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Eventos adversos em hemodiálise: relatos de profissionais de enfermagem

Eventos adversos en hemodiálisis: testimonios de profesionales de enfermería

Resumos

O presente trabalho trata-se de estudo transversal e quantitativo que analisou o conhecimento dos profissionais de enfermagem sobre Eventos Adversos (EA) em uma unidade de hemodiálise de um hospital de ensino. A coleta dos dados ocorreu de fevereiro a abril de 2011, a partir de entrevistas com 25 profissionais. A análise dos dados identificou 517 relatos de 32 tipos, sendo os mais citados: cateter obstruído, retirada acidental da agulha e coagulação do sistema extracorpóreo. As causas relacionadas ao paciente foram mencionadas em 42,8% dos relatos. As principais condutas foram implementação/alteração de protocolos e educação continuada, sendo a última a principal sugestão para a prevenção. Os resultados podem contribuir para uma análise crítica sobre a qualidade do cuidado em unidades de hemodiálise, gerando o desenvolvimento de ações que auxiliem a promoção da segurança dos pacientes.

Renal dialysis; Nursing care; Security measures


Este estudio, transversal y cuantitativo, analizó el conocimiento de los profesionales de enfermería sobre Eventos Adversos (EA) en una unidad de hemodiálisis de un hospital de enseñanza. La recolección de datos se realizó de febrero a marzo de 2011, a partir de entrevistas con 25 profesionales. El análisis de datos identificó 517 testimonios de 32 tipos, habiendo resultado los más citados: catéter obstruido, retiro accidental de la aguja y coagulación del sistema extracorpóreo. Las causas relacionadas al paciente fueron mencionadas en 42,8% de los testimonios. Las principales conductas fueron: implementación/alteración de protocolos y capacitación permanente, tratándose ésta última de la principal sugerencia para la prevención. Los resultados pueden colaborar a realizar un análisis crítico sobre la calidad del cuidado en unidades de hemodiálisis, generando el desarrollo de acciones que ofrezcan ayuda en la promoción de la seguridad de los pacientes.

Diálisis renal; Atención de enfermería; Medidas de seguridad


This cross-sectional and quantitative study analyzed the knowledge of nursing professionals regarding Adverse Events (AE) in a hemodialysis unit of a teaching hospital. Data collection was performed between February and April 2011, based on interviews with 25 professionals. Data analysis identified 517 reports of 32 types of adverse events, of which the most commonly cited were: obstructed catheter, accidental withdrawal of the needle; and clotting of the extracorporeal system. Patient-related causes were mentioned in 42.8% of the reports. The main measures adopted were the implementation/ change of protocols and continuing education; the latter is the main suggestion for prevention. The results can contribute to a critical analysis of the quality of care in hemodialysis units, resulting in the development of interventions that help promote patient safety.

Renal dialysis; Nursing care; Security measures


ARTIGO ORIGINAL

Eventos adversos em hemodiálise: relatos de profissionais de enfermagem

Eventos adversos en hemodiálisis: testimonios de profesionales de enfermería

Maiana Regina Gomes de SousaI; Ana Elisa Bauer de Camargo SilvaII; Ana Lúcia Queiroz BezerraIII; Juliana Santana de FreitasIV; Adriana Inocenti MiassoV

IEnfermeira. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Goiás. Goiânia, GO, Brasil. maianaregina@gmail.com

IIEnfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora Adjunta da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Goiás. Goiânia, GO, Brasil. anaelisa@terra.com.br

IIIEnfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora Associada da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Goiás. Goiânia, GO, Brasil. analuciaqueiroz@uol.com.br

IVEnfermeira. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Goiás. Goiânia, GO, Brasil. juzinha_gyn@hotmail.com

VEnfermeira. Professora Doutora do Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Ciências Humanas da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Ribeirão Preto, SP, Brasil. adriana.miasso@yahoo.com.br

Correspondência Correspondência: Maiana Regina Gomes de Sousa Rua 6-A, n. 25, Qd. 63, Lt. 3/60 – Bloco C – Apto. 303 - Condomínio Residencial Alameda das Rosas - Setor Oeste CEP 74115-080 – Goiânia, GO, Brasil

RESUMO

O presente trabalho trata-se de estudo transversal e quantitativo que analisou o conhecimento dos profissionais de enfermagem sobre Eventos Adversos (EA) em uma unidade de hemodiálise de um hospital de ensino. A coleta dos dados ocorreu de fevereiro a abril de 2011, a partir de entrevistas com 25 profissionais. A análise dos dados identificou 517 relatos de 32 tipos, sendo os mais citados: cateter obstruído, retirada acidental da agulha e coagulação do sistema extracorpóreo. As causas relacionadas ao paciente foram mencionadas em 42,8% dos relatos. As principais condutas foram implementação/alteração de protocolos e educação continuada, sendo a última a principal sugestão para a prevenção. Os resultados podem contribuir para uma análise crítica sobre a qualidade do cuidado em unidades de hemodiálise, gerando o desenvolvimento de ações que auxiliem a promoção da segurança dos pacientes.

Descritores: Renal dialysis. Nursing care. Security measures.

RESUMEN

Este estudio, transversal y cuantitativo, analizó el conocimiento de los profesionales de enfermería sobre Eventos Adversos (EA) en una unidad de hemodiálisis de un hospital de enseñanza. La recolección de datos se realizó de febrero a marzo de 2011, a partir de entrevistas con 25 profesionales. El análisis de datos identificó 517 testimonios de 32 tipos, habiendo resultado los más citados: catéter obstruido, retiro accidental de la aguja y coagulación del sistema extracorpóreo. Las causas relacionadas al paciente fueron mencionadas en 42,8% de los testimonios. Las principales conductas fueron: implementación/alteración de protocolos y capacitación permanente, tratándose ésta última de la principal sugerencia para la prevención. Los resultados pueden colaborar a realizar un análisis crítico sobre la calidad del cuidado en unidades de hemodiálisis, generando el desarrollo de acciones que ofrezcan ayuda en la promoción de la seguridad de los pacientes.

Descriptores: Diálisis renal. Atención de enfermería. Medidas de seguridad.

INTRODUÇÃO

A insuficiência renal ocorre quando os rins são incapazes de remover os resíduos provenientes do metabolismo celular ou de realizar as funções reguladoras(1). Acomete milhões de pessoas, as quais buscam uma chance de sobrevida na terapia renal substitutiva. Esta é um tratamento que realiza o processo de filtragem e purificação do sangue para remover líquido e produtos urêmicos que necessitam ser eliminados. No Brasil, aproximadamente 92.901 pessoas realizam esse tipo de tratamento e desses, 90,6% são submetidos à hemodiálise(2).

O procedimento de hemodiálise é efetuado a partir de um acesso venoso que permite um fluxo sanguíneo elevado. O sangue é transportado por meio de um sistema de circulação extracorpórea até um filtro capilar, onde é depurado e depois devolvido para o corpo. Geralmente é realizado três vezes por semana, durante um intervalo de três a quatro horas(3).

As unidades de hemodiálise são locais susceptíveis à ocorrência de eventos adversos (EA), pois apresentam vários fatores de risco, como: procedimentos invasivos, utilização de equipamentos complexos, pacientes críticos, alta rotatividade de pacientes e administração de medicamentos potencialmente perigosos, como a heparina. Um estudo realizado em quatro unidades de hemodiálise dos EUA identificou que, em um período de 17 meses, ocorreram 88 EA durante 64.541 tratamentos de diálise (01 caso a cada 733 tratamentos)(4).

Os EA são incidentes que ocorrem durante a prestação do cuidado à saúde e que resultam em dano ao paciente, que pode ser físico, social e psicológico, o que inclui doença, lesão, sofrimento, incapacidade ou morte(5).

A ocorrência crescente desses eventos em âmbito mundial vem preocupando especialistas, pesquisadores, gestores e profissionais da área de saúde. Dados da Organização Mundial de Saúde indicam que anualmente dezenas de milhões de pessoas no mundo inteiro sofrem lesões incapacitantes ou morte devido a EA(6).

Os profissionais de enfermagem são responsáveis por grande parte das ações assistenciais e, portanto, encontram-se em posição privilegiada para reduzir a possibilidade de incidentes atingirem o paciente, além de detectar as complicações precocemente e realizar as condutas necessárias para minimizar os danos(7).

A equipe de Enfermagem que atua em unidades de hemodiálise deve possuir conhecimentos sobre EA para poder identificar os riscos e as situações que propiciam sua ocorrência, com a intenção de buscar alternativas para minimizar as falhas, adotar métodos de análise de risco e assim garantir a qualidade do serviço.

O objetivo deste estudo foi analisar o conhecimento dos profissionais de Enfermagem sobre EA; identificar a ocorrência deste tipo de evento, no período de 2005 a 2010, em uma unidade de hemodiálise, os fatores causais, as condutas adotadas e sugestões para prevenção.

MÉTODO

Trata-se de um estudo transversal com abordagem quantitativa, realizado na unidade de hemodiálise de um hospital de ensino de Goiânia, Goiás.

A unidade dispunha de 17 máquinas de hemodiálise, sendo 14 para pacientes com sorologia negativa para Hepatite B, duas para pacientes com sorologia positiva para Hepatite B e uma reserva, para atendimento de emergência.

O atendimento dos pacientes transcorria nos turnos matutino e vespertino, de segunda a sábado, com capacidade para 34 pacientes/dia, que deveriam realizar três sessões por semana, totalizando 204 sessões semanais de hemodiálise.

A equipe de Enfermagem que atuava no serviço de Terapia Renal Substitutiva desempenhava suas funções tanto na unidade de Hemodiálise como nas Unidades de Terapia Intensiva e Diálise Peritoneal, conforme rodízio de escala. Era constituída por 42 profissionais de Enfermagem, sendo oito enfermeiros, 27 técnicos e sete auxiliares. Foram incluídos no estudo os profissionais que atuavam na unidade de hemodiálise, no período de coleta.

Dos 28 profissionais que atenderam aos critérios de inclusão, três recusaram-se a participar do estudo, resultando em uma taxa de perda de 10,7%. Desse modo, participaram da pesquisa 25 profissionais de Enfermagem.

A coleta dos dados ocorreu nos meses de fevereiro, março e abril de 2011, tendo sido utilizada a entrevista guiada por um instrumento com perguntas abertas e fechadas referentes à caracterização dos profissionais, sobre EA, sua ocorrência na unidade, fatores causais, condutas adotadas e medidas de prevenção. O instrumento foi analisado por especialistas da área de segurança do paciente.

Cada profissional foi entrevistado uma vez, na própria unidade, no horário de trabalho, mediante agendamento prévio com data e hora, atendendo a disponibilidade de cada um.

Os dados obtidos por meio das perguntas fechadas foram inseridos em um banco de dados do Microsoft Excel versão 2007 e analisados estatisticamente, empregando-se o software Statistical Package For The Social Science (SPSS) versão 15.0. Os dados provenientes das questões abertas foram agrupados e categorizados por semelhança de conteúdo.

Como teste de comparação dos relatos das diferentes categorias profissionais sobre EA, foram realizadas análises por meio do cálculo do qui-quadrado de Pearson (com níveis de significância de 5%, ou seja, p<0,05). Os resultados estão apresentados de forma descritiva, em tabelas.

Foram preservados os direitos dos participantes, conforme a Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde(8). O projeto foi aprovado pela direção pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás, sob protocolo nº 064/2008. Todos os profissionais incluídos manifestaram voluntariamente sua concordância em participar, assinando o Termo de Compromisso Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

Do total de 25 profissionais de Enfermagem que participaram do estudo, 07 (28%) eram enfermeiros (E), 16 (64%) técnicos (T) e 02 (08%) auxiliares (A). A Tabela 1 apresenta a caracterização desses profissionais.

Quanto ao conhecimento dos profissionais sobre a definição de EA, 12 profissionais (01 E; 09 T, 02 A) não souberam responder; nove (03 E; 06 T) responderam como incidentes, complicações ou eventos inesperados que ocorrem durante o tratamento; três enfermeiros referiram ser eventos ou falhas na assistência que causam prejuízo ao paciente e um técnico relatou como sendo um acidente que não deveria acontecer.

Em relação à ocorrência de EA, no período de 2005 a 2010, os profissionais fizeram 517 relatos de eventos que presenciaram ou tiveram conhecimento, os quais foram distribuídos em 11 categorias (Tabela 2).

As categorias com maior número de relatos foram relacionadas ao acesso venoso central (148; 28,6%) ao acesso venoso periférico (102; 19,7%) e aos equipamentos e materiais médico-hospitalares (75; 14,5%).

Os dados permitiram identificar que não houve diferença significativa no número de relatos entre as diferentes categorias profissionais (p <0,05). Esse fato pode ser atribuído às características estruturais da Unidade (ambiente fechado e pequeno), as quais podem ter facilitado a proximidade de todos os profissionais com qualquer intercorrência. Apesar de não ter havido diferença significativa entre os relatos por categoria, é importante descrever sua composição, para inferir sobre as necessidades educacionais na equipe. Foram identificados 32 tipos de EA nas diferentes categorias (Tabela 3).

Todos os profissionais relataram ter presenciado ou ter tido conhecimento da ocorrência de EA do tipo cateter obstruído, retirada acidental da agulha e coagulação do sistema extracorpóreo.

Quando indagados sobre as possíveis causas da ocorrência destes EA, foram relatadas 708 causas, categorizadas como relacionadas aos pacientes, aos profissionais e relacionadas à organização do serviço, como demonstra a Tabela 4.

Destaca-se que 303 (42,8%) relatos estavam relacionados ao próprio paciente, 205 (28,9%) ao profissional e 200 (28,3%) à organização do serviço.

Em relação às condutas que foram adotadas pela unidade para a prevenção de EA, houve 106 relatos cuja análise permitiu em duas categorias: direcionadas ao serviço (60; 56,6%) e direcionadas aos profissionais (46; 43,3%).

Dentro da categoria de condutas direcionadas ao serviço, 31 relatos (12 E, 15 T, 04 A) foram referentes a implementação e alteração de protocolos e rotinas na unidade, 12 (06 E, 04 T, 02 A) foram sobre melhoria dos recursos materiais, cinco (01 E, 03 T, 01 A) citavam relatórios e pareceres enviados ao serviço de compras ou departamento responsável, informando sobre a qualidade dos materiais, três (02 E, 01 A) referiam-se a medidas para melhoria dos recursos humanos e dois (01 E, 01 T) à necessidade de manutenção dos materiais e equipamentos. Seis técnicos de enfermagem ressaltaram a participação da instituição no programa Hospitais Sentinela (02), a realização de testes e vigilância constante dos materiais (02), assim como estudos e pesquisas sobre avaliação de riscos (02). Apenas um técnico afirmou que nenhuma conduta foi tomada.

Na categoria de condutas direcionadas aos profissionais, os relatos mais prevalentes diziam respeito às ações de educação continuada, sendo que 23 (06 E, 15 T, 02 A) mencionaram reuniões de discussão dos problemas e orientações, 11 (01 E, 10 T), treinamentos e oito (04 E, 03 T, 01 A), cursos de capacitação. Ainda dois profissionais um técnico de enfermagem sugeriu maior supervisão direta por parte do enfermeiro e outro sugeriu a melhoria da comunicação entre os profissionais.

No concernente às sugestões para a prevenção de EA na unidade, foram obtidas 52 manifestações, também distribuídas nas categorias condutas direcionadas ao (01 E, 01 T) relataram que nenhuma conduta foi tomada, serviço (34; 65,4%) e direcionadas aos profissionais (18; 34,6%) (Tabela 5).

DISCUSSÃO

Em relação à carga horária semanal de trabalho, destaca-se o fato de 48% dos profissionais de enfermagem da unidade de hemodiálise trabalharem de 50 a 70 horas por semana, elevando o risco eminente para que falhas sejam cometidas durante a prestação da assistência. Os riscos de o profissional cometer um erro aumentam significativamente quando a jornada de trabalho é superior a 40 horas por semana, quando os turnos de trabalho excedem 12 horas ou quando são realizadas horas extras(9).

O fato de quase metade dos servidores não saber o que são EA e do restante responder de forma incompleta indica a necessidade de maior divulgação sobre o tema dentro da instituição. Estudo realizado com a participação de 68 profissionais de enfermagem de hospitais da rede pública e privada do Rio de Janeiro constatou que 78% dos profissionais afirmaram saber o que são EA, 09% disseram já ter ouvido falar, mas não sabiam o que eram e 07% disseram nunca ter ouvido falar. Entre os que sabiam e os que já ouviram falar sobre EA, 45% aprenderam ou ouviram dentro do próprio hospital(10).

Os profissionais devem ter conhecimento sobre os EA e seu impacto na atenção à saúde, uma vez que a incidência desses eventos é um importante indicador de qualidade. O tema deve ser abordado nas instituições de ensino, seja de nível médio, superior ou de pós-graduação, e constantemente discutido nas instituições de saúde.

Os EA mais relatados pelos profissionais foram relacionados ao acesso venoso. Em estudo realizado nos EUA foram identificados EA do tipo infiltração do acesso vascular, coagulação do sistema extracorpóreo, problemas nos equipamentos de diálise, erros de medicação e queda de pacientes(4).

Neste estudo, o cateter obstruído foi um dos tipos de EA relatados por 100% dos profissionais. Ocorre quando há formação de coágulo no lúmen do cateter, impedindo o fluxo sanguíneo do corpo do paciente para a máquina de hemodiálise. Um estudo realizado em um serviço de nefrologia da cidade de Ribeirão Preto/ SP mostrou que de todas as complicações locais dos cateteres utilizados pelos pacientes em tratamento hemodialítico, 18% eram obstrução do cateter. Esse tipo de evento pode estar relacionado à condição clínica do paciente, ao tipo de cateter, à habilidade técnica do profissional, ao tempo de permanência do cateter, manipulações excessivas e inadequadas, dentre outros(11).

As complicações associadas ao acesso vascular e ao cateter podem ser graves, ocasionando alto risco demorbi-mortalidade para os pacientes. É papel do enfermeiro realizar o monitoramento, a detecção e a intervenção em complicações que ocorram durante as sessões de hemodiálise, considerando sua especialidade e sua responsabilidade frente à unidade de hemodiálise, sendo este um diferencial para a obtenção de segurança e qualidade na assistência prestada no procedimento hemodialítico(12).

Em relação à categoria de EA relacionada ao acesso venoso periférico, problemas como a retirada acidental da agulha também foram citados por todos os profissionais entrevistados. A retirada acidental da agulha que punciona a fístula arteriovenosa pode ser considerada um dos EA mais perigosos em unidades de hemodiálise, pois o paciente pode sangrar até a morte em poucos minutos. Sendo assim, faz-se necessário que a Enfermagem adote medidas que diminuam o risco de ocorrência desse evento. Na Europa, a Associação de Enfermagem de Diálise e a Associação de Assistência Renal elaboraram 12 recomendações práticas para reduzir o risco de desconexão da linha venosa, detectar sangramento o mais cedo possível, prevenir esse tipo de evento e reduzir os danos(13).

Os EA relacionados ao acesso vascular podem ser evitados por meio de melhorias dos processos assistenciais utilizados pela Enfermagem, assim como pela avaliação constante dos resultados das práticas adotadas. Um estudo direcionado a avaliar a qualidade das práticas assistenciais em hemodiálise apresentou quatro indicadores para avaliação do acesso vascular, sendo três de processo e um de resultado, quais sejam: desempenho do cateter temporário de duplo lúmen para hemodiálise; manutenção do cateter temporário de duplo lúmen, monitoramento da fístula arteriovenosa e complicações da fístula arteriovenosa(14).

A coagulação sanguínea do sistema extracorpóreo, outro EA relatado por todos os profissionais, geralmente ocorre nas sessões realizadas sem heparina, por contraindicação do medicamento. Em pesquisa feita em quatro unidades de hemodiálise dos EUA, identificou-se 19 casos de coagulação do sistema, em um período de 17 meses, sendo o segundo tipo de EA mais reportado e a maioria ocorreu em tratamentos sem o uso de heparina(4).

Em relação às principais causas dos EA, a condição clínica do paciente foi a mais relatada. Tais condições influem diretamente na ocorrência de EA, principalmente nos pacientes em estado grave, dada sua instabilidade e a necessidade de intervenções, que os deixam particularmente vulneráveis a EA(15).

As falhas individuais foram a segunda causa mais citada para a ocorrência de EA. Existem diversos fatores psicológicos e fisiológicos que podem influenciar o comportamento dos profissionais durante a assistência e interferir na segurança do paciente. Entre os mais frequentes estão a falta de habilidades técnicas cognitivas (percepção da situação), sociais (trabalho em equipe) e pessoais (estresse)(16).

Na ocorrência de um incidente, o importante é a assimilação de que a causa dos erros e EA é multifatorial e que os profissionais de saúde estão suscetíveis a cometê-los quando os processos técnicos e organizacionais são complexos e mal planejados(17). As organizações devem estruturar o sistema de forma segura, ajudando os profissionais a não errar(18). Todas as causas devem ser analisadas pelo serviço de gerenciamento de risco para o desenvolvimento de ações corretivas, visando a prevenção e a redução de EA.

Em relação às condutas adotadas para a prevenção de EA, ressalta-se que a maioria foi direcionada ao serviço, o que demonstra preocupação em melhorar as condições de trabalho e promover ambientes mais seguros. Foram mais relatadas a implementação/alteração de protocolos e a educação continuada. Os protocolos são elaborados para tornar mais eficiente o processo de trabalho, uniformizando a assistência(19).

Entre as sugestões para prevenir a ocorrência de EA, a educação continuada foi mencionada como a principal medida e como uma ação importante para formação e desenvolvimento de recursos humanos. A equipe de enfermagem de uma unidade de hemodiálise deve desenvolver competências para detectar e prevenir EA, adotando estratégias de melhoria dos processos de cuidado desenvolvidos na prática diária(20). A educação continuada deve ser considerada como parte de uma política global de qualificação dos profissionais de sáude, focada nas necessidades de mudanças da prática e na melhoria da qualidade do cuidado.

CONCLUSÃO

O estudo possibilitou a análise do conhecimento dos profissionais da equipe de Enfermagem de uma unidade de hemodiálise sobre a ocorrência de EA, seus fatores causais, condutas adotadas e medidas de prevenção desses eventos.

A análise permitiu observar que muitos profissionais não souberam definir EA, porém é importante que a equipe de Enfermagem possua conhecimento sobre este problema, para desenvolver competências para os detectar e prevenir. A falta de conhecimento pode ser solucionada por meio de ações rápidas e de baixo custo de divulgação de conceitos e informações em relação ao gerenciamento de risco.

Os relatos feitos sobre a ocorrência de EA apontam fragilidades no desenvolvimento do processo de cuidado na unidade de hemodiálise, seja por fatores causais individuais ou sistêmicos, colocando em risco a vida dos pacientes.

Este estudo contribuiu para uma análise crítica por parte dos profissionais da Unidade quanto a estrutura e os processos realizados, assim como a qualidade do cuidado prestado e tem estimulado na adoção de medidas para minimizar os EA, como notificações, mudanças nos processos, entre outras. No entanto, é contínua a necessidade de investigações, notificações e análises das ocorrências que auxiliem no planejamento de intervenções pró-ativas, com a construção de barreiras de defesa para prevenção de EA, capazes de proporcionar uma assistência de qualidade e livre de danos aos pacientes.

Recebido: 01/04/2012

Aprovado: 16/06/2012

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  • Correspondência:
    Maiana Regina Gomes de Sousa
    Rua 6-A, n. 25, Qd. 63, Lt. 3/60 – Bloco C – Apto. 303 - Condomínio Residencial Alameda das Rosas - Setor Oeste
    CEP 74115-080 – Goiânia, GO, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Mar 2013
    • Data do Fascículo
      Fev 2013

    Histórico

    • Recebido
      01 Abr 2012
    • Aceito
      16 Jun 2012
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