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A experiência do companheiro da mulher com câncer de mama* * Extraído da dissertação: “Ser companheiro da mulher com câncer de mama: análise compreensiva na perspectiva dos parceiros”, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem em Saúde Pública, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, 2016.

RESUMO

Objetivo:

Compreender a experiência de ser companheiro da mulher com câncer de mama.

Método:

Estudo qualitativo, com fundamentação teórico-metodológica na Psicologia Fenomenológico-Existencial realizado com companheiros de mulheres com câncer de mama que frequentavam um núcleo de reabilitação de mastectomizadas. Os dados foram coletados por meio de entrevistas, de junho a novembro de 2014, a partir de uma questão norteadora.

Resultados:

Participaram do estudo 10 companheiros. Com a descoberta da doença, houve uma desorganização emocional dos companheiros devido ao medo da perda das parceiras. Diante do sofrimento, demonstraram capacidade de reação: dispondo-se a cuidar, a consolar e a apoiar suas mulheres na busca do tratamento e procurando, junto com elas, reverter as situações adversas. Também se mostraram sensíveis e reconheceram o intenso sofrimento emocional de suas mulheres em razão das dificuldades enfrentadas no curso do tratamento.

Conclusão:

O estudo mostrou um sofrimento intenso dos companheiros das mulheres com câncer de mama e sua dificuldade em buscar ajuda, sendo necessário que o profissional de saúde esteja atento, acolhendo-os em todo o processo de tratamento, de modo a atenuar-lhes o sofrimento.

DESCRITORES:
Neoplasias da Mama; Estado Conjugal; Cuidadores; Existencialismo; Enfermagem Oncológica

ABSTRACT

Objective:

To understand the experience of partners of women with breast cancer.

Method:

This was a qualitative study, based on the theoretical-methodological framework of existential and phenomenological psychology, and carried out with the partners of women with breast cancer who attended a center for rehabilitation after mastectomy. The data were collected in interviews between June and November 2014, based on a guiding question.

Results:

Ten partners participated in the study. On discovering the disease, the partners experienced emotional distress caused by the fear of losing their partners. Before this suffering, they demonstrated the ability to react: willingness to provide care, to comfort and to support the women in search of treatment, and together, seek to reverse adverse situations. They also showed sensitivity and recognized the intense emotional suffering of the women caused by the challenges faced throughout the course of treatment.

Conclusion:

The present study showed the intense suffering of the partners of women with breast cancer and their difficulty to ask for help. Thus, health professionals must be alert, addressing their needs throughout the treatment process to mitigate suffering.

DESCRIPTORS:
Breast Neoplasms; Marital Status; Caregivers; Existentialism; Oncology Nursing

RESUMEN

Objetivo:

La experiencia del compañero de la mujer con cáncer de mama.

Método:

Estudio cualitativo, con fundamentación teórica metodológica en la Psicología Fenomenológica Existencial realizado con compañeros de mujeres con cáncer de mama que acudían a un núcleo de rehabilitación de mastectomizadas. Se recogieron los datos mediante entrevistas, de junio a noviembre de 2014, a partir de una cuestión orientadora.

Resultados:

Participaron en el estudio 10 compañeros. Con el descubrimiento de la enfermedad, hubo una desorganización emotiva de los compañeros en virtud del miedo de la pérdida de la pareja. Ante el sufrimiento, demostraron capacidad de reacción: disponiéndose a cuidar, consolar y apoyar a sus mujeres en la búsqueda del tratamiento y tratando de revertir, junto a ellas, las situaciones adversas. También se mostraron sensibles y reconocieron el intenso sufrimiento emotivo de sus mujeres en razón de las dificultades enfrentadas en el trascurso del tratamiento.

Conclusión:

El estudio mostró un sufrimiento intenso de los compañeros de las mujeres con cáncer de mama y su dificultad en buscar ayuda, siendo necesario que el profesional sanitario esté atento, acogiéndolos en todo el proceso de tratamiento, de modo a atenuarles el sufrimiento.

DESCRIPTORES:
Neoplasias de la Mama; Estado Conyugal; Cuidadores; Existencialismo; Enfermería Oncológica

INTRODUÇÃO

O Instituto Nacional de Câncer (INCA) estimou 300.870 novos casos de neoplasias em 2016, sendo 57.960 de câncer de mama, com um risco estimado de 56,20 casos a cada 100 mil mulheres11. Brasil. Ministério da Saúde; Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estimativa 2016: incidência de câncer no Brasil [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2015 [citado 2017 jul.10]. Disponível em: Disponível em: http://www.inca.gov.br/wcm/dmdc/2016/numeros-cancer-brasil.asp
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. Essa projeção caracteriza a doença como a neoplasia maligna que mais acomete e também a que mais causa mortes na população feminina11. Brasil. Ministério da Saúde; Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estimativa 2016: incidência de câncer no Brasil [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2015 [citado 2017 jul.10]. Disponível em: Disponível em: http://www.inca.gov.br/wcm/dmdc/2016/numeros-cancer-brasil.asp
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. Em contrapartida, ocorreu o desenvolvimento de novas tecnologias e de fármacos mais efetivos para o tratamento do câncer de mama, assim como a melhoria da prestação de serviços, o que tem contribuído, de certa forma, para o controle do agravo e para elevar a sobrevida das pessoas acometidas22. DeSantins CE, Lin CC, Mariotto AB, Siegel RL, Stein KD, Kramer JL, et al. Cancer treatment and survivorship statistics, 2014. CA Cancer J Clin. 2014;64(4):252-71. DOI 10.3322/caac.21349
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. As consequências físicas dos tratamentos acarretam sofrimento psicológico, que, por sua vez, desencadeia dificuldades emocionais e sociais e, frequentemente, levam ao isolamento social33. Loyola-Caetano EA, Borges ML, Magalhães PAP, Areco FS, Yochimochi LTB, Panobianco MS. Rehabilitation group: benefits and barriers in the perspective of women with breast câncer. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2017 [cited 2017 July 10];26(1):e3250015. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/tce/v26n1/0104-0707-tce-26-01-3250015.pdf
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. Essas consequências são decorrência de eventos estressores provenientes das alterações corporais induzidas pelo tratamento, associados a outros estressores, oriundos das transformações vivenciadas em diferentes aspectos vitais, como nas relações sociais, capacidade funcional, condição laboral e universo psíquico da mulher acometida44. Masculino DA, Fergus KD, Cullen K. Sexual identity after breast cancer: sexuality, body image, and relationship repercussions. Curr Opin Support Palliat Care. 2016;10(1):66-74. DOI: 10.1097/SPC.0000000000000184
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. Algumas delas permanecem por um tempo específico, como as referentes à duração de cada procedimento escolhido para o tratamento, enquanto outras se estendem pela vida toda, como a prevenção e os cuidados em relação ao linfedema.

Os procedimentos e tratamentos para o câncer de mama, como para toda doença grave, especialmente as crônico-degenerativas, representam, ao mesmo tempo, privação e oportunidade de reformulação. E, com o passar do tempo, as mulheres percebem que precisam reinventar a vida e retomar seu contexto social e familiar, adaptando-se às mudanças corporais e emocionais decorrentes da cirurgia e dos tratamentos a que foram submetidas.

O principal contato social mantido pela mulher com câncer de mama, além dos profissionais da equipe de saúde, é com sua família. Considerada o principal núcleo social de uma pessoa, a família é uma esfera basilar na socialização e transmissão de valores éticos, estéticos, políticos, culturais e religiosos. Vale ressaltar que a família é foco de preocupações e alegrias da mulher que sofre com o câncer de mama, um dos temas mais recorrentes nos seus discursos, pois é no cotidiano da família que ela vive seus anseios desde o momento do diagnóstico, durante os tratamentos, até o longo processo de reabilitação psicossocial55. Ribeiro VC, Portella VSDC, Malheiro VES. Mulheres de meia idade e o enfrentamento do câncer de mama. Rev Cuid [Internet]. 2014 [citado 2017 jul. 10];5(2):799-805. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.org.co/pdf/cuid/v5n2/v5n2a12.pdf
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Nessa direção, ao avaliar as relações de interdependência de mulheres com câncer de mama com os outros, estudo demonstrou que elas dão maior ênfase ao relacionamento conjugal e familiar, uma vez que o cônjuge e os familiares são as pessoas consideradas como o outro significante e/ou seus principais sistemas de apoio66. Neris RR, Anjos ACY. Experience of spouses of women with breast cancer: an integrative literature review. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2014 [cited 2017 Sept 12];48(5):922-31. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v48n5/0080-6234-reeusp-48-05-922.pdf
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. Assim, são eles os primeiros e principais elos sociais a darem a medida das ações e reações dessas mulheres.

Neste sentido, o companheiro é considerado um membro especial na família, dotado de características particulares que ultrapassam, na intimidade, todas as relações com os outros membros. A mulher e seu companheiro têm o status de provedores de cuidado e constituem forças que mantêm a coesão das relações familiares. O parceiro tem um papel fundamental nas diversas fases do tratamento, e a mulher necessitará do seu apoio após o diagnóstico, a cirurgia e durante todo o processo de reabilitação77. Campbell-Enns HJ, Woodgate RL. The psychosocial experiences of women with breast cancer across the lifespan: a systematic review protocol. JBI Database System Rev Implement Rep. 2015;13(1):112-21. DOI: 10.11124/jbisrir-2015-1795
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Pesquisa com companheiros de mulheres que vivenciaram o câncer de mama apontou que os cônjuges, ao receberem o diagnóstico da condição de saúde de suas esposas, experimentaram reações emocionais tão intensas quanto as delas e, diferentemente delas, expressaram sentimentos de esperança. Com o decorrer dos tratamentos, alguns companheiros tiveram de mudar de emprego, enquanto outros flexibilizaram sua rotina de trabalho para se colocarem disponíveis para atender às necessidades das mulheres88. Duggleby W, Bally J, Cooper D, Doell H, Thomas R. Engaging hope: the experiences of male spouses of women with breast cancer. Oncol Nurs Forum. 2012;39(4):400-6. DOI: 10.1188/12.ONF.400-406
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Estudo de revisão mostrou que os cônjuges e demais familiares valorizaram o acolhimento recebido por parte dos profissionais de saúde e as orientações recebidas no decorrer do período de tratamento do câncer de mama, mesmo quando mantiveram encontros breves ou mediados pela paciente99. Ambrósio DCM, Santos MA. Apoio social à mulher mastectomizada: um estudo de revisão. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015 [citado 2017 jul. 21];20(3):851-64. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n3/1413-8123-csc-20-03-00851.pdf
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. Nesse sentido, uma investigação científica realizada nos Estados Unidos mostrou que parceiros de mulheres diagnosticadas com câncer de mama que tiveram a oportunidade de receber aconselhamento psicoeducacional aprimoraram sua capacidade de comunicação e de oferecer suporte interpessoal à esposa, além de melhorarem também o autocuidado, o humor depressivo, a ansiedade e o ajustamento marital, incluindo questões ligadas à sexualidade do casal1010. Gilbert E, Perz J, Ussher JM. Talking about sex with health professionals: the experience of people with cancer and their partners. Eur J Cancer Care (Engl). 2016;25(2):280-93. DOI: 10.1111/ecc.12216
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Ouvir o que os parceiros afetivos das mulheres acometidas pelo câncer de mama têm a dizer pode ajudar os profissionais a perceberem os parceiros como recursos potenciais de ajuda para a reabilitação psicossocial1111. Cesnik VM, Santos MA. Mastectomia e sexualidade: uma revisão integrativa. Psicol Reflex Crít [Internet]. 2012 [citado 2017 ago. 18];25(2):339-49. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/prc/v25n2/a16v25n2
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. A literatura que trata da relação entre mastectomia e sexualidade recomenda a realização de investigações que privilegiem a visão dos companheiros, com a finalidade de complementar os muitos estudos realizados com as mulheres acometidas pelo câncer de mama.

Assim, a presente pesquisa tem o intuito de oferecer uma ampliação da visão compreensiva acerca do mundo social e circundante da mulher com câncer de mama, com foco no seu companheiro, considerando a necessidade de esclarecer os limites e as possibilidades de seu papel de apoio à esposa adoecida. O objetivo do estudo foi, então, compreender a experiência de ser companheiro da mulher com câncer de mama na sua própria perspectiva, considerando o período que abrange o diagnóstico e o processo de reabilitação.

MÉTODO

O interesse em compreender como é ser companheiro da mulher com câncer de mama fez com que optássemos pela metodologia qualitativa, uma vez que nos baseamos em compreensões que giram em torno das particularidades e não de explicações gerais, com o propósito de valorizar o caráter intrínseco, contextual e pessoal de cada vivência. Trata-se de uma proposta de estudo pautada na Psicologia Fenomenológico-Existencial, fundamentada no pensamento filosófico de Martin Heidegger1212. Heidegger M. Ser e tempo. 4ªed. Petrópolis: Vozes; 2012. e na concepção de homem e de ciência que ali se encontra para análise.

A pesquisa foi desenvolvida em um núcleo de reabilitação de mastectomizadas de uma universidade pública do interior paulista. Esse serviço conta com uma equipe multiprofissional que tem por objetivo prestar assistência integral e gratuita a mulheres com câncer mamário e prover orientações a seus familiares.

Para a participação no estudo, foram considerados os seguintes critérios de inclusão: ser homem adulto e encontrar-se na condição de união estável pelo menos desde o momento do diagnóstico de câncer de mama da mulher; sua mulher deveria ter a idade maior ou igual a 18 anos, estar inscrita no serviço e ter capacidade de comunicação preservada. O potencial participante somente foi contatado após anuência prévia de sua mulher, que primeiramente questionou o parceiro e verificou seu interesse e disponibilidade em participar do estudo. Uma vez que essa dupla condição foi preenchida, o companheiro foi contatado e convidado pelo pesquisador a colaborar. Sua mulher deveria conceder permissão para o pesquisador utilizar alguns dados de seu prontuário do serviço, como data da cirurgia e tipos de tratamento realizados. Foram critérios de exclusão: dificuldade acentuada de comunicação e/ou compreensão, que prejudicasse o entendimento das questões apresentadas nas entrevistas.

Depois do levantamento no banco de dados do serviço de reabilitação, as mulheres inscritas no serviço foram abordadas em dia e horário de atendimento. Nesse momento foi perguntado a elas se mantinham relacionamento com um mesmo companheiro (casamento ou união estável) desde o diagnóstico do câncer de mama. No caso de resposta positiva, foi apresentado a elas o projeto de pesquisa e esclarecidos os objetivos e o procedimento de coleta de dados, solicitando-lhes que consultassem seus companheiros sobre sua concordância de o pesquisador entrar em contato para convidá-los a participar do estudo. Depois da aceitação e concordância de comunicá-los do convite, o pesquisador estabeleceu o primeiro contato com os companheiros, por telefone ou em suas residências, para agendar o dia da entrevista. Para tanto, foram elaborados dois termos de consentimento, o primeiro atestando a anuência da mulher que frequenta o serviço, e o segundo, para seu companheiro. Dessa forma, o consentimento foi formalizado mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A entrevista foi aplicada em sala reservada do serviço, em dia e horário previamente combinados, quando o companheiro acompanhava a mulher no atendimento regular do serviço de reabilitação, ou nas residências dos casais, conforme preferência dos participantes. Os dados foram coletados no período de 30 de junho a 27 de novembro de 2014, e a duração das entrevistas foi, em média, de 50 minutos.

A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista fenomenológica, pautada na questão norteadora: Como tem sido para você ser companheiro de uma mulher com câncer de mama? A pergunta norteadora da pesquisa teve o intuito apenas de direcionar o foco a ser explorado no estudo, deixando o entrevistado à vontade para discorrer sobre o tema. O pesquisador ficou livre para interagir e acolher o colaborador da forma como compreendeu ser solicitado e diante da condição de ser profissional da saúde e psicólogo. As entrevistas foram gravadas em áudio e participaram 10 companheiros de mulheres com câncer de mama.

Para manter o sigilo em relação à identidade dos companheiros, suas falas foram remetidas ao número relacionado à entrevista que concederam para a coleta de dados, na sequência em que foi realizada com cada colaborador (E1, E2, E3 ... E10).

Foram respeitadas as recomendações da Resolução 466/12, do Conselho Nacional de Saúde, para pesquisas com seres humanos. Primeiramente, foi obtida a autorização do serviço para a realização do estudo naquele local, e os dados foram coletados após a aprovação da pesquisa no Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto − USP (protocolo CAAE 30819814.6.0000.5393 e ofício CEP-EERP/USP-098/2014).

RESULTADOS

Participaram do estudo 10 companheiros. Quatro unidades significativas emergiram das suas falas, permitindo seguir tanto cronologicamente o acontecimento do fenômeno estudado como o seu desenvolvimento. Partimos de uma compreensão que emergiu do surgimento do câncer de mama na mulher e o impacto promovido pela notícia, para depois apreendermos, nas falas apresentadas, os desdobramentos e repercussões da doença na vida do companheiro. As categorias abrangem o microcosmo familiar, a relação marital e o desenvolvimento da intimidade, as questões suscitadas pelo encontro com a finitude humana, o sofrimento do companheiro e a irrupção social da experiência, com suas particularidades, por meio de participações comunitárias, religiosas e técnico-científicas.

VIVENDO O IMPACTO DO DIAGNÓSTICO E A DESESTABILIZAÇÃO EMOCIONAL

O momento da notícia do diagnóstico foi descrito como o maior impacto na vida dos companheiros, gerando grande sofrimento e causando uma desestabilização emocional.

Então, eu diria pra você que é um desmoronamento, tudo aquilo que você projetou pra sua vida de família, em um primeiro momento cai por terra. É uma reconstrução, uma reconstrução. A gente fica perdido, totalmente perdido em um primeiro momento (E4).

Apesar da desestabilização inicial, os companheiros demonstraram capacidade de reagir, dispondo-se a apoiar e motivar a mulher em relação ao cumprimento do tratamento. Eles buscaram auxiliar a parceira, reverter a situação adversa e encontrar um novo caminho.

Foi aquele choque, mas tivemos que nos conscientizar e ver que hoje as coisas estão mais avançadas. Se a mulher ficar pra baixo, e o homem ficar pra baixo, os dois desabam (E6).

COMPARTILHANDO O CUIDADO DEDICADO À MULHER COM OUTROS FAMILIARES

No cenário familiar, apesar do impacto sofrido com o diagnóstico, os companheiros puderam compartilhar o cuidado dedicado à mulher com outros familiares, especialmente os filhos, que se mobilizaram no sentido de estreitar os laços de união com a mãe, demonstrando suas preocupações por meio de uma aproximação afetuosa de cuidado.

Mesmo as meninas, as filhas, não dão muito sossego pra ela: ‘Mãe, vamos em tal lugar; mãe, vamos lá, e não sei o que lá’, mas é para tirar a doença da cabeça dela (E2).

Também se fizeram presentes, na fala dos colaboradores, alguns testemunhos de cuidados oferecidos à mulher em conjunto com outros familiares. A família, assim, agrega forças nesse processo de enfrentamento, amplificando as possibilidades de suporte oferecidas pelos companheiros.

Tem dia que ela está quietinha, aí eu ligo para uma das meninas, principalmente a caçula, aí ela já liga pra ela: ‘Mãe, você vai comigo no shopping, vai comigo em tal lugar’. Aí, quando volta, já é outra pessoa, já abriu a mente (E2).

Algumas vezes, no entanto, a convergência e o compartilhamento de cuidados na família não acontecem, e cabe somente ao companheiro a incumbência de cuidar da mulher.

Hoje, o que mais contribui para a sequência deste estado de espírito dela são os filhos. Eu tenho um filho que tem um problema psicológico, que a gente está tentando ajudar, mas que ele tem distúrbio bipolar, que está contribuindo para a gente ficar neste estado (E4).

COMPARTILHANDO O ENFRENTAMENTO DA DOENÇA NA RELAÇÃO A DOIS

Nossos colaboradores descreveram a aproximação possibilitada pelo diálogo como um dos principais meios à disposição para demonstrar suas preocupações:

No começo eu queria estar junto toda hora, queria saber o que estava acontecendo, se estava bem, se não estava. Mais uma melaçãozinha do casal mesmo (E5).

Quando a tentativa de diálogo não mostrou efetividade, alternativas foram colocadas em prática. Ajudar nas tarefas domésticas também foi mencionado pelos colaboradores como um meio eficiente de oferecer apoio às companheiras:

A casa eu limpo, as roupas pesadas da máquina eu tiro, mas ela faz um pouco porque ficar deitada em cima da cama aumenta mais as doenças do organismo. Quando ela começou a levantar, bater perna, eu comecei a ficar mais feliz (E6).

Por outro lado, compartilhar a execução das tarefas domésticas não mostrou ser a melhor forma de lidar com os problemas para todos os companheiros, pois, mesmo tentando seguir esse caminho, alguns não conseguiram alcançar a aproximação desejada com a mulher ao utilizarem essa estratégia:

E, às vezes, ela acha que não está bom. Ela fala que eu devia fazer diferente. Outro dia ela veio pôr defeito e eu fiquei até nervoso. Falei pra ela que, se ela fala tanto, por que ela não faz? E ela falou que ela não pode. Então falei pra ela ficar quieta e ficar no cantinho dela, que aqui eu faço do meu jeito e tenho certeza de que estou fazendo direito. Vixe, aí ela virou a cara comigo e ficamos uns cinco ou seis dias sem se olhar na cara (E7).

ENFRENTANDO O TRATAMENTO E SEUS EFEITOS SOBRE A INTIMIDADE CONJUGAL

Esta unidade significativa abrange as falas que demonstraram as limitações da corporeidade, as carências, a culpa e as dores provenientes do tratamento do câncer e, principalmente, da cirurgia realizada. Nos discursos dos companheiros emergiram as repercussões dessas consequências da terapêutica na intimidade do casal. As dificuldades enfrentadas aparecem desde quando eles se referem ao toque físico até quando abordam a questão da relação sexual.

Depois que ela operou, ela não quis ter mais relação, e eu também não liguei muito não, sabe? Porque a gente vê de outra forma, faz de outro jeito. Eu peguei e não procurei mais ela. Ela rejeitava falando que estava com câncer de mama e tal. Ela acha que morreu tudo, para ela morreu tudo. E desde então nós não temos relação mais. E parei de procurar ela, porque não adianta (E10).

O poder-ser do corpo também abre a possibilidade de poder ter prazer na condição de potência e encontra, pela mesma condição indigente da necessidade, a possibilidade de satisfação na experiência prazerosa.

E também eu acho que é uma situação normal, porque uma mulher que está com os dois seios e de repente mutila, então o psicológico, mesmo que você não queira, ele fica abalado. Então, em um primeiro momento, teve mudanças, mas depois ela melhorou e sarou (E4).

Alguns relatos mostram que a reconstrução mamária possibilitou para as mulheres que tiveram acesso a esse recurso a revalorização de seu corpo e a satisfação com a nova imagem corporal perante o convívio com os outros. É comum a mulher solicitar a reconstrução por esses motivos, relacionados à autoimagem e autoestima. Em nosso estudo, os companheiros também manifestaram interesse em que suas mulheres realizassem a reconstrução mamária.

Eu até acho que ela deveria ter reconstruído a mama. Eu gostaria que ela tivesse reconstruído a mama (E4).

Este estudo apresenta algumas limitações. O fato de serem incluídos apenas companheiros de mulheres com câncer de mama que recebem atenção especial de um serviço de assistência e reabilitação à mulher mastectomizada não permitiu conhecer as percepções de outros companheiros que convivem com mulheres que não contam com o apoio de um serviço com características como: atendimento acessível e de portas abertas, em regime ambulatorial, norteado por equipe multiprofissional, constituído de um número expressivo de profissionais. O serviço que as companheiras dos participantes deste estudo frequentam tem prestígio junto à comunidade e, há quase três décadas ininterruptas, oferece apoio a um grupo significativo de pacientes, o que transparece nas falas dos colaboradores, sob a forma de sentimentos de gratidão e reconhecimento pelo apoio incondicional recebido por suas mulheres.

Outra limitação apresentada por esta pesquisa é a de não conhecer os depoimentos de companheiros que não se disponibilizaram a cuidar de suas mulheres, e que poderia ajudar a compreender de maneira mais clara como é ser companheiro de uma mulher com câncer de mama e não se sentir comprometido com o tratamento de sua parceira.

DISCUSSÃO

Os companheiros perceberam que, embora o sofrimento emocional de suas mulheres tenha prejudicado substancialmente a qualidade de vida do casal, as angústias e dificuldades enfrentadas por ambos no percurso de enfrentamento da doença também influenciaram positivamente a maneira de encarar a nova situação.

Ao comentarem sobre como se sentiram frente ao impacto da notícia, demonstraram intensa comoção. Mostraram-se vulneráveis a uma mescla de sentimentos de alta densidade emocional, como desespero e angústia diante das incertezas e da reação de medo que perceberam em suas mulheres, sentimentos esses potencializados à medida que a notícia do diagnóstico precisava ser repassada e transmitida para outros entes queridos.

Quando a perspectiva de futuro é significativamente alterada pelo confronto com a possibilidade da finitude, o modo de enfrentar a situação também o é. O primeiro sentimento que aparece é de estar diante de uma perda iminente, o que de fato aconteceu, pois os sonhos, projetos de vida em comum e, planos para o futuro foram abalados concretamente. Assim, os companheiros se sentiram aprisionados à nova condição e viram suas possibilidades de vir-a-ser tornarem-se restritas, pois o modo como conduziam a vida até o acontecimento da doença não incluía o aparecimento de uma ameaça tão palpável à sua sobrevivência. Depois da confirmação do diagnóstico, tudo aquilo que parecia estar garantido e ser de um determinado jeito, pode não ser mais. A dúvida e a incerteza se instalam na morada do ser, que se vê ameaçado quanto à continuidade de seu projeto existencial1313. Santos MA, Peres RS, Ferreira SMA, Gozzo TO, Panobianco MS, Almeida AM. A (in) sustentável leveza dos vínculos afetivos: investigando a sexualidade em mulheres que enfrentam o tratamento do câncer de mama. Vínculo [Internet]. 2013 [citado 2017 set. 03]; 10(1):1-8. Disponível em: Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v10n1/a02.pdf
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Os companheiros apresentaram dificuldades em perceber suas próprias fragilidades, e justificaram essa experiência defensiva de tentar se mostrar impermeáveis aos sentimentos negativos alegando não poderem se aceitar fragilizados, já que a companheira necessitaria de seu apoio e eles precisariam estar aptos a suprir as necessidades delas.

Testemunhar o adoecimento da mulher solicitou de imediato do companheiro uma postura de olhar para todos os que estavam em seu entorno, em busca daqueles que poderiam ajudar a família consternada, já que o rumo de suas vidas foi alterado. O câncer de mama instalou uma temporalidade alterada, que exigiu novas disposições e atitudes de todos, inclusive a solicitude de um para com o outro, uma vez que todos foram atingidos pelo impacto, e ficou evidente que a mulher dependeria do apoio dos seus entes queridos nesse momento difícil1414. Jardim LEF. Mundo como fundamento da psicoterapia de grupo fenomenológica. Estud Pesqui Psicol [Internet]. 2012 [citado 2017 ago. 22];12(3):938-51. Disponível em: Disponível em: http://www.redalyc.org/pdf/4518/451844639014.pdf
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O mundo familiar é o contexto circunstancial que se apresenta no entorno da situação vivenciada pelo companheiro e que se estende em um contínuo temporal/histórico e espacial. O sentido temporal ou histórico diz respeito à atualidade das características experienciadas pela situação de adoecimento e de recuperação da condição de saúde da mulher. Já o sentido espacial, que não remete ao espaço físico, diz respeito ao cenário onde tudo acontece e ao modo como o companheiro exerce seu papel de cuidador. Essa característica corresponde ao que é descrito como ser-no-mundo, fundamental para a compreensão da condição existencial do homem. Em Ser e tempo1212. Heidegger M. Ser e tempo. 4ªed. Petrópolis: Vozes; 2012., o mesmo filósofo que descreve o que é “ser no mundo” afirma que “o mundo do Dasein é mundo compartilhado” e isso quer dizer que, desde o seu fundamento, o Homem se constitui a partir de uma rede de significações compartilhadas com os outros no mundo1212. Heidegger M. Ser e tempo. 4ªed. Petrópolis: Vozes; 2012..

A partir do marco criado pela notícia do diagnóstico, a família busca uma orientação para a condição do cuidado imediato, necessário na tomada de decisão frente ao tratamento. É nesse instante que os familiares assumem seu papel de proteção e amparo, ajudando a mulher a superar os momentos em que ela se sente impotente e incapaz de controlar os eventos que ocorrem em sua vida. Reunido ao cuidado proporcionado pelo companheiro, o cuidado oferecido pelos filhos pode favorecer uma harmonia na forma como os membros familiares correspondem às solicitações da companheira e mãe.

Algumas vezes, no entanto, a convergência do cuidado não acontece, e aqueles que prestam solicitude solitariamente podem ficar sobrecarregados e apresentar, inclusive, agravos emocionais. De fato, neste estudo, essa situação foi pouco descrita por nossos colaboradores. Mas notamos que, apesar de as condições médicas gerais da mulher terem evoluído de forma favorável, a sobrecarga do companheiro gerou graves repercussões em sua vida, tais como a permanência do medo da perda e o receio de ser surpreendido pela recidiva.

A participação conjunta dos familiares envolvidos no processo de cuidar pode auxiliar todos, inclusive o companheiro, que tem sua referência têmporo-espacial desorientada, diluindo, assim, a sobrecarga exercida pela contingência de recuperação da mulher frente à doença e a seus tratamentos. Desse modo, todos sofrem, mas enfrentam juntos as adversidades de cada etapa do tratamento.

Nossos colaboradores contaram que, quando se viram diante do adoecimento de suas esposas, o primeiro recurso que utilizaram foi o diálogo. Buscaram a aproximação com a companheira, procurando apoiar e apoiarem-se não apenas em ações práticas, mas nas palavras e conversas, incentivando-as a seguir em frente, mostrando-se presentes e dispostos a ajudá-las no enfrentamento da doença e em todo o processo de reabilitação.

Mas a tentativa de manter o diálogo nem sempre se mostrou uma alternativa exequível. Alguns companheiros evitaram se culpabilizar por não conseguirem manter um diálogo satisfatório e se distanciaram do foco do problema, enquanto outros expressaram o sentimento de culpa pela dificuldade de aproximação e diálogo entre eles.

Em relação à intimidade do casal, os depoimentos dos companheiros demonstraram seus sentimentos de estranhamento e desconforto diante da nova situação deflagrada na vida de suas mulheres. Mas eles comentaram também que houve um distanciamento por parte delas, por não se sentirem “normais” após a cirurgia. A doença oncológica pode desestabilizar a vida sexual do casal de diversas maneiras1515. Santos DB, Santos MA, Vieira EM. Interrupção e retomada da vida sexual após o câncer de mama. Psicol Teor Pesqui [Internet]. 2016 [citado 2017 ago. 22];32(4):1-10. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ptp/v32n4/1806-3446-ptp-32-04-e324219.pdf
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. O padrão de relacionamento do casal que vigorava antes do aparecimento do câncer de mama, as doenças preexistentes, incluindo transtornos depressivos, além de problemas financeiros, entre outros, também apareceram como fatores importantes no sentido de auxiliarem ou dificultarem a retomada da relação íntima do casal durante o período de tratamento1616. Cesnik VM, Vieira EMV, Giami A, Almeida AM, Santos DB, Santos MA. The sexual life of women with breast cancer: meanings attributed to the diagnosis and its impact on sexuality. Estud Psicol [Internet]. 2013[cited 2017 Aug 18];30(2):187-97. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v30n2/05.pdf
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O que antes era considerado simples, como o ato de tocar ou de se relacionar sexualmente com a mulher, mudou de perspectiva e de sentido, e os companheiros passaram por uma condição corporal de indigência, de limitação e restrições, geradas pela doença e pelos tratamentos, especialmente a cirurgia da mama. Em alguns casos, essas condições podem ainda perdurar por um tempo maior, que ultrapassa o período de tratamento, convalescença e recuperação da mulher. Esses dados são consistentes com os resultados de outros estudos, que apontam a possibilidade de perdurarem sequelas físicas e psíquicas duradouras decorrentes da neoplasia mamária1717. Santos DB, Ford NJ, Santos MA, Vieira EM. Breast cancer and sexuality: the impacts of breast cancer treatment on the sex lives of women in Brazil. Cult Health Sex. 2014;16(3):246-57. DOI: 10.1080/13691058.2013.867075
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)-(1818. Cesnik VM, Santos MA. Do the physical discomforts from breast cancer treatments affect the sexuality of women who underwent mastectomy? Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2012 [cited 2017 Aug 23];46(4):1001-8. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v46n4/en_31.pdf
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.

Por outro lado, para alguns dos companheiros entrevistados, o poder-ser do corpo abriu-lhes a possibilidade de ter prazer na condição de potência e encontrar, pela mesma condição indigente da necessidade, a possibilidade de satisfação na experiência prazerosa1919. Pompeia JA, Sapienza BT. Tonalidades afetivas na terapia. In: Pompeia JA, Sapienza BT, organizadores. Os dois nascimentos do homem: escritos sobre terapia e educação na era da técnica. Rio de Janeiro: Via Verita; 2011. p.161-77.. Assim, muito além do mero alívio de uma tensão, a necessidade sexual também pôde ser vivenciada como uma experiência de plenitude que se realizou corporalmente. Depois do câncer de mama, as trocas de carícias físicas e o ato sexual adquiriram, segundo eles, novo significado, marcando uma possível ressignificação da vida e do corpo feminino mutilado.

Nossos colaboradores apresentaram tanto a condição indigente quanto a de potencialidade, e suas falas descreveram as condições limitantes que vivenciaram diante das dificuldades enfrentadas. De igual maneira, o contato próximo com a finitude de suas esposas também os instigou a redimensionarem sua potencialidade corporal, pois não permaneceram restritos às dificuldades, mas as ultrapassaram de certo modo, ao modificarem suas formas de lidar com o relacionamento sexual e com as mudanças corporais de suas mulheres.

No que se refere à questão da sexualidade e relacionamento sexual, é importante ressaltar que os profissionais de saúde ainda encontram barreiras quase intransponíveis para identificar a necessidade de cuidado dos aspectos relacionados à vida afetivo-sexual das mulheres com câncer de mama e seus parceiros. É preciso promover intervenções que levem em consideração a necessidade de abrir espaço para que o casal possa falar livremente sobre esses problemas, pois os tratamentos, como quimioterapia e radioterapia, não só afetam a libido da mulher, como também podem desencadear sintomas depressivos que prejudicam a adesão ao tratamento2020. Souza BF, Moraes JAM, Inocenti A, Santos MA, Silva AEBC, Miasso AI. Women with breast cancer taking chemotherapy: depression symptoms and treatment adherence. Rev Latino Am Enfermagem [Internet]. 2014 [cited 2017 Aug 23];22(5):866-73. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v22n5/0104-1169-rlae-22-05-00866.pdf
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CONCLUSÃO

Na perspectiva de nossos colaboradores, o fato de serem companheiros de uma mulher com câncer de mama os levou a viverem com ela a facticidade do diagnóstico. As falas permitiram desvelar que, inicialmente, houve uma desorganização emocional, com a surpresa triste e sombria da doença, seguida dos desdobramentos imprevisíveis do tratamento, que os fizeram se sentir confusos ao ter de escolher, de imediato, um caminho para que, juntos, pudessem enfrentar a situação desafiadora.

A descoberta da doença provocou uma mudança brusca na rotina de vida dos companheiros, deixando-os capturados pelo medo da perda da companheira. No entanto, eles demonstraram capacidade de reagir, dispondo-se a consolar, a motivar a mulher a buscar o tratamento, procurando reverter a situação adversa. Mas também mostraram que foi necessário um tempo considerável para que conseguissem se familiarizar com a situação e começassem a vislumbrar possibilidades de encontrar novos caminhos.

Os resultados deixaram patente o sofrimento do companheiro ao compartilhar as agruras do tratamento invasivo e suas consequências dramáticas, decorrentes dos efeitos colaterais. No entanto, apesar de se mostrarem dispostos a ofertar o cuidado à mulher, apresentaram dificuldades em perceber suas próprias fragilidades.

Diante das experiências desveladas pelos colaboradores, nosso estudo mostrou que, no atendimento às mulheres com câncer de mama, devemos atentar não apenas às suas necessidades, mas também às demandas dos familiares e do companheiro, desde o diagnóstico, integrando-os e acolhendo-os em todo o processo de tratamento das pacientes.

A coleta de informações e os cuidados técnicos podem ser aperfeiçoados, a partir do aprimoramento da qualificação do profissional, de modo a incluir na assistência o acolhimento das condições emocionais dos companheiros. O presente estudo desvelou a necessidade de direcionar o olhar e o cuidado especializado também para o companheiro da mulher mastectomizada.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Nov 2018
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    26 Jun 2017
  • Aceito
    12 Abr 2018
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