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Gerenciamento dos sintomas relacionados à quimioterapia em crianças e adolescentes: perspectivas de cuidadores familiares

RESUMO

Objetivo:

Descrever os sintomas associados ao tratamento quimioterápico e as estratégias utilizadas para seu gerenciamento na perspectiva de cuidadores familiares de pacientes oncológicos pediátricos.

Métodos:

Estudo descritivo, com análise qualitativa dos dados. A coleta dos dados deu-se em um hospital pediátrico, de dezembro de 2017 a dezembro de 2018, com cuidadoras familiares de pacientes pediátricos em quimioterapia. Realizaram-se entrevistas semiestruturadas, submetidas à análise de conteúdo indutiva. Utilizaram-se conceitos da Symptom Management Theory para a discussão dos resultados.

Resultados:

Participaram 18 cuidadoras familiares. Foram citados pelas participantes: sintomas físicos, principalmente fraqueza, alopecia, baixa imunidade, dor, mucosite, constipação, náuseas e vômitos; sintomas emocionais ou psicossociais, como tristeza e alterações de humor; e sintomas constitucionais, como inapetência e febre. Medidas farmacológicas e não farmacológicas foram mencionadas no gerenciamento dos sintomas e dos efeitos adversos.

Conclusão:

As participantes demonstraram habilidades para identificar e gerenciar os sintomas da quimioterapia. Conhecer a experiência dessas famílias pode auxiliar o enfermeiro no planejamento do cuidado e de intervenções que minimizem esses eventos.

DESCRITORES
Neoplasias; Tratamento Farmacológico; Efeitos Colaterais e Reações Adversas Relacionados a Medicamentos; Cuidadores; Enfermagem Pediátrica

ABSTRACT

Objective:

To describe the chemotherapy-associated symptoms and the strategies used for their management from the perspective of pediatric cancer patients’ family caregivers.

Methods:

This is a descriptive study with qualitative data analysis. Data collection took place in a pediatric hospital, from December 2017 to December 2018, with family caregivers of pediatric patients undergoing chemotherapy. Semi-structured interviews, subjected to inductive content analysis, were carried out. Concepts from the Symptom Management Theory were used to discuss the results.

Results:

Eighteen family caregivers participated. The participants mentioned: physical symptoms, especially weakness, alopecia, low immunity, pain, mucositis, constipation, nausea, and vomiting; emotional or psychosocial symptoms such as sadness and mood changes; and constitutional symptoms such as loss of appetite and fever. Pharmacological and non-pharmacological measures were mentioned in the management of symptoms and adverse effects.

Conclusion:

Participants demonstrated skills to identify and manage symptoms of chemotherapy. Knowing the experience of these families can help nurses in planning care and interventions to minimize these events.

DESCRIPTORS
Neoplasms; Drug Therapy; Drug-Related Side Effects and Adverse Reactions; Caregivers; Pediatric Nursing

RESUMEN

Objetivo:

Describir los síntomas asociados al tratamiento quimioterapico y las estrategias utilizadas para su gestión en la perspectiva de cuidadores familiares de pacientes oncológicos pediátricos.

Método:

Estudio descriptivo, con análisis cualitativo de los datos. La colecta de los datos ocurrió en un hospital pediátrico, entre los meses de diciembre de 2017 y diciembre de 2018, con cuidadores familiares de pacientes pediátricos en tratamiento quimioterapico. Se realizaron entrevistas semiestructuradas sometidas al análisis de contenido inductivo. Se utilizaron conceptos de la Symptom Management Theory para la discusión de los resultados.

Resultados:

Participaron 18 cuidadoras familiares. Fueron citados por las participantes: síntomas físicos, principalmente, debilidad, alopecia, baja inmunidad, dolor, mucositis, constipación, mareo y vómitos; síntomas emocionales o psicosociales, como tristeza y alteraciones del humor y síntomas constitucionales como inapetencia y fiebre. Medidas farmacológicas y no farmacológicas fueron mencionadas en la gestión de los síntomas y de los efectos adversos.

Conclusión:

Las participantes demostraron habilidades para identificar y gestionar los síntomas de la quimioterapia. Conocer la experiencia de esas familias puede auxiliar el enfermero en la planificación del cuidado y de intervenciones que atenúen esos eventos.

DESCRITORES
Neoplasias; Quimioterapia; Efectos Colaterares y Reacciones Adversas Relacionados con Medicamentos; Cuidadores; Enfermería Pediátrica

INTRODUÇÃO

O câncer infantojuvenil corresponde a um grupo de doenças que compartilham a proliferação descontrolada de células anormais.(11. Brasil. Ministério da Saúde; Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estimativa 2020: incidência de câncer no Brasil [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2019 [cited 2020 jun. 11]. Available from: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files/media/document/estimativa-2020-incidencia-de-cancer-no-brasil.pdf
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) Nos Estados Unidos, sua incidência aumenta lentamente a cada ano e, para 2020, estimam-se 11.050 novos casos entre indivíduos de zero a 14 anos.(22. American Cancer Society. Cancer facts & figures [Internet]. Atlanta: ACS; 2020 [cited 2020 June 11]. Available from: https://www.cancer.org/content/dam/cancer-org/research/cancer-facts-and-statistics/annual-cancer-facts-and-figures/2020/cancer-facts-and-figures-2020.pdf
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) No Brasil, o câncer representa a primeira causa de morte por doença entre crianças e adolescentes de 1 a 19 anos e, para 2020, estimam-se 8.460 novos casos da doença.(11. Brasil. Ministério da Saúde; Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estimativa 2020: incidência de câncer no Brasil [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2019 [cited 2020 jun. 11]. Available from: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files/media/document/estimativa-2020-incidencia-de-cancer-no-brasil.pdf
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) O câncer infantojuvenil predomina no sexo masculino, e os tipos mais incidentes são a leucemia, os tumores do sistema nervoso central e os linfomas.(11. Brasil. Ministério da Saúde; Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estimativa 2020: incidência de câncer no Brasil [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2019 [cited 2020 jun. 11]. Available from: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files/media/document/estimativa-2020-incidencia-de-cancer-no-brasil.pdf
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22. American Cancer Society. Cancer facts & figures [Internet]. Atlanta: ACS; 2020 [cited 2020 June 11]. Available from: https://www.cancer.org/content/dam/cancer-org/research/cancer-facts-and-statistics/annual-cancer-facts-and-figures/2020/cancer-facts-and-figures-2020.pdf
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)

A quimioterapia é a principal modalidade de tratamento oncológico.(33. Di Battista A, Dupuis LL, Cassidy M, Portwine C, Johnston DL, Pradier Silva M, et al. Parent attributions about child symptoms related to cancer therapy. J Pediatr Oncol Nurs. 2017;34(1):44-50. https://doi.org/10.1177/1043454215628002
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) A taxa de sobrevida global em 5 anos para todos os cânceres na infância melhorou acentuadamente nos últimos 30 anos, graças a quimioterápicos modernos e seletivos.(44. Miller KD, Siegel RL, Lin CC, Mariotto AB, Kramer JL, Rowland JH, et al. Cancer treatment and survivorship statistics, 2016. CA Cancer J Clin. 2016;66(4):271-89. https://doi.org/10.3322/caac.21349
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) Apesar de sua eficácia, essas drogas não diferenciam células normais das cancerosas e causam vários efeitos adversos.(33. Di Battista A, Dupuis LL, Cassidy M, Portwine C, Johnston DL, Pradier Silva M, et al. Parent attributions about child symptoms related to cancer therapy. J Pediatr Oncol Nurs. 2017;34(1):44-50. https://doi.org/10.1177/1043454215628002
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)

Efeitos adversos são aqueles prejudiciais, indesejáveis e observáveis, que podem ocorrer durante e/ou após intervenções e uso de medicamentos. Consideram-se efeitos adversos quando é possível estabelecer relação causal entre o tratamento medicamentoso e o efeito observado.(55. Brasil. Ministério da Saúde; Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Farmacovigilância [Internet]. Brasília: ANVISA; 2020 [cited 2020 jun. 11]. Available from: http://portal.anvisa.gov.br/farmacovigilancia
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66. World Health Organization. Glossary of terms in pharmacovigilance [Internet]. Geneva: WHO; 2018 [cited 2020 June 11]. Available from: https://www.who-umc.org/global-pharmacovigilance/global-pharmacovigilance/glossary/
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) Eles são considerados sintomáticos quando alteram o funcionamento do organismo e, nesses casos, denominam-se sintomas. Esses geralmente são perceptíveis e podem ser relatados pelo próprio paciente ou cuidador.(77. Armstrong TS. Symptoms experience: a concept analysis. Oncol Nurs Forum. 2003;30(4):601-6. https://doi.org/10.1188/03.ONF.601-606
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)

O tratamento do câncer infantojuvenil causa sintomas e efeitos adversos físicos, emocionais e psicossociais, como dor, náusea, vômito, fadiga, alopecia, mucosite, imunossupressão, distúrbios do sono e alterações de apetite e emocionais.(44. Miller KD, Siegel RL, Lin CC, Mariotto AB, Kramer JL, Rowland JH, et al. Cancer treatment and survivorship statistics, 2016. CA Cancer J Clin. 2016;66(4):271-89. https://doi.org/10.3322/caac.21349
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,88. Torres V, Nunes MDR, Silva-Rodrigues FM, Bravo L, Adlard K, Secola R, et al. Frequency, severity, and distress associated with physical and psychosocial symptoms at home in children and adolescents with cancer. J Pediatr Health Care. 2019;33(4):404-14. https://doi.org/10.1016/j.pedhc.2018.11.007
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) A identificação e a avaliação desses eventos desafiam a prática clínica, pois requerem que os profissionais lidem com um processo biopsicossocial complexo e analisem fatores por meio da observação, do autorrelato da criança e do relato dos pais.(99. Chitra P, Priya MB. Awareness regarding adverse effects of chemotherapy among parents of children attending oncology units of AIMS. Int J Nurs Care. 2014;2(2):20. https://doi.org/10.5958/2320-8651.2014.01264.2
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)

Geralmente, a família é responsável por acompanhar a criança/o adolescente durante o tratamento, e a mãe comumente é a cuidadora primária.(1010. Almico T, Faro A. Coping of caregivers of children with cancer in chemotherapy process. Psicol Saúde Doenças. 2014;15(3):723-37. https://doi.org/10.15309/14psd150313
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) Os cuidadores, por passarem mais tempo com as crianças/adolescentes, tornam-se capazes de identificar mudanças e sintomas relacionados à terapêutica e são aliados dos profissionais de saúde.(99. Chitra P, Priya MB. Awareness regarding adverse effects of chemotherapy among parents of children attending oncology units of AIMS. Int J Nurs Care. 2014;2(2):20. https://doi.org/10.5958/2320-8651.2014.01264.2
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1010. Almico T, Faro A. Coping of caregivers of children with cancer in chemotherapy process. Psicol Saúde Doenças. 2014;15(3):723-37. https://doi.org/10.15309/14psd150313
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)

A literatura traz diversas metodologias e perspectivas sobre o gerenciamento de sintomas relacionados ao tratamento oncológico.(1111. Gonzalez-Mercado VJ, Williams PD, Williams AR, Pedro E, Colon G. The symptom experiences of Puerto Rican children undergoing cancer treatments and alleviation practices as reported by their mothers. Int J Nurs Pract. 2017;23(1). https://doi.org/10.1111/ijn.12500
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1414. Sarmento LS, Silva LF, Goes FG, Paiva ED, Depianti JR. A visão dos familiares quanto às orientações realizadas junto à criança em quimioterapia antineoplásica. Cogitare Enferm. 2016;21(1):1-9. http://dx.doi.org/10.5380/ce.v21i1.42835
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) Contudo, não se identificaram estudos que explorassem sintomas decorrentes da quimioterapia e seu gerenciamento, conforme as experiências de familiares de crianças/adolescentes com câncer, e que discutissem seus dados à luz da Symptom Management Theory (SMT).(1515. Smith MJ, Liehr PR. Middle range theory for nursing. New York: Springer; 2018.) Essa teoria apresenta três conceitos essenciais: experiência com o sintoma, estratégias para seu gerenciamento e resultados decorrentes do sintoma. Em estudos na área pediátrica, ela foi utilizada apenas no contexto da asma e do HIV.(1616. Newcomb P. Using symptom management theory to explain how nurse practitioners care for children with asthma. J Theory Constr Test. 2010;14(2):40-4.1717. Loades ME, Kagee A. Exploring our understanding of fatigue among adolescents living with HIV: highlighting the unknown. J Health Psychol. 2019;24(1):125-36. https://doi.org/10.1177/1359105317710320
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)

Esta pesquisa buscou responder às questões: “Como os sintomas associados ao tratamento quimioterápico são descritos pelos cuidadores familiares de crianças e adolescentes com câncer? Que estratégias eles utilizam para seu gerenciamento?”

Este estudo objetivou descrever os sintomas associados ao tratamento quimioterápico e as estratégias para seu gerenciamento, na perspectiva de cuidadores familiares de pacientes oncológicos pediátricos.

MÉTODO

Tipo do Estudo

Estudo descritivo, com análise qualitativa dos dados, que usou conceitos da SMT(1212. Linder LA, Al-Qaaydeh S, Donaldson G. Symptom characteristics among hospitalized children and adolescents with cancer. Cancer Nurs. 2018;41(1):23-32. https://doi.org/10.1097/NCC.0000000000000469
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,1515. Smith MJ, Liehr PR. Middle range theory for nursing. New York: Springer; 2018.,1818. Dodd M, Janson S, Facione N, Faucett J, Froelicher ES, Humphreys J, et al. Advancing the science of symptom management. J Adv Nurs. 2001;33(5):668-76. https://doi.org/10.1046/j.1365-2648.2001.01697.x
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) para melhor compreender e discutir as experiências de cuidadores de crianças/adolescentes em quimioterapia.

Local

O estudo foi realizado em um hospital pediátrico no interior de São Paulo, o qual atende doze especialidades e contém leitos exclusivos para quimioterapia. Todas as enfermarias da unidade pediátrica possuem dois leitos, exceto as enfermarias de isolamento respiratório e de contato, que são individuais.

População

Selecionaram-se, por conveniência, os participantes que atenderam aos critérios de inclusão: cuidadores familiares, maiores de 18 anos, de crianças e adolescentes que tivessem realizado pelo menos um ciclo completo de quimioterapia. Excluíram-se cuidadores familiares de crianças que estivessem realizando outra modalidade de tratamento concomitante à quimioterapia ou fora de possibilidades terapêuticas curativas. Interrompeu-se o recrutamento de novos participantes quando o conjunto de dados foi suficiente para alcançar o objetivo proposto na pesquisa, observando-se a qualidade dos dados para a compreensão do fenômeno em estudo e a escassez de novos elementos para as análises previstas, constatando-se, assim, a suficiência teórica dos dados.(1919. Fontanella BJB, Luchesi BM, Saidel MGB, Ricas J, Turato ER, Melo DG. Amostragem em pesquisas qualitativas: proposta de procedimentos para constatar saturação teórica. Cad Saúde Pública. 2011;27(2):388-94. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011000200020
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2020. O’Reilly M, Parker N. Unsatisfactory saturation: a critical exploration of the notion of saturated sample sizes in qualitative research. Qual Res. 2012;13(2):190-7. https://doi.org/10.1177/1468794112446106
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)

Coleta de Dados

A coleta de dados ocorreu na clínica pediátrica de um hospital público paulista, de dezembro de 2017 a dezembro de 2018, por meio de entrevistas semiestruturadas, com duração média de 37 minutos e realizadas num único encontro com cada participante. O local da entrevista foi selecionado pelas próprias participantes, sendo que a maioria (n = 15) preferiu permanecer ao lado da criança ou adolescente na enfermaria durante a entrevista. Três delas decidiram que as entrevistas deveriam ser realizadas fora da enfermaria, nas dependências do refeitório ou da brinquedoteca. Independentemente do local escolhido, as pesquisadoras zelaram pela privacidade e conforto das participantes, garantindo que o local de escolha tivesse pouco ruído e baixo fluxo de pessoas.

Duas pesquisadoras conduziram as entrevistas, sendo uma enfermeira, com experiência em pesquisa qualitativa, e a outra uma estudante de enfermagem, treinada e supervisionada pela equipe de pesquisa. Ambas não estavam envolvidas nos cuidados das crianças/adolescentes e não tiveram contato prévio com os participantes.

Antes das entrevistas, consultaram-se os prontuários das crianças e adolescentes, para certificação do diagnóstico, fase da doença e modalidade de tratamento empregada. Realizaram-se as primeiras três entrevistas para verificar a pertinência do roteiro, previamente elaborado pelas autoras e com questões que introduziam o entrevistado paulatinamente na temática investigada. São exemplos dessas questões: Conte-me como o(a) senhor(a) acha que a quimioterapia age no corpo do seu filho (nome da criança/adolescente); Quais sintomas o(a) senhor(a) observa quando seu filho (nome da criança/adolescente) recebe quimioterapia?

Análise e Tratamento dos Dados

As entrevistas audiogravadas foram integralmente transcritas e analisadas concomitantemente à coleta, conforme etapas da análise de conteúdo indutiva: preparação, organização e relato dos resultados.(2121. Elo S, Kyngäs H. The qualitative content analysis process. J Adv Nurs. 2008;62(1):107-15. https://doi.org/10.1111/j.1365-2648.2007.04569.x
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) Na primeira, duas pesquisadoras selecionaram unidades de significado, após sucessivas leituras dos depoimentos. A organização dos dados deu-se por meio da codificação, que permitiu a seleção de conteúdo para viabilizar insights e abstrações pelas pesquisadoras. Tal conteúdo foi sintetizado e agrupado por similaridade em categorias, validadas por pesquisadora experiente em análise qualitativa. A fase de relato dos resultados apresenta-se em categorias, em conjunto com a frequência dos sintomas e dos efeitos adversos reportados, ambos validados pelas autoras. Seguiram-se as diretrizes do Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ)(2222. Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ): a 32-item checklist for interviews and focus groups. Int J Qual Health Care. 2007;19(6):349-57. https://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042
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) para aumentar o rigor no relato da pesquisa.

Aspectos Éticos

Esse estudo recebeu aprovação ética das instituições envolvidas, Parecer 2.561.591/18. Os participantes foram informados dos objetivos da pesquisa e dos procedimentos para obtenção dos dados e, sob anuência, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Para preservar o anonimato, optou-se por identificar os participantes com a letra E, seguida do número da entrevista (E1, E2 etc.).

RESULTADOS

Entrevistaram-se 18 participantes, todos do sexo feminino, a saber: 15 mães (83,5%), uma avó (5,5%), uma tia (5,5%) e uma irmã (5,5%), com idades entre 20 e 60 anos e média de 33,6 anos. O grau de instrução variou do Ensino Fundamental completo ou incompleto (7; 38,9%), Ensino Médio completo ou incompleto (8; 44,4%) a Ensino Superior completo (3; 16,7%). As entrevistadas eram provenientes do interior de São Paulo (16; 88,9%) e de outros estados (2; 11,1%). As crianças e os adolescentes tinham entre 1 e 15 anos (média de 8,4 anos) e diagnósticos de leucemia (7; 39%), linfoma (1; 5,5%), rabdomiossarcoma (3; 16,7%), osteossarcoma (2; 11,1%), sarcomas (1; 5,5%) e outros tumores sólidos (4; 22,2%).

Agruparam-se os resultados em dois temas: Sintomas e efeitos adversos das crianças e dos adolescentes e Gerenciamento dos sintomas e dos efeitos adversos pelas cuidadoras familiares. Os sintomas e os efeitos adversos apresentados pelas crianças e pelos adolescentes e descritos pelas cuidadoras familiares, assim como as estratégias utilizadas por elas para seu gerenciamento, estão representados no Quadro 1.

Quadro 1
Sintomas e efeitos adversos das crianças e dos adolescentes descritos pelas cuidadoras familiares e estratégias utilizadas para seu gerenciamento – Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2019.

Sintomas e Efeitos Adversos das Crianças e dos Adolescentes

Sintomas físicos, emocionais (ou psicossociais) e gerais (ou constitucionais) foram identificados pelas participantes como relacionados à quimioterapia. Dentre os principais sintomas físicos, destacaram-se reações gastrintestinais (náuseas e vômitos), durante ou após sessões de quimioterapia, e a constipação.

Ele (criança) fica meio enjoado, dá ânsia de vômito (E3).

O intestino travou totalmente (E1).

A disgeusia também foi observada nas crianças e nos adolescentes, gerando mudanças no padrão alimentar. Após a quimioterapia, eles deixaram de apreciar determinados alimentos, e outros passaram a aceitar apenas alimentos de sua preferência.

Ela (criança) ficou bem difícil de comer. Depois que começou as quimioterapias ela quis comer só batata frita e macarrão (E11).

A dor foi o sintoma físico mais citado, principalmente cefaleia, lombalgia, dores estomacais e artralgia.

Depois que ele (adolescente) começou a fazer quimioterapia, além dos enjoos, ele tem dores nas ‘juntas’ (E5).

Sonolência e astenia também foram alterações percebidas após o início da quimioterapia.

Se ela (criança) ficar muito tempo de pé, ela começa a querer escorar, agachar, não aguenta porque dá muita fraqueza nela (E7).

Acerca dos efeitos adversos físicos observáveis, quase a totalidade das participantes salientou a alopecia induzida pela quimioterapia.

Ela (criança) sempre teve muito pelinho nas pernas, nas costinhas. Eu vejo que aos poucos está caindo tudo (E17).

Mencionaram-se outras alterações dermatológicas, principalmente pelas cuidadoras familiares de crianças e adolescentes de pele escura, como xerodermia e o escurecimento e enfraquecimento das unhas.

A pele (ficou) muito ressecada. Você vê que é uma pele que não tem vida. Você pode hidratar, mas ainda fica bem ressecada. (...) as unhas dela (criança) ficaram enfraquecidas e pretas (E13).

As participantes citaram as mucosites como efeitos adversos incômodos e a queda da imunidade com apreensão pelos temíveis quadros infecciosos que podiam acometer crianças e adolescentes durante o tratamento.

A resistência de quem faz quimioterapia é diferente. É muito mais propensa (a infecções). Inclusive, ela (criança) já pegou fungos (E10).

Ela (criança) teve ferida na boca (E7).

As cuidadoras familiares também identificaram alterações emocionais e psicossociais decorrentes do tratamento, como revolta e raiva, principalmente nos adolescentes.

Ele (adolescente) fica meio ‘para baixo’, meio entristecido porque gostava tanto de andar de bicicleta, ficar na rua, soltar pipa e agora não pode. Ele fica triste (E9).

Ele (adolescente) ficou um pouco revoltado; anda meio estressado. Às vezes, chora, não quer vir (para o hospital), aí, ele começa: ‘Não quero mais vir!’ (E3).

Uma mãe citou a crise de choro da filha adolescente durante sessão de quimioterapia, reação esta que ela avaliou como assustadora.

Na quimioterapia, o que me assustou foi a crise que deu nela. Colocou a quimioterapia e ela só chorava (E13).

Em relação aos sintomas constitucionais, comuns em outras doenças, a febre foi citada brevemente e esteve relacionada à internação, enquanto emergência oncológica.

Dava febre e ela internava (E14).

A inapetência esteve associada a sintomas físicos, como náuseas, vômitos e disgeusia, e foi considerada sintoma grave, devido à perda de peso que preocupava as cuidadoras.

Me preocupa muito ficar sem comer porque ele emagrece muito rápido; já perdeu 7kg (E6).

Quando questionadas sobre o decorrer dos ciclos de tratamento e a manifestação dos sintomas, cinco depoentes declararam que as reações adversas diminuíram com o tempo:

No começo, o sintoma era mais forte porque era mais quimioterapia. Depois, conforme vai passando as quimioterapias, vai amenizando um pouco (E7).

Cansaço, ele (adolescente) sente bastante. Sentia bastante na primeira fase. Agora que ele está passando pela segunda, não. Está mais animadinho (E9).

Duas mães observaram piora, com o passar dos ciclos de tratamento.

No começo, ele (criança) não tinha tanto relato de sintomas e agora ele está tendo mais (E4).

Gerenciamento dos Sintomas E Dos Efeitos Adversos pelas Cuidadoras

Medidas farmacológicas e não farmacológicas foram empregadas pelas cuidadoras familiares para gerenciar os sintomas. Destacaram-se a administração da medicação prescrita, a alimentação rica em frutas e verduras e o aumento da ingesta hídrica. Para lidar com a inapetência, oferecer alimentos atrativos, dar suplementos alimentares bem tolerados e dispor de estímulos como “quanto melhor se alimenta, mais rápido pode receber alta” foram estratégias usadas por algumas cuidadoras.

Depois que ela (criança) começou os remédios, eu comecei a tratar bem a alimentação, com frutas, legumes e água à vontade (E1).

Máscaras coloridas ou com desenhos, para facilitar a aceitação das crianças de seu uso em lugares com aglomeração de pessoas, foram recursos importantes para lidar com a queda da imunidade.

Eu até conversei com a costureira para fazer mais máscaras, modelinhos com desenho que ela (criança) quer (E17).

Terapias complementares à base de sucos naturais, raízes, óleo de avestruz e chás de ervas medicinais foram citadas para potencializar a imunidade.

Eu dei suco da polpa da graviola com inhame. Ele tomou. Foi bom, até subiu a imunidade mesmo (E12).

Métodos farmacológicos e não farmacológicos foram utilizados para alívio da dor, das náuseas e dos vômitos. Uma mãe relatou oferecer alimentos leves e frios para aliviar as dores de estômago e a mucosite do filho. Aumentar a ingesta hídrica e o uso de técnicas de respiração foram formas de aliviar as náuseas. Uma mãe afirmou ainda que a posição antálgica era adotada pelo filho para alívio da lombalgia.

A gente dava bastante líquido para ele e os remédios de enjoo, mas não resolvia muita coisa. Quando ele começava a tomar líquido, ia expulsando a quimio… (E12).

E para o vômito, quando ela está assim, eu falo: ‘Filha, respira, respira muito forte, puxa lá do útero’ (E2).

Para a alopecia, o uso de adornos, como bonés e tiaras, amenizou os sinais físicos da quimioterapia.

Ele (adolescente) só ficou com vergonha porque não era acostumado a ficar careca. Aí, meu pai comprou um boné para ele (E9).

O fortalecimento de crenças religiosas e da fé foi importante para promover o bem-estar diante dos sintomas emocionais/psicossociais e a esperança da cura.

A gente se aproximou mais de Deus, porque em uma situação assim a gente crê que Deus pode curar (E9).

DISCUSSÃO

Este estudo identificou sintomas e efeitos adversos vivenciados por crianças e adolescentes, além das estratégias utilizadas pelas cuidadoras familiares para minimizá-los. Embora o sintoma seja uma experiência subjetiva, que reflete mudanças no funcionamento biopsicossocial, nas sensações ou na cognição do indivíduo(1818. Dodd M, Janson S, Facione N, Faucett J, Froelicher ES, Humphreys J, et al. Advancing the science of symptom management. J Adv Nurs. 2001;33(5):668-76. https://doi.org/10.1046/j.1365-2648.2001.01697.x
https://doi.org/10.1046/j.1365-2648.2001...
), as participantes foram capazes de identificar diversos sintomas associados à quimioterapia, além de efeitos adversos.

Os sintomas referidos nos depoimentos corroboram a literatura, e os mais citados foram: dor, náuseas e vômitos, perda de apetite, alopecia, constipação, fraqueza, perda do sono e alterações digestivas.(2323. Kudubes AA, Bektas M, Ugur O. Symptom frequency of children with cancer and parent quality of life in Turkey. Asian Pac J Cancer Prev. 2014;15(8):3487-93. https://doi.org/10.7314/apjcp.2014.15.8.3487
https://doi.org/10.7314/apjcp.2014.15.8....
2525. Rodgers C, Hooke MC, Ward J, Linder LA. Symptom clusters in children and adolescents with cancer. Semin Oncol Nurs. 2016 Nov;32(4):394-404. https://doi.org/10.1016/j.soncn.2016.08.005
https://doi.org/10.1016/j.soncn.2016.08....
) Parte dos sintomas referidos foi de natureza geral ou constitucional, ou seja, sintomas sistêmicos, não específicos e não restritos ao câncer.(2525. Rodgers C, Hooke MC, Ward J, Linder LA. Symptom clusters in children and adolescents with cancer. Semin Oncol Nurs. 2016 Nov;32(4):394-404. https://doi.org/10.1016/j.soncn.2016.08.005
https://doi.org/10.1016/j.soncn.2016.08....
) Além dos sintomas encontrados neste estudo, a literatura acrescenta a sudorese, a fadiga e o ganho ponderal.(33. Di Battista A, Dupuis LL, Cassidy M, Portwine C, Johnston DL, Pradier Silva M, et al. Parent attributions about child symptoms related to cancer therapy. J Pediatr Oncol Nurs. 2017;34(1):44-50. https://doi.org/10.1177/1043454215628002
https://doi.org/10.1177/1043454215628002...
,2525. Rodgers C, Hooke MC, Ward J, Linder LA. Symptom clusters in children and adolescents with cancer. Semin Oncol Nurs. 2016 Nov;32(4):394-404. https://doi.org/10.1016/j.soncn.2016.08.005
https://doi.org/10.1016/j.soncn.2016.08....
)

A fadiga é um sintoma amplamente apontado como angustiante e debilitante(88. Torres V, Nunes MDR, Silva-Rodrigues FM, Bravo L, Adlard K, Secola R, et al. Frequency, severity, and distress associated with physical and psychosocial symptoms at home in children and adolescents with cancer. J Pediatr Health Care. 2019;33(4):404-14. https://doi.org/10.1016/j.pedhc.2018.11.007
https://doi.org/10.1016/j.pedhc.2018.11....
,2626. Nap-van der Vlist MM, Dalmeijer GW, Grootenhuis MA, van der Ent CK, van den Heuvel-Eibrink MM, Wulffraat NM, et al. Fatigue in childhood chronic disease. Arch Dis Child. 2019;104(11):1090-5. http://dx.doi.org/10.1136/archdischild-2019-316782
http://dx.doi.org/10.1136/archdischild-2...
), porém não foi citada no estudo. Sua ausência pode estar relacionada à carência de um conceito de fadiga bem estabelecido em nossa cultura, além da baixa prioridade dada ao seu reconhecimento pelos profissionais na assistência.(1313. Silva MC, Lopes Júnior LC, Nascimento LC, Lima RA. Fatigue in children and adolescents with cancer from the perspective of health professionals. Rev Latino Am Enfermagem. 2016;24:e2784. https://doi.org/10.1590/1518-8345.1159.2784
https://doi.org/10.1590/1518-8345.1159.2...
)

O objetivo da eleição de estratégias para o gerenciamento de sintomas é evitar ou retardar resultados negativos.(2222. Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ): a 32-item checklist for interviews and focus groups. Int J Qual Health Care. 2007;19(6):349-57. https://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042
https://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042...
) Dentre as estratégias utilizadas pelas participantes, destacaram-se mudanças alimentares para melhorar a epigastralgia e a constipação e aumentar a imunidade. Para minimizar sintomas e efeitos adversos dos quimioterápicos, alterações significativas no padrão alimentar das famílias de crianças com câncer são em geral reportadas.(2727. Aburn G, Gott M. Education given to parents of children newly diagnosed with acute lymphoblastic leukemia: the parent’s perspective. Pediatr Nurs. 2014;40(5):243-8,256.)

Dentre as estratégias para o enfrentamento da alopecia, as cuidadoras familiares apresentaram o uso de adornos. Mudanças na aparência provavelmente afetam o conceito de autopercepção das crianças e de aceitação social e refletem a preocupação parental com a repercussão psicossocial dos efeitos da terapia nos filhos, além da própria repercussão física.(33. Di Battista A, Dupuis LL, Cassidy M, Portwine C, Johnston DL, Pradier Silva M, et al. Parent attributions about child symptoms related to cancer therapy. J Pediatr Oncol Nurs. 2017;34(1):44-50. https://doi.org/10.1177/1043454215628002
https://doi.org/10.1177/1043454215628002...
,2828. Williams PD, Piamjariyakul U, Shanberg R, Williams AR. Monitoring and alleviation of symptom occurrence and severity among thai children and adolescents during cancer treatments. J Pediatr Oncol Nurs. 2015;32(6):417-28. http://dx.doi.org/10.1177/1043454214563754
http://dx.doi.org/10.1177/10434542145637...
) Essa preocupação também é observada com o uso de máscaras coloridas, para facilitar sua utilização. Estudos identificam a máscara como um transtorno para crianças e adolescentes, pois causam vergonha e despertam olhares indesejáveis.(1313. Silva MC, Lopes Júnior LC, Nascimento LC, Lima RA. Fatigue in children and adolescents with cancer from the perspective of health professionals. Rev Latino Am Enfermagem. 2016;24:e2784. https://doi.org/10.1590/1518-8345.1159.2784
https://doi.org/10.1590/1518-8345.1159.2...
) Educação em saúde e apoio emocional são ferramentas úteis para minimizar tais sentimentos.

Neste estudo, o conceito de cura esteve associado à espiritualidade e à esperança. A espiritualidade foi citada como recurso durante o tratamento e complementar à terapia convencional.(2929. Crisp CL. Faith, hope, and spirituality: supporting parents when their child has a life-limiting illness. J Christ Nurs. 2016;33(1):14-21.3030. Nicholas DB, Barrera M, Granek L, D’Agostino NM, Shaheed J, Beaune L, et al. Parental spirituality in life-threatening pediatric cancer. J Psychosoc Oncol. 2017;35(3):323-34. http://dx.doi.org/10.1080/07347332.2017.1292573
http://dx.doi.org/10.1080/07347332.2017....
) Estes são recursos importantes para o enfrentamento das adversidades do tratamento, contribuindo para menores taxas de ansiedade e estresse, garantindo satisfação com progressos da terapia, preservando a crença na possibilidade de transitoriedade da doença e, principalmente, possibilitando vislumbrar a cura(2929. Crisp CL. Faith, hope, and spirituality: supporting parents when their child has a life-limiting illness. J Christ Nurs. 2016;33(1):14-21.3131. Leite ACAB, Garcia-Vivar C, Neris RR, Alvarenga WA, Nascimento LC. The experience of hope in families of children and adolescents living with chronic illness: a thematic synthesis of qualitative studies. J Adv Nurs. 2019;75(12):3246-62. http://dx.doi.org/10.1111/jan.14129
http://dx.doi.org/10.1111/jan.14129...
). Com base na SMT, o ambiente cultural, ou seja, as crenças, os valores e as práticas familiares afetam tanto a seleção de estratégias para o gerenciamento de um sintoma como seus resultados. É importante que a enfermagem identifique e valorize as crenças familiares, para fortalecer suas estratégias de gerenciamento dos sintomas.

Algumas participantes relataram uma evolução na melhoria dos sintomas com o passar do tempo, enquanto outras não. A SMT destaca que, assim como a manifestação do sintoma, o gerenciamento dele é um processo dinâmico, modificado por avaliações individuais e influenciado por fatores, como a maneira como o indivíduo concebe e responde à experiência de um determinado sintoma, o contexto no qual o sintoma ocorre e o estado presente de saúde-doença da criança/adolescente(1818. Dodd M, Janson S, Facione N, Faucett J, Froelicher ES, Humphreys J, et al. Advancing the science of symptom management. J Adv Nurs. 2001;33(5):668-76. https://doi.org/10.1046/j.1365-2648.2001.01697.x
https://doi.org/10.1046/j.1365-2648.2001...
).

Não foram citadas estratégias de gerenciamento para vários sintomas identificados. Apesar da menção de recursos complementares para o alívio dos sintomas e dos eventos adversos do tratamento, seu uso ainda limitado pode ser decorrente do desconhecimento do emprego dessas medidas, bem como do preparo limitado desses cuidadores familiares para o controle dos eventos, principalmente no domicílio(2828. Williams PD, Piamjariyakul U, Shanberg R, Williams AR. Monitoring and alleviation of symptom occurrence and severity among thai children and adolescents during cancer treatments. J Pediatr Oncol Nurs. 2015;32(6):417-28. http://dx.doi.org/10.1177/1043454214563754
http://dx.doi.org/10.1177/10434542145637...
). Segundo a SMT, todos os sintomas incômodos precisam ser gerenciados. Para tanto, destaca-se a importância do papel da enfermagem para instruir as famílias, para que essas se sintam capazes de identificar e agir diante dos sintomas(2222. Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ): a 32-item checklist for interviews and focus groups. Int J Qual Health Care. 2007;19(6):349-57. https://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042
https://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042...
).

Possíveis limitações do estudo devem-se ao cenário único de pesquisa e aos diferentes momentos do tratamento em que as crianças e adolescentes se encontravam, considerando-se a variabilidade da ocorrência de sintomas ao longo da terapia antineoplásica. Além disso, apesar de esse estudo ter incluído cuidadoras familiares, que foram as informantes-chave para a compreensão do fenômeno pesquisado, considera-se como limitação a não inclusão de participantes homens, uma vez que possibilitaria conhecer o fenômeno investigado sob a perspectiva de outros cuidadores familiares, como pais e avós, por exemplo.

CONCLUSÃO

As cuidadoras familiares identificaram sintomas e efeitos adversos do tratamento quimioterápico, além de buscarem estratégias para seu gerenciamento, a partir de métodos farmacológicos e não farmacológicos.

As fortalezas deste estudo centram-se nas informantes, que compartilharam uma riqueza de dados essenciais para trabalhos dessa natureza, e na diversidade de diagnósticos oncológicos e amplitude da faixa etária. Isso assegurou melhor compreensão da perspectiva das cuidadoras familiares quanto ao fenômeno investigado. Munidos desse conhecimento, os profissionais de saúde, dentre eles o enfermeiro, podem capacitar essas famílias na identificação dos sintomas e dos efeitos adversos mais prevalentes e que mais as afligem, além de capacitá-las para o controle desses eventos nos contextos em que se dá o tratamento, inclusive o domiciliar.

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Apoio financeiro

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Processo: 312339/2017-8. Bolsa de Iniciação Científica (PIBIC).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Ago 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    29 Out 2020
  • Aceito
    09 Abr 2021
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