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Estudantes do ensino médio e o conhecimento em HIV/AIDS: que mudou em dez anos?

Estudiantes secundarios y conocimiento sobre el VIH/SIDA: ¿qué ha cambiado en diez años?

Resumos

Estudo exploratório, descritivo, comparativo, com abordagem quantitativa, cujo objetivo foi comparar o conhecimento de estudantes do ensino médio de duas escolas estaduais públicas de Peruíbe, SP, Brasil, sobre o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) e da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (aids), nos anos de 1999 e 2010. Nos dois anos, na população estudada predominaram estudantes do sexo feminino, menores de 18 anos, solteiros e de cor branca. Foi encontrada diferença estatisticamente significativa quanto ao conhecimento sobre HIV/aids entre os grupos estudados. Verificou-se que mesmo havendo intervalo de dez anos entre os estudos, os dois grupos de estudantes não se consideraram vulneráveis ao HIV e apresentaram dúvidas quanto ao conhecimento correto sobre o tema, o que indica a necessidade de sua abordagem contínua com adolescentes jovens.

HIV; Síndrome de Imunodeficiência Adquirida; Estudantes; Ensino Fundamental e Médio; Conhecimento; Enfermagem em saúde pública


Estudio exploratorio, descriptivo, comparativo, de abordaje cuantitativo, objetivando comparar el conocimiento de estudiantes secundarios de dos escuelas estatales públicas de Peruíbe-SP-Brasil, sobre el Virus de Inmunodeficiencia Humana (VIH) y el Síndrome de Inmunodeficiencia Adquirida (SIDA) en 1999 y 2010. En ambos años, predominaron en la población investigada estudiantes de sexo femenino, menores de 18 años, solteros, de raza blanca. Se encontró diferencia estadísticamente significativa respecto del conocimiento sobre HIV/SIDA entre los grupos estudiados. Se verificó que, incluso existiendo un intervalo de diez años entre los estudios, los dos grupos de estudiantes no se consideraron vulnerables al VIH y expresaron dudas sobre el correcto conocimiento del tema, lo cual indica la necesidad de un abordaje continuo de la temática con adolescentes jóvenes.

VIH; Síndrome de Inmunodeficiencia Adquirida; Estudiantes; Educación Primaria y Secundaria; Conocimiento; Enfermería en salud pública


An exploratory, descriptive, comparative study with a quantitative approach, whose objective was to compare the knowledge of high school students from two public state schools of Peruíbe, SP, Brazil, about Human Immunodeficiency Virus (HIV) and Acquired Immunodeficiency Syndrome (AIDS), in the years 1999 and 2010. In both of these years, the predominant population studied was female students, under 18 years old, unmarried and white. A statistically significant difference was found with respect to knowledge about HIV/AIDS among the groups studied. It was found that even with ten-year interval between the studies, the two groups of students did not consider themselves vulnerable to HIV and presented doubts as to the correct knowledge about the topic, which indicates the need for a continuous approach with young adolescents.

HIV; Acquired Immunodeficiency Syndrome; Students; Education Primary and Secundary; Knowledge; Public health nursing


INTRODUÇÃO

Este estudo se insere na linha de pesquisa Diagnósticos e Intervenção de Enfermagem em Saúde Coletiva do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem (PPGE) e integra a produção do Grupo de Pesquisa Vulnerabilidade, adesão e necessidades de saúde, cadastrado no CNPq, vinculado ao Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP).

Trata-se de um grupo de pesquisa que toma como base os conceitos de vulnerabilidade, adesão e necessidades de saúde e o instrumental teórico-metodológico da Epidemiologia Clássica e Crítica para orientar o desenvolvimento de estudos no campo da Enfermagem em Saúde Coletiva. Dentre seus estudos está o desenvolvimento de investigações relacionadas às doenças prevalentes nos perfis epidemiológicos da sociedade brasileira, entre as quais, tuberculose, aids e outras, contribuindo para a formulação e implementação de políticas públicas de saúde.

A epidemia de HIV/aids continua sendo grave problema de saúde no Brasil e no mundo e a enfermagem tem participação importante no desenvolvimento de ações de promoção da saúde, prevenção e assistência as DST/HIV/aids entre os jovens( 11. Nichiata LYI, Gryschek ALFPL, Ciosak SI, Takahashi RF. Atividades de prevenção às DST/HIV e a aids desenvolvidas pela enfermagem nas unidades básicas de saúde. In: Borges ALV, Fujimori E, organizadores. DST e AIDS. Barueri (SP): Manole; 2009. p. 370-411. ).

Estima-se que, mundialmente, os jovens entre 15 a 24 anos são responsáveis por 45% de novas infecções pelo HIV e que 370 mil crianças menores de 15 anos tornaram-se infectadas em 2007( 22. UNAIDS. 2008 Report on the Global AIDS epidemic {Internet}. Geneva; 2008 {cited 2010 Feb 10}. Available from: http://data.unaids.org/pub/GlobalReport/2008/jc1510_2008_global_ report_pp29_62_en.pdf
http://data.unaids.org/pub/GlobalReport/...
).

No Brasil, os casos notificados de aids em jovens de 13 a 19 anos, de 1980 a 2009, foi de 5.457 casos e na faixa etária de 20 a 29 anos, foram 81.547 casos. Isso indica que muitos desses jovens podem ter se infectado na adolescência( 33. Boletim Epidemiológico AIDS. 27ª a 52ª Semanas Epidemiológicas. Brasília: Ministério da Saúde. 2009;6(1). ). Cabe lembrar que, o grupo de 10 a 20 anos representa hoje aproximadamente 21% da população brasileira( 44. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Síntese dos Indicadores Sociais traz um retrato do Brasil em 2003 {Internet}. Rio de Janeiro; 2005 {citado 2010 out. 20}. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php? id_noticia=317&id_pagina=1
http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/...
).

Sabe-se que existem diversos aspectos que relacionam a vulnerabilidade dos jovens à aids como: a sensação de onipotência, a falta de informações adequadas, os preconceitos, as barreiras socioeconômicas, a necessidade de exploração do novo, o pobre sistema educacional que desestimula o aprendizado, as dificuldades de escolha, a indefinição de identidade, a urgência no futuro, a carência, a baixa qualidade dos serviços de saúde, os profissionais despreparados para lidar com o adolescente, a falta de recursos institucionais para esse grupo, a necessidade de afirmação grupal, a desagregação familiar, a dependência econômica, a baixa noção de cidadania (é um ser no início da sua construção de cidadania) e o início da atividade sexual com toda a sua insegurança, suas fantasias e muitas vezes às escondidas( 55. Ayres JRCM. HIV/aids, DST e abuso de drogas entre adolescentes: vulnerabilidade e avaliação de ações preventivas. São Paulo: Casa de Edição; 1996. - 66. Paiva V, Peres C, Blessa C. Jovens e adolescentes em tempos de AIDS: reflexões sobre uma década de trabalho de prevenção. Rev Psicol USP {Internet}. 2002 {citado 2010 ago. 5};13(1):55-78. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-65642002000100004
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
).

Com relação à vulnerabilidade, essa possui três dimensões interdependentes: a individual, que considera a capacidade das pessoas incorporarem o conhecimento e transformar os comportamentos que os tornem suscetíveis ou não ao HIV/aids; a programática, que considera a estrutura e a organização dos serviços de saúde para o combate às DST/aids e a social,composta pela economia, políticas públicas, em especial de educação e saúde, a cultura, a ideologia e as relações de gênero que definem a vulnerabilidade individual e programática( 77. Mann J, Tarantola DJM, Netter T. A Aids no mundo. Rio de Janeiro: Relume-Dumará; 1993.

8. Ayres JRCM, França Junior I, Calazans G, Salletti H. Vulnerabilidade e prevenção em tempos de Aids. In: Barbosa R, Parker R, organizadores. Sexualidade pelo avesso: direitos, identidades e poder. Rio de Janeiro: IMS/UERJ; 1999. p. 49-72.

9. Ayres JRCM, Dalmaso ASW, Novaes HMD, Schraiber LB, Nemes MIB, Peduzzi M. Caminhos da integralidade: levantamento e análise de tecnologias de cuidado integral à saúde em Serviços de Atenção Primária em região metropolitana. São Paulo: FMUSP; 2010.
- 1010. Bertolozzi MR, Nichiata LYI, Takahashi RF, Ciosak SI, Hino P, Val LF, et al. The vulnerability and the compliance in Collective Health. Rev Esc Enferm USP {Internet}. 2009 {cited 2010 Sep 17};2(spe 2):1326-30. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v43nspe2/en_a31v43s2.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v43nspe2...
).

É importante salientar que, a vulnerabilidade individual se refere ao grau e à qualidade da informação que os indivíduos dispõem sobre os problemas de saúde, sua elaboração e aplicação na prática, entendendo que há contextos de ausência de atitudes preventivas relacionada às características pessoais (idade, sexo, raça, entre outros), desenvolvimento emocional, percepção do risco, conhecimentos sobre Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST/HIV/aids), sexualidade, negociação de práticas sexuais seguras, crenças, valores, entre outros. Considera-se também, que situações adversas na vida, distribuem-se de maneira desigual, segundo os indivíduos, regiões e grupos sociais e relaciona-se com a pobreza, com as crises econômicas e com o nível educacional( 1111. Muñoz-Sánchez AI, Bertolozzi MR. Pode o conceito de vulnerabilidade apoiar a construção do conhecimento em Saúde Coletiva? Ciênc Saúde Coletiva. 2007;12(2):319-24. ).

Não se considerar vulnerável, porque confia no namorado(a) e associar a aids ao medo, à morte, à doença incurável, continuam sendo as maiores dificuldades de prevenção, segundo estudo sobre as reflexões de uma década de trabalho de prevenção a aids em jovens e adolescentes( 66. Paiva V, Peres C, Blessa C. Jovens e adolescentes em tempos de AIDS: reflexões sobre uma década de trabalho de prevenção. Rev Psicol USP {Internet}. 2002 {citado 2010 ago. 5};13(1):55-78. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-65642002000100004
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
).

No que se refere à vulnerabilidade individual, especificamente relacionada ao conhecimento, estudo realizado com 360 jovens em escolas estaduais públicas do ensino médio, no município de Peruíbe, SP, Brasil em 1999, demonstrou que 50,5% ainda acreditavam, erroneamente, que a doação de sangue pode infectar o doador; 30% referiam que não sabiam se a picada de inseto transmitia o HIV, 12% confirmaram que era possível; 36,7% acreditavam que a transmissão da aids ocorre com o uso de seringas descartáveis por usuários de drogas injetáveis (UDI) e 53,2% consideram não correr risco ou pequeno risco para o HIV( 1212. Val LF, Meneghin P. Aids-related factors among high school students. Saarbrücken, Germany: VDM Verlag Dr. Müller; 2010. ).

Em Peruíbe, município do estudo, políticas públicas têm sido desenvolvidas como a 1ª Jornada de Saúde do Adolescente de Peruíbe em 2009, onde foi lançado o Programa de Atenção Integral ao Adolescente (PAI). Também já existe no município a Casa do Adolescente de Peruíbe (CADOL).

Com essas ações implantadas e passado dez anos do primeiro estudo, houve mudança no conhecimento e na percepção de risco dos estudantes sobre HIV/aids?

Frente a essas considerações, esse estudo objetivou comparar as diferenças no perfil demográfico, no conhecimento dos estudantes do ensino médio sobre HIV/aids e na percepção de risco nos estudos de 1999 e 2010( 1212. Val LF, Meneghin P. Aids-related factors among high school students. Saarbrücken, Germany: VDM Verlag Dr. Müller; 2010. - 1313. Val LF. Estudo dos fatores relacionados à aids entre estudantes do ensino médio. {dissertação}. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2001. ).

A finalidade desse estudo foi obter dados que possam servir de subsídios para que os setores responsáveis pela saúde e educação do município, construam programas preventivos em HIV/aids, para os estudantes do ensino médio das escolas públicas estaduais de acordo com a realidade apresentada pelos mesmos.

MÉTODO

Trata-se de um estudo quantitativo, do tipo exploratório-descritivo, comparativo com abordagem quantitativa. Os dados analisados no presente estudo referem-se aos achados da pesquisa Estudo dos fatores relacionados à aids entre estudantes do ensino médio ( 1313. Val LF. Estudo dos fatores relacionados à aids entre estudantes do ensino médio. {dissertação}. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2001. ) realizada em 1999 e comparados com a pesquisa Vulnerabilidade ao HIV/aids de jovens do ensino médio: o que mudou em dez anos, realizada em 2010.

Os participantes da pesquisa foram constituídos da amostra de estudantes matriculados em duas escolas estaduais públicas em Peruíbe, SP, Brasil.

Na pesquisa realizada em 1999, estavam matriculados 2.219 estudantes nas duas escolas. Foi utilizada amostragem probabilística, resultando 360 estudantes, 15% da população total eletiva.

Na pesquisa realizada em 2010, contava-se com 1.512 estudantes matriculados nas duas Escolas. Para definição da amostra de alunos, utilizou-se uma proporção sobre o conhecimento sobre sexo dos escolares do ensino médio do primeiro estudo (67%), estabelecendo-se uma margem de erro de 0,05%, o que resultou em um tamanho de amostra de 323 estudantes. Porém, participaram efetivamente da pesquisa 226 estudantes. A perda de 30% ocorreu porque apesar da receptividade dos alunos e da escola, alguns estudantes não trouxeram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) assinado, outros se recusaram em receber o TCLE para colher a assinatura do responsável e outros faltaram no dia da entrega do termo ou no dia da coleta dos dados.

Para a coleta de dados, a escolha das salas foi por sorteio aleatório simples do primeiro, segundo e terceiro ano do ensino médio, dos três períodos: manhã, tarde e noite das duas escolas. A coleta de dados ocorreu em dois dias do mês de junho de 1999 e dois dias do mês de fevereiro de 2010, marcados em conjunto com as diretoras das escolas, sendo dois dias para cada escola. Foi realizada devolutiva nas escolas participantes.

Em 2010 foi aplicado o instrumento tipo questionário anônimo e auto aplicável utilizado em 1999( 1313. Val LF. Estudo dos fatores relacionados à aids entre estudantes do ensino médio. {dissertação}. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2001. ). Composto por duas partes, a primeira traz caracterização socioeconômica geral dos estudantes e a segunda aborda temas relacionados ao conhecimento, crenças, valores, atitudes e práticas relacionadas à vivência da sexualidade e vulnerabilidade ao HIV, totalizando 51 questões. O questionário contém questões fechadas, algumas de múltipla escolha, elaboradas conforme escala de Likert.

Para mensuração do perfil demográfico considerou-se as questões relativas à idade, sexo, cor, estado civil; para o conhecimento foram utilizadas as questões relativas a assistir aulas ou palestras sobre HIV/aids, uso correto do preservativo, sobre a transmissão do vírus e questão relativa a avaliação do conhecimento e do risco em adquirir HIV/aids.

Nos dois estudos as respostas constantes nos questionários foram digitadas no programa Microsoft Office Excel 2007, constituindo duas planilhas, um referente ao ano de 1999 e outra de 2010.

As duas planilhas foram agrupadas e processadas com o Statistical Package for the Social Sciences(SPSS) versão 18 e as comparações feitas com o teste do Qui-Quadrado (com correção de continuidade, quando necessário) ou com o teste da Razão de Verossimilhança (quando as proporções esperadas foram menores do que 5 em mais do que 20% das caselas) com nível de significância de 5%.

Ambos os projetos foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP), protocolo nº 05/1999 e protocolo nº 871/2009.

RESULTADOS

Em ambos os estudos, quanto aos resultados do perfil demográfico, predominou estudantes do sexo feminino; menores de 18 anos; solteiros e da cor branca (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização do perfil demográfico dos estudantes do ensino médio de duas escolas estaduais públicas de Peruíbe, 1999 e 2010

A média de idade foi de 18,7 anos em 1999, (mínima de 15 anos e máxima de 48 anos) e no estudo de 2010, 16,8 anos, (mínima de 13,2 anos e máxima de 30,3 anos).

Em 1999, foi maior o percentual de estudantes que afirmaram terem tido palestra/aula na escola sobre HIV/aids do que em 2010, sendo esta diminuição significativa estatisticamente. Também diminuíram o percentual de estudantes com conhecimento sobre os modos de transmissão do vírus e sobre o uso correto do preservativo masculino, diferenças estas significativas (Tabela 2).

Tabela 2
Comparação do conhecimento em HIV/aids de estudantes do ensino médio de duas escolas estaduais públicas de Peruíbe sobre o HIV/aids, 1999 e 2010

Observa-se que em 10 anos, menos estudantes sabem que a transmissão da aids pode ocorrer por meio da mãe infectada para o feto; de que uma pessoa com aids pode parecer saudável e que a transmissão da aids pode ocorrer tendo relação sexual com parceiro(a) infectado(a).

Aumentou a porcentagem de estudantes com dúvidas se a transmissão da aids pode ocorrer com o uso comum de piscinas, de 21,9% para 40,9%. Como também aumentou, se a transmissão da aids ocorre em assentos de ônibus ou privadas, de 11,1% para 27,4%, sendo que aumentou os que acreditam que sim, diferenças estas, estatisticamente significativas.

Houve um aumento de 13,7% para 30,7%, dos estudantes que disseram que o uso de banheiros e utensílios domésticos, após a utilização por um portador do HIV/aids implica em risco de transmissão e se o doador de sangue pode se infectar com o vírus, aumentou de 10,4% para 20,0%.

Comparando o estudo de 1999 com o estudo de 2010, sobre a avaliação dos estudantes quanto ao próprio conhecimento em HIV/aids, percebe-se que houve diferença estatisticamente significativa, porém ainda não se consideram em risco (Tabela 3).

Tabela 3
Comparação da avaliação do conhecimento e do risco em adquirir o HIV de estudantes do ensino médio de duas escolas estaduais públicas de Peruíbe, 1999 e 2010

DISCUSSÃO

Não houve diferença estatisticamente significativa, em ambos os estudos, com relação aos dados demográficos, sexo e estado civil, continuou o predomínio do sexo feminino e dos solteiros.

Sobre a idade dos estudantes, aparentemente, os estudantes do ensino médio foram mais novos no estudo de 2010do que os estudantes de 1999. Isso pode ser reflexo do aumento da taxa de escolarização de jovens de 15 a 17 anos que vem ocorrendo no país. Aumentou de 33% nos últimos dez anos para 82,4%, em 2003. Uma das análises é que as exigências do mercado de trabalho contribuíram para o aumento na procura pelo ensino médio( 44. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Síntese dos Indicadores Sociais traz um retrato do Brasil em 2003 {Internet}. Rio de Janeiro; 2005 {citado 2010 out. 20}. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php? id_noticia=317&id_pagina=1
http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/...
).

Embora seja maior o percentual dos estudantes que se considerou da cor branca em ambos os estudos, houve o aumento significativo de estudantes que se consideraram negros/mulatos (de 17,2% em 1999 para 41,6% em 2010) .

O 4º Relatório Nacional de Acompanhamento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) mostrou que vem ocorrendo maior percentual de negros no ensino médio. Em 1992, a proporção de brancos de 15 a 17 anos matriculados no antigo colegial (27,1%) era quase o triplo da proporção dos negros (9,2%). Em 2008, a diferença havia caído para 44% (61% entre os brancos, 42,2% entre pretos ou pardos). Este aumento no percentual de negros no ensino médio pode estar refletindo maior acesso à escolarização. No entanto, este mesmo relatório mostra diferença neste acesso para meninos e meninas negras, mostrando que quanto se adiciona o componente gênero, o relatório indica que meninas negras freqüentam menos as escolas, apresentam menos médias de anos de estudo e maior defasagem escolar( 1414. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Desigualdade entre negros e brancos cai na educação, mas não na renda {Internet}. Brasília; 2010 {citado 2010 out. 7}. Disponível em: http://www.pnud.org.br/Noticia.aspx?id=2296
http://www.pnud.org.br/Noticia.aspx?id=2...
).

Foi significativa a redução no percentual de estudantes que tiveram aula/palestra nas escolas de 1999 para 2010. Um aluno, do terceiro ano do ensino médio noturno de uma das escolas, informou que não assistia à palestra sobre o HIV/aids desde sua sétima série.

De modo semelhante, estudo com 4.929 estudantes de trinta e oito escolas estaduais de ensino médio no município de São Paulo, apontou que 36,9% dos entrevistados nunca tiveram aulas ou atividades abordando sexo/sexualidade na escola. Ainda nesse estudo, a maioria (55,7%) afirmou que nunca recebeu materiais educativos sobre esses assuntos( 1515. Figueiredo R, Alves MCGP, Escuder MM, Pupo LR. Comportamento sexual, uso de preservativos e contracepção de emergência por adolescentes do município de São Paulo - estudo com estudantes de escolas públicas de ensino médio. São Paulo: Instituto de Saúde; 2008. ).

Acredita-se que para promover aquisição de conhecimento e de comportamentos saudáveis e protetores nos jovens em relação as DST/aids, palestras contribuem, mas não resolvem a questão, visto que esses assuntos são repletos de conceitos, preconceitos e emoções( 1616. Figueiredo R, Kalchkmann S, Bastos S. Sexualidade, prática sexual na adolescência e prevenção de DST/AIDS e gravidez não planejada, incluindo contracepção de emergência. São Paulo: Instituto de Saúde; 2008. ). Mas, acredita-se da importância de propiciar espaços, para que os jovens em grupos possam expressar suas dúvidas, medos e desejos sem constrangimento.

Também, houve diferença significativa sobre o conhecimento quanto aos modos de transmissão do HIV, sobre quanto os estudantes conhecem sobre o assunto HIV/aids, respectivamente; e sobre como colocar e retirar a camisinha masculina, no estudo de 2010, os estudantes sabem menos.

Os estudantes do estudo de 2010, 34,5% não sabem ou tem dúvidas sobre o modo correto de colocar o preservativo masculino, isso sugere que oficinas de orientação sexual sejam realizadas, contribuindo para o uso desse método, tanto contraceptivo, quanto preventivo das DST/aids. Quanto menor a idade, mais natural é ter dúvidas, sobre o modo correto de usar o preservativo, como também é natural, as meninas terem maiores dúvidas que os meninos, visto que o preservativo é masculino. Isso mostra a necessidade das meninas receberem mais orientações sobre este assunto, evitando que na hora da relação sexual um parceiro desmotive o outro a usar a proteção( 1212. Val LF, Meneghin P. Aids-related factors among high school students. Saarbrücken, Germany: VDM Verlag Dr. Müller; 2010. ).

Estudo sobre o uso do preservativo, tendências entre 1998 e 2005 na população brasileira concluiu ser necessário aprofundar a discussão em torno de ações que visem a aumentar o uso consistente de preservativo, especialmente entre populações de menor escolaridade( 1717. Berquó E, Barbosa RM, Lima LP. Uso do preservativo: tendências entre 1998 e 2005 na população brasileira. Rev Saúde Pública. 2008;42 Supl 1:34-44. ).

Ao analisar o uso do preservativo na iniciação sexual de adolescentes brasileiros, também nos períodos de 1998 e 2005, confirmou-se a diminuição no uso do preservativo entre os jovens que iniciaram atividade sexual antes dos 14 anos, expressivamente na região Sudestes e entre os mais escolarizados. Reforça-se o incremento no uso do preservativo na iniciação sexual( 1818. Paiva V, Calazans G, Venturi G, Dias R. Idade e uso de preservativo na iniciação sexual de adolescentes brasileiros. Rev Saúde Pública. 2008;42 Supl 1:45-53. ).

A principal motivação para o uso do preservativo, num estudo realizado com 4.929 estudantes foi a prevenção da gravidez (72,3%) e a prevenção das DST/aids (63,7%). Porém, 19,3% dos meninos afirmaram que teriam relação sexual sem preservativo, contra 53,2% das meninas( 1515. Figueiredo R, Alves MCGP, Escuder MM, Pupo LR. Comportamento sexual, uso de preservativos e contracepção de emergência por adolescentes do município de São Paulo - estudo com estudantes de escolas públicas de ensino médio. São Paulo: Instituto de Saúde; 2008. ).

Quanto ao próprio risco em contrair o HIV, não houve diferença significativa entre os dois estudos, demonstrando que os estudantes não se vem vulneráveis ao HIV/aids.

Diferentemente do resultado do nosso estudo, o estudo sobre o nível de conhecimento e percepção de risco da população brasileira, em geral, sobre o HIV/aids, 1998 e 2005, referiu que diminuiu a proporção de pessoas que declararam possuir algum tipo de risco frente à aids, passando de 51,1% no levantamento anterior para 33,8% em 2005. Este mesmo comportamento foi observado no segmento populacional de jovens de 16 a 24 anos do ensino médio( 1919. Ferreira MP. Nível de conhecimento e percepção de risco da população brasileira sobre o HIV/AIDS, 1998 a 2005. Rev Saúde Pública. 2008;42 Supl 1: 65-71. ).

Inquérito domiciliar nacional, realizado em 2008, com 8.000 indivíduos, verificou entre jovens de 15 a 24 anos, que a proporção com conhecimento incorreto das formas de transmissão do HIV foi de quase 48%, sendo 47,1% entre os homens e 49,6% entre as mulheres( 2020. Pascom ARP, Ferraz DAS, Arruda MR, Brito I. Conhecimento e práticas sexuais de risco associados ao HIV na população brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Rev Tempus Actas Saúde Coletiva {Internet}. 2010 {citado 2010 out. 30};2(2). Disponível em: http://www.tempusactas.unb.br/index.php/tempus/issue/view/83/showToc
http://www.tempusactas.unb.br/index.php/...
).

Para os jovens de 16 a 24 anos não houve aumento significativo dos que possui informação mínima a respeito do HIV/aids( 1818. Paiva V, Calazans G, Venturi G, Dias R. Idade e uso de preservativo na iniciação sexual de adolescentes brasileiros. Rev Saúde Pública. 2008;42 Supl 1:45-53. ).

Sabe-se que apesar de haver algum tipo de atividade de prevenção do HIV em 70% das escolas no país, nos últimos anos houve uma redução do nível de conhecimento sobre aids entre a população de 15 a 24 anos, maior entre os grupos de menor escolaridade( 2121. Villela WV, Doreto DT. Sobre a experiência sexual dos jovens. Cad Saúde Pública. 2006;22(11):2467-72. ).

Os resultados do presente estudo são preocupantes visto que com diferença de dez anos entre os estudos, os estudantes demonstraram ter menos conceitos corretos sobre o HIV/aids, na atualidade.

Com os resultados apresentados, sugerem-se ações de promoção de saúde que são importantes formas de abertura para o diálogo entre escola e serviços de saúde. É importante criar redes para promoção de saúde e, sobretudo, manter um canal de comunicação para troca de informação e estabelecimento dos vínculos necessários ao atendimento de problemas de saúde sexual e reprodutiva. Essas ações podem ser palestras nas escolas, serviço de saúde ou comunidade; debates; trabalho de grupo; oficinas e reuniões de articulação entre escola e serviço. É necessário que sejam organizadas ações conjuntas e a realização de um levantamento dos principais problemas e necessidades que acometem a população escolar( 1616. Figueiredo R, Kalchkmann S, Bastos S. Sexualidade, prática sexual na adolescência e prevenção de DST/AIDS e gravidez não planejada, incluindo contracepção de emergência. São Paulo: Instituto de Saúde; 2008. ).

CONCLUSÃO

Podemos concluir, de acordo com os objetivos propostos, que passados dez anos de diferença entre os dois estudos, os estudantes do ensino médio das escolas pesquisadas de 2010, podem estar mais vulneráveis ao HIV/aids, do que os estudantes do ensino médio do estudo de 1999. Pairam mais dúvidas entre esses estudantes quanto ao conhecimento correto sobre o HIV/aids. Quanto ao risco, contínua igual, pois eles não se consideram vulneráveis ao HIV, indicando que sempre e de forma contínua é necessário abordar este tema com os jovens nas escolas.

Os autores agradecem às diretoras, secretárias e estudantes das escolas participantes: Escola Estadual de Ensino Médio Carmem Miranda e Escola Estadual Professor Ottoniel Junqueira, pelo apoio para que esse estudo fosse realizado.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Nichiata LYI, Gryschek ALFPL, Ciosak SI, Takahashi RF. Atividades de prevenção às DST/HIV e a aids desenvolvidas pela enfermagem nas unidades básicas de saúde. In: Borges ALV, Fujimori E, organizadores. DST e AIDS. Barueri (SP): Manole; 2009. p. 370-411.
  • 2
    UNAIDS. 2008 Report on the Global AIDS epidemic {Internet}. Geneva; 2008 {cited 2010 Feb 10}. Available from: http://data.unaids.org/pub/GlobalReport/2008/jc1510_2008_global_ report_pp29_62_en.pdf
    » http://data.unaids.org/pub/GlobalReport/2008/jc1510_2008_global_ report_pp29_62_en.pdf
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    Boletim Epidemiológico AIDS. 27ª a 52ª Semanas Epidemiológicas. Brasília: Ministério da Saúde. 2009;6(1).
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    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Síntese dos Indicadores Sociais traz um retrato do Brasil em 2003 {Internet}. Rio de Janeiro; 2005 {citado 2010 out. 20}. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php? id_noticia=317&id_pagina=1
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  • 5
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2013
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