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Sistematização da Assistência de Enfermagem: buscando contornos teóricos definitórios e diferenciadores

RESUMO

Objetivou-se elaborar proposições teóricas que auxiliem na compreensão da Sistematização da Assistência de Enfermagem enquanto fenômeno distinto do Processo de Enfermagem. Estudo teórico reflexivo que apresentou duas categorias: “Sistematização da Assistência de Enfermagem: buscando contornos diferenciadores” e “Sistematização da Assistência de Enfermagem: buscando contornos definitórios”. Identificou-se que a sistematização não se ocupa em orientar a assistência profissional de enfermagem em si, já que essa questão, aliada às orientações quanto à elaboração da documentação clínica resultante da assistência de enfermagem implementada, diz respeito ao processo. A despeito do que é a Sistematização da Assistência de Enfermagem, tem-se que se trata de um campo de conhecimento que, por meio de seus três pilares e elementos constituintes, suporta a estruturação de serviços de enfermagem e, por consequência, a organização ou reorganização do trabalho profissional em enfermagem. Conclui-se que a sistematização, à luz das proposições teóricas aqui apresentadas, constitui área de conhecimento que representa uma forma particular de realizar a gestão de serviços de enfermagem quando se consideram os três pilares que a compõem.

DESCRITORES
Processo de Enfermagem; Serviços de Enfermagem; Gestão em Saúde; Recursos Humanos; Organização e Administração; Prática Profissional

ABSTRACT

The objective of this study was to elaborate theoretical propositions to help understanding the Systematization of Nursing Care as a distinct phenomenon of the Nursing Process. It is a reflective, theoretical study that presented two categories: “Systematization of Nursing Care: seeking differentiating contours” and “Systematization of Nursing Care: seeking defining contours”. It was identified that the systematization is not concerned with guiding the professional nursing care itself, since this issue, together with the guidelines regarding the elaboration of clinical documentation resulting from the implemented nursing care, is related to the process. Despite what the Systematization of Nursing Care is, the idea is that it is a field of knowledge that, through its three pillars and constituent elements, supports the structuring of nursing services and, consequently, the organization or reorganization of professional work in nursing. It is concluded that systematization, in the light of the theoretical propositions presented here, is an area of knowledge that represents a particular way of carrying out the management of nursing services when the three pillars that compose it are considered.

DESCRIPTORS
Nursing Process; Nursing Services; Health Management; Workforce; Organization and Administration; Professional Practice

RESUMEN

Se propuso elaborar proposiciones teóricas que auxilien en la comprensión de la Sistematización de la Asistencia de Enfermería como un fenómeno distinto del Proceso de Enfermería. Estudio teórico reflexivo que presentó dos clases: “Sistematización de la Asistencia de Enfermería: buscando contornos diferenciadores” y “Sistematización de la Asistencia de Enfermería: buscando contornos definitorios”. Se identificó que la sistematización no se ocupa en orientar la asistencia profesional de enfermería por si misma, una vez que esa cuestión, sumada a las orientaciones a respecto de la elaboración de la documentación clínica resultante de la asistencia de enfermería implementada, se refiere al proceso. A pesar de lo que es la Sistematización de la Asistencia de Enfermería, se conviene definir como un campo de conocimiento que, por medio de sus tres pilares y elementos que la constituyen, soporta la estructuración de servicios de enfermería y, por así decirlo, la organización o reorganización del trabajo profesional en enfermería. Se concluye que la sistematización, siguiendo las proposiciones teóricas presentadas, constituye área de conocimiento que representa una forma particular de realizar la gestión de servicios de enfermería cuando se consideran los tres pilares que la componen.

DESCRIPTORES
Proceso de Enfermería; Servicios de Enfermería; Gestión en Salud; Recursos Humanos; Organización y Administración; Práctica Profesional

INTRODUÇÃO

Compreender a organização do trabalho profissional(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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), como ela se processa na prática dos serviços de enfermagem brasileiros, que bases teóricas a suportam e quem são os agentes responsáveis por ela, quando consideradas as atividades assistenciais de enfermeiros, obstetrizes, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteiras, constitui desafio teórico e prático que ainda carece de reflexões disciplinares. A organização do trabalho profissional requer considerar segundo a Resolução 358 de 2009 do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) o método, o pessoal e os instrumentos(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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), pilares fundamentais da Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE).

A literatura tem apontado que a organização do trabalho se relaciona ao “processo que envolve as atividades dos trabalhadores, as relações de trabalho com seus pares e com a hierarquia e que ocorre numa determinada estrutura institucional”(22. Gelbcke FL, Leopardi MT. Perspectivas para um novo modelo de organização do trabalho da enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem [Online]. 2004,57(2):193-7. DOI: https://doi.org/10.1590/S0034-71672004000200012
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). Ao considerar essa perspectiva, amplia-se o olhar para além da assistência, ao abarcar questões maiores que a assistência em si, contemplando o serviço de enfermagem ao situá-lo em uma perspectiva organizacional em um dado serviço de saúde. Os mesmos autores citam que tal organização “sofre influências estruturais, relacionadas à estrutura macroeconômica, bem como organizacionais, como o modo de gestão empreendido pela instituição, que está, por sua vez, relacionado ao modo de produção vigente”(22. Gelbcke FL, Leopardi MT. Perspectivas para um novo modelo de organização do trabalho da enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem [Online]. 2004,57(2):193-7. DOI: https://doi.org/10.1590/S0034-71672004000200012
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). Nesse entendimento, a organização do trabalho profissional(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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) guarda predicados relacionados à gestão em enfermagem nos serviços de saúde.

O Cofen tem envidado esforços ao longo dos anos para garantir as condições necessárias no tocante à implementação do Processo de Enfermagem (PE) nos diversos contextos assistenciais que demandam o cuidado profissional de enfermagem. Essa operacionalização seria possível por meio da SAE. Entretanto, o que parece de fácil compreensão, ou seja, que a SAE organiza o trabalho profissional(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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), ainda suscita ampla discussão a respeito do que significaria tal organização, visto que lacunas importantes perduram desde 2002 com a aprovação da primeira resolução(33. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução COFEN-272/2002 – Revogada pela Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: Cofen; 2002 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-2722002-revogada-pela-resoluao-cofen-n-3582009_4309.html
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) que tratou da temática.

A Resolução 272(33. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução COFEN-272/2002 – Revogada pela Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: Cofen; 2002 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-2722002-revogada-pela-resoluao-cofen-n-3582009_4309.html
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), naquele momento, abordou em seu texto a SAE e o PE como fenômenos semelhantes e, mais de 18 anos após, ainda evoca reflexões que contribuam para a delimitação clara das diferenças conceituais e operacionais acerca dos termos, bem como o modus operandi da SAE na organização do trabalho profissional(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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). Desfazer a trama terminológica e conceitual e, também, delimitar os predicados que permitam apreender a identidade fenomênica da SAE como distinta do PE se faz necessário para avanços no conhecimento disciplinar. A SAE está essencialmente envolvida com a gestão dos serviços de enfermagem, quando ela se propõe a organizar o trabalho profissional. Por sua vez, o PE está implicado na orientação do cuidado e na documentação da prática(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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). Não obstante, ainda que a atual resolução tenha avançado em assinalar a finalidade de cada termo, ela não definiu conceitual e operacionalmente a SAE, seus três pilares e nem que elementos compõem cada um deles.

Na mesma resolução(33. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução COFEN-272/2002 – Revogada pela Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: Cofen; 2002 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-2722002-revogada-pela-resoluao-cofen-n-3582009_4309.html
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), a SAE e o PE eram apontados com etapas semelhantes. A primeira resolução, embora revogada, ainda marca sensivelmente o discurso profissional brasileiro e contribui para ofuscar, por vezes, as correções que a resolução 358 de 2009 efetuou. Não obstante, entre os profissionais e, mesmo na produção científica nacional de enfermagem, expressões como “implementar a SAE” ou “implantar a SAE” são recorrentes. Também, “registrar a SAE” ou “fazer a SAE” são achados comuns. Essa perspectiva aproxima a SAE da função precípua do PE, qual seja orientar o cuidado profissional e a documentação da prática(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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) e contribui para a compreensão equivocada de que tais termos signifiquem o mesmo fenômeno.

Compreende-se por pertinente que expressões como “implementar” ou “implantar” a SAE não sejam as mais adequadas quando consideradas as análises diagnósticas quanto à presença ou à ausência de seus pilares e dos elementos constituintes que os compõem. Sugere-se considerar, por exemplo, que, ao se inaugurar um novo serviço de enfermagem, o que melhor caracteriza esse momento seria a ação de organizar o trabalho profissional de enfermagem de que fala a Resolução 358(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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). Por seu turno, quando um dado serviço, por iniciativa própria, impelido por força de fiscalização dos Conselhos Regionais de Enfermagem, ou, ainda, por adesão institucional espontânea a um dado selo de acreditação, realiza mudanças institucionais, a ação que melhor caracteriza esse momento seria a de (re)organizar o trabalho profissional de enfermagem.

A literatura de enfermagem tem identificado correntes de pensamento que corroboram com a problemática aqui aventada. Foram identificadas três correntes de pensamentos, quais sejam: a primeira corrente trata SAE, PE e metodologia da assistência de enfermagem (MAE) como termos distintos; uma segunda corrente considera PE e MAE como sinônimos; e uma terceira corrente considera SAE, PE e MAE como sinônimos(44. Fuly PSC, Leite JL, Lima SBS. Correntes de pensamento nacionais sobre rentes de pensamento nacionais sobre sistematização da assistência de enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem [Online]. 2008;61(6):883-7. DOI: https://doi.org/10.1590/S0034-71672008000600015
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). Ainda têm sido apontadas na literatura de enfermagem confusão conceitual e dúvida quanto ao emprego da SAE, do PE e das taxonomias(55. Santana RF. Sistematização da Assistência de Enfermagem, uma invenção brasileira? Revista de Enfermagem e Atenção à Saúde. 2019;8(2):1-2. DOI: https://doi.org/10.18554/reas.v8i2.4249
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). Essas últimas são exemplificadas pela taxonomia dos Diagnósticos de Enfermagem da NANDA-Internacional (NANDA-I)(66. NANDA International. Diagnósticos de enfermagem da NANDA-I: definições e classificação 2018-2020. 11ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2018.), Classificação dos Resultados de Enfermagem(77. Moorhead S, Johnson M, Maas M, Swanson E. NOC – Classificações dos resultados de enfermagem: mensuração dos resultados em saúde. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2016.), Classificação das Intervenções de Enfermagem(88. Bulechek GM, Butcher HK, Dochterman JM. NIC – Classificação das intervenções de enfermagem. 6ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2016.) e Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE®)(99. Garcia TR. Avanços no conhecimento da Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem – CIPE® (1989-2017). In: Anais do I Encontro Internacional do Processo de Enfermagem, 22 e 23 de junho de 2017. Campinas (SP). São Paulo: Galoá, 2018 [cited 29 Sept 2021]. Available from: https://proceedings.science/enipe/papers/avancos-no-conhecimento-da-classificacao-internacional-para-a-pratica-de-enfermagem—cipe%C2%AE-%281989-2017%29?lang=pt-br
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).

Editorial(55. Santana RF. Sistematização da Assistência de Enfermagem, uma invenção brasileira? Revista de Enfermagem e Atenção à Saúde. 2019;8(2):1-2. DOI: https://doi.org/10.18554/reas.v8i2.4249
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) que discutiu a temática da SAE trouxe a provocação de que ela se trata de uma invenção brasileira e questiona: “Porque [sic] a criação da SAE no Brasil, se o Processo de Enfermagem é em si o modelo do exercício profissional? Porque [sic] no Brasil a SAE sobressai em detrimento do Processo de Enfermagem?” São questões que merecem reflexões, pois se advoga que a SAE e o PE são termos/conceitos distintos e cunhados com propósitos diferentes, embora eles estejam (inter) relacionados no cotidiano dos serviços de enfermagem e possuam um propósito convergente, ou seja, de um lado qualificar a gestão do serviço de enfermagem por meio da SAE e, do outro, qualificar a prática profissional das enfermeiras brasileiras por meio do PE.

O termo SAE tem sido utilizado nacionalmente para se referir à organização da assistência mediante a utilização das fases do método científico, entretanto, essa associação pode não se adequar ao fenômeno em questão, visto que sistematizar pode significar organizar, mas necessariamente utilizando-se de todas as fases de tal método(1010. Carvalho EC, Bachion MM, Dalri MCB, Jesus CAC. Obstacles for the implantation of the nursing process in Brazil. Revista de enfermagem UFPE on line. 2007;1(1):95-9. DOI: https://doi.org/10.5205/reuol.17-8781-1-LE.0101200712
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). Assim, parece pertinente ainda questionar na contemporaneidade: há acordo sobre o conceito da SAE?(1111. Garcia TR, Nóbrega MM. Systematization of nursing care: is there agreement on the concept Revista Eletrônica em Enfermagem. 2009 [cited 29 Sept 2021];11(2):233. Available from: https://www.revistas.ufg.br/fen/article/view/46933/23032
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).

Em norma editada pelo Cofen, é apontado que a SAE tem como objetivo tornar possível a operacionalização do PE(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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). Nesse sentido, compreende-se que ela reúne as condições indispensáveis à implantação e à implementação do PE. A diferenciação entre os termos seria mais bem compreendida, então, por sua finalidade, ou seja, o “para que”, e, assim, a SAE organizaria o trabalho profissional para operacionalização do PE(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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). Contudo, ainda há carência de teorização que ancore a ontologia do que seja a SAE, elucidando o que ela é, ou pelo menos apresentando contornos epistemológicos claros.

Ponto crítico é considerar que a SAE operacionalizaria algo que, em tese, compõe um de seus próprios pilares, pois o PE tem relação direta com o pilar método, sendo apontado como um de seus elementos(1212. Santos IM, Fontes NC, Silva RS, Brito SS. SAE. Sistematização da Assistência de Enfermagem. Um guia para a prática. Bahia: Conselho Regional de Enfermagem da Bahia; 2016 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://ba.corens.portalcofen.gov.br/wp-content/uploads/2016/07/GUIA_PRATICO_148X210_COREN.pdf
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). A literatura(55. Santana RF. Sistematização da Assistência de Enfermagem, uma invenção brasileira? Revista de Enfermagem e Atenção à Saúde. 2019;8(2):1-2. DOI: https://doi.org/10.18554/reas.v8i2.4249
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) traz que o pilar método poderia ser entendido como o PE em si, e, desse modo, estaria contido na SAE, cujo questionamento acerca da questão é: Seria o PE algo menor, ou, ainda, um eixo da SAE? Problematiza-se que a SAE existe em função do PE e, desse modo, há que se fazer um exercício quanto à compreensão do lugar do PE nesse contexto, pois ele não deveria ser considerado parte integrante da ferramenta que reúne as condições para que ele se efetive na prática profissional cotidiana.

Revisitando a atual resolução, considera-se que o termo “Processo de Enfermagem” tem contornos epistemológicos mais claros que os da SAE, sendo possível compreender o que é o PE e como ele se operacionaliza. Além disso, suas cinco etapas já estão bem definidas, em que a coleta de dados, o diagnóstico, o planejamento, a implementação e a avaliação de enfermagem(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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) já possuem aspectos conceituais e operacionais bem delineados. Desse modo, é possível compreender claramente o que é o PE e como ele é operacionalizado na prática, bem como seu contexto de utilização – o cuidado de enfermagem, gênese de sua implicação. Questiona-se, ainda, se já não chegou o momento de a enfermagem brasileira, por meio de seus órgãos competentes, revisarem e atualizarem a Resolução 358 de 2009.

Guardados os aspectos éticos que a crítica reserva e reafirmando-se o integral respeito à produção brasileira sobre a temática, visto que circulam três correntes de pensamento(44. Fuly PSC, Leite JL, Lima SBS. Correntes de pensamento nacionais sobre rentes de pensamento nacionais sobre sistematização da assistência de enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem [Online]. 2008;61(6):883-7. DOI: https://doi.org/10.1590/S0034-71672008000600015
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), equívocos terminológicos e conceituais são comuns quando se acessa a produção sobre a SAE. Não raras vezes, as pesquisas abordam a temática da SAE e, no todo ou em parte, situam tais pesquisas à luz do PE, contribuindo para a manutenção de usos equivocados de tais termos. Logo, compreender a SAE conceitual e operacionalmente pode ajudar a dirimir ou pelo menos minimizar tais equívocos.

Ante o exposto, tem-se como pergunta norteadora da presente pesquisa: que proposições teóricas contribuem para a delimitação de contornos epistemológicos definitórios da SAE? O objetivo deste estudo foi elaborar proposições teóricas que auxiliem na compreensão da SAE enquanto fenômeno distinto do PE.

MÉTODO

Estudo teórico reflexivo apoiado nas resoluções do Cofen que versam sobre a temática e em um corpus de textos nacionais selecionados. Privilegiou-se a seleção de textos brasileiros por ser a SAE tema comum à enfermagem nacional. Também este estudo é parte das reflexões que o primeiro autor vivenciou ao entrar em campo para a coleta de dados, considerando a tese em elaboração, intitulada “Significados atribuídos à SAE: implicações para o cuidado em saúde”.

Sistematização da Assistência de Enfermagem: Buscando Contornos Diferenciadores

Esta categoria realiza o exercício reflexivo de apresentar proposições teóricas que auxiliem a diferenciar a SAE do PE, enquanto fenômenos distintos que permeiam os espaços de produção de cuidado. Delineia-se primeiramente o que não é a SAE, para que, em um segundo momento, seja possível (re)- construir a compreensão sobre esse fenômeno e, então, apontar pistas teóricas de modo a assinalar o que seria a SAE.

Há que se explicitar aspectos relacionados ao PE para que, a partir deles, se possa melhor compreender os contornos epistemológicos da SAE. O PE ocorre de forma processual em um continuum de uma situação de cuidado, em que este seria “o modo de fazer o trabalho de enfermagem contemporâneo, o modo de emprego científico da enfermagem”(55. Santana RF. Sistematização da Assistência de Enfermagem, uma invenção brasileira? Revista de Enfermagem e Atenção à Saúde. 2019;8(2):1-2. DOI: https://doi.org/10.18554/reas.v8i2.4249
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), sendo constituído de cinco etapas, fases e componentes(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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), dos quais os diagnósticos, os resultados e as intervenções de enfermagem “constituem um modo de fazer e um modo de pensar a prática da enfermagem”(1313. Garcia TR, Nóbrega MM, Carvalho EC. Processo de enfermagem: aplicação à prática profissional. Online Brazilian journal of nursing. 2004 [cited 29 Sept 2021];3(2):25-33. Available from: http://www.uff.br/nepae/objn302garciaetal.htm
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).

A implementação do PE deve ser ancorada em uma teoria de enfermagem, que suporte o movimento processual e cíclico característico do PE e norteie sua implementação, maximizando seu propósito terapêutico, que é o de orientar o cuidado profissional e a documentação da prática(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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). Um dos objetivos inequívocos do PE, considerando as fases que lhe são próprias, situa-se na identificação, na nomeação, no estabelecimento de resultados e no tratamento de uma “resposta humana a condições de saúde/processos da vida, ou a uma vulnerabilidade a essa resposta”(66. NANDA International. Diagnósticos de enfermagem da NANDA-I: definições e classificação 2018-2020. 11ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2018.) por parte dos clientes sob a responsabilidade clínica do enfermeiro e de sua equipe.

É importante frisar que existe a necessidade de considerar que as teorias de enfermagem orientam a aplicação de seus elementos à prática profissional por meio do PE(1313. Garcia TR, Nóbrega MM, Carvalho EC. Processo de enfermagem: aplicação à prática profissional. Online Brazilian journal of nursing. 2004 [cited 29 Sept 2021];3(2):25-33. Available from: http://www.uff.br/nepae/objn302garciaetal.htm
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). Tem-se como exemplo, para ancorar o PE, a Teoria Interativa de Amamentação que “descreve, explica, prediz e prescreve a amamentação, examinando os fatores que antecedem e influenciam, bem como as consequências no processo de amamentar”(1414. Primo CC, Brandão MAG. Interactive Theory of Breastfeeding: creation and application of a middle-range theory. Revista Brasileira de Enfermagem. 2017;70(6):1191-8. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0523
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).

Além das teorias de enfermagem, a prática profissional por meio do PE pode ser ancorada em outros referenciais teóricos. A esse respeito cita-se a pesquisa que objetivou identificar que referenciais teóricos guiam a prática clínica de enfermagem em saúde mental, identificando-se que, além das teorias de enfermagem, suportam a prática de enfermagem o “referencial biomédico; referenciais que subsidiam práticas alternativas; referencial subsidiado pela política pública da redução de danos; e referencial da teoria psicanalítica”(1515. Costa LDW, Silveira LC, Vieira AN, Cunha BM, Almeida ANS, Guerreiro EM. Theoretical references that guide nursing practice in mental health. Escola Anna Nery. 2014;18(2):336-42. DOI: http://dx.doi.org/10.5935/1414-8145.20140049
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).

O PE pode ser compreendido como o “principal modelo metodológico para o desempenho sistemático da prática profissional, ou um instrumento tecnológico de que se lança mão para favorecer o cuidado”(1616. Garcia TR, Nóbrega MML. Nursing Process: from theory to the practice of care and research. Escola Anna Nery. 2009;13(1):188-93. DOI: https://doi.org/10.1590/S1414-81452009000100026
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). Delineia-se, desse modo, a implicação direta do PE com o cuidado profissional de enfermagem à beira do leito, caracterizado principalmente pelas ações cuidativas diretamente ligadas ao paciente. Esse aspecto é essencial para se compreender a distinção entre os termos, pois a partir da compreensão do que seja o PE, pode-se teorizar o que não caracteriza a SAE, diferenciando-a dele.

Para melhor auxiliar na compreensão do que não é a SAE, foram estabelecidas proposições teóricas a partir das reflexões que nortearam este texto (Quadro 1). Ressalta-se que essas proposições devem ser futuramente submetidas a escrutínio científico, para que sejam validadas ou refutadas, considerando o próprio avanço da produção de conhecimento sobre a temática. Entretanto, elas podem ser consideradas, até o momento, avanços para além do que tem sido produzido acerca da SAE, pela ação propositiva de diferenciação que elas possibilitam.

Quadro 1.
Proposições teóricas que delimitam o que não é a Sistematização da Assistência de Enfermagem.

Em síntese, a SAE constitui objeto epistemológico distinto do PE e não é o PE em si. Ela não se ocupa de fenômenos assistenciais diretos e respostas humanas que são a gênese da implicação do PE. Antes, a partir de seus três pilares, ela reúne as condições indispensáveis para que seja possível organizar o trabalho profissional de enfermagem(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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), de modo a efetivar a operacionalização do PE à prática profissional cotidiana nos diversos contextos assistenciais.

Sistematização da Assistência de Enfermagem: Buscando Contornos Definitórios

Essa categoria de análise realiza o exercício de delimitar de forma contundente que a SAE deve se aproximar de estudos que se ocupem de objetos de pesquisa relacionados à organização do trabalho profissional de enfermagem(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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). Também se deve ter cuidado para não compreender a SAE como um conhecimento substitutivo no que tange à administração de enfermagem. Isso porque a SAE não é a gestão e nem a administração de enfermagem, mas representa um campo peculiar de produção de conhecimento, que tem íntima relação com tais áreas. Pode-se dizer que a SAE é uma customização no modo de organizar os serviços de enfermagem e geri-los.

Tem sido apontado na literatura de enfermagem que a SAE suporta a gestão em enfermagem(55. Santana RF. Sistematização da Assistência de Enfermagem, uma invenção brasileira? Revista de Enfermagem e Atenção à Saúde. 2019;8(2):1-2. DOI: https://doi.org/10.18554/reas.v8i2.4249
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). Entretanto, discorda-se dessa perspectiva, visto que a SAE se ancora em princípios da administração e, desse modo, os conhecimentos em gestão em enfermagem suportam a SAE e essa, por consequência, permite a organização do trabalho profissional(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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) – e não o contrário. A SAE constitui uma ferramenta customizada que a enfermagem brasileira cunhou e normatizou para caracterizar a prática administrativa necessária à operacionalização do PE por meio da organização do trabalho profissional(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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) de enfermagem.

Considerados os avanços e os retrocessos associados à SAE, pondera-se que os primeiros se situam à medida em que se sancionou uma resolução que impele legalmente que os serviços de enfermagem tenham padrões mínimos de organização do trabalho profissional, de modo que seja possível operacionalizar o PE(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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), o que pode ser apontado como avanços. Por retrocessos, tem-se que a ausência de consenso quanto à compreensão conceitual e operacional, bem como em termos de proposições, considerando o fenômeno SAE, pode minimizar as reais contribuições que esta tem para os serviços de enfermagem e saúde. Por consequência, pode-se minimizar a real contribuição do PE à prática profissional já que tais questões não são comumente discutidas.

A Resolução 358 de 2009(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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) não define conceitualmente e nem operacionalmente o que é a SAE, o método, o pessoal e os instrumentos. Este texto abarca que método, pessoal e instrumentos precisam ser compreendidos em uma perspectiva diferente das de etapas ou fases do PE(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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). Desse modo, eles não possuem um caráter processual e cíclico. Na literatura de enfermagem, eles são apontados como eixos(55. Santana RF. Sistematização da Assistência de Enfermagem, uma invenção brasileira? Revista de Enfermagem e Atenção à Saúde. 2019;8(2):1-2. DOI: https://doi.org/10.18554/reas.v8i2.4249
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), porém parece que esse termo não consegue traduzir a ideia estrutural que será apresentada a seguir. Refletindo-se em possibilidades de representação dos três termos, apreende-se que expressões como sustentáculo, arcabouço, coluna, esteio, base e pilar(1717. Dicio [Internet]. Dicionário online de português. [citado 29 Set 2021]. Disponível em: https://www.dicio.com.br
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) podem melhor representá-los.

A palavra pilar, segundo o conceito do dicionário, por ser compreendida como “coluna simples que sustenta uma construção”(1717. Dicio [Internet]. Dicionário online de português. [citado 29 Set 2021]. Disponível em: https://www.dicio.com.br
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). Esta parece adequada para ser utilizada e representar a estrutura ou a anatomia da SAE a partir do método, do pessoal e dos instrumentos. Assim, infere-se que os três pilares da SAE compreenderiam domínios do conhecimento profissional essenciais à organização do trabalho profissional de que fala a Resolução 358(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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), mas, possivelmente, não contemplem toda a gama de conhecimentos necessários para tal atividade.

Cada pilar serviria de arcabouço estrutural à SAE. Entretanto, deve-se ter claro que cada pilar é constituído por partes menores, ou seja, elementos basilares que lhes conformam enquanto pilares estruturantes. Com base em Hulley et al.(1818. Hulley SB, Cummings SR, Browner WS, Grady DG, Newman TB. Delineando a pesquisa clínica: uma abordagem epidemiológica. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2008.), é proposta a compreensão da SAE a partir de sua anatomia (do que ela é feita), bem como de sua fisiologia (como ela funciona). Na Figura 1, pode ser visto um esquema explicativo que inclui os três pilares e os elementos constituintes da SAE em uma perspectiva anatomofisiológica.

Figura 1.
Anatomia e fisiologia da Sistematização da Assistência de Enfermagem.

Quando tais pilares e seus elementos constituintes estão presentes em um dado contexto assistencial – um serviço de enfermagem, compreende-se que esteja presente a anatomia da SAE e, assim, tem-se as condições necessárias conhecidas até o momento à operacionalização do PE. Entretanto, tais pilares e elementos constituintes precisam estar interconectados, em harmonia com PE de modo que a utilização de cada elemento constituinte pelos enfermeiros seja uma realidade diária possível – operacionalizável. Os pontos de intersecção entre os círculos significam que os pilares e elementos constituintes estão presentes mas, também, harmônicos entre si e funcionantes, oportunizando, dessa forma, a prática profissional a partir do PE e o funcionamento do serviço de enfermagem em questão – descortinando a fisiologia da SAE.

Retornando à anatomia da SAE, esta é composta de três pilares. O pilar método pode ser compreendido a partir dos seguintes elementos constituintes: teorias de enfermagem e PE/consulta de enfermagem. O PE tem relação com as taxonomias de enfermagem e os registros de enfermagem(1212. Santos IM, Fontes NC, Silva RS, Brito SS. SAE. Sistematização da Assistência de Enfermagem. Um guia para a prática. Bahia: Conselho Regional de Enfermagem da Bahia; 2016 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://ba.corens.portalcofen.gov.br/wp-content/uploads/2016/07/GUIA_PRATICO_148X210_COREN.pdf
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). Consideram-se relacionados ao método, ainda, como subsídios para a implementação do PE a anamnese e o exame físico de enfermagem. Acrescentem-se, também, os demais referenciais teóricos implicados na prática clínica de enfermagem e, assim, assumidos como tendo relação intrínseca com o pilar método.

O pilar pessoal tem sido associado ao dimensionamento da equipe(1212. Santos IM, Fontes NC, Silva RS, Brito SS. SAE. Sistematização da Assistência de Enfermagem. Um guia para a prática. Bahia: Conselho Regional de Enfermagem da Bahia; 2016 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://ba.corens.portalcofen.gov.br/wp-content/uploads/2016/07/GUIA_PRATICO_148X210_COREN.pdf
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). Entretanto, tal perspectiva deve ser extrapolada e englobar a equipe de enfermagem, a gestão de pessoas e a formação de recursos humanos(1919. Santos GLA, Valadares GV, Aranha JS, Silva JLL, Santos SS, Guerra TRB. Relato de experiência sobre ensino e aplicação do processo de enfermagem. International Journal of Current Research. 2020;12(4):10093-7. DOI: https://doi.org/10.24941/ijcr.38379.04.2020
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). Já o pilar instrumentos tem sido associado aos protocolos, aos manuais e aos impressos(1212. Santos IM, Fontes NC, Silva RS, Brito SS. SAE. Sistematização da Assistência de Enfermagem. Um guia para a prática. Bahia: Conselho Regional de Enfermagem da Bahia; 2016 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://ba.corens.portalcofen.gov.br/wp-content/uploads/2016/07/GUIA_PRATICO_148X210_COREN.pdf
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). A literatura de enfermagem tem oferecido maior detalhamento dos elementos constituintes do pilar instrumentos e aponta como seus integrantes: “manual de enfermagem, regimento interno do serviço de enfermagem, protocolos operacionais padrão, protocolos assistenciais e bundles, as escalas de avaliação clínica e os formulários/impressos de enfermagem”(1919. Santos GLA, Valadares GV, Aranha JS, Silva JLL, Santos SS, Guerra TRB. Relato de experiência sobre ensino e aplicação do processo de enfermagem. International Journal of Current Research. 2020;12(4):10093-7. DOI: https://doi.org/10.24941/ijcr.38379.04.2020
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).

Outro ponto sensível é a produção de conhecimento acerca da SAE em periódicos nacionais. Devem ser identificados os limites e as possibilidades que existem acerca da SAE enquanto objeto de estudo que provoca questionamentos e, por consequência, a elaboração de problemas de pesquisa a serem resolvidos por aqueles que se debruçam sobre a temática para produzir ciência. Qual é o lugar de fala das produções que versam sobre a SAE? Advoga-se que os autores deveriam, em seus textos, dentre outros aspectos, deixar claro a posição teórica adotada quanto ao termo, para que o conhecimento possa ser produzido e consumido, tendo-se a clareza sobre em quais correntes de pensamento(44. Fuly PSC, Leite JL, Lima SBS. Correntes de pensamento nacionais sobre rentes de pensamento nacionais sobre sistematização da assistência de enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem [Online]. 2008;61(6):883-7. DOI: https://doi.org/10.1590/S0034-71672008000600015
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) estão assentadas as discussões.

A SAE é um termo que merece, por parte da enfermagem brasileira, especial atenção, visto que os equívocos terminológicos relacionados a ela, sejam em ambientes assistenciais, em espaços formais de ensino ou mesmo entre pesquisadores, têm acarretado prejuízos na produção de conhecimento e na delimitação epistemológica quando considerado o termo. Assim, foram elaboradas proposições teóricas, com base nas reflexões aqui postas, objetivando-se ampliar a compreensão acerca da SAE (Quadro 2).

Quadro 2.
Proposições teóricas que delimitam o que é a Sistematização da Assistência de Enfermagem.

A SAE, à luz da Resolução 358 de 2009, organiza o trabalho profissional quanto ao método, pessoal e instrumentos, de modo que seja possível a operacionalização do PE(11. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução Cofen-358/2009. Brasília, DF: COFEN; 2009 [cited 29 Sept 2021]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html
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). Entretanto, traz-se a seguinte provocação: operacionalizaria apenas o PE? A organização do trabalho profissional encontra harmonia com a perspectiva da organização ou reorganização do processo de trabalho, entendido como “organização e distribuição das atividades do trabalho nos serviços de saúde”(2020. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem (COFEN). Resolução COFEN 543/2017. Brasília, DF: COFEN; 2017 [cited 2020 Jan 28]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-5432017_51440.html
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).

Contudo há que se considerar que a complexidade do processo de trabalho do enfermeiro está para além da simples organização e distribuição de atividades(2020. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem (COFEN). Resolução COFEN 543/2017. Brasília, DF: COFEN; 2017 [cited 2020 Jan 28]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-5432017_51440.html
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), visto que a literatura tem apontado outros processos de trabalho em enfermagem, quais sejam o processo de trabalho de assistir, de administrar, de ensinar, de pesquisar e de participar politicamente(2121. Sanna MC. Os processos de trabalho em Enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem [online]. 2007;60(2):221-4. DOI: https://doi.org/10.1590/S0034-71672007000200018
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). Isso tem fundamental importância, pois como já posto, possivelmente ainda exista a necessidade de se identificar outros pilares para além dos já existentes que contemplem a gama de processos de trabalho que envolvem a organização do trabalho profissional de enfermagem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta reflexão alcançou o objetivo proposto, que foi o de apresentar proposições teóricas que possibilitaram compreender melhor e diferenciar a SAE do PE, ainda que de forma embrionária e no contexto de uma reflexão teórica, o que constitui uma limitação do estudo. Desse modo, a SAE não é o PE e não deve ser abordada como semelhante a ele; não ocorre em etapas e não está relacionada diretamente ao cuidado à beira do leito, embora tenha implicações importantes, por viabilizar, por meio de seus três pilares, a operacionalização do PE e, por consequência, sua implantação e sua implementação.

Em síntese, a SAE não configura objeto epistemológico que tenha relação direta com o cuidado à beira do leito, que é espaço privilegiado para a implementação do PE – instrumento orientador do cuidado prestado por enfermeiras e pelas equipes de enfermagem, do qual resulta uma série de informações clínicas, que necessitam ser registradas e formalizadas por meio de comunicação escrita.

A despeito do que é a SAE, o termo reúne predicados que lhe caracterizam como um campo de conhecimento relacionado à gestão e/ou à administração dos serviços de enfermagem. Não se pode afirmar que a SAE é a gestão em enfermagem, mas compreende-se que, por meio de seus pilares, ela contribui para a organização do trabalho profissional nos diversos contextos assistenciais, desdobrando-se em uma ferramenta que pode suportar a prática de gestão de lideranças de enfermagem.

EDITOR ASSOCIADO

Marcia Regina Cubas

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    03 Nov 2021
  • Aceito
    02 Fev 2022
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