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O cuidar da pessoa: a trajetória de ensino do departamento de enfermagem materno-infantil e psiquiátrica da EEUSP

Care of person: the teaching's trajectory of maternal-child and Psychiatric nursing department

Resumos

As autoras apresentam as perspectivas para o ensino do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, a partir de considerações sobre a estrutura e características do trabalho desenvolvido. Analisando o conceito vocação, apresentam a tendência humanística que norteia todo o processo de trabalho do Departamento.

Vocação; Trabalho profissional; Ensino de Enfermagem


The purpose of this article is to present the Maternal-Child and Psychiatric Nursing Department perspectives to nursing education. The issue is examined in relation to the humanistic vocation of the Department.

Vocation; Professional work; Nursing education


ARTIGOS ORIGINAIS

O cuidar da pessoa: a trajetória de ensino do departamento de enfermagem materno-infantil e psiquiátrica da EEUSP

Care of person: the teaching's trajectory of maternal-child and Psychiatric nursing department

Margareth AngeloI; Maria Alice TsunechiroII; Hideko Takeuchi ForcellaII; Miriam Aparecida Barbosa MerighiII

IProfessor Doutor e Chefe do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica

IIProfessor Doutor do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica

RESUMO

As autoras apresentam as perspectivas para o ensino do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, a partir de considerações sobre a estrutura e características do trabalho desenvolvido. Analisando o conceito vocação, apresentam a tendência humanística que norteia todo o processo de trabalho do Departamento.

Unitermos: Vocação.Trabalho profissional. Ensino de Enfermagem.

ABSTRACT

The purpose of this article is to present the Maternal-Child and Psychiatric Nursing Department perspectives to nursing education. The issue is examined in relation to the humanistic vocation of the Department.

Uniterms: Vocation. Professional work. Nursing education.

INTRODUÇÃO

O presente texto, visa apresentar à comunidade externa à Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP), as perspectivas do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica (ENP), no tocante ao seu processo de trabalho relativo à dimensão ensinar, componente da tríade de atividades fim da universidade-ensino, pesquisa e extensão.

O preparo do material determinou a necessidade de recuperação da evolução histórica e da caracterização das atividades de ensino do Departamento, visto que, uma vez compreendidas as suas peculiaridades, as perspectivas fariam sentido enquanto prosseguimento de uma trajetória de trabalho.

I. TRAJETÓRIA HISTÓRICA: A CONSOLIDAÇÃO DO DEPARTAMENTO

Como conseqüência da reforma das universidades brasileiras, a EE passou a figurar como uma das Unidades de Ensino da USP e o Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica, constituído como um de seus Departamentos, em 1970, com as seguintes disciplinas: Enfermagem Obstétrica e Ginecológica, Enfermagem Pediátrica e Enfermagem Psiquiátrica (CARVALHO, 1980).

Nessa época, ainda como conseqüência da Reforma Universitária, houve a necessidade de revisão dos currículos mínimos dos cursos superiores. Assim, o Conselho Federal de Educação, pela Resolução nº 4/72 aprovou o Parecer nº 167/ 72, determinando a nova estrutura curricular das Escolas de Enfermagem, oficializou a integração dos cursos de Enfermagem e Obstetrícia, consolidando o que já existia na prática - a ligação intima entre os programas destinados à formação de dois profissionais da área de saúde que se completam no exercício das respectivas funções. O Curso passou a ser de Enfermagem e de Obstetrícia. Visava a formação de enfermeiros e sua habilitação em um dos três campos: Enfermagem Médico-Cirúrgica, Enfermagem Obstétrica e Enfermagem de Saúde Pública (CARVALHO, 1980).

Cabe ressaltar que, no ano anterior, o Curso de Obstetrícia ministrado pela Escola de Obstetrícia do Departarmento de Obstetrícia e de Ginecologia da Faculdade de Medicina da USP foi integrado na EE, em decorrência da Portaria GR nº 1.398 de 18 de fevereiro de 1.971. Como diversas disciplinas de enfermagem constavam do currículo do Curso de Obstetrícia, e como o disposto no parágrafo único do artigo 6º do Estatuto cia Universidade, não admitia a "duplicação de meios para fins idênticos ou equivalentes, no mesmo município", após inúmeras reuniões entre as duas instituições de ensino, decidiu-se que o Curso de Obstetrícia seria integrado à EE; as obstetrizes e enfermeiras instrutoras daquela Escola foram incorporadas ao corpo docente da EE, nos três Departamentos existentes na ocasião, conforme a área de atuação. As docentes que participavam do ensino das disciplinas específicas de Obstetrícia, passaram a compor o quadro docente do ENP. As alunas matriculadas no Curso de Obstetrícia completaram a sua formação na EE (CARVALHO, 1980).

Conforme a denominação constante no processo da constituição do Departamento ENP, as disciplinas dos niveis de graduação e de pós-graduação, reproduziam os nomes das respectivas áreas de sua competência: Enfermagem Pediátrica, Enfermagem Psiquiátrica, Enfermagem Obstétrica e Enfermagem Ginecológica. No início, na década de 40, a denominação correspondia a da área médica passando, ainda nessa década, a constar também o termo Enfermagem.

No nivel de graduação, essa nomenclatura perdurou até 1996, último ano da vigência do antigo currículo.

Na nova estrutura curricular, vigente a partir de 1994, o ENP é responsável por três das quatro áreas temáticas da grade curricular, Enfermagem na Saúde da Criança e do Adolescente, Enfermagem na Saúde da Mulher, Enfermagem na Saúde do Adulto II enfoque Enfermagem Psiquiátrica e disciplinas optativas.

A Habilitação em Enfermagem Obstétrica e Neonatal, foi oferecida até 1991, em dois semestres, passando em, 1992, para Especialização em Enfermagem Obstétrica, com carga horária de 1.284 horas,

No nivel de Pós-Graduação, nível de Mestrado, desde 1975, o ENP participa do Programa com três áreas de concentração, Enfermagem Pediátrica, Enfermagem Psiquiátrica e Enfermagem Obstétrica e Neonatal. Até 1991, cada área oferecia três disciplinas obrigatórias por turma, e a partir de 1992, com a reformulação nos programas passou a oferecer duas disciplinas; essas disciplinas reproduzem a mesma nomenclatura da área de concentração.

Até o momento, nessas três áreas, foram formados 92 mestres, ou seja, 25 na área de Enfermagem Psiquiátrica, 33 na de Enfermagem Pediátrica e 34 na de Enfermagem Obstétrica e Neonatal.

No nível de Doutorado, não havendo área de concentração, o vinculo do aluno se estabelece por meio de orientadores. Assim, desde 1985, foram formados 16 doutores sob a orientação de docentes do ENP, sendo dois do exterior.

Na busca de aprofundamento do conhecimento, docentes do ENP têm procurado não só por meio de estudos individuais e grupais e de pós-graduação, criar grupos e núcleos de estudos (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, 1994).

Nesse sentido, em 1987, houve a criação do Núcleo de Estudo e Pesquisa sobre Comunicação em Enfermagem - NEPCEN - composto por docentes e alunos de pós-graduação que desenvolveram ou vem desenvolvendo teses e dissertações nesta área, bem como aluno de graduação com atividades de iniciação cientifica. Tem a finalidade de produzir conhecimento em comunicação em Enfermagem, tendo em vista que ela é o processo que permeia todas as áreas de enfermagem. Seus objetivos são: desenvolver estudos e pesquisas que contribuam para melhores condições de ensino e pesquisa sobre comunicação; utilização consciente do processo de comunicação no ensino da assistência de enfermagem à população, principalmente, nos aspectos de educação para a saúde e humanização no uso da tecnologia de assistência; criar instrumentos para complementar resultados das pesquisas cientificas; oferecer cursos de educação continuada em nivel local, regional e nacional; criar núcleos satélites em várias regiões para a disseminação do conhecimento produzido e desenvolver estudos e pesquisas sobre comunicação em enfermagem de modo geral.

Além disso, destacamos a participação decisiva de docentes do ENP no Núcleo de Assistência para o Autocuidado da Mulher (NAAM) que está vinculado ao Departamento ENC. E um projeto que tem como foco o conhecimento e a sistematização das crenças, dos valores e das práticas de saúde da população. A este projeto central articula-se projetos específicos com a finalidade de contribuir para o desenvolvimento do conhecimento básico e aplicado na promoção de saúde da mulher. Conceitos e constructos de duas teorias norteiam estes estudos através da utilização de metodologia quantitativa e qualitativa. Seu embasamento se faz pela Teoria do Autocuidado de Orem e pela Teoria do Cuidado Cultural de Leininger. Assim, assistência e pesquisa não são consideradas entidades estanques, mas servem de suporte uma para a outra. A meta é desenvolver modelo teórico experimental para melhorar a qualidade da assistência e construir um corpo de conhecimento básico e aplicado para a enfermagem. O aluno é inserido neste processo como agente em formação, capaz de aprender, desenvolver e aplicar o conhecimento obtido.

Também, por iniciativa de docente do ENP, criou-se, na EE, o Centro de Pesquisa Interdepartamental, com o objetivo de desenvolver pesquisa interdepartamental, e de iniciar o estudo para o estabelecimento de linhas de pesquisa. A partir de 1989, este Centro transformou-se na Comissão de Pesquisa, prevista pelo atual Estatuto da Universidade.

Na década de 90 foi criado o 8º Centro Colaborador da OMS para Pesquisa e Treinamento em Saúde Mental, primeiro na área de Enfermagem em nivel mundial, que foi designado pela Organização Mundial da Saúde em 1993, para desenvolver pesquisa na área, capacitar recursos humanos e fazer assessorias em nivel regional, nacional e internacional.

Ainda, na tentativa de resgatar e preservar a memória da Enfermagem, prioritariamente da Enfermagem Brasileira, foi criado pelo ENP em 1992, como uma das atividades do Jubileu de Ouro da EE, o Centro Histórico-Cultural da Enfermagem Ibero-Americana para subsidiar pesquisas sobre a história da Enfermagem e da Obstetrícia, oferecendo à comunidade científica dados fidedignos, com vistas a se tornar um centro de referência sobre o assunto, em nivel nacional e internacional.

O Grupo de Estudos da Enfermagem da Família representa outro núcleo de investigação do Departamento, criado em 1994, com o objetivo de desenvolver conceitos e modelos teóricos relativos ao cuidar da família em enfermagem e desenvolver tecnologia e estratégias de pesquisa, ensino e intervenção de enfermagem aplicadas à família. A este Grupo estão vinculados alunos de pós-graduação e de graduação em atividades de investigação, participando da consolidação desta área de conhecimento do Departamento e da enfermagem brasileira.

Além disso, como Departamento responsável pela formação da enfermeira obstétrica ou obstetriz, docentes da área se empenharam e participaram efetivamente para a reativação da Associação Brasileira de Obstetrizes (ABO). Isso ocorreu em 1992 e na nova configuração, foi transformada na Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros Obstetras (ABENFO) cuja finalidade é de criar mecanismos para a defesa de uma política de saúde que favoreça a assistência integral com qualidade à saúde da mulher e da criança no contexto brasileiro. São Paulo foi a primeira seção instalada após a reativação da ABENFO, em junho de 1993. Imediatamente após a sua instalação, a Seção responsabilizou-se pela organização do I Congresso Brasileiro de Enfermagem Obstétrica e Neonatal ocorrido nas dependências da EE, em 1994, cujo tema central foi "A Enfermagem Obstétrica no contexto sócio-cultural brasileiro". A participação expressiva e avaliação favorável, mostrou a importância dessa Associação, cuja presidência da Seção São Paulo é assumida por docente deste Departamento.

II. A VOCAÇÃO HUMANÍSTICA DO DEPARTAMENTO

II.1. Vocação

A palavra vocação tem sido usada com certa constância, sobretudo nos ambientes acadêmicos, universitários, e faz muito sentido quando aplicada ao propósito de compreender um caminho de vida e no caso, o caminho do Departamento.

O que é vocação? Segundo o médico humanista e historiador, G.MARAÑÓN, vocação é a voz interior que nos chama a uma profissão e exercício de uma determinada atividade. Para o autor, a vocação é uma necessidade, que impulsiona o homem a criar a beleza, se é um artista, a buscar a verdade, se é um homem da ciência e se é um mestre, a ensinar aos outros a verdade e a beleza conhecidas e o modo de buscar as ignoradas. Tais vocações, por serem de categorias tão elevadas, supõe aptidão, ou seja, nunca é platônica, mas implica em servir ao objeto de vocação (MARAÑÓN, 1946).

Neste sentido, continua o autor, a vocação nada mais é do que “a aspiração a servir, de uma aptidão ainda não revelada” e “o encanto ou encantamento que gera luz da obscuridade e ligeireza do esforço”

Trazendo estas idéias ao contexto do Departamento, pode-se dizer que a vocação representa uma tendência, um jeito de ser, fundamentado num principio que foi se consolidando com a vivência. Uma vivência que foi por sua vez, possibilitando ordem e clareza desta vocação.

Analisando nosso trabalho, descobrimos uma vocação ou uma tendência, que de certo modo nos unifica enquanto Departamento, aparentemente tão distinto, considerando-se as especialidades que o compõem.

A vocação do Departamento que identificamos hoje, não resultou de uma autêntica aptidão, mas de um processo de convivência de predileções pelas questões de humanidade no domínio da enfermagem.

Cada uma das três especialidades, embora em tempos distintos, passou a formular indagações e a dirigir o olhar, também para uma realidade não técnica do processo de cuidar em enfermagem.

Esta realidade não técnica, compreendia um olhar mais atento à pessoa foco de nossa atenção (criança, mulher e doente mental), que padecia de uma dada condição clinica, e às suas vivências diante de tais condições.

Assim, paralelamente ao desenvolvimento de atividades que já faziam parte de um compromisso com a grade curricular da Escola, outros deveres inventados pelo Departamento passaram a fazer parte do cotidiano de trabalho. Aqui reside a arte do encantamento, como sinal da vocação do Departamento, expressa pela sua capacidade criadora de direcionar seus esforços, de desenvolver um certo conhecimento e de ter como conseqüência um bem-estar, ainda que transitório, enquanto compensação pelo sacrifício da caminhada.

O Departamento passou, portanto, a construir um caminho orientado a desvendar a realidade não técnica do cuidar em enfermagem, apropriando-se de conhecimentos e métodos que não faziam parte do domínio da enfermagem.

Assim, configurou-se o principio, o eixo sobre o qual hoje, as atividades do Departamento, incluindo as de ensino, são desenvolvidas:” o processo de cuidar da pessoa no contexto de suas vivências, ao longo do ciclo vital”.

II.2. O Eixo

“Visão humanista de um cuidar concebido para e por pessoas, oposta à visão de um homem subjugado por padrões de cuidar que o destroem em sua essência” (ANGELO,1996).

Este princípio, introduz a idéia que dá sustentação ao eixo do Departamento, composto basicamente por três elementos: pessoa, vivências e ciclo vital.

Não é propósito deste texto analisar em profundidade e mesmo oferecer novas definições aos componentes, mas apresentá-los rapidamente, de modo a permitir a compreensão de algumas idéias básicas aplicadas ao ensino do Departamento.

• Pessoa:

Refere-se ao ser pessoa numa concepção filosófica, que considera, porém ultrapassa o biológico, o corpo. Nesta perspectiva, focaliza sua possibilidade de ser e estar no mundo, interagindo com as situações e a elas atribuindo significados.

• Vivências:

Componente que diz respeito às experiências vividas pela pessoa. Não se refere apenas ao incidente da experiência, mas a representação simbólica e portanto única do mesmo, conseqüente ao vivido, e cujo manejo permite à pessoa construir ações conscientes.

Neste sentido, a doença por exemplo, não é tida como um estado patológico passível ou não de cura, mas como um momento na vida da pessoa, tenha a duração que tiver, no qual a pessoa dirige suas ações, à partir do significado da doença em seu existir global.

• Ciclo vital:

Representa a abrangência do ciclo de vida da pessoa, caracterizada pelas dimensões tempo, composta pelos estágios de desenvolvimento e eventos, pelos fatores que atuam sobre a pessoa ao longo da vida, e que resultam em possibilidades peculiares de ser no mundo.

Este componente aglutina as especialidades trabalhadas no Departamento: a criança, a mulher e o adulto em situação de doença mental.

II.3. O reflexo no ensino

O ensino do cuidar da pessoa no contexto de suas vivências ao longo do ciclo vital, tem sido vivido no Departamento, desde a última década, mas com maiores possibilidades à partir do novo currículo de graduação da EEUSP, em vigência desde 1994. Assim, a experiência de ensino no âmbito de graduação tem estreita relação com alguns pontos focalizados pelo novo currículo.

Planejado para capacitar enfermeiros a serem mais responsivos às necessidades da sociedade, mais eficazes em humanizar os ambientes de cuidado à saúde, altamente tecnológicos, mais criativos e, mais capazes de pensamento crítico e de aplicarem abordagens acadêmicas aos problemas e questões vivenciadas pelas pessoas sob seus cuidados, o novo currículo tem a destacar dois pontos de suas intenções: o resgate da dimensão humana do cuidar e as interações professor-aluno, como substrato para a facilitação da formação dos conteúdos cognitivo, simbólico e afetivo dos estudantes, compatível ao ensino de terceiro grau.

Os objetivos do currículo implicam na re-elaboração de aspectos dos papéis docente e discente, na vivência das experiências de aprendizagem, pautadas em especial, em dois aspectos do papel docente (IDE; ANGELO, 1996).

• Inserção gradativa do aluno no processo de cuidar, visando o desenvolvimento da familiaridade, conhecimento, compreensão e aplicação de conteúdos relativos aos conceitos: trabalho, saúde e pessoa na perspectiva da enfermagem.

• Atenção às experiências do aluno, visando facilitar o processo de definição do ser enfermeiro, num contexto que privilegie uma aprendizagem siginificativa, propiciando o desenvolvimento de habilidades integrais do aluno, com atenção especial à articulação do pensar, sentir e agir, que constitui a essência do processo de construção de significados.

O Departamento, como já foi apresentado, é responsável hoje por três áreas temáticas. Dadas as características da grade curricular, as disciplinas são ministradas do terceiro ao sexto semestre, representando a experiência de interação docente com alunos com diferentes possibilidades e vivências no curso.

Tal situação implica na necessidade de: diagnóstico de demandas de aprendizagem, atenção à seleção e indicação de experiências além do cuidado para não considerar a especialidade da disciplina como um fim nela mesma, mas como um meio para a aprendizagem do processo de trabalho do enfermeiro .

Assim, cumpre destacar alguns pontos que caracterizam o ensino de graduação atualmente no Departamento, nas disciplinas das áreas temáticas:

• Desenvolvimento dos conteúdos das especialidades, em conformidade com princípios técnico-científicos essenciais, com as transformações das políticas de saúde e as necessidades de desenvolvimento da profissão, respeitando a inserção da disciplina no continuum do processo de formação do aluno,

• Ampliação dos contextos de vivências dos alunos junto às pessoas foco de atenção das disciplinas (criança, mulher e adulto com doença mental), considerando os âmbitos hospitalar e extra-hospitalar,

• Planejamento de experiências que possibilitem ao aluno, a vivência dos componentes do eixo do Departamento, como parte integrante do processo de cuidar em enfermagem, destacado sobretudo nas experiências de aprendizagem relacionadas a proposição de estratégias de intervenção capazes de integrar os objetivos da assistência à saúde e as vivências das pessoa assistidas.

O novo currículo, é importante que se destaque, exigiu do corpo docente do Departamento, uma renovação de estratégias de ensino e busca de recursos inovadores, no sentido de viabilizar os objetivos e a atual configuração do curso de graduação.

Ainda, como disciplina obrigatória, o Departamento ministra Antropologia Filosófica e Enfermagem, cujo propósito e conteúdo estão plenamente albergados no âmbito de trabalho do Departamento.

As disciplinas optativas visam atender outro dos propósitos do currículo novo, qual seja, oferecer disciplinas que permitam ao aluno a oportunidade de organizar sua inserção no currículo, à partir de seus interesses, necessidades e possibilidades. As disciplinas refletem o processo de trabalho do Departamento, relacionado ao eixo que o caracteriza:

• Enfermagem e família

• Enfermagem e o paciente no processo de morrer

• Métodos anticoncepcionais

• O processo de aleitamento materno na fase perinatal

• Enfermagem na saúde escolar

• Assistência de enfermagem em creches

• Dinâmica de grupo

No âmbito da pós-graduação, o eixo do Departamento encontra maiores possibilidades de expansão, visto estarem Os processos de aprendizagem centrados na investigação. Assim, as linhas de pesquisa fornecem o suporte para a formação dos mestres e doutores no Departamento, ressaltando e fortalecendo de maneira expressiva a vocação humanística já apresentada.

As disciplinas neste nível de formação, são organizadas e estão direcionadas tanto à temática trabalhada na investigação, mas também e principalmente às estratégias de trabalho utilizadas nas linhas de pesquisa do corpo docente.

• Comunicação em Enfermagem Aspectos

• Psicossociais da Assistência de Enfermagem

• Pesquisa Qualitativa em Enfermagem

• Pesquisa Etnográfica em Enfermagem

• Seminários Avançados em Pesquisa

• Etnográfica em Enfermagem

• Pesquisa Fenomenológica em enfermagem

• Evolução histórico-social de Assistência em Saúde Mental

III. PERSPECTIVAS PARA O ENSINO NO DEPARTAMENTO

A análise da vivência da dimensão ensinar, tem sido possível à partir das interações com os alunos e das conseqüências destas interações para o processo de transformação tanto do ensino como da assistência, que caracterizam o contexto de inserção dos alunos que passam pelo Departamento e também da identificação das necessidades de produção de conhecimentos que alimentem o contexto de assistência à saúde.

Até agora, apresentamos alguns aspectos, aqueles significativos em nossa vivência do ensino de enfermagem, certas de que seria pouco provável conseguir pontuar todos os componentes da experiência, sobretudo considerando que alguns talvez nem estejam ainda disponíveis em nossa consciência, que é o órgão do sentido das experiências.

O que se apresenta à nossa vista, e portanto o que podemos considerar como perspectiva, parte do desenho já indicado.

Neste sentido, as perspectivas para o ensino no Departamento, relaciona-se à continuidade de um trabalho direcionado à superação de dois grandes obstáculos, um da assistência e outro do ensino, pertinentes à vocação do Departamento (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, 1996):

1. Diagnosticar e desenvolver estratégias de ensino e de intervenção, destinadas a preencher o vazio existente, relativo às demandas de recuperação da dignidade (de ser pessoa), no processo de assistir em saúde.

Os obstáculos nesta esfera são decorrentes de paradigmas norteados pela tirania da técnica, da doença e da burocracia, que negam qualquer possibilidade de atuação de forças do ser na prática assistencial.

Hoje, identificamos como área ou conteúdos carentes de um novo olhar na intervenção,e portanto também no ensino e pertinentes às especialidades do Departamento:

• A reabilitação psicossocial da pessoa com doença mental

• O fortalecimento da criança e da mulher, enquanto pessoas e cidadãs

• O fortalecimento da família, como substrato para a recuperação da sociedade e da saúde da pessoa

• O espaço de comunicação interpessoal, tão próprio da condição humana e por isso, o local onde se produz o reconhecimento do outro como alguém que em sua diferença nos é semelhante

• A morte como um momento na vida da pessoa, uma experiência na qual o poder pessoal ainda é passível de ser vivido

2. Desenvolver novas estratégias pedagógicas, no âmbito da graduação e da pós-graduação, capazes de facilitar o fortalecimento da vocação tanto para o serviço, como para a investigação e a docência:

• ampliar a possibilidade de integração de graduandos e pós-graduandos, criando maior condição para que o pós-graduando experimente estratégias de ensino facilitadoras de aprendizagem significativa em enfermagem

• ampliar as experiências de aprendizagem integradas ao eixo do Departamento, a nível de graduação

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O que apresentamos do Departamento, reflete a trajetória das pessoas envolvidas no seu processo de trabalho (docentes e discentes), que com seu caminhar deixam marcas no caminho, marcas de humanismo.

O caminho não está pronto, mas está sendo construído passo a passo.

A relevância das marcas de humanismo, que caracteriza nosso trabalho cientificamente qualificado, reside na possibilidade para a reflexão sobre o todo do assistir em Enfermagem.

Ao aproximarmos a perspectiva da reflexão sobre o todo do nosso saber cientifico, estamos nos aproximando da missão da Universidade e quem sabe, talvez até estimulando as potencialidades últimas do espírito.

Trata-se sem dúvida de uma tarefa sem fim, afinal são infinitas as indagações acerca do todo do ser.

E assim prosseguimos, nesta nossa condição de aprendizes das possibilidades do existir humano e sua relação com a Enfermagem.

Finalizamos este texto, com um Autor que consegue expressar exatamente a percepção que temos de nosso trabalho:

“...a partir do momento em que me pergunto o que acontece na morte de um homem, o que é a morte, não só do ponto de vista fisiológico, mas sob toda a perspectiva de reflexão, a partir desse momento em que interrogo filosoficamente, já estou falando em coesão global do mundo e da vida...”

"Ao indagar de modo verdadeiramente filosófico, o espírito humano abre-se sem reservas para o todo do ser, e é somente então que penetra em suas próprias possibilidades"

JOSEF PIEPER

  • ANGELO,M. Humanismo e enfermagem: a possibilidade na tarefa profissional. Escola de Enfermagem da USP, 1996.
  • CARVALHO, A. C. Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo: Resumo histórico - 1942-1980. São Paulo, Escola de Enfermagem, 1980.
  • IDE,C.A.C.; ANGELO,M. Transformando hábitos de formação em saúde: evidências de um processo na área de enfermagem. Escola de Enfermagem da USP, 1996.
  • UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica. Avaliação Departamental (1989-1993) São Paulo, 1994.
  • UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica. Projeto Acadêmico 1996- 2000 São Paulo, 1996.
  • MARAÑÓN,G. Vocación v etica v otros ensaios Buenos Aires, Espasa-Calpe, 1946.
  • PIEPER,J. Abertura para o todo: a chance da universidade (ensaio). São Paulo, Apel Ed., 1989. p.28-9

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Mar 2010
  • Data do Fascículo
    Dez 1996
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