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Associação dos fatores de estresse e sintomas depressivos com o desempenho acadêmico de estudantes de enfermagem* * Extraído da tese: “Fatores de estresse, sintomas depressivos, suporte social e resiliência associados ao desempenho acadêmico em estudantes de enfermagem”, Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo, 2016.

RESUMO

Objetivo:

Verificar a associação dos fatores de estresse e da sintomatologia depressiva com o desempenho acadêmico de estudantes de enfermagem.

Método:

Pesquisa observacional, transversal, quantitativa, realizada em uma universidade pública em Manaus. Utilizou-se de dados sociodemográficos para a caracterização dos estudantes, do coeficiente de rendimento escolar e rendimento semestral individual, da Escala de Avaliação de Estresse em Estudantes de Enfermagem e da Escala de rastreamento de sintomatologia depressiva. Para a análise, foi utilizado o Coeficiente de correlação de Pearson, teste de ANOVA e a regressão linear múltipla.

Resultados:

Participaram 155 estudantes de enfermagem. Os fatores de estresse na realização das atividades práticas, comunicação profissional e formação profissional tiveram uma correlação positiva com rendimento semestral individual, enquanto o fator depressão, interpessoal, somática e iniciativa tiveram correlação negativa.

Conclusão:

O presente estudo identificou aspectos positivos dos fatores de estresse para um melhor desempenho acadêmico, todavia, a presença de sintomas depressivos implicou menor desempenho acadêmico.

DESCRITORES
Estudantes de Enfermagem; Estresse Psicológico; Depressão; Desempenho Acadêmico

ABSTRACT

Objective:

To verify the association of stress factors and depressive symptoms with the academic performance of nursing students.

Method:

Cross-sectional, quantitative, observational research conducted at a public university in Manaus. Socio-demographic data, academic performance coefficient and individual semester performance, the Instrument for the Assessment of Stress in Nursing Students and the CES-D Center for Epidemiologic Studies Depression Scale were used to characterize the students. Pearson's correlation coefficient, ANOVA test and multiple linear regression were used for the analysis.

Results:

155 nursing students participated in the study. The stress factors “performance of practical activities”, “professional communication” and “professional education” had a positive correlation with individual semester performance, while the factors “depressive affect”, “interpersonal” and “somatic/attitudes” had a negative correlation.

Conclusion:

The present study identified positive impacts of stress factors on academic performance, however, the presence of depressive symptoms was associated with lower academic performance.

DESCRIPTORS
Students, Nursing; Stress, Psychological; Depression; Academic Performance

RESUMEN

Objetivo:

Verificar la asociación de los factores de estrés y la sintomatología depresiva con el desempeño académico de estudiantes de enfermería.

Método:

Investigación observacional, transversal, cuantitativa, realizada en una universidad pública en Manaus. Se utilizaron datos sociodemográficos para la caracterización de los estudiantes, del coeficiente de rendimiento escolar y rendimiento semestral individual, la Escala de Evaluación de Estrés en Estudiantes de Enfermería y la Escala de rastreo de sintomatología depresiva. Para el análisis, se utilizó el Coeficiente de correlación de Pearson, la prueba de ANOVA y la regresión lineal múltiple.

Resultados:

Participaron 155 estudiantes de enfermería. Los factores de estrés en la realización de las actividades prácticas, comunicación profesional y formación profesional tuvieron una correlación positiva con rendimiento semestral individual, mientras que el factor depresión, interpersonal, somático e iniciativa tuvieron correlación negativa.

Conclusión:

El presente estudio identificó aspectos positivos de los factores de estrés para un mejor desempeño académico, sin embargo la presencia de síntomas depresivos implicó menor desempeño académico.

DESCRIPTORES
Estudiantes de Enfermería; Estrés Psicológico; Depresión; Rendimiento Académico

INTRODUÇÃO

Pesquisas têm mostrado que as adversidades da vida acadêmica repercutem em aspectos negativos para a experiência do estudante de enfermagem durante a graduação(11. Roso-Bas F, Pades Jiménez A, García-Buades E. Emotional variables, dropout and academic performance in Spanish nursing students. Nurse Educ Today. 2016;37(2):53-8. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2015.11.021
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22. Tharani A, Husain Y, Warwick I. Learning environment and emotional well-being: A qualitative study of undergraduate nursing students. Nurse Educ Today. 2017;59(12):82-87. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2017.09.008
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) e refletem no seu desempenho(33. Budu HI, Abalo EM, Bam V, Budu FA, Peprah P. A survey of the genesis of stress and its effect on the academic performance of midwifery students in a college in Ghana. Midwifery. 2019;73(6):69-77. DOI: https://doi.org/10.1016/j.midw.2019.02.013
https://doi.org/10.1016/j.midw.2019.02.0...
). O envolvimento do estudante no curso, sem suficiente clareza emocional, pode suscitar sentimentos pessimistas em relação à enfermagem e despertar pensamentos de abandono dos estudos e baixo otimismo(11. Roso-Bas F, Pades Jiménez A, García-Buades E. Emotional variables, dropout and academic performance in Spanish nursing students. Nurse Educ Today. 2016;37(2):53-8. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2015.11.021
https://doi.org/10.1016/j.nedt.2015.11.0...
). Além disso, a qualidade do ambiente acadêmico pode comprometer o aprendizado e o desempenho dos estudantes de enfermagem(22. Tharani A, Husain Y, Warwick I. Learning environment and emotional well-being: A qualitative study of undergraduate nursing students. Nurse Educ Today. 2017;59(12):82-87. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2017.09.008
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).

O sofrimento vivenciado pelo estudante é visto como consequência do ambiente acadêmico, do ensino, avaliação, exigências curriculares e falta de recursos, o que aumenta a percepção de sobrecarga e pode afetar os resultados das avaliações(22. Tharani A, Husain Y, Warwick I. Learning environment and emotional well-being: A qualitative study of undergraduate nursing students. Nurse Educ Today. 2017;59(12):82-87. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2017.09.008
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). Estudo de revisão evidenciou que durante a formação acadêmica dos estudantes de enfermagem os níveis de estresse sofrido foram de moderados a alto, consequência de fatores associados ao cuidado com pacientes, desempenho de tarefas avaliativas, cargas de trabalho e relações negativas com funcionários e professores(44. Labrague LJ, McEnroe-Petitte DM, Gloe D, Thomas L, Papathanasiou IV, Tsaras K. A literature review on stress and coping strategies in nursing students. J Ment Health. 2017;26(5):471-80. DOI: https://doi.org/10.1080/09638237.2016.1244721
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). Ainda, somada ao estresse, a depressão tem se apresentado como um problema de alta prevalência entre estudantes de enfermagem, produzindo um impacto negativo na saúde e no desempenho dos estudantes(55. Tung YJ, Lo KKH, Ho RCM, Tam WSW. Prevalence of depression among nursing students: A systematic review and meta-analysis. Nurse Educ Today. 2018;63(4):119-29. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2018.01.009
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).

O desgaste emocional do estresse vivenciado pelo estudante no período de formação pode levar a situações mais comprometedoras, como o burnout, um esgotamento ou exaustão emocional advinda das exigências acadêmicas, com prejuízos ao aprendizado(66. Reis D, Xanthopoulou D, Tsaousis IC. Measuring job and academic burnout with the Oldenburg Burnout Inventory (OLBI): Factorial invariance across samples and countries. 2015;2(1):8-18. DOI: https://doi.org/10.1016/j.burn.2014.11.001
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).

Neste contexto, deve-se considerar a teoria interacionista, a qual compreende por estresse a interação do indivíduo e o seu meio ambiente, bem como a interpretação positiva ou negativa que ele faz de um determinado evento. A percepção do evento estressor pode desencadear manifestações de natureza fisiológica e emocional(77. Lazarus RS, Folkman S. Stress, appraisal and coping. New York: Springer; 1984.).

Dessa maneira, no contexto ambiental do estudante de enfermagem a ocorrência dos fatores de estresse e sintomas depressivos é um problema evidente(44. Labrague LJ, McEnroe-Petitte DM, Gloe D, Thomas L, Papathanasiou IV, Tsaras K. A literature review on stress and coping strategies in nursing students. J Ment Health. 2017;26(5):471-80. DOI: https://doi.org/10.1080/09638237.2016.1244721
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55. Tung YJ, Lo KKH, Ho RCM, Tam WSW. Prevalence of depression among nursing students: A systematic review and meta-analysis. Nurse Educ Today. 2018;63(4):119-29. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2018.01.009
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). A sintomatologia depressiva é o conjunto de sintomas, entre os quais se destacam sentimento de culpa, de inutilidade, desamparo, desesperança, perda de apetite e distúrbios do sono. Esses sintomas estão relacionados às dimensões depressão, interpessoal, afetos positivos e somática/iniciativa, importantes para a definição do diagnóstico clínico de depressão(88. Radloff LS. The CES-D Scale: a self-report depression scale for research in the general population. Appl Psychol Meas. 1977;1(3):385-401. DOI: https://doi.org/10.1177%2F014662167700100306
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).

Os fatores de estresse inerentes à vida acadêmica são as atividades práticas, comunicação profissional, gerenciamento do tempo, ambiente, formação profissional e atividades teóricas(99. Costa ALS, Polak C. Construction and validation of an instrument for the assessment of stress among nursing students. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(spe):1017-26. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342009000500005
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). Para avaliar tais fatores, a Escala de Avaliação de Estresse em Estudantes de Enfermagem (AEEE) foi elaborada e apresentou boa qualidade psicométrica(99. Costa ALS, Polak C. Construction and validation of an instrument for the assessment of stress among nursing students. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(spe):1017-26. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342009000500005
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). Diante da diversidade cultural brasileira, tal instrumento necessita ser aplicado em locais de características socioculturais diferentes do proposto originalmente, trazendo novas evidências para garantir a equivalência cultural do conceito.

Diante desta problemática e aliada às particularidades de múltiplos ambientes de formação no território nacional, este estudo contribui com evidências sobre os aspectos psicoemocionais de estudantes da região Norte do Brasil. Especificamente, o local de escolha foi o Amazonas, onde existem características próprias relacionadas à procedência dos estudantes de outras localidades do interior do estado, com dificuldades de acesso e residência longe de suas famílias. Além disso, constatou-se que evidências são incipientes sobre o impacto desses desgastes no desempenho acadêmico do estudante.

A relevância deste tipo de estudo envolve o reconhecimento de sinais e sintomas que repercutem na vida do estudante e, futuramente, na saúde do profissional de enfermagem, uma vez que estresse psicológico tem impactado negativamente o desempenho de estudantes de outros cursos da área da saúde(1010. Aboalshamat K, Hou XY, Strodl E. Psychological well-being status among medical and dental students in Makkah, Saudi Arabia: a cross-sectional study. Med Teach. 2015;37 Suppl 1:S75-81. DOI: 10.3109/0142159X.2015.1006612
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). O aspecto inovador da presente pesquisa foi analisar os aspectos psicoemocionais dos fatores de estresse, sintomatologia depressiva e sua relação com o desempenho acadêmico. Poucos estudos abordaram este aspecto como desfecho. Desse modo, para confirmar a hipótese de que os fatores de estresse e os sintomas depressivos, evidentes no contexto da vida acadêmica, também impactam o desempenho acadêmico do estudante de enfermagem, o estudo teve como objetivo verificar a associação dos fatores de estresse e da sintomatologia depressiva com o desempenho acadêmico de estudantes de enfermagem.

MÉTODO

Tipo de estudo

Pesquisa observacional, transversal, quantitativa realizada em uma universidade pública na cidade de Manaus, Amazonas. O curso de graduação em enfermagem é diurno (manhã e tarde) e tem duração de 5 anos.

População

A população do presente estudo consistiu em 212 estudantes regularmente matriculados no curso de enfermagem.

Foram aceitos os estudantes regularmente matriculados nos semestres ímpares (1°, 3°, 5°, 7°, 9°) uma vez que o ingresso na IES ocorre anualmente. Excluíram-se os alunos ausentes na instituição nos horários agendados para a coleta de dados, as gestantes e os menores de 18 anos.

A população de estudo foi composta da totalidade dos estudantes, ou seja, 212 estudantes foram convidados a participar da pesquisa, sendo 62 do 1° semestre, 47 do 3°, 45 do 5°, 36 do 7° e 22 do 9° semestre. Destes, 155 (73,1%) aceitaram participar, havendo 57 (26,9%) perdas, motivadas por ausência de 34 estudantes da sala de aula no momento da coleta de dados (devido à participação em projetos externos, alunos em intercâmbio, em período de estágio curricular em unidades de saúde e faltas não justificadas), cinco foram excluídos por dados incompletos, uma por gravidez e 17 não aceitaram participar da pesquisa com a justificativa de falta de tempo para responder ao instrumento.

Coleta de dados

A coleta de dados ocorreu de 25 de junho a 30 de julho de 2015. Utilizou-se de questionário com dados sociodemográficos, acadêmicos, desempenho acadêmico (medido pelo Coeficiente de rendimento escolar (CRE) e Rendimento semestral individual (RSI). O RSI foi desenvolvido para esta pesquisa, representa a média ponderada do rendimento escolar do aluno por semestre e foi calculado a partir da soma da média final de cada disciplina cursada no semestre, dividida pelo número de disciplinas cursadas no semestre, a partir do histórico escolar. O RSI é obtido pela seguinte fórmula: RSI=∑[Média final 1+Média final 2+ MFn(todas as disciplinas do semestre)]/Número de disciplinas do semestre.

Foi utilizada a Escala de Avaliação de Estresse em Estudantes de Enfermagem (AEEE) e Escala de rastreamento de sintomatologia depressiva do Center for Epidemiologic Studies –Depression (CES-D). A AEEE foi construída e validada para avaliação dos fatores de estresse em estudantes de enfermagem(99. Costa ALS, Polak C. Construction and validation of an instrument for the assessment of stress among nursing students. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(spe):1017-26. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342009000500005
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) e fundamenta-se no modelo transacional do estresse(77. Lazarus RS, Folkman S. Stress, appraisal and coping. New York: Springer; 1984.). É composta de 30 itens, distribuídos em seis domínios, a saber: (1) Realização de atividades práticas; (2) Comunicação profissional; (3) Gerenciamento do tempo; (4) Ambiente; (5) Formação profissional; (6) Atividade teórica. Os itens do instrumento têm opções de resposta em uma escala tipo Likert, com valores de zero a três nos seguintes níveis de intensidade: 0 – não vivencio a situação; 1 – não me sinto estressado com a situação; 2 – sinto-me pouco estressado com a situação; 3 – sinto-me muito estressado com a situação. No estudo de construção e validação, o instrumento apresentou boa confiabilidade com alfa de Cronbach entre 0,717 e 0,866.

A escala de rastreio de sintomatologia depressiva CES-D(88. Radloff LS. The CES-D Scale: a self-report depression scale for research in the general population. Appl Psychol Meas. 1977;1(3):385-401. DOI: https://doi.org/10.1177%2F014662167700100306
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) é um instrumento para a avaliação da ocorrência de sintomatologia depressiva na população geral e em diversas faixas etárias. Foi validada no Brasil para estudantes universitários partindo de uma versão brasileira já existente da escala(1111. Hauck Filho N, Teixeira MAP. A estrutura fatorial da Escala CES-D em estudantes universitários brasileiros. Aval Psicol [Internet]. 2011 [citado 2018 fev. 2];10(1):91-7. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-04712011000100010&lng=pt
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). É composta de quatro fatores relacionados: Fator “Depressão”; Fator “Interpessoal”; Fator “Afetos positivos” e Fator “Somática/iniciativa”. O Fator “Depressão” é constituído por sete itens de afetos negativos, característicos do quadro depressivo. O Fator “Interpessoal” possui dois itens e avalia crenças negativas que trazem dificuldades nas relações e funcionamento social. O Fator “Afetos positivos” conta com quatro itens que avaliam os aspectos de otimismo, esperança e satisfação de vida. O Fator “Somáticos/iniciativa” compõe uma dimensão de sete itens relacionados às dificuldades em se engajar e manter as atividades cotidianas. Esses quatro fatores abrangem os principais aspectos afetivos, cognitivos, somáticos e comportamentais da depressão. A CES-D possui 20 questões, cujas respostas são dadas segundo a frequência com que cada sintoma esteve presente na semana precedente à aplicação do instrumento. Para a avaliação de cada item, foi utilizada uma escala tipo Likert de quatro pontos, sendo: 0 – Raramente ou nunca; 1 – Poucas vezes; 2 – Um tempo considerável; 3 – Todo o tempo. O escore total variou de 0 a 60 pontos. Quatro itens (questões) são relacionados a um sentido positivo, ou seja, compõem os fatores de afetos positivos, com o objetivo de impedir tendências a respostas repetitivas e avaliar a presença ou ausência de afeto positivo. Esses itens são pontuados de modo reverso, e maiores pontuações representam menor frequência de sintomas. O ponto de corte adotado neste estudo foi ≥16 pontos para identificar a ocorrência de sintomas de depressão; abaixo de 16 pontos representa ausência de sintomas depressivos(55. Tung YJ, Lo KKH, Ho RCM, Tam WSW. Prevalence of depression among nursing students: A systematic review and meta-analysis. Nurse Educ Today. 2018;63(4):119-29. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2018.01.009
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). No estudo de validação do instrumento com estudantes universitários brasileiros, o alfa total foi de 0,89, o que indica boa consistência interna. A escala fornece índices de ajuste aceitáveis para uma estrutura de quatro fatores, sugerindo a relativa adequação para uso com universitários brasileiros na forma original da escala com quatro fatores.

Análise e tratamento dos dados

Quanto à análise dos dados, para avaliar a intensidade do estresse entre os estudantes de enfermagem pela AEEE, foi calculada a média dos itens que compõem cada domínio a fim de identificar os de maior e menor estresse para o estudante. O domínio de maior média foi considerado o de maior estresse. Pela média obtida em cada domínio, o estudante foi classificado quanto à intensidade de estresse baseado na normalidade da escala em: baixa, média, alta e muito alta intensidade de estresse, em cada um dos seis domínios. A pontuação considerada para a classificação da intensidade de estresse em cada domínio está na Tabela 1.

Tabela 1
Classificação da intensidade de estresse, segundo quartis de risco em cada domínio(99. Costa ALS, Polak C. Construction and validation of an instrument for the assessment of stress among nursing students. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(spe):1017-26. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342009000500005
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).

Para a avaliação da sintomatologia depressiva pela CES-D, considerou-se o ponto de corte como ≥16 para identificar ocorrência de sintomas de depressão, abaixo representa ausência de sintomas depressivos(55. Tung YJ, Lo KKH, Ho RCM, Tam WSW. Prevalence of depression among nursing students: A systematic review and meta-analysis. Nurse Educ Today. 2018;63(4):119-29. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2018.01.009
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).

Nos testes de normalidades houve distribuição normal, assim, para analisar a correlação utilizou-se do teste de Pearson. Para comparar medidas entre grupos foi aplicado o teste de ANOVA (Analysis of variance). Para a identificação dos fatores preditores do desempenho acadêmico, foi realizada a análise de regressão múltipla. A variáveis foram selecionadas por um modelo LASSO (Least Absolute Shrinkage), tendo como variável resposta o RSI e o CRE. Os instrumentos foram avaliados quanto à confiabilidade pelo teste de alfa de Cronbach. Empregou-se intervalo de confiança (IC) de 95%, nível de significância de 5%, p-valor < 0,05.

Aspectos éticos

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo e da Instituição de Ensino Superior, onde os dados foram coletados, sob o Parecer n.º 1.122.822 e n.º 1.233.289 de 2015, atendendo a todas as especificações da Resolução n. 466/12, do Conselho Nacional de Saúde, que aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos.

RESULTADOS

Participaram da pesquisa 155 estudantes de enfermagem (45 do 1° semestre; 25 do 3° semestre; 38 do 5° semestre; 27 do 7° semestre; e 20 do 9° semestre) matriculados no curso de graduação em enfermagem da IES do estado do Amazonas, Brasil.

Na análise de confiabilidade dos instrumentos, o valor de Alfa de Cronbach para todos os itens do AEEE foi de 0,88 e de 0,78 para o CES-D. Na análise por fator, foram obtidos alfas de 0,62 (Interpessoal) a 0,84 (Depressão) para o CES-D; e de 0,64 (Atividade Teórica) a 0,79 (Formação Profissional) para o AEEE.

Quanto ao perfil dos estudantes, houve predominância de mulheres (83%), média de idade de 22,8 anos (DP=6,1), a maioria (88,4%) era solteira, 87,1% não tinham filhos, 53,5% residiam com os pais e eram dependentes financeiros (84,5%). Quanto às características acadêmicas, a maioria (29%) estava no primeiro semestre escolar, 16,1% no terceiro semestre, 24,5% no quinto semestre, 17,4% no sétimo semestre e 12,9% no nono semestre. A porcentagem de não reprovação em disciplinas ao longo do curso foi de 54,2%, 72,9% não estavam na prática de campo. A atividade complementar (pesquisa, extensão ou monitoria) foi realizada por 58,1% dos estudantes. A maioria dos alunos (74,2%) não recebia bolsa de incentivo financeiro. A enfermagem não foi o curso de primeira opção ao ingressar na Universidade (51,0%), e 49% dos alunos pensaram, em algum momento, em desistir do curso. A maioria (96,9%) relatou o desejo de prosseguir os estudos após o término da graduação, e 56,1% eram procedentes de escola da rede pública de ensino. A carga horária das atividades acadêmicas em média foi 31,9 (DP=11,5) horas semanais. Estudantes do nono semestre tiveram maior carga horária de atividades acadêmicas do que aqueles dos demais semestres, com média de 42,6 (DP=10,9) horas semanais. Os alunos do nono semestre acumularam a maior média de reprovações ao longo do curso: em média, seis disciplinas reprovadas. Estudantes do sétimo semestre foram os que mais apresentaram aprovação em disciplinas, média de 37 disciplinas.

Quanto à análise descritiva dos fatores de estresse, mostrado na Tabela 2, pode-se observar que a maioria dos estudantes apresentou baixa pontuação de estresse em todos os domínios analisados. Porém, observa-se pontuação de média intensidade de estresse nos domínios “Realização das atividades práticas” (29,7%), “Ambiente” (24,5%), “Gerenciamento do tempo” (21,3%) e “Atividade teórica” (16,8). Pontuação de alta intensidade de estresse nos domínios “Comunicação profissional” e “Formação profissional”, representado por 20,6% e 18,7%, respectivamente.

Tabela 2
Classificação da intensidade de estresse dos estudantes de enfermagem, segundo os domínios da AEEE – Manaus, AM, 2015.

Houve variação dos escores de estresse por fator do AEEE, segundo o Semestre Escolar. Observa-se aumento significativo na intensidade de estresse ao longo dos semestres escolares nos fatores Atividade Teórica, Formação Profissional, Comunicação Profissional e Realização das Atividades Práticas. Isso significa que, ao longo do curso, o nível de estresse relacionado a esses fatores aumenta significativamente entre os estudantes de enfermagem. Quanto à sintomatologia depressiva em estudantes de enfermagem, foram encontradas maior ocorrência no 3° e 7° semestres e menor ocorrência no 1° semestre do curso. Os sintomas depressivos estavam presentes em 74 (47,7%) dos estudantes de enfermagem. A Figura 1 mostra a ocorrência da sintomatologia depressiva segundo o semestre escolar.

Figura 1
Ocorrência de sintomatologia depressiva em estudantes de enfermagem, segundo o semestre escolar – Manaus, AM, 2015.

Na Tabela 3, apresenta-se a associação entre os fatores de estresse e sintomatologia depressiva com o coeficiente de rendimento escolar (CRE) e rendimento semestral individual (RSI) na população analisada.

Tabela 3
Correlação entre os fatores de estresse e sintomatologia depressiva com o desempenho acadêmico dos estudantes de enfermagem – Manaus, AM, 2015.

Os domínios de estresse “Realização das atividades práticas”, “Comunicação profissional”, “Formação profissional” influenciaram positivamente o desempenho acadêmico dos estudantes de enfermagem. A ocorrência de sintomatologia depressiva nos fatores depressão, interpessoal, somática/iniciativa influenciaram negativamente o desempenho acadêmico.

Na Tabela 4, verifica-se que os fatores que impactam negativamente o RSI dos estudantes de enfermagem (conforme mostra o valor de β) foram: morar sozinho e estar no 7° semestre escolar. O modelo apresentado explicou 33,4% (R2= ,334 R2Ajustado= ,392) da variabilidade do RSI nos estudantes de enfermagem.

Tabela 4
Modelo de Regressão Linear Múltipla dos fatores preditores do Rendimento Semestral Individual – RSI – Manaus, AM, 2015.

DISCUSSÃO

A análise dos dados mostra o impacto de fatores de estresse e sintomatologia depressiva no desempenho acadêmico dos estudantes de enfermagem. Contrastando com outras pesquisas, cujos impactos são negativos no desempenho acadêmico em estudantes de enfermagem(66. Reis D, Xanthopoulou D, Tsaousis IC. Measuring job and academic burnout with the Oldenburg Burnout Inventory (OLBI): Factorial invariance across samples and countries. 2015;2(1):8-18. DOI: https://doi.org/10.1016/j.burn.2014.11.001
https://doi.org/10.1016/j.burn.2014.11.0...
) e de outros cursos de graduação(1010. Aboalshamat K, Hou XY, Strodl E. Psychological well-being status among medical and dental students in Makkah, Saudi Arabia: a cross-sectional study. Med Teach. 2015;37 Suppl 1:S75-81. DOI: 10.3109/0142159X.2015.1006612
https://doi.org/10.3109/0142159X.2015.10...
), nesta pesquisa, os fatores de estresse apresentaram uma influência positiva no desempenho acadêmico do estudante de enfermagem.

A maior intensidade de estresse nos fatores “Realização das atividades práticas”, “Comunicação profissional”, “Formação profissional” está relacionada a um maior rendimento semestral individual (RSI), maior desempenho acadêmico. Esses domínios têm relação com situações da prática profissional que consolidam o desejo do status profissional. Entendemos que a aspiração pelo futuro profissional, embora esteja relacionada com maior intensidade de estresse, pode contribuir para um elevado investimento no currículo e no aprimoramento teórico, o que justifica o melhor desempenho acadêmico. Outra sugestão que poderia explicar esse fato é o processo de regulação emocional, que pode exercer influência sobre o enfrentamento e a gestão das emoções que o indivíduo experimenta ao buscar atingir suas metas profissionais. Nesta pesquisa, o evento estressor pode ser bem gerenciado pelos estudantes de enfermagem, não afetando o seu desempenho de maneira negativa(1212. Gloss JJ. Emotion regulation: current status and future prospects. Psychol Inq. 2015;26(1):1-26. https://doi.org/10.1080/1047840X.2014.940781
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).

Esse aspecto positivo do estresse é um dado que se destaca neste estudo, o que sugere uma percepção positiva do evento estressor pelos estudantes desta pesquisa, reiterando o movimento direcionado ao enfrentamento do estresse, de acordo com a teoria interacionista(77. Lazarus RS, Folkman S. Stress, appraisal and coping. New York: Springer; 1984.). No modelo interacionista, a percepção do evento como estressor depende da interação do indivíduo com o ambiente. A subjetividade é determinante da severidade do estressor, ou seja, se o evento for interpretado como desgastante, podem surgir manifestações de estresse(77. Lazarus RS, Folkman S. Stress, appraisal and coping. New York: Springer; 1984.).

Na presente pesquisa, a “Realização de atividades práticas”, que diz respeito às habilidades dos estudantes e o sentimento relacionado ao cuidado do paciente, representou de baixa a média intensidade de estresse em alunos do quinto, sétimo e nono semestre. A atividade prática tem representado um fator de estresse para estudantes de enfermagem em pesquisas anteriores(1313. Souza VS, Costa MAR, Rodrigues AC, Bevilaqua JF, Inoue KC, Oliveira JLC, et al. Stress among nursing undergraduate students of a Brazilian public university. Invest Educ Enferm [Internet]. 2016 [cited 2018 Jun 23];34(3):518-27. Available from: https://aprendeenlinea.udea.edu.co/revistas/index.php/iee/article/view/325707
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1515. Suen WQ, Lim S, Wang W, Kowitlawakul Y. Stressors and expectations of undergraduate nursing students during clinical practice in Singapore. Int J Nurs Pract. 2016;22(6):574-83. DOI: https://doi.org/10.1111/ijn.12473
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). Essa adversidade sugere uma preocupação dos estudantes com as práticas de campo, que pode ter surgido a partir do quarto semestre, quando iniciam suas práticas nas unidades de saúde.

A “Comunicação profissional” representou de média a alta intensidade de estresse em estudantes do quinto, sétimo e nono semestre, o que pode ser explicado por situações e relações de conflitos vivenciadas durante a vida acadêmica. Outro ponto de destaque para a compreensão desse resultado é o local de realização da prática clínica, que na atual fase se realizou em hospitais da rede pública e sem característica de acolhimento dos estudantes, como se observa nos hospitais universitários de ensino. Estudantes do quarto ano apresentaram maiores médias de pontuação neste domínio em outro estudo, fato justificado pela presença mais constante destes estudantes com maior demanda de interação com equipe multiprofissional, pacientes e familiares e necessidade de tomada de decisão nesta fase final de curso(1616. Bosso LO, Silva RM, Costa ALS. Biosocial-academic profile ane stress in first-and fourth-year nursing students. Invest Educ enferm. 2017;35(2):131-38. DOI: https://doi.org/10.17533/udea.iee.v35n2a02
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). Na comparação entre estudantes de enfermagem e medicina, desafios semelhantes foram verificados, recomendando melhoria da comunicação destas experiências conflituosas entre professores e supervisores(1717. WeurlanderM, Lönn A, Seeberger A, Broberger E, Hult H, Wernerson A. How do medical and nursing students experience emotional challenges durilg clinical placements? Int J Med Educ. 2018;27(9):74-82. DOI: https://doi.org/10.5116/ijme.5a88.1f80
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).

O “Gerenciamento do tempo”, que representa as dificuldades enfrentadas para conciliar o tempo entre as atividades da vida acadêmica, lazer, social e laboral, foi o domínio predominante na análise do escore padronizado e, para o aluno do terceiro semestre, foi o mais pontuado. A explicação deste fato deve-se à maior demanda de atividades laboratoriais das disciplinas básicas – estas são pré-requisitos para as dos semestres seguintes, com necessidade de maior tempo dedicado para estudo, diminuindo o tempo para as atividades de lazer e vida social. A pressão das responsabilidades acadêmicas e as diversas atribuições para o estudante de enfermagem são fatores de estresse(1414. Hirsch CD, Barlem ELD, Almeida LK, Tomaschewski-Barlem JG, Lunardi VL, Ramos AM. Stress triggers in the educational environment from the perspective of nursing students. Texto Context Enferm. 2018;27(1):e0370014. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0104-07072018000370014
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). A falta de tempo para as atividades acadêmicas ou pessoais e falta de lazer foi preditor de estresse em pesquisa com 146 estudantes de enfermagem de universidade pública na região Sul do Brasil(1818. Hirsch CD, Barlem ED, Tomaschewski-Barlem JG, Lunardi VL, Oliveira ACC. Predictors of stress and coping strategies adopted by nursing students. Acta Paul Enferm. 2015;28(3):224-9. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201500038
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).

Nesta pesquisa, o “Ambiente”, que se refere às dificuldades enfrentadas pelo estudante com os meios de transporte e acesso aos locais de estudo, representou média intensidade de estresse para os estudantes do terceiro semestre. A distância exige mais tempo para o deslocamento, podendo se tornar um estressor. Esses achados contrastam com a baixa intensidade de estresse neste domínio encontrada em um estudo realizado no interior de São Paulo(1919. Almeida LY, Carrer MO, Souza J, Pillon SC. Evaluation of social support and stress in nursing students. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03405. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2017045703405
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), o que pode caracterizar o estresse neste domínio como característica regional.

A “Formação profissional”, relacionada com a preocupação com a formação e o impacto desta no futuro profissional, apresentou aumento da intensidade de estresse a partir do quinto semestre e alcançou intensidade muito alta entre estudantes finalistas do curso. Sugere-se possível aumento progressivo da intensidade de estresse à medida que o estudante avança no curso, corroborando a literatura, que aponta diversos estressores relacionados à insegurança na transição de estudante para profissional e competitividade no mercado de trabalho(1919. Almeida LY, Carrer MO, Souza J, Pillon SC. Evaluation of social support and stress in nursing students. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03405. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2017045703405
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).

A realização das “Atividades teóricas”, que está relacionada ao grau de dificuldade sentido pelos estudantes com o conteúdo programático, representou média intensidade de estresse para os estudantes. A responsabilidade com o conteúdo teórico, o número de disciplinas para cursar por semestre, a realização de provas e trabalhos de aula foram levantados como fatores de estresse(2020. Bagcivan G, Cinar FI, Tosun N, Korkmaz R. Determination of nursing students' expectations for faculty members and the perceived stressors during their education. Contemp Nurse. 2015;50(1):58-71. DOI: 10.1080/10376178.2015.1010259
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). Sugere-se, com os dados encontrados neste estudo, que o estudante ao ingressar na universidade é confrontado com dificuldades em assimilar novas disciplinas e um extenso conteúdo teórico, o que pode refletir no seu desempenho.

Quanto à sintomatologia depressiva, maiores escores nos fatores “Depressão”, “Interpessoal” e “Somática/iniciativa” implicam menor RSI. O aumento da intensidade de estresse, apesar de aumentar o desempenho, parece exceder a capacidade de enfrentamento pelo estudante, como aponta a teoria interacionista(77. Lazarus RS, Folkman S. Stress, appraisal and coping. New York: Springer; 1984.), com possibilidade de ocorrência de sintomas depressivos, além de contribuir para um menor desempenho acadêmico.

A sintomatologia depressiva em outros estudos tem sido associada a maiores níveis de estresse entre estudantes de enfermagem(55. Tung YJ, Lo KKH, Ho RCM, Tam WSW. Prevalence of depression among nursing students: A systematic review and meta-analysis. Nurse Educ Today. 2018;63(4):119-29. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2018.01.009
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), fato que pode explicar a ocorrência de menor desempenho acadêmico diante de maior intensidade de sintomas depressivos. Observou-se que ocorreram sintomas depressivos em 47,7% da população de estudantes analisada. Em pesquisa de revisão sistemática de 27 estudos, constatou-se alta prevalência de depressão em estudantes de enfermagem, porém sem diferença significativa quando comparada com estudantes de outros cursos(55. Tung YJ, Lo KKH, Ho RCM, Tam WSW. Prevalence of depression among nursing students: A systematic review and meta-analysis. Nurse Educ Today. 2018;63(4):119-29. DOI: https://doi.org/10.1016/j.nedt.2018.01.009
https://doi.org/10.1016/j.nedt.2018.01.0...
). Estudo com 270 estudantes universitários de vários cursos em Gana verificou a prevalência desse fenômeno em 39,2% dos estudantes(2121. Oppong Asante K, Andoh-Arthur J. Prevalence and determinants of depressive symptoms among university students in Ghana. J Affect Disord. 2015;15(171):161-6. DOI: 10.1016/j.jad.2014.09.025
https://doi.org/10.1016/j.jad.2014.09.02...
). Destaca-se, nesta pesquisa, um percentual elevado de sintomatologia depressiva entre os estudantes de enfermagem quando comparado aos estudos apresentados. A maior sintomatologia depressiva pode estar associada aos fatores de estresse percebidos por estes indivíduos, uma vez que o estresse é um fator de desgaste no contexto acadêmico do estudante de enfermagem(1313. Souza VS, Costa MAR, Rodrigues AC, Bevilaqua JF, Inoue KC, Oliveira JLC, et al. Stress among nursing undergraduate students of a Brazilian public university. Invest Educ Enferm [Internet]. 2016 [cited 2018 Jun 23];34(3):518-27. Available from: https://aprendeenlinea.udea.edu.co/revistas/index.php/iee/article/view/325707
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).

Morar sozinho foi um dos fatores que impactam negativamente o RSI dos estudantes de enfermagem (conforme mostra o valor de β). Sentimento de solidão ou baixo apoio social podem interferir em condições físicas e psicológicas que impactam negativamente o desempenho acadêmico(1919. Almeida LY, Carrer MO, Souza J, Pillon SC. Evaluation of social support and stress in nursing students. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03405. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2017045703405
http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2017...
,2222. Holt-Lunstad J, Smith TB. Loneliness and social isolation as risk factors for mortality. a meta-analytic review. Perspect Psychol Sci. 2015;10(2):227-37. DOI: https://doi.org/10.1177/1745691614568352
https://doi.org/10.1177/1745691614568352...
). Especificamente nesta pesquisa, verificou-se notável ocorrência de sintomatologia depressiva no 3° semestre, o que pode decorrer do processo de adaptação, da realidade do ensino superior e da inserção do discente nas disciplinas específicas do curso de enfermagem, nas quais já estão em maior contato com pacientes doentes e em sofrimento, o que requer conhecimentos e habilidades ainda em desenvolvimento no discente(99. Costa ALS, Polak C. Construction and validation of an instrument for the assessment of stress among nursing students. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(spe):1017-26. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342009000500005
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342009...
,1313. Souza VS, Costa MAR, Rodrigues AC, Bevilaqua JF, Inoue KC, Oliveira JLC, et al. Stress among nursing undergraduate students of a Brazilian public university. Invest Educ Enferm [Internet]. 2016 [cited 2018 Jun 23];34(3):518-27. Available from: https://aprendeenlinea.udea.edu.co/revistas/index.php/iee/article/view/325707
https://aprendeenlinea.udea.edu.co/revis...
). Corroborando esses achados, foi encontrada maior chance de desenvolver sintomas depressivos em estudantes que cursavam terceiro e quarto semestre escolar(2323. Horgan A, Sweeney J, Behan L, McCarthy G. Depressive symptoms, college adjustment and peer support among undergraduate nursing and midwifery students. J Adv Nurs. 2016;72(12):3081-92. DOI: https://doi.org/10.1111/jan.13074
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). Sugere-se que, após o primeiro ano, os estudantes já tiveram um tempo para o ajustamento acadêmico e social. Aqueles que não completaram essa adequação no primeiro ano de forma satisfatória manifestam a partir do terceiro semestre maior desgaste emocional.

Neste estudo, estudantes no sétimo semestre obtiveram maior desempenho acadêmico, medido pelo RSI. Possivelmente, o bom índice de desempenho acadêmico deve-se a uma característica própria da população analisada, em que muitos estudantes ao longo do curso envolvem-se em atividades extracurriculares, como grupos de pesquisa, atividades de extensão, centro acadêmico, comissões internas e organização de eventos, aumentando a rede social de suporte durante a graduação. Evidências na literatura comprovam que o apoio de pares está correlacionado com menores ocorrências de sintomas depressivos na universidade(2323. Horgan A, Sweeney J, Behan L, McCarthy G. Depressive symptoms, college adjustment and peer support among undergraduate nursing and midwifery students. J Adv Nurs. 2016;72(12):3081-92. DOI: https://doi.org/10.1111/jan.13074
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).

A ocorrência de sintomatologia depressiva entre os estudantes de enfermagem desta pesquisa suscita a necessidade de intervenções por parte das instituições de ensino para auxiliar estes discentes a manejar as dificuldades inerentes ao curso de graduação. Melhor manejo do estresse e sintomas depressivos em acadêmicos de enfermagem, além de melhorar o desempenho acadêmico, em longo prazo, pode trazer impactos positivos para a saúde de novos profissionais. Sugere-se a que novos estudos investiguem como os fatores acadêmicos podem estar associados à prevalência da sintomatologia depressiva, assim como esclareçam mecanismos de proteção que impactam o desempenho acadêmico.

Entre as limitações de pesquisa, verifica-se o número reduzido de estudantes, pois este aspecto requer um maior cuidado dos pesquisadores quanto à generalização dos dados e análises estatísticas de maior complexidade. Em outro aspecto, a pesquisa mostrou a realidade em uma instituição pública, o que requer novos estudos com estudantes de instituições privadas.

CONCLUSÃO

Os resultados deste estudo mostraram o impacto de fatores de estresse e sintomas depressivos no desempenho acadêmico de estudantes universitários de enfermagem da região Norte do Brasil. Quanto à sintomatologia depressiva, maiores escores nos fatores “Depressão”, “Interpessoal” e “Somática/iniciativa” implicaram menor rendimento acadêmico. Em contraste, maiores índices de estresse em fatores relacionados à “realização de atividades práticas”, “comunicação profissional” e “formação profissional” foram associados a um maior rendimento semestral individual, sugerindo impacto também positivo do estresse na vida acadêmica. O fato de esses domínios estarem relacionados à prática do profissional de enfermagem e a identificação de um aumento progressivo do estresse ao longo do curso podem sugerir movimento de alta intensidade de estresse na transição para o mercado de trabalho. Por isso, estratégias educativas e formativas devem estar voltadas para o enfrentamento e manejo das preocupações futuras de estudantes, visando garantir melhores resultados no bem-estar emocional do profissional de enfermagem.

A análise dos dados indicou possíveis fatores para direcionar intervenções visando à melhora no desempenho acadêmico de discentes de enfermagem, como estratégia de cuidado da sua saúde e qualidade de vida. Além disso, explorar estratégias de enfrentamento de estressores inerentes ao processo de formação, que estarão presentes no cotidiano do profissional de enfermagem, é fundamental em vista do componente subjetivo determinante de consequências positivas ou negativas em resposta ao evento estressor.

  • *
    Extraído da tese: “Fatores de estresse, sintomas depressivos, suporte social e resiliência associados ao desempenho acadêmico em estudantes de enfermagem”, Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo, 2016.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    22 Jul 2018
  • Aceito
    21 Maio 2019
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