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Ensino da disciplina administração em enfermagem: em busca de um novo paradigma

Nursing administration course: looking for the new paradigm

Resumos

Neste trabalho as autoras apresentam, um relato da experiência sobre o ensino da disciplina Administração em Enfermagem, da Escola de Enfermagem da USP, descrevendo como esta vem sendo inserida no novo currículo do curso de graduação em Enfermagem.

Currículo de Enfermagem; Educação em Enfermagem; Ensino em Administração em Enfermagem


This is to present the experience, at the University of São Paulo - School of Nursing, under development by nursing faculties in the Nursing Administration Course, as part of undergraduate nursing curriculum reform.

Nursing Curriculum; Nursing Education; Adminstration Nursing Teaching


ARTIGOS ORIGINAIS

Ensino da disciplina administração em enfermagem: em busca de um novo paradigma

Nursing administration course: looking for the new paradigm

Maria Helena Trench Ciampone; Maria Madalena Januário Leite; Raquel Rapone Gaidzinski

Enfermeira Professora Doutora do Departamento de Orientação Profissional da Escola de Enfermagem da USP

RESUMO

Neste trabalho as autoras apresentam, um relato da experiência sobre o ensino da disciplina Administração em Enfermagem, da Escola de Enfermagem da USP, descrevendo como esta vem sendo inserida no novo currículo do curso de graduação em Enfermagem.

Unitermos: Currículo de Enfermagem. Educação em Enfermagem. Ensino em Administração em Enfermagem.

ABSTRACT

This is to present the experience, at the University of São Paulo - School of Nursing, under development by nursing faculties in the Nursing Administration Course, as part of undergraduate nursing curriculum reform.

Uniterms: Nursing Curriculum, Nursing Education. Adminstration Nursing Teaching

Introdução

O Departamento de Orientação Profissional (ENO) tem como finalidade contribuir na formação do aluno no que se refere ao desenvolvimento de condutas profissionais para o exercício da enfermagem. Tem como área de abrangência do conhecimento a história e a legislação profissional, a ética, o ensino, a pesquisa e o gerenciamento em enfermagem. Essas áreas têm seu desdobramento nos níveis de graduação (bacharelado e licenciatura), pós-graduação (senso-lato e senso-estrito) e extensão universitária.

Temos defendido a tese que a manutenção do Departamento ENO, fundamenta-se no perfil acadêmico definido pela especificidade do conhecimento que constitui sua área temática própria. Assim, esforços têm sido despendidos, individualmente e coletivamente pelos docentes no sentido de consolidar linhas de pesquisa que fortaleçam as áreas de conhecimento deste Departamento, ou seja a capacitação ético-profissional, a qualificação da força de trabalho para o gerenciamento da assistência e o compromisso com a investigação cientifica.

Uma das metas é melhorar a qualidade do ensino de graduação, no que se refere às áreas de competência do Departamento. Essa meta pressupõe revisar objetivos das disciplinas e investir na busca da superação dos padrões do processo ensino-aprendizagem vigentes. Isso implica em repensar as estratégias pedagógicas que estimulem a criatividade e a crítica e com isso a motivação e o compromisso individual e coletivo dos docentes e discentes com a profissão.

Dentre o conjunto de disciplinas, temos percebido que uma articulação importante diz respeito à inserção da disciplina de Administração no currículo de graduação em Enfermagem, tendo como pano de fundo o processo histórico de desenvolvimento das políticas públicas desde o início do século.

É sabido que as políticas sanitárias do início do século, estavam voltadas para o "controle" de doenças que ameaçavam a manutenção da força de trabalho e consequentemente a expansão das atividades econômicas capitalistas. Esse "controle" visava superar setorialmente as ameaças advindas do adoecer em massa, omitindo a análise da natureza das relações sociais que determinavam os processos de morbi-mortalidade (COSTA, 1985)

Conforme salienta MENDES (1994) neste século o sistema de saúde brasileiro transitou, do sanitarismo campanhista para o modelo médico-assitencial privativista, até chegar, nos anos 80, ao projeto neoliberal.

Fica evidente que ao longo das diferentes décadas a evolução das políticas norteadoras do setor saúde no Brasil sofrem influência direta das políticas públicas contencionistas, sendo que a formação de recursos humanos na saúde vai se dando à reboque e não de modo prospectivo.

Fica evidente, também, ao final da década de 60, a instauração de um modelo assistencial orientado para a acumulação de capital, traduzido pela tecnificação dos atos médicos, enfatizando a assistência hospitalar, a divisão técnica e social do trabalho, com tendência à especialização, fragmentação do processo assistencial e expansão de indústrias de medicamentos, instrumentais e equipamentos.

Segundo ROCHA (1985) nesse processo vai se dando a mercantilização e expansão da medicina privada, dos convênios celebrados pela previdência com os hospitais, clínicas e laboratórios, direcionando a forma de pagamento por unidade de serviço.

Nesse contexto a administração na enfermagem exercia o papel preponderante de controle dos recursos para a assistência, tanto no aspecto de recursos humanos como materiais, físicos e financeiros. Esse enfoque foi sustentado pelas teorias de administração, que mesmo introduzindo a dimensão das relações humanas como importante no contexto do trabalho, o faz de modo utilitarista.

Com o movimento da reforma Sanitária que culmina na perspectiva de implementação do Sistema Único de Saúde, vem à tona os paradoxos dos modelos assistenciais clínico e epidemiológico que norteiam os diferentes projetos de intervenção em saúde.

De acordo com os princípios e diretrizes do novo sistema proposto, a questão da gerência de serviços de saúde começa a ser rediscutida no sentido de : viabilizar a articulação dos diferentes níveis de assistência na busca de resolutividade.

Assim o planejamento, a organização e o gerenciamento dos serviços de saúde, tanto hospitalares quanto de unidades básicas ou especializadas devem ter como eixo norteador a vigilância epidemiológica. Nesse sentido o modelo clinico de assistência é importante, mas não é suficiente.

A partir desse referencial, passamos a repensar o ensino da administração em enfermagem, que vinha se mantendo predominantemente no enfoque intra-hospitalar.

Diante das mudanças acima expostas, consideramos que os tradicionais modelos de gestão os quais vínhamos utilizando, não mais respondem às demandas presentes no nosso contexto de saúde.

Assim, iniciamos um processo de reformulação de conteúdos da disciplina Administração em enfermagem, tanto no ensino de graduação como na Pós- Graduação.

Para CAMPOS (1989) a reorganização dos serviços de saúde baseadas no pensamento sanitário vêm levando à reformulação dos conteúdos também, dos cursos de saúde pública, criando novos cursos de gestão e planejamento de sistemas de saúde, dando surgimento a um novo especialista: “o administrador sanitário, profissional que deverá dominar tanto os tradicionais conhecimentos de saúde pública, como a habilidade para gerenciar, planejar e organizar os serviços de saúde na busca de uma maior capacidade de resolver problemas da área, lidando com todo o complexo de determinantes desses processos” .

Portanto, compartilhando preocupações e incertezas acerca desse processo necessário de mudanças que deverá ocorrer na formação dos profissionais de saúde, nos propomos a relatar parte cia experiência que temos vivido como docentes de uma Universidade Pública, no ensino de Graduação em Enfermagem, recortando nesse momento a disciplina de Administração em Enfermagem.

A historicidade da inserção da disciplina Administração no currículo de Enfermagem.

A história da referida disciplina no Brasil, inicia-se, conforme GOMES(1990), a partir do fim do século XIX, na Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras , com o Decreto n.º 791 de 1890, onde se ministrava conhecimentos de administração e escrituração do serviço sanitário e econômico das enfermarias.

Na década de 20, com a implantação do modelo Nightingale na Escola de Enfermagem do Departamento Nacional de Saúde Pública, atual Anna Nery, a formação dos enfermeiros voltou-se para saúde pública, preservando-se a disciplina Administração, embora com o enfoque hospitalar.

Em 1949 o ensino da enfermagem passa a ser regulado pela Lei n.º 775/49, regulamentada pelo Decreto n.º 27.426/49 que dispõe sobre o currículo dos cursos e as condições de preparação de enfermeiros, estipulando a duração de quatro anos e a exigência de conclusão do curso colegial, sendo esse currículo uma adaptação do "Curriculum Guide", norte-americano de 1937, onde foi incluída a disciplina Princípios de Administração Sanitária.

Em 1961, com a Lei n.º 2.604/55, regulamentada pelo Decreto n.º 50.387/ 61, sobre o exercício da enfermagem, dá-se à enfermeira o poder de mando em relação aos auxiliares e atendentes de enfermagem e aos cuidados de enfermagem. Nesse momento, dá-se a passagem definitiva dos cursos de enfermagem para o nível superior, em obediência ao disposto ria Lei nº 2.995/56.

A seguir, o Conselho Federal de Educação baixou o Parecer n.º 271/62 que fixou o currículo mínimo e determinou a duração de 3 anos para o Curso de Enfermagem. Foi nesta restruturação, como relatou CARVALHO (1971), que a disciplina Administração passou a integrar as especializações especificadas neste currículo.

Em 1972 foi aprovado o Parecer n.º 163/72, como consequência da reforma universitária, com a carga horária de 2500 horas , onde o número de disciplinas de Administração elevou-se para cinco, uma vez que foi incorporada nas habilitações: Enfermagem Obstétrica; Enfermagem Médico-Cirúrgica e Enfermagem de Saúde Pública.

No ano de 1986 foi aprovada a nova lei do exercício profissional em enfermagem, Lei n.º 7.498/86, cujo conteúdo evidenciou a importância do ensino da disciplina Administração aplicada à Enfermagem na formação do profissional, uma vez que, segundo seu enunciado, é prerrogativa da enfermeiro, entre outras atividades, a de planejar, organizar, coordenar, orientar e avaliar os serviços de assistência de enfermagem, bem como participar dos programas de treinamento e aprimoramento do pessoal de saúde, particularmente dos programas de educação continuada.

Em 1994, foi aprovada a Portaria n.º 1.721/94, que regulamenta atualmente o ensino dos Cursos de Graduação em Enfermagem, compreendendo uma carga horária de 3500 horas, com duração mínima de 4 anos, onde a disciplina Administração em Enfermagem passou a abranger 15%(525 horas) da caga horária total do curso, evidenciando o reconhecimento da sua importância para a formação do enfermeiro.

Na Escola de Enfermagem da USP, o ensino dessa disciplina, a partir da passagem definitiva dos cursos de enfermagem para o nível superior, como disposto na lei n.º 2995/56, de acordo com LEITE (1994), sempre ocupou lugar de destaque, com o desenvolvimento de atividades teóricas e práticas.

Ao resgatar o ensino da disciplina Administração aplicada à Enfermagem no Curso de Graduação da EEUSP, LEITE (1994) relata que inicialmente pautava-se nas teorias de Taylor e Fayol, definindo-se a administração, para os alunos, como instrumento de organização e racionalização do trabalho, cabendo à enfermeira, portanto planejar, dirigir, controlar e organizar as atividades da equipe de enfermagem, visando o cumprimento das tarefas estabelecidas. Assim os objetivos enunciados eram de que os alunos fossem capazes de planejar e coordenar o trabalho em equipe, de orientar os funcionários, de elaborar normas, rotinas e procedimentos, e tomar decisões. Era um ensino idealizado, dissociado da realidade, que dificultava a reflexão, por parte dos alunos, sobre a prática vivenciada nas unidades de estágio, o que, posteriormente, era reiterado na atuação profissional.

A partir de 1980, segundo esta autora, ocorreram fatos marcantes para o desenvolvimento desta disciplina, uma vez que teve sua carga ampliada de 345 horas para 540 horas, evidenciando o quanto as docentes a consideravam importante para a formação do aluno. Foi nesse período que os alunos começaram um processo de discussão, onde avaliaram negativamente a disciplina tanto em relação ao conteúdo que estava sendo ministrado quanto ao relacionamento professor-aluno.

Em função destes acontecimentos, o corpo docente iniciou um processo de discussões e questionamentos, buscando a restruturação da disciplina, com a participação de alunos e enfermeiros de campo. Como resultado foi-se evidenciando, como bem CIAMPONE (1987) relatou na sua dissertação de mestrado, o quanto o ensino e a prática da função administrativa seguiam os pressupostos da administração tradicional onde, na enfermagem, as enfermeiras ditavam regras cabendo ao pessoal auxiliar executá-las.

Ainda como decorrências destas discussões, refletimos sobre qual era o marco conceitual que buscávamos para a nossa disciplina, considerando: "o educando como elemento ativo, dotado de potencialidade e capacidade para prover mudanças, capaz de agir de forma consciente e reflexiva; o docente como elemento capaz de proporcionar aos alunos condições que o desenvolvam em um processo onde o aluno e o docente estão inseridos num contexto mais amplo, que é a sociedade contextualizada nos seus aspectos econômico-político-social, onde se desenvolve a assistência à saúde" ( SILVA et al, 1988). Passamos, portanto, a compreender o processo educacional influenciado pelos determinantes individuais, organizacionais e político-sociais onde está inserido.

Outro fato importante a ser ressaltado é que, até então, a bibliografia que utilizávamos para ministrar os conteúdos específicos de administração advinha sempre de livros escritos por administradores e ou psicólogos, e na área especifica de enfermagem eram utilizadas monografias, teses e livros norte-americanos. Decidimos, então, escrever um livro sobre Administração em Enfermagem (KURCGANT et al, 1991) abordando o conteúdo programático que ministrávamos na disciplina.

A elaboração desse livro constituiu-se num momento importante porque nos levou analisar o nosso ensino, refletindo sobre “o que” e “o como” direcionávamos o conteúdo abordado junto ao alunos. Escrevê-lo, deu-nos a oportunidade de refletir sobre a prática da enfermagem à luz de diferentes enfoques administrativos.

Dando continuidade ao processo reflexivo da avaliação sobre o ensino da disciplina Administração aplicada à Enfermagem, nos anos 90, as docentes iniciaram estudos e pesquisas para melhor compreensão da sua prática. Assim temos a publicação de CIAMPONE et al (1993) que apresentou como estava sendo desenvolvido o ensino da disciplina em questão; os de KURCGANT et al (1994 e 1994a) que objetivaram conhecer as opiniões das alunas sobre a referida disciplina, ao inicio e ao término do bloco teórico; a tese de doutorado de LEITE (1994) que desvelou a concepção dos alunos sobre esta disciplina; a tese de doutorado de TAKAHASHI (1994) cujo objetivo foi o de identificar os critérios que os alunos consideraram na escolha da profissão e as expectativas desses alunos quanto à sua formação profissional; e o trabalho de GAIDZINSKI et al (1995) que buscou revelar como as egressas do Curso de Graduação em Enfermagem percebem a influência da disciplina na sua prática profissional.

KURCGANT et al (1994 e 1994a) mostraram que as alunas ao chegarem para cursar a disciplina perceberam a administração dentro das abordagens clássica e cientifica de Taylor e Fayol, enfocando o "polo" organização e não o "polo" trabalhador. As falas revelaram que as estudantes, consideraram a administração aplicada à enfermagem como exercício da burocracia, associado à ineficiência administrativa. Porém, ao término do bloco teórico, modificaram essa percepção quando relataram ser a função administrativa um papel que a enfermeira desempenha no exercício profissional, percebendo a enfermeira como um elemento responsável pelas propostas de desenvolvimento de pessoal e pela melhoria da qualidade da assistência prestada.

LEITE (1994) verificou que as alunas apresentavam dúvidas em relação ao significado da função administrativa, tendo dificuldade em relacioná-la com a função assistencial, provavelmente porque esta é a diretriz da formação durante o Curso de Graduação, onde se valoriza o cuidado individualizado. Ainda este trabalho desvelou que, embora as docentes, por meio dos objetivos e conteúdos, vêm buscando contemplar a compreensão da função administrativa como instrumento de mudança da prática de enfermagem, as falas das alunas mostraram, ao contrário, que elas acabam aceitando passivamente que a enfermeira desenvolva suas atividades de, modo funcionalista, centrada na tarefa, tendo o controle, a disciplina, o ordem e a hierarquia como premissas básicas na gerência da equipe de enfermagem. O que se concluiu da análise do discurso das alunas no final da disciplina é que elas questionam, mas aceitam esse modo de "ser enfermeira", desvelando a influência das enfermeiras assistenciais na compreensão do significado da função administrativa.

Também, o trabalho de GAIDZINSKI et al(1995) realizado a partir dos relatos de um grupo de enfermeiras egressas revelou que as mesmas consideram a referida disciplina como de extrema importância por ter oferecido segurança e desenvolvimento de uma atitude reflexiva, fatores que auxiliaram a enfrentar situações de trabalho, diferenciando-as em relação às colegas formadas por outras instituições.

Os conteúdos abordados pela disciplina relativos às questões de relacionamento e de desenvolvimento pessoal no trabalho foram referidos como suficientes, entretanto, necessitando de uma abordagem mais ampla por ser essa habilidade mais difícil de ser desenvolvida na prática da enfermagem.

Ainda, a função administrativa é referida como tendo dois significados: um relacionado à burocracia tendo como objetivo o controle, a manutenção e a ordem dos recursos da unidade e, outro relacionado à administração do cuidado de enfermagem. Este último significado foi considerado como o único processo de trabalho que a enfermeira gostaria de exercer.

Nestes dois trabalhos, ficou também evidenciada a necessidade de mudanças no Curso de Graduação em Enfermagem, principalmente na estrutura da grade curricular, para que administração e assistência se integrem em todos os momentos da formação do aluno. Tanto as alunas como as egressas do Curso de Enfermagem apontaram que esta disciplina deveria ser ministrada desde o início do curso, instrumentalizando as demais, para a formação da identidade profissional pois, possibilitaria que as discentes tivessem a oportunidade de perceber que as atividades desenvolvidas pelas enfermeiras estão voltadas para o processo de gerenciamento e não só para o processo do cuidado do paciente.

Cabe ressaltar, que paralelamente à essas modificações que ocorreram durante a década de 80 e nos primeiros anos da década de 90, em relação à disciplina de Administração aplicada à Enfermagem, também ocorriam no processo de reorientação curricular na EEUSP.

Construindo um novo paradigma norteador do ensino

De acordo com as mudanças implementadas no currículo de graduação da EE a disciplina de Administração em Enfermagem passa a ser ministrada como um dos eixos horizontais, sendo o conteúdo introduzido gradativamente no decorrer do curso.

A inserção de conteúdos teórico-práticos de enfermagem a partir do primeiro ano consiste em tentativa de diminuir a distância entre a etapa pré-profissional e o tronco profissional, viabilizando uma articulação entre as diferentes áreas de saber que subsidiam a formação profissional. Assim sendo, o programa está atualmente, estruturado nas disciplinas: Introdução à Enfermagem, Administração em Enfermagem I, Administração em Enfermagem II, Administração em Enfermagem III e Estágio Curricular de Administração em Enfermagem, desta forma temos:

Disciplina Introdução à Enfermagem - ministrada no primeiro semestre do curso em conjunto com os Departamentos Enfermagem em Saúde Coletiva e Enfermagem Médico-Cirúrgica, com uma carga horária total de 90 horas, das quais GO horas destinam-se a introdução de conteúdos específicos do Departamento de Orientação Profissional ou seja, História da Enfermagem, Ética e Administração.

Nesse primeiro momento os objetivos são: instrumentalizar o aluno para a compreensão da enfermagem como prática social; relacionar os atuais modelos de prática de saúde e de enfermagem à história destas práticas; compreender a ética como ciência que norteia a inserção do cidadão e do profissional na sociedade; compreender os processos de trabalho da enfermagem nos âmbitos do cuidar individual, do cuidar coletivo e do administrar; identificar as diversas realidades de saúde da população brasileira e as diferentes visões de saúde e doença subjacentes às políticas e programas de intervenção de saúde vigentes; identificar as diferentes formas de inserção cios serviços de enfermagem nas instituições de saúde e destas no Sistema Único de Saúde.

Para tanto o conteúdo programático está subdividido em três unidades temáticas:

Unidade I:

• História da Enfermagem: compreensão histórica do cuidar. O nascimento e a institucionalização da enfermagem.

• Ética: ciência e objeto de estudo; moral e sociedade; valores, direitos e deveres.

• Instrumentos que norteiam a conduta do cidadão e do profissional.

Unidade II:

• Introdução ao processo de trabalho e seus elementos constitutivos.

• Processo de trabalho em saúde na emergência do capitalismo.

• Modelos de prática de saúde no capitalismo: clínico e epidemiológico.

• Concepções do processo saúde-doença: unicausalidade, multicausalidade e determinação social.

• Processo de trabalho da enfermagem a partir de sua institucionalização: o cuidar do enfermeiro e da enfermagem; a enfermagem como prática social.

• O processo de trabalho administrar e seus elementos: objeto, finalidade, meios e instrumentos.

• Instrumentos de trabalho da enfermagem: das técnicas ao sistema de assistência de enfermagem (SAE).

Unidade III:

• Processo de produção em saúde tendo em vista o panorama de vida e saúde do brasileiro.

• Evolução histórica das políticas de saúde no Brasil.

• Da medicina preventiva à saúde coletiva - os programas de saúde.

• O Sistema Único de Saúde (SUS).

• A organização dos serviços de enfermagem nas instituições de saúde do Sistema Único de Saúde.

Como estratégia de ensino busca-se, através de visitas e observação em diferentes instituições, proporcionar ao aluno um primeiro contato com as unidades integrantes do Sistema Único de Saúde, no sentido de visualizar a inserção dos serviços de enfermagem nessas instituições.

Disciplina Administração em Enfermagem I : ministrada no terceiro semestre do curso, contendo uma carga horária de 90 horas, tem como objetivos: analisar a influência das teorias da administração no processo de trabalho administrar em enfermagem; identificar e analisar os meios e instrumentos do processo de trabalho administrar na prática de enfermagem.

Nesta disciplina o conteúdo programático versa sobre:

• Teorias de administração aplicada à enfermagem;

• Filosofia e estrutura organizacional;

• Meios e instrumentos do processo de trabalho administrar: planejamento; instrumentos de informação; recursos humanos; recursos materiais; recursos físicos e recursos financeiros;

• O processo decisório;

• O processo de mudança.

Ao cursar essa disciplina o grupo de alunos encontra-se subdividido em quatro áreas temáticas: Saúde do Adulto I; Saúde do Adulto II; Saúde da Mulher e Saúde da Criança e do Adolescente. A opção pela trajetória nestas quatro áreas é auto-dirigida, cabendo ao aluno escolher a sequência, bem como, as disciplinas optativas oferecidas que complementarão o número de créditos necessários.

A disciplina de Administração em Enfermagem I transcorre em paralelo as áreas temáticas do terceiro semestre, sendo obrigatória ao conjunto de alunos das quatro áreas.

Visando dinamizar o processo de formação busca-se integrar os conteúdos teórico-práticos desenvolvidos nesta disciplina com a prática vivenciada pelos alunos nos diferentes campos de estágio em cada uma das áreas temáticas.

Para tanto, uma das estratégias pedagógicas utilizadas consiste no levantamento de dados, a partir de roteiros pré-elaborados, onde os alunos correlacionam os meios e instrumentos do processo de trabalho administrar ao processo de cuidar.

Outra estratégia, que tem sido desenvolvida, para articular os conteúdos teórico-práticos consiste na escolha pelos alunos de uma situação problemática observada durante o estágio, a fim de elaborar uma análise sistematizada que subsidie o processo decisório na prática. Para tanto, os alunos constituem grupos de no mínimo seis e no máximo de dez integrantes e trabalham sobre o problema escolhido sistematizando o processo de tomada de decisão conforme as etapas preconizadas por CIAMPONE (1991). O trabalho final é apresentado por cada grupo possibilitando resgatar o conjunto das experiências analisadas pelos grupos.

Embora a avaliação do novo currículo implementado esteja ainda, em pleno processo de desenvolvimento os alunos e docentes tem se referido a validade destas estratégias como forma de articulação entre o processo de cuidar e o de gerenciamento da assistência.

Após o desenvolvimento da disciplina Administração em Enfermagem I há um hiato de dois semestres, seguindo no sexto semestre com a disciplina Administração em Enfermagem II.

Nesta fase da formação os objetivos a serem desenvolvidos são: compreender como se dá a formulação de políticas de recursos humanos nas organizações de saúde; analisar o processo de gerenciamento de recursos humanos na enfermagem; reconhecer os referenciais norteadores dos métodos de organização e divisão do trabalho na enfermagem e discutir a qualidade de vida no trabalho, correlacionando com a saúde do trabalhador de enfermagem.

Para o desenvolvimento da disciplina optou-se pela estratégia pedagógica da problematização. Segundo os pressupostos norteadores deste processo o ensino-aprendizagem adquire maior significação para o aluno quando este se dá a partir da reflexão de uma situação prática descrita pelo professor, tomada como ponto de partida para a aprendizagem. Nesta metodologia o professor rompe com o papel tradicional de ministrar conteúdos teóricos aos alunos, assumindo o papel de facilitador da aprendizagem, ao propor uma situação a ser problematizada pelo grupo que buscará a auto-aprendizagem. (SCHMIDT, 1994, SCHMIDT; MOUST, 1995 e SCHMIDT;, BOON; PINTO, 1996)

De acordo os objetivos da disciplina, o conteúdo programático a ser desenvolvido compreendeu a organização de três situações a serem analisadas pelos grupos de alunos.

Uma vez descrita a situação ponto partida, conforme discutido no Simpósio "A aprendizagem baseada em problemas como estratégia para educação permanente dos profissionais de saúde", onde apresentou-se uma série de experiências de implementação da metodologia em currículos de escolas da área de saúde, a trajetória a ser percorrida na aprendizagem baseada em problemas, compreende sete passos: (SCHMIDT; BOON; PINTO, 1996)

1º) esclarecer alguns termos e conceitos desconhecidos;

2º) listar todos os fenômenos a serem explicados;

3º) explicar os fenômenos tendo como base o conhecimento existente("brainstorming": o que nós já sabemos sobre o problema);

4º) resumir o modelo mental compartilhado pelo grupo;

5º) formular objetivos de aprendizagem: o que nós ainda precisamos conhecer sobre o problema;

6º) estudo auto-dirigido;

7º) compartilhar o conhecimento adquirido, relatar para o grupo.

A primeira situação analisada abrangeu o conteúdo relativo a política e gerenciamento de recursos humanos nas organizações de saúde, tendo como foco o distrito sanitário, na perspectiva do sistema local de saúde, segundo os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde.

A segunda situação abarcou os conteúdos relativos a organização e divisão do trabalho na enfermagem em uma instituição pública hospitalar e a terceira situação compreendeu o conteúdo referente qualidade de vida no trabalho e a saúde do trabalhador de enfermagem.

A introdução da perspectiva metodológica da aprendizagem baseada em problemas foi uma experiência inovadora tanto para o grupo de alunos como para as docentes envolvidas, o que obrigou a rever os conteúdos a luz de uma nova estratégia de ensino, consistindo em uma experiência desafiadora.

Embora, no presente momento de construção deste relato de experiência, esta disciplina esteja em processo final de desenvolvimento da problematização da última situação, as avaliações efetuadas têm demonstrado progressos na forma de aprendizagem, merecendo continuidade no processo e uma avaliação pormenorizada dos pontos a serem aprimorados bem como, dos aspectos considerados facilitadores ou não do processo ensino-aprendizagem.

Dando continuidade a abordagem da administração, no semestre seguinte, ou seja, no sétimo semestre ocorre a disciplina Administração em Enfermagem III com carga horária de 315 horas. Neste momento o aluno já deve estar intrumentalizado quanto aos conteúdos teóricos e, portanto nesta disciplina, deverão alcançar os seguintes objetivos: vivenciar as políticas locais das instituições de saúde e suas implicações na organização do serviço de enfermagem e da unidade; desenvolver atividades de gerenciamento em uma unidade de enfermagem de um serviço de saúde e discutir as tendências e perspectivas da administração em enfermagem.

Desta forma, o conteúdo a ser vivenciado, pelos alunos, durante a atuação no campo de prática refere-se:

I- O diagnóstico administrativo, estratégico e ideológico na dimensão da unidade/ serviço:

• a inserção do serviço de enfermagem na organização: cultura, objetivos, estrutura, poder e propostas assistenciais e de desenvolvimento de pessoal;

• os instrumentos de informação;

• o perfil da clientela e dos recursos humanos;

• os recursos financeiros, materiais e físicos;

• os programas e métodos assistenciais;

• as relações de trabalho: liderança, supervisão e conflitos;

• as mudanças necessárias e possíveis.

II- A administração dos recursos necessários para a assistência de enfermagem prestada na unidade.

III- A avaliação das propostas, dos métodos assistenciais e dos recursos empregados.

IV- As tendências e perspectivas da administração em enfermagem.

O último semestre, ou seja o oitavo semestre do curso, destina-se a realização do estágio curricular, onde o aluno escolhe uma da quatro disciplinas optativas complementares, dentre as quais é de responsabilidade do Departamento de Orientação Profissional, a disciplina Estágio Curricular de Administração em Enfermagem.

Este estágio curricular compreende uma carga horária de 435 horas e objetiva preparar o aluno para uma inserção mais qualificada no contexto de atuação. Neste momento o aluno já deve: ter uma maior autonomia, e aprofundará a experiência no processo de gerenciamento e no processo de cuidar na unidade campo de prática, validando conhecimentos, habilidades e atitudes adquiridas na formação básica do curso de graduação, nos diferentes níveis de atenção à saúde.

Esta última disciplina também tem como objetivo que o aluno elabore uma monografia relativa aos aspectos administrativos, éticos, legais e pedagógicos envolvidos no processo de trabalho gerenciamento da assistência de enfermagem.

Neste momento, estamos numa fase de transição, num processo de mudança, onde a relação professor-aluno e a própria relação do professor consigo mesmo, isto é, sua competência, está sendo repensada. Acreditamos que precisamos nos capacitar para desenvolver o ensino, tendo como horizonte a construção de um novo projeto político que norteie a prática da enfermagem. Isso implica em rever os paradigmas, a tecnologia educacional e principalmente, explicitar posições a serviço de uma sociedade mais justa, igualitária onde a saúde seja, de fato, um direito do cidadão e um dever do Estado.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Mar 2010
  • Data do Fascículo
    Dez 1996
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