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Percepção de pessoas pós-Acidente Vascular Cerebral sobre o gerenciamento de caso conduzido por enfermeiro* * Extraído da tese: “Gerenciamento de caso conduzido por enfermeiro para pessoas com Acidente Vascular Cerebral: estudo de métodos mistos”, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do Paraná, 2019.

RESUMO

Objetivo:

Identificar a percepção de pessoas pós-Acidente Vascular Cerebral acerca do gerenciamento de caso conduzido pelo enfermeiro.

Método:

Pesquisa qualitativa descritiva, com 13 participantes pós-Acidente Vascular Cerebral, acompanhados pelo gerenciamento de caso conduzido por enfermeiro durante seis meses e entrevistados em seus domicílios um mês após do término do acompanhamento. As entrevistas foram gravadas, transcritas na íntegra e analisadas com auxílio de software.

Resultados:

Dos 13 participantes, 57,14% eram homens, 50% com idade variando de 50 a 59 anos. A análise do conteúdo resultou em três categorias: “Autogestão do cuidado”, referente às modificações de atitudes em relação ao tratamento, devido principalmente ao medo de recidiva em curto período de tempo; “Sequelas e repercussões tardias do Acidente Vascular Cerebral”, que apresenta as dificuldades dos participantes após o evento; e “Apoio recebido pós-Acidente Vascular Cerebral”, que enfatiza as ações e atitudes do enfermeiro gerente de caso no período de acompanhamento.

Conclusão:

O gerenciamento de caso foi percebido pelo participante como uma ferramenta promotora de saúde e capaz de aumentar a adesão ao tratamento.

DESCRITORES
Acidente Vascular Cerebral; Cuidados de Enfermagem; Administração de Caso; Saúde do Adulto

ABSTRACT

Objective:

To identify the perception of post-stroke patients on the case management conducted by nurses.

Method:

Qualitative descriptive study with 13 post-stroke patients, followed-up with case management conducted by a nurse for six months, and interviewed at home one month after the end of the follow-up. The interviews were recorded, transcribed in full and analyzed with the help of a software.

Results:

Of the 13 participants, 57.14% were men and 50% were between 50 and 59 years. Content analysis resulted in three categories: “Self-management of care”, which addressed changes in attitudes towards treatment, mainly due to concern of recurrence in a short period of time; “Sequelae and late repercussions of the stroke”, which presents participants’ difficulties after the event; and “Support received after a stroke”, which emphasizes the actions and attitudes of the case manager nurse during the follow-up period.

Conclusion:

Case management was perceived by the participant as a health-promoting tool capable of increasing treatment adherence.

DESCRIPTORS
Stroke; Nursing Care; Case Management; Adult Health

RESUMEN

Objetivo:

Identificar la percepción de personas que han sufrido un Accidente Cerebrovascular sobre la gestión del caso realizada por un enfermero.

Método:

Se trata de una investigación cualitativa descriptiva, llevada a cabo entre 13 participantes que sufrieron un Accidente Cerebrovascular, cuyo seguimiento fue gestionado por un enfermero durante seis meses y que fueron entrevistados en sus domicilios un mes después de haberse terminado el seguimiento. Las entrevistas se grabaron y se transcribieron en su totalidad y se analizaron con la ayuda de programas informáticos

Resultados:

De los 13 participantes, el 57,14% era del sexo masculino y el 50% tenía una edad comprendida entre los 50 y los 59 años. El análisis del contenido dio como resultado tres categorías: “Autogestión del cuidado”, que se refiere a los cambios de actitud hacia el tratamiento, principalmente por el miedo a una recidiva en un período corto; la segunda trata de las “Secuelas y repercusiones tardías del Accidente Cerebrovascular”, que presenta las dificultades de los participantes después del hecho, y la tercera se refiere al “Apoyo recibido después del Ictus”, que hace hincapié en las acciones y actitudes del enfermero gestor del caso durante el período de seguimiento.

Conclusión:

La gestión del caso fue percibida por el participante como una herramienta de promoción de la salud, capaz de aumentar la adhesión al tratamiento.

DESCRIPTORES
Accidente Cerebrovascular; Atención de Enfermería; Manejo de Caso; Salud del Adulto

INTRODUÇÃO

O Acidente Vascular Cerebral (AVC) é responsável pela incapacidade temporária ou crônica dos acometidos, devido a limitações na capacidade física, psicológica e social. Uma em cada quatro pessoas que sofreram um AVC vai a óbito no primeiro ano, enquanto aproximadamente 35% permanecem com sequelas e necessitam de auxílio nas atividades cotidianas, o que dificulta a reintegração profissional11 Morais HCC, Gonzaga NC, Aquino PS, Araujo TL. Strategies for self-management support by patients with stroke: integrative review. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(1):136-43. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420150000100018
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.

Em nível mundial, no ano de 2010, o AVC acometeu 33 milhões de pessoas: destas, por volta de 16 milhões tiveram o primeiro episódio, sendo que cerca de 30% possuíam idade abaixo de 65 anos(22 American Heart Association. Heart disease and stroke statistics: 2015 update. A report from the American Heart Association. Circulation, 131:29-322. doi: https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000152
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). No Brasil, o AVC merece destaque por ser a principal causa de internações, mortalidade e incapacidades, superando várias outras doenças cardíacas e até mesmo o câncer. Essa situação resulta em impacto socioeconômico considerável(33 Reis RD, Pereira EC, Pereira MIM, Soane AMNC, Silva JV. Significados, para os familiares, de conviver com um idoso com sequelas de Acidente Vascular Cerebreal (AVC). Interface (Botucatu). 2017;21(62):641-50. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1807-57622016.0206
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-44 Perry JJ, Losier JH, Stiell IG, Sharma M, Abdulaziz K. National survey of emergency physicians for impact ischemic attack (TIA) risk stratification consensus and appropriate treatment for given level of risk. J Stroke Cerebrovasc Dis. 2016;25(6):1517-23. doi: https://doi.org/10.1017/cem.2015.57
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).

Estudo brasileiro apontou que a incidência de AVC no Brasil foi de 108 casos por ano a cada 100 mil habitantes, com aproximadamente 18% de taxa de óbito nos primeiros 30 dias e 31% após um ano, com taxa de recidiva de 15,9%(33 Reis RD, Pereira EC, Pereira MIM, Soane AMNC, Silva JV. Significados, para os familiares, de conviver com um idoso com sequelas de Acidente Vascular Cerebreal (AVC). Interface (Botucatu). 2017;21(62):641-50. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1807-57622016.0206
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). A taxa de mortalidade no primeiro mês após um AVC recorrente varia de 23% a 41%, com risco aumentado para incapacidade (39% a 53%)(55 Bailey RR. Lifestyle modification for secondary stroke prevention. Am J Lifestyle Med. 2018; 12(2):140-7. doi: https://doi.org/10.1177/1559827616633683
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).

A Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS), o diabetes mellitus e as cardiopatias são fatores de risco para o AVC, bem como fatores comportamentais, incluindo o excesso de peso, a inatividade física, o consumo de álcool e tabaco, além do contraceptivo oral. Essas as situações promovem a aceleração do processo de aterosclerose(66 Nunes DLS, Fontes WS, Lima MA. Cuidado de enfermagem ao paciente vítima de acidente vascular encefálico. Rev Bras Ci Saúde. 2017;21(1):87-96. doi: https://doi.org/10.4034/RBCS.2017.21.01.11
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-77 Rodrigues M, Santana L, Galvão I. Fatores de risco modificáveis e não modificáveis do AVC isquêmico: uma abordagem descritiva. Rev Med (São Paulo). 2017;96(3):187-92. doi: 10.11606/issn.1679-9836.v96i3p187-192
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).

A localização do AVC influencia no aparecimento de sequelas, dependendo da duração da perfusão inadequada no tecido cerebral e da existência de circulação colateral. As alterações mais comuns nos pacientes acometidos pelo AVC são distúrbios sensoriais, psicológicos, cognitivos e motores(88 Cavalcante TF, Moreira RP, Guedes NG, Araujo TL, Lopes MVO, Damasceno MMC, et al. Nursing interventions for stroke patients: an integrative literature review. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1495-500. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000600031
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).

A ampla variedade de déficits neurológicos deixados pelo AVC reforça a magnitude da sua problemática. São inúmeras limitações provenientes da doença, como dificuldade de locomoção, comunicação, alimentação, visão, adesão ao tratamento, controle de doenças pré-existentes, entre outras. Diante disso, a equipe de saúde, com destaque para o enfermeiro, tem o papel de advogar em favor do paciente, possibilitando, assim, o planejamento de cuidados de acordo com as necessidades individuais, a fim de contribuir para a reabilitação(66 Nunes DLS, Fontes WS, Lima MA. Cuidado de enfermagem ao paciente vítima de acidente vascular encefálico. Rev Bras Ci Saúde. 2017;21(1):87-96. doi: https://doi.org/10.4034/RBCS.2017.21.01.11
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).

Sobre os modelos de cuidados às pessoas com doenças crônicas no Brasil, propôs-se um baseado no Modelo de Pirâmide de Risco, o Modelo de Atenção às Condições Crônicas (MACC) para o Sistema Único de Saúde (SUS) que apresenta ações de acordo com a gravidade da condição crônica. Esse modelo enfatiza a promoção da saúde à população, sendo estruturado em ações de autocuidado apoiado para as condições mais simples e gestão da saúde para as pessoas que têm uma doença estabelecida, além de aplicar a tecnologia de gestão de caso para as pessoas com condições de saúde complexas(99 Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária à saúde: o imperativo da consolidação da estratégia da saúde da família. Brasília: OPAS; 2012.).

Nesse sentido, o gerenciamento de caso pode ser definido como um processo desenvolvido entre o gerente de caso e uma pessoa com uma condição de saúde complexa (situações de readmissões frequentes nos serviços de saúde, tratamento de alto custo e exigência de recursos de alta complexidade). De maneira cooperativa com a rede de suporte social, esse gerenciamento proporciona melhora na qualidade de vida e na autonomia do paciente e da família.

Dessa forma, o gerenciamento de caso constitui-se uma possibilidade de cuidado a ser empregado pelo enfermeiro a pessoas acometidas pelo AVC, tendo em vista seus resultados benéficos, como a redução de hospitalizações, internações sociais e eventos adversos(99 Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária à saúde: o imperativo da consolidação da estratégia da saúde da família. Brasília: OPAS; 2012.). Considerando que o AVC é uma complicação aguda do adoecimento crônico, que os cuidados com vistas a reduzir os episódios recorrentes são adjuvantes no tratamento clínico e que as pessoas acometidas necessitam atuar junto ao enfermeiro para autogerir seu tratamento, este estudo objetivou identificar a percepção de pessoas pós-AVC acerca do gerenciamento de caso conduzido pelo enfermeiro.

MÉTODO

Tipo de estudo

Trata-se de estudo qualitativo de caráter descritivo.

Cenário

O estudo foi realizado no período março de 2016 a julho 2019, em uma cidade da região central do sul do Paraná, e está vinculado à pesquisa “Gerenciamento de caso conduzido por enfermeiro para pessoas com acidente vascular cerebral: estudo de métodos mistos”.

Coleta de dados

Os participantes foram 13 pessoas pós-AVC, os quais receberam o acompanhamento mediante gerenciamento de caso conduzido por um enfermeiro durante seis meses. O recrutamento foi realizado em dois hospitais públicos filantrópicos. Diariamente realizava-se contato com um responsável pelo internamento de pacientes com AVC, enfermeiro ou médico. Quando informada sobre internação de paciente com diagnóstico médico de AVC, a pesquisadora dirigia-se ao hospital e aplicava os demais critérios de inclusão: possuir diagnóstico prévio de HAS, residir no município da pesquisa, ser adulto com idade entre 18 e 64 anos e com classificação na avaliação funcional de Rankin de no máximo quatro pontos no momento da alta hospitalar. Excluíam-se aqueles com pretensão de mudança de cidade de residência nos meses da coleta de dados. A partir do aceite em participar da pesquisa, a pesquisadora agendava a primeira visita domiciliar para após a alta hospitalar do participante.

A gestão de caso foi realizada pela pesquisadora e as atividades que compuseram a intervenção foram as seguintes: contato via telefone, visitas no domicílio, consulta de enfermagem com o estabelecimento de metas. Durante o acompanhamento, foram realizados o encaminhamento para consulta médica e para outros profissionais (fisioterapeuta, nutricionista e psicólogo), o encaminhamento/acompanhamento para a Unidade Básica de Saúde (UBS) e, por fim, as orientações sobre mudanças alimentares, desenvolvimento de estratégias para favorecer a adesão à terapêutica medicamentosa e não medicamentosa e promover hábitos de vida saudáveis, como diminuição do peso, realização de atividades físicas, redução da circunferência abdominal, da glicemia e da pressão arterial.

A entrevista foi realizada somente com o participante em sua residência em até um mês após o término do acompanhamento, de acordo com a sua disponibilidade. As entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra com duração de 15 minutos, sendo, posteriormente, lidas pelos participantes as alterações e/ou correções de acordo com o Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ)(1010 Tong A, Sainsbury P, Craig J, Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ): a 32-item checklist for interviews and focus groups. Int J Qual Health Care. 2007; 19(6):349-57. doi: https://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042
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).

Análise e tratamento dos dados

A análise das transcrições das entrevistas foi realizada com auxílio do software Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRAMUTEQ_0.6-alpha3®). É um software livre que permite a análise de textos oriundos de entrevistas e de outros documentos discursivos(1111 Camargo BV, Justo AM. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas Psicol. 2013;21(2):513-8. doi: http://dx.doi.org/10.9788/TP2013.2-16
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).

O corpus construído consiste na inserção dos textos no software OpenOffice.org, em arquivo único, e salvo no formato texto.txt, separado por linhas de comando de acordo com as variáveis, para reconhecimento do software IRAMUTEQ_0.6-alpha3®. Com base no corpus inicial, são separados os segmentos de texto que compõem cada classe, denominados Unidades de Contexto Elementar (UCE). O Iramuteq permite vários tipos de análises, sendo neste utilizada estudo a Classificação Hierárquica Descendente (CHD)(1111 Camargo BV, Justo AM. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas Psicol. 2013;21(2):513-8. doi: http://dx.doi.org/10.9788/TP2013.2-16
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-1212 Souza MAR, Wall ML, Thuler ACMC, Lowen IMV, Peres AM. The use of IRAMUTEQ software for data analysis in qualitative research. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03353. doi: http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2017015003353
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).

Os dados foram processados, agrupados e classificados de acordo com a ocorrência das palavras. A CHD permitiu a apresentação em dendograma das classes, demonstrando a ligação e associação entre as classes(1212 Souza MAR, Wall ML, Thuler ACMC, Lowen IMV, Peres AM. The use of IRAMUTEQ software for data analysis in qualitative research. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03353. doi: http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2017015003353
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). Nesta pesquisa, as classes com UCE semelhantes foram agrupadas em categorias, com os nomes substituídos pela letra P, a fim de codificar os participantes.

Aspectos éticos

A aprovação da pesquisa foi obtida mediante o Comitê de Ética da Universidade Estadual do Centro-Oeste sob o Parecer 3.002.936 de 2018. Respeitando os princípios da Resolução nº 466/2012, todos os participantes realizaram leitura e tinham condições neurológicas e físicas para, assim, assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Após o término de pesquisa, os participantes foram redirecionados para as Unidades de Saúde de referência, com vistas à continuidade do acompanhamento.

RESULTADOS

Das 13 pessoas que fizeram parte da pesquisa, 57,14% eram homens, 92,85% declararam-se casados/união estável, 50% tinham faixa etária de 50 a 59 anos, seguido por 28,57% entre 60 a 64 anos, 78,57% informaram escolaridade fundamental incompleta, 35,71% possuíam como ocupação as atividades do lar e 50% tinham uma renda de até dois salários mínimos. A classificação de Rankin demonstrou que quatro participantes se enquadravam no grau 1 (nenhuma deficiência significativa), cinco no grau 2 (leve deficiência), um participante no grau 3 (deficiência moderada) e três no grau 4 (deficiência moderadamente grave).

Ao importar o corpus no software Iramuteq, o processamento foi realizado em 12 segundos. Foram utilizados 132 segmentos de texto, de um total de 157 classificados, obtendo-se aproveitamento de 84,08%.

Para a apresentação do dendograma, o corpus foi particionado em dois subcorpora, sendo o primeiro formado pelas classes 5 e 6, que obtiveram, respectivamente, 22,7% e 12,1% das UCE. O segundo subcorpus foi formado pelas classes 3 e 4, com 14,4% e 18,9% do total de UCE, respectivamente, e pelas classes 1 e 2, com 18,9% e 12,9% do total de UCE. Na parte inferior das classes, encontra-se uma lista de palavras derivadas a partir do teste de qui-quadrado (Figura 1).

Figura 1
Representação do dendograma com a frequência percentual das UCE por classe e valores de qui-quadrado (χ2) das palavras, gerados pelo IRAMUTEQ.

A primeira categoria, “Autogestão do cuidado”, foi composta pelas classes 1 e 2, que se referem às mudanças de atitudes em relação à terapêutica medicamentosa e não medicamentosa, explicitadas pelo receio de um novo episódio de AVC.

Os depoimentos a seguir remetem mudanças de atitudes relacionadas a aspectos não medicamentosos:

(...) hoje eu me cuido mais do que me cuidava antes, faço dieta, faço caminhadas (P5).

(...) continuo verificando a pressão todo dia. Antes, não fazia nenhuma atividade física. Agora, faço no simulador de caminhada todo dia. Comecei fazendo 20 minutos e agora faço 1 hora de caminhada (P3).

(...) bebi 3 latas de cerveja essa semana. Antes, eu bebia 3 caixas. O cigarro que é difícil, ainda fumo 2 carteiras por dia; antes fumava 4! Hoje, não usamos mais tempero pronto na comida (P10).

(...) eu me cuido mais hoje, mas ainda acho que é pouco. Hoje, eu me preocupo mais com a saúde pelo medo de uma recidiva, porque sei que isso pode acontecer! (P6).

Os relatos de P7 e P9 representam a autogestão do cuidado com intervenções voltadas para a adesão ao tratamento medicamentoso:

(...) eu tomo o remédio certinho. Não esqueço e nem tomo mais do que o médico mandou. Quero me cuidar muito mais para não ter outro AVC desse. Imagine ficar numa cama sem poder andar?! (P7).

(...) a primeira coisa que eu faço de manhã cedo é medir a pressão, a glicemia e tomar meus medicamentos. Não esqueço de jeito nenhum! (P9).

Nas classes 3 e 4, correspondentes à segunda categoria, são apresentados depoimentos relacionados às dificuldades apresentadas pelos participantes pós-AVC, denominadas “Sequelas e repercussões tardias do AVC”.

(...) não consigo andar sozinha direito... Tem sempre que ter alguém do meu lado para me apoiar! (P11).

(...) depois que eu vim para casa, demorou eu entrar nos eixos. Hoje eu estou, digamos, não 100% para escrever, mas melhorei (P9).

(...) precisei de muita ajuda no começo para tomar banho, caminhar e comer. Hoje, tomo banho sozinha, caminho sozinha, mas, mesmo assim, fico nervosa e triste por não conseguir fazer as coisas como fazia antes (P2).

As classes 5 e 6 correspondem à terceira categoria, intitulada “Apoio recebido pós-AVC”, que reflete o apoio fornecidos pela gerente de caso durante a intervenção da pesquisa. A necessidade de apoio está representada no próximo depoimento:

(...) todos da minha família entenderam melhor o que eu posso comer. Eles estão sempre aqui; todo mundo ajuda... até minha esposa que também tem pressão alta conseguiu emagrecer! (P12).

A seguir, alguns depoimentos demonstram a percepção dos participantes sobre o gerenciamento de caso recebido e a importância do gerente de caso para a sua recuperação:

(...) graças à sua ajuda, consegui que o posto de saúde marcasse as minhas fisioterapias e até a hidroginástica, porque não é todo mundo que consegue (P8).

(...) você explicou para mim e para minha família como lidar com as dificuldades vindas com o AVC. Você falou com o pessoal do posto de saúde e por isso eles vieram me visitar depois da alta do hospital, que foi o momento mais difícil! (P10).

(...) foi um apoio muito importante para mim, fez muita diferença. Quantos pacientes passaram por isso e não tiveram as mesmas orientações que eu tive? Realmente, é um problema para saúde pública que graças a Deus para mim foi diferente (P6).

DISCUSSÃO

Houve predomínio do sexo masculino e com idade acima de 50 anos. Esse resultado vai ao encontro de estudo realizado em hospital Universitário de São Paulo, no qual a média de idade dos pacientes admitidos no serviço de neurologia foi de 53,4 anos, sendo 63,2% destes do sexo masculino(77 Rodrigues M, Santana L, Galvão I. Fatores de risco modificáveis e não modificáveis do AVC isquêmico: uma abordagem descritiva. Rev Med (São Paulo). 2017;96(3):187-92. doi: 10.11606/issn.1679-9836.v96i3p187-192
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). Em relação à escolaridade e à renda, os resultados foram similares a um estudo realizado em Recife, cujos participantes tinham baixa escolaridade e renda(1313 Melo SPSC, Cesse EAP, Lira PIC, Rissin A, Cruz RSBLC, Batista Filho M. Doenças crônicas não transmissíveis e fatores associados em adultos numa área urbana de pobreza do nordeste brasileiro. Ciênc Saúde Coletiva. 2019;24(8):3159-68. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232018248.30742017
https://doi.org/10.1590/1413-81232018248...
).

Na primeira categoria, “Autogestão do cuidado”, os participantes enfatizaram questões acerca da adaptação e das mudanças nos hábitos de vida e adesão medicamentosa, proporcionadas pela ação do gerente de caso. Tal fato corrobora a definição de autogestão do cuidado, que é a capacidade das pessoas de gerenciar os sintomas e as mudanças que advêm do adoecimento, seja individualmente ou com apoio de seus familiares, nesse caso, também com a intervenção do gerente de caso(1414 Balduino AFA, Mantovani MF, Lacerda MR, Meier MJ. Análise conceitual de autogestão do indivíduo hipertenso. Rev Gaúcha Enferm. 2013;34(4):37-44. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1983-14472013000400005
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).

Devido às repercussões das doenças crônicas nos níveis de morbidade e mortalidade, bem como nos custos em saúde, a Autogestão do cuidado mostra-se benéfica ao auxiliar no controle da doença, uma vez que o indivíduo passa a contribuir para o cuidado de si, mesmo diante de suas limitações(1414 Balduino AFA, Mantovani MF, Lacerda MR, Meier MJ. Análise conceitual de autogestão do indivíduo hipertenso. Rev Gaúcha Enferm. 2013;34(4):37-44. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1983-14472013000400005
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).

Os participantes também informaram ter incorporado algumas ações, como aferição da pressão arterial, em sua rotina de autogestão do cuidado. Essas ações realizadas para o cuidado das doenças crônicas são importantes para reduzir os danos trazidos por essa condição. Assim, identificar sinais e sintomas, manusear equipamentos e dispositivos de testes, além da mudança de estilo de vida, são ações proativas para o controle da doença(1515 Galvão MTRLS, Janeiro JMSV. O autocuidado em enfermagem: autogestão, automonitorização e gestão sintomática como conceitos relacionados. Rev Min Enferm. 2013;17(1):231-5. doi: http://www.dx.doi.org/10.5935/1415-2762.20130019
http://www.dx.doi.org/10.5935/1415-2762....
).

Os participantes realizaram ações de autogestão com a finalidade de prevenir fatores de risco para complicações do AVC. Nesse sentido, as ações realizadas foram a procura por uma alimentação saudável e a realização das atividades físicas. Ressalta-se que esse conjunto de atitudes para um estilo favorável ao controle da HAS também deve ser adotado com vistas a prevenir o AVC, somado ao controle de estresse, à redução do consumo de álcool e tabaco e à adesão ao tratamento medicamentoso(1616 Malachias MVB, Póvoa RMS, Nogueira AR, Souza D, Costa LS, Magalhães ME. 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial: capítulo 3 - avaliação clínica complementar. Arq Bras Cardiol. 2016; 107(3 Supl.3):14-7.doi: http://dx.doi.org/10.5935/abc.20160153
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).

No relato de P10, é possível perceber que, embora tenha havido uma redução na quantidade diária da ingestão de bebidas alcoólicas e consumo de cigarro, há a dificuldade da cessação completa. Verifica-se que, apesar dos problemas existentes para as mudanças do estilo de vida, a autogestão se apresenta no fato do participante identificar a necessidade de saúde, por meio de atitudes colaborativas no atendimento às orientações do gerente de caso(1414 Balduino AFA, Mantovani MF, Lacerda MR, Meier MJ. Análise conceitual de autogestão do indivíduo hipertenso. Rev Gaúcha Enferm. 2013;34(4):37-44. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1983-14472013000400005
http://dx.doi.org/10.1590/S1983-14472013...
).

Verificou-se também que houve preocupação dos participantes na adesão ao tratamento medicamentoso, ao seguir o uso correto da dose e os horários prescritos, pois essa ação é um componente importante para o controle da HAS e a prevenção de eventos cardiovasculares. Nesse sentido, indica-se o acompanhamento dos pacientes e seus familiares envolvidos no processo de cuidados, pela equipe de saúde, afim de que haja aumento da adesão e sucesso do tratamento(1616 Malachias MVB, Póvoa RMS, Nogueira AR, Souza D, Costa LS, Magalhães ME. 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial: capítulo 3 - avaliação clínica complementar. Arq Bras Cardiol. 2016; 107(3 Supl.3):14-7.doi: http://dx.doi.org/10.5935/abc.20160153
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).

Em estudo randomizado no qual o enfermeiro realizou o acompanhamento para a prevenção de doenças cardiovasculares e modificação de estilo de vida, foram encontrados resultados similares aos deste estudo. As ações estavam associadas com a mudança de comportamentos de vida saudáveis (alimentação saudável, prática de atividade física) e o aumento da adesão à medicação. Nesse sentido, a ação do enfermeiro no gerenciamento de caso é avaliada como positiva, sobretudo em relação às pessoas com HAS, principalmente quando se trata do efeito das orientações sobre mudanças de estilo de vida e adesão ao tratamento(1717 Ozpancar N, Pakyuz SC, Topcu B. Hypertension management: what is the role of case management? Rev Esc Enferm USP. 2017;51:e03291. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1980-220X2017016903291
http://dx.doi.org/10.1590/S1980-220X2017...
).

No Ceará, um estudo desenvolvido com 193 pessoas cadastradas no Sistema de Gestão Clínica de Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus da Atenção Básica (SIS-HIPERDIA) verificou que o AVC foi um aviso que gerou mudanças no comportamento das pessoas em relação à adesão á terapêutica medicamentosa para a HAS(1818 Lima DBS, Moreira TMM, Borges JWP, Rodrigues MTP. Association between treatment compliance and different types of cardiovascular complications in arterial hypertension patients. Texto Contexto Enferm. 2016;25(3):e0560015. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0104-07072016000560015
http://dx.doi.org/10.1590/0104-070720160...
). Tal fato corrobora os depoimentos dos participantes desta pesquisa, pois os participantes, com o auxílio do gerente de caso, demonstraram preocupação em aderir ao tratamento medicamentoso a fim de reduzir o risco de novas complicações.

Na segunda categoria, “Sequelas e repercussões tardias do AVC”, identificou-se com frequência nas falas dos participantes a dificuldade na realização de caminhadas devido às limitações provocadas pelo AVC. A independência na deambulação é alcançada quando ocorre a melhora do equilíbrio postural, que é afetado nas pessoas pós-AVC, em decorrência do comprometimento cognitivo e deslocamento do peso para a parte do corpo não afetada, dificultando a realização das atividades cotidianas. Dessa maneira, o comprometimento motor possui forte correlação com a mobilidade e o equilíbrio prejudicado, o que influencia na quantidade de suporte que o indivíduo pós-AVC precisa para caminhar(1919 Medeiros CSP, Fernandes SGG, Souza DE, Guedes DT, Cacho EWA, Cacho RO. Comprometimento motor e risco de quedas em pacientes pós-acidente vascular encefálico. Rev Bras Ci Mov [Internet]. 2019 [citado 2019 ago. 19];27(1):42-9. https://portalrevistas.ucb.br/index.php/RBCM/article/view/7940
https://portalrevistas.ucb.br/index.php/...
).

No período pós-AVC, o hemicorpo afetado encontra-se em estado de flacidez e com tônus muscular insuficiente, o que dificulta o início do movimento. Assim, a incapacidade funcional pode ser considerada uma das sequelas mais importantes em decorrência do AVC, além da redução da função cognitiva, que influencia negativamente na sobrevivência e na recuperação a longo prazo(2020 Miranda MR, Bueno GCR, Ribeiro LC, Matos JFS, Fonseca CF. Benefícios da hidroterapia em pacientes após-acidente vascular cerebral (AVC). Rev Inic Cient Ext [Internet]. 2018 [citado 2019 ago. 19];1(n.esp.5):465-71. Disponível em: https://revistasfacesa.senaaires.com.br/index.php/iniciacao-cientifica/article/view/121/78
https://revistasfacesa.senaaires.com.br/...
).

As pessoas pós-AVC demonstram fraqueza muscular e perda de destreza, implicando na deambulação. Embora haja a recuperação de alguma habilidade de locomoção, pode ocorrer muitas vezes a redução da velocidade, do comprimento e no ritmo da marcha. Essa condição, ao ser associada ao medo da queda, e na falta de confiança para caminhar, pode limitar a participação da pessoa pós-AVC na comunidade, o que destaca a reabilitação na deambulação como um aspecto importante no retorno da participação social do indivíduo(2121 Nascimento L, Ada L, Rocha G, Salmela LT. Perceptions of individuals with stroke regarding the use of a cane forwalking: a qualitative study. J Bodyw Mov Ther. 2019;23:166e170. doi: https://doi.org/10.1016/j.jbmt.2018.02.001
https://doi.org/10.1016/j.jbmt.2018.02.0...
). Nessa pesquisa, o encaminhamento do participante à fisioterapia foi essencial para o fortalecimento da musculatura, exercício do equilíbrio, dentre outros aspectos importantes para a reabilitação. Os depoimentos dos participantes desta pesquisa abordaram as dificuldades para caminhar e a necessidade de apoio na realização das atividades de vida diária, mas não houve referência aos motivos dessa limitação, se por medo da queda ou por falta de equilíbrio.

Observa-se, ainda, o impacto causado pelo déficit no funcionamento físico, sensorial e cognitivo, no que diz respeito ao desempenho das atividades cotidianas, por haver dependência de outras pessoas, situação que pode influenciar a capacidade de tomada de decisão sobre o que, quando e como realizar determinada atividade, interferindo na autonomia e, consequentemente, no aparecimento de sentimentos negativos, como angústia e tristeza. Os cuidadores devem, nessa situação, buscar promover a autonomia dessas pessoas, de modo a promover a sua individualidade(33 Reis RD, Pereira EC, Pereira MIM, Soane AMNC, Silva JV. Significados, para os familiares, de conviver com um idoso com sequelas de Acidente Vascular Cerebreal (AVC). Interface (Botucatu). 2017;21(62):641-50. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1807-57622016.0206
http://dx.doi.org/10.1590/1807-57622016....
).

A tristeza e a ansiedade podem surgir pós-AVC no que tange à dependência da família ou de cuidador para realizar atividades cotidianas, as quais eram realizadas anteriormente de modo individual, como apresenta a fala do participante P2. Em estudo canadense desenvolvido com pessoas pós-AVC, o sentimento de ansiedade é muitas vezes apresentado pelos pacientes, juntamente com a depressão, podendo interferir negativamente na reinserção social do indivíduo por conta de limitações físicas e da própria aceitação(2222 Barcley R, Ripat J, Mayo N. Factors describing community ambulation after stroke: a mixed-methods study. Clin Rehabil. 2015;29(5):509-21. doi: https://doi.org/10.1177/0269215514546769
https://doi.org/10.1177/0269215514546769...
-2323 Reis C, Faro A. Repercussões psicológicas após um acidente vascular cerebral (AVC): uma revisão de literatura. Psic Saúde Doenças. 2019; 20(1):16-32. doi: http://dx.doi.org/10.15309/19psd200102
http://dx.doi.org/10.15309/19psd200102...
).

O “Apoio recebido após o AVC” constitui a terceira categoria, que demonstra a relevância de pessoas significativas para a recuperação dos indivíduos. Podem ser pessoas da família, parceiros, vizinhos, amigos, profissionais da saúde, que exercem relacionamento positivo e oferecem auxílio quando necessário. Muitas vezes, o suporte para mudanças necessárias, a fim de atingir metas definidas entre o participante e o gerente de caso, é dado pela família, uma vez que é a responsável pela motivação e pelo auxílio para adequar atividades diárias. Dessa forma, o processo de reabilitação deve abordar tanto os pacientes como os cuidadores, visto que as consequências do AVC atingem todos(2424 Sorensen SL, Pedersen SKS, Pallesen H. Social psychological mechanisms and processes in a novel, health professional-led, self-management intervention for older stroke individuals: a synthesis and phenomenological study. BMC Health Serv Res. 2019;19:320. doi: https://doi.org/10.1186/s12913-019-4150-x
https://doi.org/10.1186/s12913-019-4150-...
). Resultados de um estudo escocês demonstraram que o tratamento de pessoas pós-AVC foi menos difícil quando compartilhado com a família e os amigos, principalmente pelo apoio emocional e auxílio na realização de atividades de vida diária, o que fornecia segurança para a tomada de decisões(2525 Gallacher KI, May CR, Langhorne P, Mair FSM. A conceptual model of treatment burden and patient capacity in stroke. BMC Fam Pract. 2018; 19:9. doi: https://doi.org/10.1186/s12875-017-0691-4
https://doi.org/10.1186/s12875-017-0691-...
).

Os depoimentos dos participantes também remetem a falta sentida por eles de visita e apoio da equipe de saúde, principalmente daquela que era referência para seu acompanhamento. Um estudo realizado com pessoas pós-AVC revela que, nesse momento, há necessidade por parte do paciente de ser orientado quanto à saúde, sobre como evitar um novo episódio e a melhor maneira de autogerir a situação. Isso reforça o impacto e a importância da equipe de saúde ao acompanhar pacientes que sobreviveram ao AVC, em especial na capacitação acerca dos fatores de risco e trajetória da recuperação(2626 Pearce G, Pinnock H, Epiphaniou E, Parke HL, Heavey E, Griffiths CJ, et al. Experiences of self-management support following a stroke: a meta-review of qualitative systematic reviews. PLoS One. 2015;10(12):e0141803. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0141803
https://doi.org/10.1371/journal.pone.014...
).

O estudo desenvolvido na Escócia também abordou o fato de existir, de acordo com relato dos participantes, uma má comunicação entre a equipe de saúde que realizava o seu acompanhamento, evidenciando uma assistência insatisfatória da atenção primária. Outro fato identificado foi o interesse dos participantes em conhecer e atualizar-se sobre o percurso do AVC, bem como seu controle, tratamento, recuperação, entre outros(2525 Gallacher KI, May CR, Langhorne P, Mair FSM. A conceptual model of treatment burden and patient capacity in stroke. BMC Fam Pract. 2018; 19:9. doi: https://doi.org/10.1186/s12875-017-0691-4
https://doi.org/10.1186/s12875-017-0691-...
). Além disso, outro benefício percebido pelos participantes da pesquisa foi o impacto positivo do gerenciamento de caso desenvolvido pelo enfermeiro, ao longo do processo de recuperação, por meio de ações individualizadas e interdisciplinares. A mudança de hábitos de vida requer um plano de ação que seja desenvolvido de acordo com o grau de compreensão do indivíduo, uma vez que favorece menor resistência e maior possibilidade de traçar estratégias e metas para alterar os hábitos de acordo com a necessidade, adequando-se quando e como for preciso(44 Perry JJ, Losier JH, Stiell IG, Sharma M, Abdulaziz K. National survey of emergency physicians for impact ischemic attack (TIA) risk stratification consensus and appropriate treatment for given level of risk. J Stroke Cerebrovasc Dis. 2016;25(6):1517-23. doi: https://doi.org/10.1017/cem.2015.57
https://doi.org/10.1017/cem.2015.57...
,99 Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária à saúde: o imperativo da consolidação da estratégia da saúde da família. Brasília: OPAS; 2012.).

Entre os benefícios reconhecidos pelos participantes acerca do gerenciamento de caso, verifica-se o vínculo criado entre o indivíduo pós-AVC e o enfermeiro gerente de caso, evidenciado pelas falas que expressam confiança entre eles. A confiança desenvolvida ao longo do tempo permite o desenvolvimento de práticas de saúde efetivas, por meio de trocas de conhecimentos, experiências e identificação de situações importantes. Essa condição reforça que aderir ao cuidado proposto é de suma importância para a recuperação e melhor condição de saúde(2727 Barroso VG, Mattos CM. Sentimento de pertencimento na constituição do vínculo em uma autogestão de saúde suplementar. Ciênc Cuid Saúde. 2016;15(4):616-23. doi: http://dx.doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v15i4.33385
http://dx.doi.org/10.4025/cienccuidsaude...
).

Outro benefício do gerenciamento de caso, verificado por meio das falas, foi o fato de se sentirem mais informados e, com isso, despertarem o sentimento de responsabilidade pelo seu processo de recuperação e cuidado. Nesse sentido, uma revisão bibliográfica identificou a importância do gestor de caso ser o profissional enfermeiro, pois este é a principal referência para o paciente e seus familiares, principalmente no que tange à educação em saúde para a promoção de hábitos saudáveis e prevenção de doenças ou complicações(2828 Ulbrich EM, Mattei AT, Mantovani MF, Madureira AB, Kalinke LP. Care models for people with chronic diseases: integrative review. Invest Educ Enferm. 2017;35(1):8-16. doi: http://dx.doi.org/10.17533/udea.iee.v35n1a02
http://dx.doi.org/10.17533/udea.iee.v35n...
).

A importância e os benefícios do gerenciamento de caso conduzido por enfermeiro são reforçados ao longo dos depoimentos, uma vez que os participantes identificaram os pontos positivos desse tipo de cuidado, referindo que todos os indivíduos pós-AVC deveriam dispor desse acompanhamento.

Considera-se como limitação do estudo o baixo número de participantes e de instituições. Ademais, as avaliações das atividades de gerenciamento de caso não ocorreram durante o processo, acontecendo somente após 30 dias do término da intervenção.

CONCLUSÃO

As intervenções do gerenciamento propostas nesta pesquisa permitiram identificar que esse é um modelo de cuidado passível de ser empregado pelos enfermeiros para pessoas pós-AVC, pois possibilita o estabelecimento de vínculo e, consequentemente, a advocacia em favor do paciente. Além disso, auxilia na promoção da saúde, na prevenção das complicações associadas às doenças crônicas e, consequentemente, promove a visibilidade do enfermeiro no atendimento às doenças crônicas.

  • *
    Extraído da tese: “Gerenciamento de caso conduzido por enfermeiro para pessoas com Acidente Vascular Cerebral: estudo de métodos mistos”, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do Paraná, 2019.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    31 Ago 2019
  • Aceito
    20 Out 2020
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