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Estratégias De Comunicação Da Equipe De Enfermagem Na Afasia Decorrente De Acidente Vascular Encefálico* * Extraído da dissertação "Estratégias de comunicação da equipe de enfermagem na afasia após acidente vascular encefálico", Centro de Pós-Graduação e Pesquisa Mestrado em Enfermagem, Universidade de Guarulhos, 2010

Resumos


Estudo exploratório, transversal, de delineamento quantitativo, cujo objetivo foi identificar estratégias de comunicação referidas e usadas pela equipe de enfermagem durante o cuidado de pacientes afásicos após acidente vascular encefálico. Foram utilizadas a técnica de entrevista e a observação participante com 27 sujeitos da equipe de enfermagem de unidades neurológicas de um hospital geral. As estratégias mais referidas foram os gestos (100%), a comunicação verbal (33,3%), a comunicação escrita (29,6 %) e os toques (18,5%). Entre as estratégias observadas, os gestos atingiram 40,7% e o toque esteve presente em todas as situações, dado seu caráter instrumental imprescindível aos cuidados. Os achados indicam desconhecimento da comunicação não verbal, proxêmica, cinésica ou tacêsica. Não foram observadas diferenças significativas entre as categorias profissionais em função do tempo de experiência com respeito às estratégias referidas pelos membros da equipe de enfermagem para cuidar do paciente afásico.


Acidente vascular cerebral 
; Afasia; Comunicação; Equipe de enfermagem
; Relações enfermeiro-paciente



This is an exploratory, cross-sectional study of quantitative design that aimed to identify the communication strategies used and reported by the nursing staff in the care of aphasic patients after a stroke. The techniques used were the participant observation and interviews with 27 subjects of the nursing staff of neurological units in a general hospital. The most frequently mentioned strategies were gestures (100%), verbal communication (33.3%), written communication (29.6%) and the touch (18.5 %). Among the observed strategies, the gestures reached 40.7% and the touch was present in all situations, given its instrumental character essential to care. The findings show lack of knowledge of nonverbal, proxemics , kinesics and tacesics communication. No significant differences were observed among the professional categories depending on the length of experience with respect to the strategies reported by members of the nursing staff in the care for aphasic patients.


Stroke; Aphasia; Communication; Nursing, team
; Nurse-patient relations



Estudio exploratorio de corte transversal, cuantitativo, cuyo objetivo fue identificar estrategias de comunicación utilizadas por el equipo de enfermería en el cuidado de pacientes afásicos después de un accidente cerebrovascular. Se utilizaron las técnicas de entrevistas y de observación participante en 27 sujetos del equipo de enfermería de unidades de neurología de un hospital general. Las estrategias más referidas fueron gestos (100%), comunicación verbal (33,3%), comunicación escrita (29,6%) y los toques (18,5%). Entre las estrategias observadas, los gestos alcanzaron el 40,7 % y el toque estaba presente en todas las situaciones dado su carácter instrumental esencial para cuidar. Los resultados indican un desconocimiento de la comunicación no verbal, proxémica, kinésica o háptica. No se observaron diferencias significativas entre las categorías profesionales en función del tiempo de experiencia con respecto a las estrategias mencionadas por los miembros del personal de enfermería para el cuidado de los pacientes con afasia.


Accidente cerebrovascular
; Afasia; Comunicación; Grupo de enfermería
; Relaciones enfermero-paciente



Introdução

O acidente vascular encefálico (AVE) é uma enfermidade crônica com alta incidência nos dias atuais, constituindo importante problema de saúde pública(11.Bejot Y, Benatru I, Rouaud O, Fromont A, Besancenot JP, Moreau T, et al. Epidemiology of stroke in Europe: geographic and environmental differences. J Neurol Sci. 2007;262(1-2):85-8). Dados resultantes do perfil epidemiológico estimam que em 2015 o AVE atingirá 6,3 milhões de pessoas no mundo, com impacto expressivo nos custos em saúde(22.Bonita R, Beaglehole R. Stroke prevention in poor countries: time for action. Stroke. 2007;38(11):2871-2). A doença provoca sequelas cognitivas, motoras, emocionais e de comunicação(33.Falcão IV, Carvalho EMF, Barreto KML, Lessa FJD, Leite VMM. Acidente vascular cerebral precoce: implicações para adultos em idade produtiva atendidos pelo Sistema Único de Saúde. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2004;4(1):95-102), o que repercute em vários aspectos da vida das pessoas por ela acometidas, envolvendo inclusive seus familiares. Entre essas incapacidades, destaca-se a afasia, déficit de comunicação que afeta o uso e a compreensão da linguagem(44.Hilari K, Needle JJ, Harrison KL. What are the important factors in health-related quality of life people with aphasia? A systematic review. Arch Phys Med Rehabil. 2012;93(1 Suppl):S86-95) e atinge de 21 a 38% dos pacientes que sofreram um AVE(55.Engelter ST, Gostynski M, Papa S, Frei M, Born C, Ajdacic-Gross V, et al. Epidemiology of aphasia attributable to first ischemic stroke: incidence, severity, fluency, etiology, and thrombolysis. Stroke. 2006;37(6):1379-84). É frequentemente associada à depressão(66.Pontes AC, Leitão IMTA, Ramos IC. Comunicação terapêutica em enfermagem: instrumento essencial do cuidado. Rev Bras Enferm. 2008;61(3):312-8), por influenciar negativamente as atividades da vida diária e a independência, para a qual a comunicação é fundamental. 


A comunicação terapêutica com pacientes afásicos é considerada elemento essencial no cuidado, estando associada aos resultados da assistência de enfermagem e influindo positivamente na relação entre profissionais, pacientes e familiares. Os profissionais de saúde devem estar preparados para utilizar esse tipo de comunicação, que tem como objetivo o uso da habilidade e do conhecimento próprios da área para ajudar a pessoa com limitações físicas temporárias a se adaptar a uma nova fase da vida(66.Pontes AC, Leitão IMTA, Ramos IC. Comunicação terapêutica em enfermagem: instrumento essencial do cuidado. Rev Bras Enferm. 2008;61(3):312-8). Acredita-se que essa adaptação influencia as condições emocionais e o tempo de recuperação, diminuindo o período de hospitalização. 


Classificam-se nessa condição os tipos de comunicação de acordo com os recursos utilizados e com a finalidade de estabelecer uma definição que facilite sua compreensão entre os profissionais. Assim, a comunicação cinésica refere-se aos gestos; a tacêsica, ao toque e a proxêmica, à proximidade, estando incluídas na comunicação não verbal. 


Os profissionais de enfermagem permanecem próximos aos pacientes a maior parte do tempo de seus turnos de trabalho devido à necessidade de desempenhar muitos procedimentos. Observam-se dificuldades desses profissionais na execução do cuidado aos pacientes com afasia e a comunicação em geral é inexpressiva, desprovida de qualquer traço de empatia e não terapêutica. O uso de estratégias de comunicação apropriadas é elemento essencial no cuidado, porque promove segurança e satisfação(77.Caron OAF, Silva IA. Parturiente e equipe obstétrica: a difícil arte da comunicação. Rev Latino Am Enferm. 2002;10(4):485-92). 


A afasia deixa o paciente vulnerável, com risco elevado de resultados insatisfatórios da assistência em decorrência de eventos adversos, pela impossibilidade ou limitações para expressar suas necessidades e insatisfações referentes aos cuidados de saúde. Em recente estudo no Canadá, os pacientes afásicos apresentaram piores resultados em relação à qualidade de vida, quando comparados aos pacientes em outras condições, revelando o impacto negativo da afasia em sua independência, nas relações sociais e em seu ambiente de vida. Portanto, a habilidade de comunicação terapêutica é essencial para o profissional de enfermagem, podendo ser uma intervenção essencial para melhorar a qualidade de vida dessas pessoas, sendo necessário estudos futuros que confirmem essa hipótese. Dessa maneira, torna-se fundamental o conhecimento dos aspectos relacionados a essa temática que possam auxiliar no mapeamento das condições atuais do cuidado e da percepção dos envolvidos quanto a essa problemática; já que se constitui em lacuna importante da assistência.


Este estudo teve como objetivo descrever as estratégias de comunicação referidas e usadas pelos membros da equipe de enfermagem para cuidar do paciente afásico após AVE.


Método

Estudo com corte transversal, em que entrevistas foram usadas para obter as informações referentes às estratégias usadas e observação de campo para verificar sua aplicação durante os cuidados de enfermagem prestados pelos mesmos sujeitos entrevistados. Considera-se o delineamento quantitativo, porque os dados registrados no diário de campo foram categorizados, quantificados e tratados quantitativamente. Os dados foram colhidos em unidades de internação destinadas ao atendimento de pacientes neurológicos, em um hospital geral no município de São Paulo.


A amostra foi constituída por 27 sujeitos, (seis enfermeiros, 11 técnicos e dez auxiliares de enfermagem), que representaram 69% dos integrantes das equipes de enfermagem das unidades onde o estudo foi realizado. Foram incluídos os profissionais que estavam atuando na assistência direta aos pacientes e que aceitaram participar do estudo, e excluídos aqueles que se encontravam de férias, licença médica ou que exerciam atividades administrativas. Após contatos preliminares para recrutamento, ocorreu agendamento individual para realização de entrevistas e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.


A coleta de dados foi realizada pelo primeiro autor do estudo em duas fases: 1ª) entrevista semiestruturada, previamente agendada com cada participante do estudo, em local reservado na clínica neurológica, durante seu horário de trabalho. Uso de formulário contendo dados demográficos, profissionais e questões fechadas e abertas sobre as estratégias. 2ª) Observação dos mesmos sujeitos executando cuidados de enfermagem, com uso de diário de campo, tendo como referência o roteiro elaborado pelo pesquisador, incluindo os principais aspectos sobre as estratégias a ser observadas. A etapa de observação foi realizada sobretudo no período da manhã, quando é realizada a maioria dos cuidados de enfermagem, sendo anotadas no diário de campo as estratégias de comunicação e as atitudes do participante durante esses cuidados. 


Os dados foram classificados em variáveis qualitativas, que foram analisadas estatisticamente por frequências absolutas e relativas, e em variáveis quantitativas, analisadas pelo teste exato de Fisher.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da instituição sob o protocolo de número 505/09.


Resultados

Características sociodemográficas

A média de idade dos 27 participantes no estudo foi de 34 anos de idade ±8,4, sendo que 55,2% da amostra tinha menos de 35 anos de idade, e 55,5% atuava por mais de cinco anos com pacientes que sofreram AVE. Quanto ao tempo de formado, a média foi de 7,8 anos ± 6,0 e o tempo de atuação no cuidado com pacientes com AVE foi de 4,8 anos ± 3,7.


Não foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre as categorias profissionais (p>0,05) quanto às estratégias referidas. Destaca-se a ausência de referência do toque pelos enfermeiros. O tipo de comunicação predominante foram os gestos, o uso de papel e caneta e a comunicação verbal.


As estratégias referidas pelos participantes em relação ao tempo de experiência profissional tampouco apresentam diferenças significativas entre os mais e os menos experientes. Nos dois grupos, os gestos atingiram as maiores frequências, tendo sido referidos por todos os entrevistados. Chama atenção que o uso de papel e caneta e falar pausadamente foram referidos apenas pelos sujeitos com menos experiência, atingindo um terço deles. Evidenciam-se baixas frequências para a maioria das estratégias referidas (Tabela 2).


Tabela 1
Estratégias de comunicação referidas pelos profissionais da equipe de enfermagem - São Paulo, SP, Brasil, 2010
Tabela 2
Estratégias de comunicação referidas pelos participantes em função do tempo de experiência profissional - São Paulo, SP, Brasil, 2010
Figura 1

Estratégias de comunicação referidas e observadas no cuidado do paciente afásico - São Paulo, SP, Brasil, 2010


A Figura 1 exibe as diferenças entre as estratégias segundo as técnicas de coleta dos dados utilizadas e revela o uso consistente da comunicação não verbal com base na observação realizada.


Discussão

Os resultados obtidos revelaram o uso de abordagens metodológicas adequadas para a identificação das estratégias usadas no cuidado do paciente afásico. Confrontar o conhecimento teórico concernente às estratégias em função dos dados das entrevistas e compará-las às empregadas no campo assistencial permitiu verificar uma dicotomia preocupante no saber/fazer de algumas técnicas de comunicação e desconhecimento teórico em outras. Contudo, o mais evidenciado foi o automatismo presente na realização dos cuidados, executados com poucas iniciativas de comunicação não verbal e apatia por parte de muitos pacientes.


A comunicação efetiva entre os pacientes que sofreram AVE e a equipe assistencial muitas vezes não é atingida devido à resistência dos profissionais em aprender métodos novos e mais eficazes. Contudo, estabelecer medidas eficazes na interação com esses pacientes traz resultados com impacto positivo na assistência. 


Verificou-se que os gestos, a comunicação verbal, o recurso do uso de papel e caneta foram as estratégias mais referidas pelos profissionais, com 100, 54,5 e 50%, respectivamente. Entre as estratégias observadas, a comunicação verbal, o toque e a proximidade foram as mais frequentes. Já os gestos, estratégia mais referida pelos participantes, estiveram presentes em menor intensidade durante o cuidado, com um percentual de 40,7%. Eles exercem relevante papel na decodificação das mensagens recebidas durante as interações profissionais ou pessoais(1111.Silva LMG, Brasil VV, Guimarães HCQCP, Savonitti BHRA, Silva MJP. Comunicação não verbal: reflexões acerca da linguagem corporal. Rev Latino Am Enferm. 2000;8(4):52-8) e a equipe deve receber orientação quanto a sua importância para facilitar o processo de entendimento entre quem cuida e quem está sob cuidados. 


As expressões e as manifestações corporais são elementos fundamentais para o processo de comunicação, razão de sua ampla utilização. Em estudo feito com graduandos de enfermagem sobre o significado da comunicação não verbal, os gestos e a expressão facial foram os símbolos mais apontados nas relações humanas(1212.Santos CCV, Shiratori K. A influência da comunicação não verbal no cuidado de enfermagem. Rev Bras Enferm. 2005;58(4):434-7). Há autores, entretanto, que afirmam que a comunicação tacêsica (toque) é a estratégia mais usada na comunicação com os clientes, o que está em consonância com a nossa observação. Apesar de os gestos serem mais prevalentes que o toque na opinião dos participantes, este último é uma ferramenta no processo de comunicação observado, porém com relevante caráter instrumental. Além dos ilustradores, não foram observados outros tipos de gestos, como os emblemáticos, os reguladores e os afetivos.


Com relação às estratégias referidas e o ao tempo de formado, os gestos também foram comuns e com grande predomínio tanto entre os que concluíram seu curso de formação há menos de cinco anos, como entre aqueles com mais de cinco anos; sendo que entre os primeiros a comunicação escrita e falar pausadamente também foram muito utilizados. Os com mais tempo de formados utilizam, além dos gestos, a comunicação verbal.


Identificou-se que a amostra incluiu profissionais jovens, sobretudo técnicos e auxiliares de enfermagem com 7,8 anos de formação e experiência com pacientes pós-AVE de 4,8 anos, características que pareceram não interferir nos resultados de uma comunicaçao efetiva. A literatura afirma que não há evidências que associem o tempo de atuação com melhor desempenho na comunicação(1010.Schneider CC, Bielemann VLM, Sousa AS, Quadros LCM, Kantorski LP. Comunicação na unidade de tratamento intensivo, importância e limites- visão da enfermagem e familiares. Cienc Cuid Saúde. 2009;8(4):531-9), porém existem dados que confirmam que a experiência facilita a comunicação com pessoas com incapacidades de se comunicar(66.Pontes AC, Leitão IMTA, Ramos IC. Comunicação terapêutica em enfermagem: instrumento essencial do cuidado. Rev Bras Enferm. 2008;61(3):312-8). Isto leva à reflexão de que a comunicação é uma habilidade que não é desenvolvida e/ou exigida nos cursos de formação profissional na área da saúde. Essa situação tende a mudar, porque atualmente a ênfase é dada ao desenvolvimento dessa competência em profissionais, pela demanda de relações adequadas com as pessoas em seus mais diversos contextos de vida. Essa habilidade vem sendo incluída na definição dos perfis profissionais e nos currículos, principalmente dos enfermeiros, presentes em minoria na amostra deste estudo. 


A comunicação proxêmica, presente em todas as interações observadas entre os sujeitos deste estudo, foi relacionada por acadêmicos de enfermagem como a principal influência da comunicação não verbal durante os cuidados de enfermagem(1313.Silva MJP. Percebendo o ser humano além da doença: o não verbal detectado pelo enfermeiro. Nursing (São Paulo). 2001;4(41):14-20). A grande utilização desse tipo de comunicação justifica-se pela necessidade de aproximação enfermeiro-cliente, essencial no relacionamento interpessoal que faz parte do processo terapêutico(1313.Silva MJP. Percebendo o ser humano além da doença: o não verbal detectado pelo enfermeiro. Nursing (São Paulo). 2001;4(41):14-20). Há de se considerar, entretanto, que os cuidados observados poderiam introduzir viés na avaliação dessa variável, pois é impossível para o profissional executá-los sem estar próximo do paciente. A forma como o profissional ocupa um espaço que pertence ao paciente exige dele o conhecimento necessário para que o sujeito de suas ações não se sinta inadequadamente invadido(1414.Prochet TC, Silva MJP. Proxêmica: as situações reconhecidas pelo idoso hospitalizado que caracterizam sua invasão do espaço pessoal e territorial. Texto Contexto. 2008;17(2):321-6). É nesse momento que o uso de técnicas de comunicação apropriadas pode garantir o diferencial que as ações de enfermagem necessitam atingir.


A comunicação tacêsica esteve presente em todas as atividades observadas e ocorreu igualmente por estar relacionada à execução dos procedimentos. Esse tipo de comunicação envolve o uso das mãos e, se usado corretamente, permite um atendimento mais humanizado(1313.Silva MJP. Percebendo o ser humano além da doença: o não verbal detectado pelo enfermeiro. Nursing (São Paulo). 2001;4(41):14-20). Neste estudo, seu uso durante o cuidado pode ser classificado como toque instrumental, porque foi o tipo de toque necessário para o desenvolvimento das técnicas, não objetivando outra finalidade. Esse fato leva a pressupor que os profissionais aplicaram o recurso sem a consciência de sua importância e sua indicação na relação cliente-profissional, em consonância com o estudo que observou predominância do toque instrumental sobre o instrumental-afetivo e afetivo(1515.Pinheiro EM, Rocha IF, Silva MCM. Identificação dos tipos de toque ocorridos no atendimento de enfermagem de um serviço ambulatorial. Rev Esc Enferm USP. 1998;32(3):192-8). Seus autores atestaram que os profissionais de enfermagem devem compreender que o processo de cuidar também é uma forma de comunicação não verbal. Em outro estudo observacional(1616.Gala MF, Telles SCR, Silva MJP. Ocorrência e significado do toque entre profissionais de enfermagem e pacientes de uma UTI e unidade semi-intensiva cirúrgica. Rev Esc Enferm USP. 2003;37(1):52-61) foi constatado que os profissionais têm consciência da importância do toque para uma assistência de qualidade, em contraposição aos achados desta pesquisa, na qual foi referido por menos de um quinto dos sujeitos. 


As diferenças observadas entre os dados da entrevista semiestruturada e a observação de campo podem estar associadas ao fato de a comunicação verbal não ser importante na concepção dos profissionais e também porque não possuem conhecimento fundamentado sobre comunicação, já que informaram não ter recebido esse conteúdo específico durante seu desenvolvimento profissional. Em recente estudo sobre fatores que influenciam a comunicação entre pacientes com incapacidade de comunicação e os profissionais de saúde, o conhecimento sobre o tema e das habilidades de comunicação foram relacionados. Assim, a falta de preocupação e o desconhecimento das estratégias de comunicação não verbal impossibilitam estabelecer comunicação efetiva com esses pacientes(1717.O’Halloran R, Grohn B, Worrall L. Environmental factors that influence communication for patients with a communication disability in acute hospital stroke units: a qualitative metasynthesis. Arch Phys Med Rehabil. 2012;93(1 Suppl):S77-85). 


Esses aspectos são importantes porque a complexidade imposta pelo atendimento ao paciente afásico implica apoio aos profissionais que, para oferecer cuidado em situações difíceis, requerem atenção especial das instituições acadêmicas e assistenciais. O conhecimento e o desenvolvimento de habilidades são necessários nessas situações, bem como o apoio e a existência de políticas e processos institucionais(1111.Silva LMG, Brasil VV, Guimarães HCQCP, Savonitti BHRA, Silva MJP. Comunicação não verbal: reflexões acerca da linguagem corporal. Rev Latino Am Enferm. 2000;8(4):52-8). Oferecer um ambiente que favoreça a comunicação terapêutica associada ao treinamento, ao envolvimento da família, ao ambiente físico adequado e às atitudes dos profissionais são fatores essenciais para estabelecer uma comunicação adequada(1818.O’Halloran R, Worrall L. Environmental factors that influence communication between patients and their healthcare providers in acute hospital stroke units: an observational study. Int J Lang Commun Disord. 2011;46(1):30-47). Investigação realizada com pessoas com afasia mostrou que estas se comunicam melhor com profissionais que foram devidamente capacitados(1919.Simmons-Mackie NN, Cristie CO, Kagan A, Huijbregts M, McEwen, Willems J. Communicative access and decision making for people with aphasia: implementing sustainable healthcare systems change. Aphasiology. 2007;21(1):39-66). 


Este estudo apresentou algumas limitações que podem ter influenciado os resultados. A primeira foi que o pesquisador não fazia parte da equipe de enfermagem estudada, o que pode ter influenciado a coleta de dados durante o período de observação, uma vez que, mesmo sabendo dos objetivos do estudo, terem se mostrado disponíveis e aparentemente seguros em suas respostam durante a entrevista, os participantes pareciam se sentir incomodados com o fato de estarem sendo observados. Isso pode ter feito que não utilizassem todos os recursos que habitualmente usam em seu dia a dia. 


Sugere-se a realizaçao de estudos em que seja incluída a observação da interação profissionalpaciente em momentos de encaminhamentos para exames, preparo para alta e outras situações não rotineiras. E também estudos com maior disponibilidade de tempo do pesquisador, que associem as dificuldades com o grau de lesão, o deficit neuronal, o tipo de afasia e a avaliação do estado emocional do paciente após AVE. 


Apesar das limitações, este estudo oportunizou refletir sobre a atuação do profissional de enfermagem no que concerne a falta de instrumentalização sobre as técnicas de comunicação. A dificuldade na comunicação com os pacientes com afasia após AVE reflete a ausência de programas de formação e capacitação para os profissionais de saúde.


Considerada um instrumento básico da enfermagem, a comunicação deve ser encarada como uma capacidade a ser desenvolvida pelos enfermeiros, independentemente de sua área de atuação. Por meio dessa habilidade, identificamos, compreendemos e contribuímos para a resolução dos problemas dos pacientes e de seus familiares.


Conclusão

Não foram observadas diferenças significativas entre as categorias profissionais em função do tempo de experiência com respeito às estratégias referidas pelos membros da equipe de enfermagem para cuidar do paciente afásico. As estratégias observadas contrapõem-se às referidas em frequência e qualidade, tendo-se constatado nas entrevistas, embora com baixas frequências, maior diversidade de recursos que facilitam a comunicação, porém seu uso não foi observado na prática. 


A comunicação não verbal tacêsica e a proxêmica foram observadas porque os cuidados de enfermagem exigiam o toque instrumental e a proximidade do paciente, o que torna a avaliação de seu uso complexa e discutível. 


As estratégias de comunicação utilizadas pela equipe de enfermagem com os pacientes afásicos são aplicadas de maneira informal, sem conhecimento apropriado dos profissionais e sem esforços para ser atingida uma comunicação mais terapêutica.


  • *
    Extraído da dissertação "Estratégias de comunicação da equipe de enfermagem na afasia após acidente vascular encefálico", Centro de Pós-Graduação e Pesquisa Mestrado em Enfermagem, Universidade de Guarulhos, 2010

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Abr 2014

Histórico

  • Recebido
    03 Set 2013
  • Aceito
    22 Jan 2014
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