Acessibilidade / Reportar erro

Correlação entre sintomas depressivos e qualidade de vida de usuários de substâncias psicoativas

Resumos

Objetivos: Avaliar a correlação entre a presença de sintomas depressivos e a qualidade de vida em usuários de substâncias psicoativas dos Centros de Atenção Psicossocial de Mato Grosso. Método: Estudo transversal analítico, realizado nos Centros de Atenção Psicossocial, com 109 usuários. Foram utilizados os instrumentos Medical Outcomes Study 36, Inventário de Depressão de Beck, variáveis sociodemográficas e do uso de substâncias psicoativas. Foi realizada a análise de Tukey e correlação de Spearman com nível de significância de α<0,05. Resultados: Os domínios mais afetados da qualidade de vida foram aspectos emocionais, sociais e de saúde mental, além de forte correlação entre sintomas depressivos e qualidade de vida. Conclusão: O uso de substâncias psicoativas e a presença de sintomas interferem significativamente na vida dos usuários, o que pode comprometer a motivação para o tratamento, afetando negativamente a qualidade de vida desta população.



Transtornos relacionados ao uso de substâncias; Depressão; Qualidade de vida; Serviços de Saúde Mental; Enfermagem psiquiátrica


Objectives: To evaluate the correlation between the presence of depressive symptoms and quality of life in users of psychoactive substances from Psychosocial Attention Centers in Mato Grosso. Method: A cross-sectional analytical study, conducted in Psychosocial Attention Centers, with 109 users. The instruments used were: Medical Outcomes Study 36, Beck Depression Inventory, socio-demographic variables and the use of psychoactive substances. A Tukey analysis and a Spearman correlation were conducted with a significance level of α<0,05. Results: The most affected domains of quality of life were emotional, social and mental health aspects, besides the strong correlation between depressive symptoms and quality of life. Conclusion: The use of psychoactive substances and the presence of symptoms significantly interfere in the life of users, which can compromise the motivation to the treatment, negatively affecting the quality of life in this population.



Substance-related disorders; Depression; Quality of life; Mental Health Services; Psychiatric nursing


Objetivo: Evaluar la relación de los síntomas depresivos y la calidad de vida en los usuarios de sustancias psicoactivas de los Centros de Atención Psicosocial de Mato Grosso. Método: Estudio transversal analítico realizado en los Centros de Atención Psicosocial con 109 usuarios. Se utilizaron los Instrumentos: Medical Outcomes Study 36, el Inventario de Depresión de Beck, de variables sociodemográficas y del uso de sustancias psicoactivas. Se realizó el análisis de Tukey y la correlación de Spearman con nivel de significancia de α<0,05. Resultados: Los dominios más afectados de la calidad de vida fueron los aspectos emocionales, sociales y de salud mental, además de una fuerte correlación entre los síntomas depresivos y la calidad de vida. Conclusión: El uso de sustancias psicoactivas y la presencia de síntomas depresivos interfieren significativamente en la vida de los usuarios, lo que puede comprometer la motivación para el tratamiento, afectando negativamente la calidad de vida de esta población.


Trastornos relacionados con sustancias; Depresión; Calidad de vida; Servicios de Salud Mental; Enfermería psiquiátrica


Introdução

Durante muito tempo, o comportamento do uso abusivo de substâncias que alteram o funcionamento cerebral causando modificações no estado mental, denominadas substâncias psicoativas (SPA), foi tratado com ações punitivas por ser considerado falha moral ou falta de força de vontade(101 1. Jesus CF, Rezende MM. Dirigentes de instituições que assistem dependentes químicos no Vale do Paraíba. Estud Psicol (Campinas). [Internet]. 2008 [citado 2013 ago. 22];25(4):499-507. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v25n4/a04v25n4.pdf
http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v25n4/a0...
). Entretanto, nas últimas duas décadas, com o progressivo desenvolvimento dos estudos científicos, a abordagem começou a ser realizada de forma preventiva e terapêutica, por ser compreendida como um sério problema de saúde, que afeta diversas áreas da vida do indivíduo, com repercussões diretas ou indiretas na qualidade de vida (QV)(202 2.Moreira TC, Figueiró LR, Fernandes S, Justo DM, Dias IR, Barros HMT, et al. Quality of life of users of psychoactive substances, relatives, and non-users assessed using the WHOQOL- BREF. Ciên Saúde Coletiva [Internet]. 2013 [cited 2014 Jan 12];18(7):1953-62. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n7/10.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n7/10.pd...

03 3.Millson PE, Challacombe L, Villeneuve PJ, Fischer B, Strike CJ, Myers T, et al. Self-perceived health among Canadian opiate users: a comparison to the general population and to other chronic disease populations. Can J Public Health. 2004;95(2):99-103
-404 4.Costenbader EC, Zule WA, Coomes CM. The impact of illicit drug use and harmful drinking on quality of life among injection drug users at high risk for hepatitis C infection. Drug Alcohol Depend. 2007;89(2-3):251-58).

A QV refere-se à percepção individual subjetiva dos diversos aspectos que envolvem capacidade física, habilidade funcional, aspecto emocional, social e econômico, função intelectual e percepção do estado geral de saúde(505 5.Blay SL, Marchesoni MSM. Association among physical, psychiatric and socioeconomic conditions and WHOQOL-Bref scores. Cad Saúde Pública. 2011;27(4):677-86).

Internacionalmente e no Brasil, diferentes instrumentos têm sido utilizados para avaliar a QV nas mais diferenciadas populações. Entre eles, o MOS SF-36 (The Medical Outcomes Studies 36-Item Short-Form), que avalia a QV relacionada à saúde, traduzido e validado no Brasil em 1997(606 6.Ciconelli RM, Ferraz MB, Santos W, Meinão I, Quaresma MR. Tradução para a língua portuguesa e validação do questionário genérico de avaliação da qualidade de vida SF-36 (Brasil SF-36). Rev Bras Reumatol. 1999;39(3):143-50), e o WHOQOL (World Health Organization Quality of Life) elaborado pela Organização Mundial da Saúde para avaliar a QV geral(707 7.Fleck MPA, Leal OF, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, et al. Desenvolvimento da versão em português do instrumento de avaliação de qualidade de vida da OMS (WHOQOL-100). Rev Bras Psiquiatr. 1999;21(1):19-28).

Deste modo, diante da proliferação de investigações sobre QV a partir da década de 1980, um estudo realizado para descrever o perfil destas publicações no Brasil evidenciou a realização e aplicabilidade destes instrumentos em diferentes populações, com pacientes idosos, pacientes com doenças crônicas, mas poucos estudos foram encontrados investigando usuários de SPA(808 8.Neves EB, Krueger E, Pietrovski EF, Teixeira ACM, Araujo MR, Scheeren EM. Perfil das publicações sobre qualidade de vida no SciELO. Rev Uniandrade. 2011;12(2):147-61).

O uso de SPA interfere negativamente na QV do usuário afetando diretamente os aspectos psicológicos, ambientais e de auto avaliação física(202 2.Moreira TC, Figueiró LR, Fernandes S, Justo DM, Dias IR, Barros HMT, et al. Quality of life of users of psychoactive substances, relatives, and non-users assessed using the WHOQOL- BREF. Ciên Saúde Coletiva [Internet]. 2013 [cited 2014 Jan 12];18(7):1953-62. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n7/10.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n7/10.pd...
). Acrescenta-se ainda a alta prevalência de transtornos psiquiátricos nessa população, confirmando que o uso crônico das SPA pode se constituir em fator desencadeante ou consequente de quadros psiquiátricos, principalmente relacionados aos transtornos do humor e estados depressivos(909 9.Scheffer M, Pasa GG, Almeida RMM. Dependência de álcool, cocaína e crack e transtornos psiquiátricos. Psicol Teoria Pesq. 2010;26(3):533-41).

Embora a literatura científica tenha discutido os danos decorrentes do uso de SPA(1010.Facundo FRG, Pedrão LJ. Personal and interpersonal risk factors in the consumption of illicit drugs by marginal adolescents and young people from juvenile gang. Rev Latino Am Enferm. 2008;16(3):368-74

11.Bastos FI, Bertoni N, Hacker MA. Drug and alcohol use: main findings of a national survey, Brazil 2005. Rev Saúde Pública 2008;42 Supl 1:109-17
-1212.Jungerman FS, Lararanjeira R, Bressan RA. Maconha: qual a amplitude de seus prejuízos? Rev Bras Psiquiatr. 2005;27(1):5-6), estudos sobre o uso dessas e a QV têm sido realizados internacionalmente, em sua maioria entre usuários de drogas injetáveis, opioides e/ou em programas de substituição (metadona), constatando que o uso afeta a QV, com maior prejuízo para os aspectos emocionais, de saúde mental e de funcionamento social(303 3.Millson PE, Challacombe L, Villeneuve PJ, Fischer B, Strike CJ, Myers T, et al. Self-perceived health among Canadian opiate users: a comparison to the general population and to other chronic disease populations. Can J Public Health. 2004;95(2):99-103-404 4.Costenbader EC, Zule WA, Coomes CM. The impact of illicit drug use and harmful drinking on quality of life among injection drug users at high risk for hepatitis C infection. Drug Alcohol Depend. 2007;89(2-3):251-58,1313.Dalgard O, Egeland A, Skaug K, Vilimas K, Steen T. Health-related quality of life in active injecting drug users with and without chronic hepatitis C virus infection. Hepatology. 2004;39(1):74-80).

No Brasil, estudos com essa população ainda são escassos, principalmente no que se refere em correlacionar o uso da SPA, QV e depressão entre usuários em geral, bem como em usuários em tratamento nos Centros de Atenção Psicossocial para álcool e outras drogas (CAPS ad). Este fato é reiterado pelo estudo que investigou a produção científica sobre os CAPS no período de 1998 a 2008, evidenciando uma lacuna quanto aos usuários de SPA e, dentre os existentes, a maioria (73,9%) foi realizada nas regiões sul e sudeste, levantando a necessidade de estudos nas demais regiões do Brasil(1414.Cordeiro LRO, Oliveira MS, Souza RC. The scientific production of Psychosocial Care Centers. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2012 [cited 2014 Jan 22];46(1):119-23. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v46n1/en_v46n1a16.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v46n1/en...
).

Considerando que a dependência química traz inúmeros prejuízos em todas as esferas na vida do indivíduo(1010.Facundo FRG, Pedrão LJ. Personal and interpersonal risk factors in the consumption of illicit drugs by marginal adolescents and young people from juvenile gang. Rev Latino Am Enferm. 2008;16(3):368-74-1111.Bastos FI, Bertoni N, Hacker MA. Drug and alcohol use: main findings of a national survey, Brazil 2005. Rev Saúde Pública 2008;42 Supl 1:109-17), que a presença de comorbidade, como a depressão, pode agravar e dificultar o processo de recuperação, afetando diretamente a qualidade de vida e, ainda, que há escassez de dados sobre a temática na região centro-oeste, acreditamos que os resultados possam contribuir para a melhoria de estratégias políticas direcionadas ao atendimento desta população, visando a uma maior aderência ao tratamento.

Diante da hipótese de que os sintomas depressivos exercem um importante impacto na QV de usuários de SPA, este estudo objetiva avaliar a correlação entre a presença de sintomas depressivos e a qualidade de vida em usuários de substâncias psicoativas dos Centros de Atenção Psicossocial do estado de Mato Grosso.

Método

Aspectos éticos

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, sob o registro 0556/07 e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido dos participantes.

Desenho, local e período do estudo

Estudo transversal, observacional, descritivo e analítico, desenvolvido nos Centros de Atenção Psicossocial para Álcool e Outras Drogas (CAPS ad) de quatro Municípios do estado de Mato Grosso: Cuiabá/capital, Várzea Grande, Rondonópolis e Barra do Garças, no período de 2009 a 2011.

População e amostra

A população foi constituída por usuários em acompanhamento nos CAPS ad dos quatro municípios considerados. A amostra foi obtida pelo método de amostragem aleatória estratificada dos CAPS as, proporcional ao tamanho médio da população de usuários que se encontravam em tratamento nos CAPS ad nos últimos 10 meses. Assim, considerando uma confiança de 95%, um erro amostral de 5%, uma proporção de 0,5, e um aumento de 20% para as perdas, a amostra totalizou 109 usuários nos quatro CAPS ad.

Vale salientar que nesta população os usuários observados em determinado mês, também tinham a possibilidade de serem observados nos próximos meses. Por tal motivo, foi utilizado o número médio de indivíduos por mês, ao invés do número total em cada município, como é usual na prática de amostragem.

Critérios de inclusão: usuários com idade superior a 18 anos em uso de SPA ilícitas.

Procedimentos

A coleta de dados ocorreu após o teste piloto, que mostrou a aplicabilidade dos instrumentos. As entrevistas foram realizadas individualmente, em ambiente reservado, com tempo médio de 40 a 50 minutos por pesquisadores previamente treinados.

Foram utilizados três instrumentos: 1) Questionário composto por dados sociodemográficos e relativos ao uso de SPA na vida, atualmente e no primeiro uso; 2) QV por meio do Medical Outcomes Study 36 – Item Short-Form Health Survey(606 6.Ciconelli RM, Ferraz MB, Santos W, Meinão I, Quaresma MR. Tradução para a língua portuguesa e validação do questionário genérico de avaliação da qualidade de vida SF-36 (Brasil SF-36). Rev Bras Reumatol. 1999;39(3):143-50), instrumento multidimensional, que avalia a QV relacionada à saúde, traduzido, adaptado e validado no Brasil em 1997, composto por 36 itens, divididos em 8 escalas ou domínios: capacidade funcional; aspectos físicos; dor; estado geral de saúde; vitalidade; aspectos sociais; aspectos emocionais e saúde mental. Os escores variam de zero (pior estado de saúde) a 100 (melhor estado de saúde); 3) Inventário de Depressão de Beck(1515.Gorestein C, Andrade L. Inventário de depressão de Beck: propriedades psicométricas da versão em português. Rev Psiquiatr Clín (São Paulo). 1998;25(5):245-50) (IBD), que investiga a presença de sintomas depressivos. Escala composta por 21 itens, incluindo sintomas e atitudes em quatro graus de intensidade (0,1,2,3). Para definição do ponto de corte do estudo, consideraram-se, de acordo com a literatura, escores específicos para amostras não diagnosticadas com transtornos afetivos, segundo os quais os valores menores ou iguais a 15 classificavam os indivíduos como normais (sem a presença de sintomas); 16 a 20 disforia (mudanças repentinas e transitórias do estado de ânimo) e superiores a 20, sugestivos de depressão(1616.Leal EM, Godinho DPG, Mann R, Strike C, Brands B, Khenti A. Estudo de comorbidade: sofrimento psíquico e abuso de drogas em pessoas em centros de tratamento, Macaé – Brasil. Texto Contexto Enferm. 2012;21(n.esp):96-104).

Análise estatística dos resultados

O processamento dos dados foi realizado com os programas estatísticos Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 15.0 e o MINITAB versão 15. Utilizaram-se técnicas descritivas e inferências. Na parte descritiva foram consideradas porcentagens e medidas de posição e variação, e na parte inferencial foi utilizada a análise da variância múltipla. Para comparar a diferença entre as médias dos domínios utilizou-se o teste de comparações pareadas de Tukey e a correlação de Spearman, com um nível de significância de α<0,05, em ambas as técnicas.

Resultados

Observa-se na Tabela 1 a idade média dos usuários (29,8 anos), com predominância do sexo masculino (84,4%), estado civil solteiro (55,0%), a maioria possuía ensino fundamental completo (42,2%), e ocupação (66,1%).

Tabela 1
Tabela 1 – Distribuição, em número de porcentagem, das características sociodemográficas de usuários de substâncias psicoativas, CAPS ad. – Mato Grosso, 2011

Os dados da Tabela 2 mostram as SPA mais utilizadas na vida: maconha (85,3%), seguida de pasta-base (77,0%) e cocaína (70,6%). Em relação ao uso atual, a pasta-base (31,2%), seguida de maconha (30,3%) e cocaína (8,3%) foram as mais utilizadas. A primeira droga de uso na vida foi a maconha (74,3%).

Tabela 2
Tabela 2 – Distribuição, em número de porcentagem, do tipo de SPA utilizada na vida, atualmente e no primeiro uso entre os usuários de SPA CAPS ad. – Mato Grosso, 2011

Os menores escores observados foram nos domínios do aspecto emocional e os maiores na capacidade funcional. Para verificar se as médias dos domínios do SF36 eram estatisticamente diferentes, foi utilizada uma análise da variância multivariada (ANOVA). Dessa análise, verificou-se que existe diferença estatística entre as médias dos escores do SF36 (p<0,001). Para verificar quais médias eram diferentes, foi realizada uma comparação múltipla pelo método de Tukey, e as letras diferentes da coluna 2, Tabela 3, indicam que os domínios são estatisticamente diferentes ao nível de 5%.

Tabela 3
Tabela 3 – Estatística descritiva dos domínios do SF-36 dos usuários de SPA, CAPS ad. – Mato Grosso, 2011

Em relação à presença de sintomas depressivos observou-se que 37,6% dos usuários, apresentaram ponto de corte sugestivo de depressão e 12,8% sintomas de disforia (Tabela 4).

Na Tabela 5 podemos observar forte correlação entre o BDI e o SF36 para todos os domínios (p-valores<0,05), sendo a vitalidade e saúde mental os que mais se sobressaíram.

Tabela 4
Tabela 4 – Estatística descritiva do Inventário de Depressão de Beck (BDI) dos usuários de SPA., CAPS ad. – Mato Grosso, 2011

Tabela 5
Tabela 5 – Coeficientes de correlação de Spearman entre os domínios do SF-36 e o BDI, CAPS ad. – Mato Grosso, 2011

Discussão

Os achados do presente estudo, em relação à idade média dos usuários, assemelham-se às médias obtidas em outros estudos, assim como a alta prevalência do uso de SPA entre os usuários do sexo masculino(1111.Bastos FI, Bertoni N, Hacker MA. Drug and alcohol use: main findings of a national survey, Brazil 2005. Rev Saúde Pública 2008;42 Supl 1:109-17,1616.Leal EM, Godinho DPG, Mann R, Strike C, Brands B, Khenti A. Estudo de comorbidade: sofrimento psíquico e abuso de drogas em pessoas em centros de tratamento, Macaé – Brasil. Texto Contexto Enferm. 2012;21(n.esp):96-104). A análise dos padrões de consumo de álcool e drogas em uma amostra representativa da população urbana brasileira demonstrou uma diferença significativa em algum momento da vida no sexo masculino em relação ao feminino(1111.Bastos FI, Bertoni N, Hacker MA. Drug and alcohol use: main findings of a national survey, Brazil 2005. Rev Saúde Pública 2008;42 Supl 1:109-17). Neste contexto, estudos sobre prevalência e incidência do uso de SPA, embora com divergências nos padrões de consumo entre os países, costumam relatar que o sexo masculino se destaca como o maior consumidor(1717.Sousa FSP, Oliveira EN. Caracterização das internações de dependentes químicos em Unidade de Internação Psiquiátrica de Hospital Geral. Ciênc Saúde Coletiva. 2010;15(3):671-7).

Embora seja presente um preconceito social em relação a qualquer dependência de substância, a mulher ainda é mais estigmatizada do que o homem. A ela são atribuídos estereótipos de maior agressividade, tendência à promiscuidade e a falhas no cumprimento do papel familiar. Apesar de todas as mudanças nos papéis sociais de homens e mulheres, esse estereótipo ainda é presente, dificultando o acesso dessas ao tratamento. Desta forma, as mulheres geralmente estão sub-representadas nos centros terapêuticos(1818.Hochgraf PB, Brasiliano S. Mulheres e substâncias psicoativas. In: Seibel SD, organizador. Dependência de drogas. 2ª edição. São Paulo: Atheneu; 2010. p.1025-42).

Em nossa amostra, quanto ao estado civil, os solteiros e separados formaram um percentual de 65,14%, ou seja, uma grande proporção relatou não ter um companheiro ou uma relação estável. Estudo desenvolvido demonstrando os fatores de risco para o consumo de drogas, especialmente o consumo abusivo, enfatizou que dentre outras variáveis, a situação conjugal foi um importante aspecto a ser considerado(1919.Medina MG, Santos DN, Almeida Filho NM, Barqueiro CC. Epidemiologia do consumo de substâncias psicoativas. In: Seibel SD, organizador. Dependência de drogas. 2ª edição. São Paulo: Atheneu; 2010. p.71-98), fato reafirmado em investigação da dependência do tabaco e QV, na qual, dentre os problemas sociais, os relacionados aos cônjuges sobressaíram-se aos demais(2020.Portugal FB, Correa APM, Siqueira MM. Alcoolismo e comorbidade em um programa de assistência aos dependentes de álcool. SMAD Rev Eletr Saúde Mental Álcool Drog [Internet]. 2010 [citado 2014 jan. 17];6(1):1-13. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/smad/v6n1/06.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/smad/v6n1/...
).

Esses achados permitem levantar a hipótese de que o usuário de SPA tem maior dificuldade em manter um relacionamento conjugal estável, em consequência do comportamento desencadeado pelo uso, desestabilizando as relações afetivas. Essa situação se fundamenta na medida em que os cônjuges convivem em um ambiente permeado de conflitos, ameaças, desqualificação e ciúmes, acarretando distanciamento e desesperança(2121.Santos ECV, Martin E. Cuidadoras de pacientes alcoolistas no município de Santos, SP, Brasil. Rev Bras Enferm. 2009;6(2):194-99). É válido ressaltar que um estudo entre cuidadores de dependentes químicos, realizado no estado de Mato Grosso em 2010, visando avaliar a sobrecarga do cuidado, encontrou que a maioria das cuidadoras eram esposas, e que essas apresentavam sintomas depressivos, sendo a falta de interesse sexual o fator que mais contribuiu para este quadro(2222.Marcon SR, Rubira EA, Espinosa MM, Barbosa DA. Quality of life and depressive symptoms among caregivers and drug dependent people. Rev Latino Am Enferm. 2012;20(1):167-74), confirmando a dificuldade na convivência com esta situação adversa.

De acordo com o grau de instrução, houve uma predominância de usuários que possuíam apenas o ensino fundamental completo. A baixa escolaridade entre os usuários de SPA pode ser atribuída, entre outros fatores, à falta de motivação e à descontinuidade de investimentos em educação, interrompendo de forma precoce as atividades escolares. Estudos evidenciam que o baixo rendimento escolar associa-se com o uso pesado de álcool, e acrescentam-se aqui outras drogas, podendo ocorrer alterações neuropsicológicas com prejuízo na aprendizagem, acarretando baixo desempenho, levando à baixa autoestima e à descontinuidade das atividades acadêmicas(1919.Medina MG, Santos DN, Almeida Filho NM, Barqueiro CC. Epidemiologia do consumo de substâncias psicoativas. In: Seibel SD, organizador. Dependência de drogas. 2ª edição. São Paulo: Atheneu; 2010. p.71-98).

A baixa escolaridade, aliada ao fato de um terço da população do estudo ter referido nenhuma ocupação no momento da pesquisa, chama a atenção para a falta de qualificação profissional e a baixa inserção no mercado de trabalho, interferindo na perspectiva de reinserção social.

Em relação as SPA, os inalantes (denominados solventes, como loló, lança-perfume e outras) são as substâncias mais utilizadas no Brasil. Porém, no sul do país a maconha assume essa posição(1919.Medina MG, Santos DN, Almeida Filho NM, Barqueiro CC. Epidemiologia do consumo de substâncias psicoativas. In: Seibel SD, organizador. Dependência de drogas. 2ª edição. São Paulo: Atheneu; 2010. p.71-98), fato este evidenciado neste estudo em que a maior proporção de usuários referiu a maconha como a SPA mais utilizada. Estudo realizado no Rio de Janeiro-RJ, corrobora esse achado, apontando a maconha como a droga ilícita mais utilizada, com prevalência de 77,8%, seguida do crack/cocaína, com 58,6%(2323.Vargens OMC, Brands B. Use of illicit drugs and critical perspectives of drug users’ relatives and acquaintances in Northern Rio de Janeiro (City), Brazil. Rev Latino Am Enferm. 2009;17(n.spe):776-82). O fácil acesso à droga, bem como o baixo custo e, ainda, o fato de ser a maconha considerada uma droga menos agressiva e com menos estigma social, podem contribuir para o aumento do uso.

Um estudo discutindo a amplitude do prejuízo do uso da maconha evidenciou que entre os que experimentam a substância em média 10% se tornarão usuários diários e 20 a 30% irão consumir semanalmente(1212.Jungerman FS, Lararanjeira R, Bressan RA. Maconha: qual a amplitude de seus prejuízos? Rev Bras Psiquiatr. 2005;27(1):5-6). Embora as alterações cerebrais decorrentes do uso da maconha sejam mais sutis quando comparadas com outras SPA, não significa que elas não existam e não sejam relevantes. Deste modo, considerando que o consumo pode acarretar prejuízos, dentre eles os transtornos mentais(1212.Jungerman FS, Lararanjeira R, Bressan RA. Maconha: qual a amplitude de seus prejuízos? Rev Bras Psiquiatr. 2005;27(1):5-6), o assunto é particularmente importante para a equipe de saúde mental no planejamento e na implementação do cuidado.

No presente estudo, a pasta-base foi a segunda SPA mais utilizada na vida, aparecendo em primeiro lugar, para o uso atual, entre os usuários em tratamento. A pasta básica de cocaína (PBC) é comum nas regiões norte e centro-oeste brasileiro, sendo preparada de modo artesanal, em laboratórios improvisados principalmente para manter o seu baixo custo. A ela são adicionadas várias substâncias tóxicas, o que provoca uma adulteração da droga com alta concentração desses produtos(2424.Seibel SD. Cocaína e crack. In: Seibel SD, organizador. Dependência de drogas. 2ª edição. São Paulo: Atheneu; 2010. p. 217-30), expondo os usuários aos mais diferenciados prejuízos orgânicos e psíquicos.

Vale ressaltar que os usuários relataram a continuidade do uso de SPA durante a coleta de dados. Tal situação pode estar relacionada ao fato de que a atual Política assumida pelos CAPS ad, de Redução de Danos, não prioriza a abstinência total como premissa básica para o tratamento no serviço. Nessa perspectiva, os resultados são buscados em longo prazo, a abstinência é uma consequência e a atenção é focada nos prejuízos da droga e não na droga em si. Desta maneira, acredita-se que haja maior incentivo para o tratamento, além de possibilitar uma postura ativa do usuário quanto à continuidade do uso ou não, ou seja, sua auto-responsabilização no processo terapêutico.

Os resultados relacionados à primeira droga utilizada na vida permitem inferir que, à semelhança de outras investigações, neste estudo houve a predominância da maconha. Pesquisa realizada em âmbito nacional no ano de 2008, apontou que 80,1% dos entrevistados utilizaram maconha na primeira vez em que consumiram SPA, sendo essa em 79,6% obtida com amigos, parentes ou conhecidos(1111.Bastos FI, Bertoni N, Hacker MA. Drug and alcohol use: main findings of a national survey, Brazil 2005. Rev Saúde Pública 2008;42 Supl 1:109-17). O uso inicial de qualquer SPA visa a aspectos como aceitação pelo grupo social, desafio às normas, vontade de sentir os efeitos da substância, dentre outros. Independentemente do motivo do uso, o início normalmente tem ocorrido na adolescência, o que intensifica a demanda por programas preventivos para esta faixa etária(2525.Gabatz RIB, Schmidt AL, Terra MG, Padoin SMM, Silva AA, Lacchini AJB. Percepção dos usuários de crack em relação ao uso e tratamento. Rev Gaúcha Enferm. 2013;34(1):140-6) com vistas a reduzir os malefícios do uso precoce, proporcionando melhores condições de QV.

O uso de SPA e a QV têm sido discutidos, em sua maioria, em estudos americanos que mostram entre os usuários de SPA escores de QV inferiores, quando comparados com a população em geral e com outros pacientes portadores de doenças crônicas(404 4.Costenbader EC, Zule WA, Coomes CM. The impact of illicit drug use and harmful drinking on quality of life among injection drug users at high risk for hepatitis C infection. Drug Alcohol Depend. 2007;89(2-3):251-58,1313.Dalgard O, Egeland A, Skaug K, Vilimas K, Steen T. Health-related quality of life in active injecting drug users with and without chronic hepatitis C virus infection. Hepatology. 2004;39(1):74-80).

No Brasil os resultados não são diferentes. Um estudo realizado em Pelotas-RS verificou uma associação significativa entre os menores escores de QV e o uso de álcool e/ou outras drogas. Em nossa população de estudo, os escores de QV foram consideravelmente inferiores aos escores de QV da população geral daquele município(2626.Jansen K, Mondin TC, Ores LC, Souza LD, Konradt CE, Pinheiro RT, et al. Mental common disorders and quality of life in young adulthoods: a population-based sample in Pelotas, Rio Grande do Sul State, Brazil. Cad Saúde Pública. 2011;27(3):440-8), o que reforça a influência negativa do uso das SPA na percepção subjetiva da QV.

Considerando que a QV é subjetiva e deve ser aferida por meio de diferentes domínios, neste estudo, os domínios mais comprometidos foram os aspectos emocionais, mentais e sociais. Resultados semelhantes foram obtidos em investigação no Canadá, comparando a QV de pacientes em condições médicas graves e usuários de opiáceos em um programa de substituição. O estudo evidenciou menores escores entre os usuários de opiáceos, principalmente para os aspectos sociais, emocionais, energia e vitalidade e, ainda, limitações decorrentes de transtornos mentais(303 3.Millson PE, Challacombe L, Villeneuve PJ, Fischer B, Strike CJ, Myers T, et al. Self-perceived health among Canadian opiate users: a comparison to the general population and to other chronic disease populations. Can J Public Health. 2004;95(2):99-103).

Na última década, a ocorrência de transtornos mentais e uso de SPA tem sido largamente reconhecida na clínica psiquiátrica, com destaque para os sintomas depressivos(2727.Zaleski M, Laranjeira RR, Marques ACPR, Ratto L, Romano M, Alves HNP, et al. Diretrizes da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (ABEAD) para o diagnóstico e tratamento de comorbidades psiquiátricas e dependência de álcool e outras substâncias. Rev Bras Psiquiatr. 2006;28(2):142-8). Assim, os sintomas depressivos evidenciados em mais de um terço da amostra do presente estudo vão ao encontro dos achados obtidos com essa população, em que os percentuais foram de 35,0%(1919.Medina MG, Santos DN, Almeida Filho NM, Barqueiro CC. Epidemiologia do consumo de substâncias psicoativas. In: Seibel SD, organizador. Dependência de drogas. 2ª edição. São Paulo: Atheneu; 2010. p.71-98) e variação de 30 a 50,0%, respectivamente(2727.Zaleski M, Laranjeira RR, Marques ACPR, Ratto L, Romano M, Alves HNP, et al. Diretrizes da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (ABEAD) para o diagnóstico e tratamento de comorbidades psiquiátricas e dependência de álcool e outras substâncias. Rev Bras Psiquiatr. 2006;28(2):142-8).

Os sintomas depressivos têm sido os mais estudados dentre os transtornos psiquiátricos em relação à qualidade de vida(2828.Lima AFBS, Fleck MPA. Qualidade de vida e depressão: uma revisão da literatura. Rev Psiquiatr Rio Gd Sul [Internet]. 2009 [citado em 25 de abril de 2014];31(3 Supl). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v31n3a02s1.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v3...
), e no presente estudo observou-se uma forte correlação entre os sintomas depressivos e todos os domínios da QV. Essa correlação acarreta o declínio da QV dos usuários na medida em que a depressão aumenta a sensação de dor, a incapacidade funcional, diminui a qualidade das relações sociais, além de tornar a adesão ao tratamento mais difícil(2929.Couto ER, Couto E, Vian B, Gregório Z, Nomura ML, Zaccaria R, et al. Quality of life, depression and anxiety among pregnant women with previous adverse pregnancy outcomes. São Paulo Med J. 2009;127(4):185-9).

Observamos que os domínios mais fortemente correlacionados com os sintomas depressivos foram a saúde mental, que envolve alterações psíquicas, assim como sentimentos de tristeza, ansiedade e outros, e o domínio de vitalidade, que se refere à energia para as atividades rotineiras, disposição e relação com a vontade de transformar decisões em ações. Esta identificação permite o planejamento de estratégias mais direcionadas com enfoque nas necessidades individuais, com vistas a facilitar a adesão ao tratamento e a recuperação, proporcionando a retomada de atividades de cuidado com o corpo, lazer, atividades sociais e outras.

Vale enfatizar que, embora a literatura evidencie a correlação entre a depressão e QV, atualmente, tem sido discutido se os conceitos de QV e depressão são sobrepostos ou distintos(2828.Lima AFBS, Fleck MPA. Qualidade de vida e depressão: uma revisão da literatura. Rev Psiquiatr Rio Gd Sul [Internet]. 2009 [citado em 25 de abril de 2014];31(3 Supl). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v31n3a02s1.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v3...
), em decorrência de ambos se basearem em um modelo teórico de bem-estar, de que a depressão pode causar influência negativa na percepção da QV e, ainda, de que a QV avalia aspectos psicopatológicos, como sintomas depressivos(2828.Lima AFBS, Fleck MPA. Qualidade de vida e depressão: uma revisão da literatura. Rev Psiquiatr Rio Gd Sul [Internet]. 2009 [citado em 25 de abril de 2014];31(3 Supl). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v31n3a02s1.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v3...
,3030.Aigner M, Forster-Streffleur S, Prause W, Freidl M, Weiss M, Bach M. What does the WHOQOL-Bref measure? Measurement overlap between quality of life and depressive symptomatology in chronic somatoform pain disorder. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2006;41(1):81-6).

Por outro lado, existem evidências de que a QV dos indivíduos deprimidos não está somente associada à presença de sintomas depressivos, mas também a diferentes variáveis psicossociais, o que sugere que depressão e QV são conceitos correlacionados, porém distintos(3030.Aigner M, Forster-Streffleur S, Prause W, Freidl M, Weiss M, Bach M. What does the WHOQOL-Bref measure? Measurement overlap between quality of life and depressive symptomatology in chronic somatoform pain disorder. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2006;41(1):81-6).

Mesmo diante das questões referentes a este tema que ainda permanecerem inconclusivas, há um consenso na literatura de que a associação entre depressão e qualidade de vida representa um impacto na vida dos indivíduos, sendo relevante a compreensão da aplicabilidade do conceito de qualidade de vida no cuidado à saúde, assim como das limitações metodológicas envolvidas no estudo dessa medida(2828.Lima AFBS, Fleck MPA. Qualidade de vida e depressão: uma revisão da literatura. Rev Psiquiatr Rio Gd Sul [Internet]. 2009 [citado em 25 de abril de 2014];31(3 Supl). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v31n3a02s1.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v3...
).

Os dados obtidos no estudo reafirmam a hipótese de que a presença de sintomas depressivos exerce um importante impacto na qualidade de vida dos indivíduos. Sendo assim, a avaliação da qualidade de vida aparece como um desfecho relevante, pois pela sua multidimensionalidade é potencialmente capaz de detectar a magnitude e a abrangência do comprometimento que a depressão impõe(2828.Lima AFBS, Fleck MPA. Qualidade de vida e depressão: uma revisão da literatura. Rev Psiquiatr Rio Gd Sul [Internet]. 2009 [citado em 25 de abril de 2014];31(3 Supl). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v31n3a02s1.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v3...
).

Vale ressaltar que o desenho do estudo não permite o estabelecimento de relações causais. Portanto, estudos longitudinais podem ser realizados para que possam estabelecer com maior clareza a relação entre depressão e QV.

Os achados do estudo reafirmam a necessidade de esforços entre a equipe multiprofissional, tanto para a avaliação integral do usuário, como para a elucidação diagnóstica, visando à instituição das terapêuticas adequadas para suprimir os sintomas e melhorar a QV.

É importante ressaltar que no Brasil, e mais especificamente no estado de Mato Grosso, a realização de estudos em serviços de atenção a usuários de SPA utilizando escalas de avaliação traduzidas e validadas são escassos. Portanto, algumas limitações devem ser consideradas, como o levantamento bibliográfico que mostrou um número reduzido de trabalhos realizados com esse instrumento, para esta população, e dentre os poucos estudos encontrados, a maioria eram internacionais, dificultando a comparação com nossa população por tratar-se de outra realidade. Por esse motivo, buscaram-se estudos com usuários de SPA com as mais diferenciadas metodologias, a fim de obter um parâmetro para análise dos dados.

Conclusão

Foram encontrados escores que indicam o comprometimento da QV dos usuários de SPA, assim como uma forte correlação com sintomas depressivos. Esses dados contribuem para o direcionamento de intervenções de enfermagem e da equipe multiprofissional, mostrando a necessidade de reconhecer precocemente os sintomas depressivos que comprometem a efetividade terapêutica, dificultam a adesão ao tratamento e afetam negativamente a QV de vida dos usuários. O reconhecimento desses sintomas, bem como a sua correlação com a QV, possibilita a implementação de ações direcionadas às necessidades individuais e coletivas dos usuários com consequente melhoria na QV.

References

  • 01
    1. Jesus CF, Rezende MM. Dirigentes de instituições que assistem dependentes químicos no Vale do Paraíba. Estud Psicol (Campinas). [Internet]. 2008 [citado 2013 ago. 22];25(4):499-507. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v25n4/a04v25n4.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v25n4/a04v25n4.pdf
  • 02
    2.Moreira TC, Figueiró LR, Fernandes S, Justo DM, Dias IR, Barros HMT, et al. Quality of life of users of psychoactive substances, relatives, and non-users assessed using the WHOQOL- BREF. Ciên Saúde Coletiva [Internet]. 2013 [cited 2014 Jan 12];18(7):1953-62. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n7/10.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n7/10.pdf
  • 03
    3.Millson PE, Challacombe L, Villeneuve PJ, Fischer B, Strike CJ, Myers T, et al. Self-perceived health among Canadian opiate users: a comparison to the general population and to other chronic disease populations. Can J Public Health. 2004;95(2):99-103
  • 04
    4.Costenbader EC, Zule WA, Coomes CM. The impact of illicit drug use and harmful drinking on quality of life among injection drug users at high risk for hepatitis C infection. Drug Alcohol Depend. 2007;89(2-3):251-58
  • 05
    5.Blay SL, Marchesoni MSM. Association among physical, psychiatric and socioeconomic conditions and WHOQOL-Bref scores. Cad Saúde Pública. 2011;27(4):677-86
  • 06
    6.Ciconelli RM, Ferraz MB, Santos W, Meinão I, Quaresma MR. Tradução para a língua portuguesa e validação do questionário genérico de avaliação da qualidade de vida SF-36 (Brasil SF-36). Rev Bras Reumatol. 1999;39(3):143-50
  • 07
    7.Fleck MPA, Leal OF, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, et al. Desenvolvimento da versão em português do instrumento de avaliação de qualidade de vida da OMS (WHOQOL-100). Rev Bras Psiquiatr. 1999;21(1):19-28
  • 08
    8.Neves EB, Krueger E, Pietrovski EF, Teixeira ACM, Araujo MR, Scheeren EM. Perfil das publicações sobre qualidade de vida no SciELO. Rev Uniandrade. 2011;12(2):147-61
  • 09
    9.Scheffer M, Pasa GG, Almeida RMM. Dependência de álcool, cocaína e crack e transtornos psiquiátricos. Psicol Teoria Pesq. 2010;26(3):533-41
  • 10
    Facundo FRG, Pedrão LJ. Personal and interpersonal risk factors in the consumption of illicit drugs by marginal adolescents and young people from juvenile gang. Rev Latino Am Enferm. 2008;16(3):368-74
  • 11
    Bastos FI, Bertoni N, Hacker MA. Drug and alcohol use: main findings of a national survey, Brazil 2005. Rev Saúde Pública 2008;42 Supl 1:109-17
  • 12
    Jungerman FS, Lararanjeira R, Bressan RA. Maconha: qual a amplitude de seus prejuízos? Rev Bras Psiquiatr. 2005;27(1):5-6
  • 13
    Dalgard O, Egeland A, Skaug K, Vilimas K, Steen T. Health-related quality of life in active injecting drug users with and without chronic hepatitis C virus infection. Hepatology. 2004;39(1):74-80
  • 14
    Cordeiro LRO, Oliveira MS, Souza RC. The scientific production of Psychosocial Care Centers. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2012 [cited 2014 Jan 22];46(1):119-23. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v46n1/en_v46n1a16.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v46n1/en_v46n1a16.pdf
  • 15
    Gorestein C, Andrade L. Inventário de depressão de Beck: propriedades psicométricas da versão em português. Rev Psiquiatr Clín (São Paulo). 1998;25(5):245-50
  • 16
    Leal EM, Godinho DPG, Mann R, Strike C, Brands B, Khenti A. Estudo de comorbidade: sofrimento psíquico e abuso de drogas em pessoas em centros de tratamento, Macaé – Brasil. Texto Contexto Enferm. 2012;21(n.esp):96-104
  • 17
    Sousa FSP, Oliveira EN. Caracterização das internações de dependentes químicos em Unidade de Internação Psiquiátrica de Hospital Geral. Ciênc Saúde Coletiva. 2010;15(3):671-7
  • 18
    Hochgraf PB, Brasiliano S. Mulheres e substâncias psicoativas. In: Seibel SD, organizador. Dependência de drogas. 2ª edição. São Paulo: Atheneu; 2010. p.1025-42
  • 19
    Medina MG, Santos DN, Almeida Filho NM, Barqueiro CC. Epidemiologia do consumo de substâncias psicoativas. In: Seibel SD, organizador. Dependência de drogas. 2ª edição. São Paulo: Atheneu; 2010. p.71-98
  • 20
    Portugal FB, Correa APM, Siqueira MM. Alcoolismo e comorbidade em um programa de assistência aos dependentes de álcool. SMAD Rev Eletr Saúde Mental Álcool Drog [Internet]. 2010 [citado 2014 jan. 17];6(1):1-13. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/smad/v6n1/06.pdf
    » http://pepsic.bvsalud.org/pdf/smad/v6n1/06.pdf
  • 21
    Santos ECV, Martin E. Cuidadoras de pacientes alcoolistas no município de Santos, SP, Brasil. Rev Bras Enferm. 2009;6(2):194-99
  • 22
    Marcon SR, Rubira EA, Espinosa MM, Barbosa DA. Quality of life and depressive symptoms among caregivers and drug dependent people. Rev Latino Am Enferm. 2012;20(1):167-74
  • 23
    Vargens OMC, Brands B. Use of illicit drugs and critical perspectives of drug users’ relatives and acquaintances in Northern Rio de Janeiro (City), Brazil. Rev Latino Am Enferm. 2009;17(n.spe):776-82
  • 24
    Seibel SD. Cocaína e crack. In: Seibel SD, organizador. Dependência de drogas. 2ª edição. São Paulo: Atheneu; 2010. p. 217-30
  • 25
    Gabatz RIB, Schmidt AL, Terra MG, Padoin SMM, Silva AA, Lacchini AJB. Percepção dos usuários de crack em relação ao uso e tratamento. Rev Gaúcha Enferm. 2013;34(1):140-6
  • 26
    Jansen K, Mondin TC, Ores LC, Souza LD, Konradt CE, Pinheiro RT, et al. Mental common disorders and quality of life in young adulthoods: a population-based sample in Pelotas, Rio Grande do Sul State, Brazil. Cad Saúde Pública. 2011;27(3):440-8
  • 27
    Zaleski M, Laranjeira RR, Marques ACPR, Ratto L, Romano M, Alves HNP, et al. Diretrizes da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (ABEAD) para o diagnóstico e tratamento de comorbidades psiquiátricas e dependência de álcool e outras substâncias. Rev Bras Psiquiatr. 2006;28(2):142-8
  • 28
    Lima AFBS, Fleck MPA. Qualidade de vida e depressão: uma revisão da literatura. Rev Psiquiatr Rio Gd Sul [Internet]. 2009 [citado em 25 de abril de 2014];31(3 Supl). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v31n3a02s1.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n3s0/v31n3a02s1.pdf
  • 29
    Couto ER, Couto E, Vian B, Gregório Z, Nomura ML, Zaccaria R, et al. Quality of life, depression and anxiety among pregnant women with previous adverse pregnancy outcomes. São Paulo Med J. 2009;127(4):185-9
  • 30
    Aigner M, Forster-Streffleur S, Prause W, Freidl M, Weiss M, Bach M. What does the WHOQOL-Bref measure? Measurement overlap between quality of life and depressive symptomatology in chronic somatoform pain disorder. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2006;41(1):81-6

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2014

Histórico

  • Recebido
    26 Jul 2013
  • Aceito
    16 Maio 2014
Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: reeusp@usp.br