emprego doméstico.

Nos dois decênios que antecederam a ruptura de ambiente manifestada na recessão econômica de 2015-16 e no afastamento da Presidente Dilma Roussef em 2016, o contingente absoluto e a participação das domésticas na estrutura ocupacional sofreram uma redução, bem como a atividade diminuiu sua participação na composição do trabalho feminino. Foi mantida, todavia, sua característica estrutural de massiva predominância feminina, porém com profundas mudanças no perfil das trabalhadoras. As principais mudanças foram o intenso processo de envelhecimento, que se deu em ritmo superior ao do total dos ocupados; o aumento do número de anos de escolarização da força de trabalho doméstica; e o crescimento na proporção de domésticas que são consideradas “chefes de família” nos domicílios em que residem. Quanto às condições laborais, observou-se uma alteração significativa na composição desse trabalho segundo suas formas de inserção, com redução da proporção de mensalistas e aumento da de diaristas. Não obstante, houve um aumento do grau de formalização desse trabalho, dado o crescimento nas proporções de mensalistas com carteira e de domésticas que contribuem para a previdência social. A duração semanal do trabalho das mensalistas evidenciou forte diminuição, alinhando o emprego doméstico à referência constitucional, e houve leve aumento da média das horas semanais trabalhadas das diaristas. Ainda, a remuneração do trabalho doméstico registrou aumento real e em relação ao rendimento médio do total de ocupados.

No contexto das crises econômicas e políticas de 2015-22 e de uma nova legislação do trabalho doméstico, reafirmaram-se as principais tendências quanto ao perfil das trabalhadoras observadas pelo menos desde o fim do século XX. O trabalho doméstico remunerado permaneceu sendo uma atividade com larga predominância feminina, ainda que tenha havido um leve aumento da proporção de homens, e com viés de participação de pessoas negras. A continuidade nos processos de envelhecimento e de escolarização, tanto quanto o aumento da proporção de domésticas que são “responsáveis pelo domicílio”, indicam que se consolidou uma ruptura importante em comparação com o retrato da oferta desse trabalho típico do século anterior. O virtual desaparecimento de mulheres jovens, provavelmente com maior escolarização, na composição do trabalho doméstico sugere que as filhas de famílias pobres teriam rompido com seu “destino” – o de reproduzirem a atividade das mães na condição de domésticas – e encontrado alternativas em outras ocupações, configurando uma mudança estrutural na composição do trabalho doméstico no país.

Após ter sido freado na recessão de 2015-16 e na lenta recuperação que lhe sucedeu em 2017-19, o processo anterior de redução da participação do serviço doméstico na estrutura ocupacional, em especial na composição do trabalho das mulheres, foi renovado em consequência da pandemia da covid-19. A atividade doméstica foi uma das mais atingidas pela perda de postos de trabalho em 2020 e não conseguiu recuperar seu patamar anterior ao longo de 2021-22. Nesse cenário, prosseguiu a trajetória de redução da parcela de mensalistas e aumento da de diaristas na estrutura do trabalho doméstico. E, diferentemente do que ocorrera antes que as crises sobreviessem, houve uma perda de rendimento real e relativo e uma alta no grau de informalização da ocupação evidenciada pelo aumento da proporção de domésticas sem carteira e pela redução da parcela que contribui para a previdência social. Nesse período, aumentou a incidência de pobreza e de extrema pobreza em famílias de domésticas, o que também serve como indicativo da piora nas condições gerais do trabalho doméstico após 2015.

Ao fim do período analisado, o trabalho doméstico permanecia como importante empregador de força de trabalho feminina, especialmente negra, e também como provedor de serviços de cuidados no país. Suas vicissitudes e a incompletude da reforma normativa de 2013-15 – tanto em sua formulação, quanto na implementação – sugerem que a atividade deva continuar a receber atenção da política pública com o objetivo de assegurar às domésticas o direito ao trabalho digno. Nesse sentido, são pontos a se explorarem na agenda política do trabalho doméstico:

  • Promoção de campanhas e programas de conscientização das trabalhadoras domésticas sobre os seus direitos;

  • Apoio à realização de cursos de capacitação com ativa participação de sindicatos, associações e organizações do terceiro setor;

  • Extensão de direitos das trabalhadoras mensalistas às diaristas;

  • Acesso ao seguro-desemprego e ao auxílio-doença em termos iguais aos dos empregados do setor privado;

  • Adicional de insalubridade no caso de trabalho repetitivo, com uso de produtos químicos e de medicamentos e relacionamento com pessoas doentes;

  • Aposentadoria especial, considerando que o trabalho doméstico sujeita a pessoa a riscos à integridade física e mental;

  • Fiscalização das empresas de intermediação dos serviços de trabalho doméstico;

  • Políticas de reconhecimento dos direitos das trabalhadoras de cuidados.

  • 1
    O artigo toma por base e estende os conteúdos da apresentação realizada no Theme Track C: Gender, Work and Family, da Conferência da Society for the Advancement of Socio-Economics (SASE) realizada no Rio de Janeiro em 2023, sob o título de The Dynamics of Domestic Paid Work in Brazil Under the Economic and Political Crises of 2015-2022. Na sua origem, o texto resulta de pesquisa realizada com apoio da American University, Washington, DC. Os autores agradecem à professora Mieke Meurs, do Departamento de Economia da American University, na formulação do objeto e pelos comentários oferecidos ao longo da execução da pesquisa. Agradecem, igualmente, a Edgard Rodrigues Fusaro, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), pelo inestimável suporte na preparação dos dados da seção 3. Por fim, agradecem a dois pareceristas anônimos, cujos comentários pertinentes ajudaram a melhorar passagens do texto. Como sempre, quaisquer equívocos são de exclusiva reponsabilidade dos autores.
  • 2
    Note o leitor que, deste ponto em diante, o artigo adota o gênero feminino na expressão que designa o total de homens e mulheres ocupadas no trabalho doméstico remunerado em função da presença massivamente majoritária de mulheres nessa atividade no Brasil. Quando necessário decompor as estatísticas por sexo, utilizamos as expressões “domésticas mulheres” e “domésticos homens” para referir aos respectivos contingentes específicos.
  • 3
    Os dados foram apurados na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). Além da antiga PNAD, a evidência empírica apresentada neste artigo inclui dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), do IBGE, e da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), da Fundação SEADE, DIEESE e instituições estaduais de estatística socioeconômica. Sempre que necessário, a fonte dos dados será referida entre parênteses, além de sua especificação nas tabelas e gráficos.
  • 4
    Regiões Metropolitanas de Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador e São Paulo, e o Distrito Federal.
  • 5
    Os dados sobre o perfil das trabalhadoras domésticas examinados nesta subseção abrangem exclusivamente as domésticas mulheres no último trimestre de cada ano de referência.
  • 6
    A condição de pobreza e de extrema pobreza foi calculada com base no rendimento domiciliar mensal per capita nominal mensurado em múltiplo do salário-mínimo. Assim, foram consideradas em condição de extrema pobreza as domésticas cujo rendimento familiar per capita fosse menor do que um quarto do salário-mínimo, e em condição de pobreza aquelas cujo rendimento se situasse no intervalo entre um quarto e metade do salário-mínimo.
  • 7
    Valores a preços do último trimestre de 2022, deflacionados pelo INPC-IBGE.
  • Financiamento:
    Não houve financiamento para a elaboração da pesquisa.
  • Disponibilidade de dados:
    Declaramos que os dados contidos nesta pesquisa estão disponíveis nas referências citadas ao longo do texto.
  • CLASSIFICAÇÃO JEL:
    J16, J21, J81.

Referências

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    » http://doi.org/10.1590/S0102-69922015000100009
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  • BRASIL. Emenda Constitucional nº 72, de 2 de abril de 2013. Altera a redação do parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal para estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2013. Disponível em: http://portal.mte.gov.br/trab_domestico/emenda-constitucional-n-72/ Acesso em: 22 de ago. 2025.
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  • BRASIL. Lei Complementar nº 150, de 1 de junho de 2015. Dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCivil _03/leis/LCP/Lcp150.htm. Acesso em: 22 ago. 2025.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Out 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    30 Dez 2023
  • Aceito
    09 Jul 2025
Creative Common - by 4.0
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