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Dor, cicatrização e satisfação da mulher após reparo perineal com cola cirúrgica e fio de sutura

Resumo

OBJETIVO

Comparar a intensidade da dor, o processo de cicatrização e a satisfação da mulher com o reparo do trauma perineal no parto normal por meio de cola cirúrgica ou fio de sutura.

MÉTODO

Estudo transversal alinhado a um ensaio clínico realizado na maternidade de Itapecerica da Serra, São Paulo. A amostra foi constituída por mulheres que foram avaliadas entre 10 a 20 dias após o parto. Os desfechos foram analisados segundo a distribuição das mulheres no grupo experimental (GE: reparo perineal com cola cirúrgica Glubran-2®; n=55) e no grupo controle (GC: reparo perineal com fio Vicryl®; n=55).

RESULTADOS

Foram avaliadas 110 puérperas. Não houve diferença entre GE e GC quanto às características sociodemográficas e clínico-obstétricas. A intensidade da dor perineal, avaliada pela escala visual numérica, foi menor entre as mulheres do GE em comparação ao GC (p<0,001). Segundo a escala REEDA, não houve diferença significativa na cicatrização perineal (p=0,267) entre GE e GC. A satisfação das mulheres com o reparo perineal, avaliada por escala de cinco pontos, foi maior com o uso da cola cirúrgica (p=0,035).

CONCLUSÃO

A cola cirúrgica mostrou vantagens em relação à dor perineal e maior satisfação das mulheres comparada com o uso do fio de sutura. O processo de cicatrização foi similar nos dois tipos de reparo.

Descritores:
Enfermagem Obstétrica; Parto Normal; Períneo; Dor; Cicatrização; Cola

Abstract

OBJECTIVE

To compare the intensity of pain, the healing process and women’s satisfaction with the repair of perineal trauma during vaginal delivery using surgical glue or suture.

METHOD

Cross-sectional study aligned with a clinical trial conducted at a maternity in Itapecerica da Serra, São Paulo. The sample consisted of women who were evaluated between 10 and 20 days after delivery. The outcomes were analyzed according to the distribution of women in the experimental group (EG: perineal repair with Glubran-2® surgical glue; n=55) and in the control group (CG: perineal repair with Vicryl® suture thread; n=55).

RESULTS

110 puerperal women were evaluated. There was no difference between EG and CG regarding sociodemographic and clinical-obstetric characteristics. The intensity of perineal pain, assessed by the visual numeric scale was lower among women in the EG compared to the CG (p<0.001). According to the REEDA scale, there was no significant difference in perineal healing (p=0.267) between EG and CG. The satisfaction of women with perineal repair, assessed using a five-point scale, was higher with the use of surgical glue (p=0.035).

CONCLUSION

Surgical glue showed advantages in relation to perineal pain and greater satisfaction for women compared to the use of suture. The healing process was similar for both types of repair.

Descriptors
Obstetric Nursing; Natural Childbirth; Perineum; Pain; Wound Healing; Cola

Resumen

OBJETIVO

Comparar la intensidad del dolor, el proceso de cicatrización y la satisfacción de la mujer con la reparación del trauma perineal durante el parto normal utilizando pegamento quirúrgico o hilo de sutura.

MÉTODO

Estudio transversal anidado a un ensayo clínico realizado en el hospital-maternidad de Itapecerica da Serra, São Paulo. La muestra consistió en mujeres que fueron evaluadas entre 10 y 20 días después del parto. Los resultados se analizaron según la distribución de las mujeres en el grupo experimental (GE: reparación perineal con pegamento quirúrgico Glubran-2®; n=55) y en el grupo control (GC: reparación perineal con hilo Vicryl®; n=55).

RESULTADOS

Se evaluaron 110 mujeres en el postparto. No hubo diferencia entre GE y CG en cuanto a las características sociodemográficas y clínico-obstétricas. La intensidad del dolor perineal, evaluada mediante la escala numérica visual, fue menor entre las mujeres del GE en comparación con aquellas del GC (p<0,001). Según la escala REEDA, no hubo diferencias significativas en la cicatrización perineal (p=0,267) entre el GE y GC. La satisfacción de las mujeres con la reparación perineal, evaluada mediante una escala de cinco puntos, fue mayor con el uso de pegamento quirúrgico (p=0,035).

CONCLUSIÓN

El pegamento quirúrgico mostró ventajas con relación al dolor perineal y mayor satisfacción de las mujeres, en comparación con el hilo de sutura. El proceso de cicatrización fue similar para ambos tipos de reparación.

Descriptores
Enfermería Obstétrica; Parto Normal; Perineo; Dolor; Cicatrización de Heridas; Cola

Introdução

O trauma perineal ocorre com frequência no parto normal e está fortemente relacionado com morbidades de curto ou longo prazo. São comuns as complicações que ocorrem durante o processo de cicatrização do períneo desde as primeiras horas após o parto e até meses ou anos depois, como dor, edema, hiperemia, equimose, sangramento vaginal, infecção e deiscência, além de outras morbidades, como dispareunia, incontinência urinária (IU) e anal (IA) e diminuição da força muscular do assoalho pélvico (FMAP)11. Francisco AA, Kinjo MH, Bosco CS, Silva RL, Mendes EPB, Oliveira SMJV. Association between perineal trauma and pain in primiparous women. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(n.spe):39-44. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000600006
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2. Naidu M, Sultan AH, Thakar R. Reducing obstetric anal sphincter injuries using perineal support: our preliminary experience. Int Urogynecol J. 2017;28(3):381-9. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s00192-016-3176-4.
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-33. Paiva CSB, Oliveira SMJV, Francisco AA, Luana R, Mendes EPB, Steen M. Length of perineal pain relief after ice pack application: a quasi-experimental study. Women Birth. 2016;29(2):117-22. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.wombi.2015.09.002
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Uma publicação do Ministério da Saúde (MS) do Brasil apresenta que 71,6% das mulheres são submetidas a episiotomia durante o parto normal44. Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher [Internet]. Brasília; 2009 [citado 2018 set. 29]. Disponível em: http://www.bvsms.saude.gov.br/bvs/publicações/pnds_crianca_mulher.pdf
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. Inquérito nacional sobre o parto e nascimento relata que em 53,5% das mulheres foi realizada a episiotomia55. Leal MC, Pereira APE, Domingues RMSM, Theme Filha MM, Dias MAB, Pereira MN, et al. Obstetrician interventions during labor and childbirth in Brazilian low-risk women. Cad Saúde Pública. 2014;30 Supl.1:S17-32. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0102311X00151513
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. A frequência de traumas perineais varia internacionalmente, sobretudo em relação à episiotomia. Em países asiáticos, como China e Taiwan, sua taxa ultrapassa 82%, enquanto em países europeus, tais como Suécia, Dinamarca e Inglaterra, ela ocorre entre 9,7% e 13%66. Graham ID, Carroli G, Davies C, Medves JM. Episiotomy rates around the world: an update. Birth. 2005;32(3):219-23. DOI: https://doi.org/10.1111/j.0730-7659.2005.00373.x
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dos partos vaginais.

A dor perineal é uma das morbidades mais comuns que ocorrem no período puerperal, afetando cerca de um terço das primíparas após o parto normal, e está associada ao tempo de pós-parto e à presença de traumas locais. A presença de trauma perineal aumenta em cerca de três vezes a chance de se ter dor local nas primíparas comparada ao períneo íntegro11. Francisco AA, Kinjo MH, Bosco CS, Silva RL, Mendes EPB, Oliveira SMJV. Association between perineal trauma and pain in primiparous women. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(n.spe):39-44. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000600006
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. A dor pode ser avaliada por escalas e questionários como a Escala Visual Numérica (EVN) e a Escala Visual Analógica (EVA)77. Nilsen E, Sabatino H, Lopes MHBM. The pain and behavior of women during labor and the different positions for childbirth. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2011 [cited 2018 Oct 16];45(3):557-65. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0080-62342011000300002&lng=en&nrm=iso&tlng=en
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. Há recomendação para que seja avaliada antes, durante e após procedimentos e ou intervenções, atentando para sua localização, intensidade e sensação. O processo de cicatrização perineal pode ser avaliado após o parto por meio do instrumento de avaliação da cicatrização perineal REEDA (redness, edema, ecchymosis, discharge, approximation e que em português corresponde a hiperemia, edema, equimose, secreção e coaptação das bordas da incisão). Esse instrumento foi desenvolvido por Davidson, em 1970, e revisado posteriormente por Carey, em 1971, e Bolles, em 197288. Davidson N. REEDA: evaluating post partum healing. J Nurse Midwifery. 1974;19(2):6-8. DOI: https://doi.org/10.1111/j.1542-2011.1974.tb00384.x
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As morbidades que ocorrem no pós-parto também estão relacionadas com o tipo de reparo perineal. Há falta de padronização das técnicas e materiais utilizados, pois alguns realizam suturas contínuas ou interrompidas com fio categute ou poliglicólico 910, e outros optam por não suturar em algumas situações. Evidências atuais recomendam o uso da técnica de sutura contínua, pois há diminuição da dor e desconforto na região perineal, menor uso de anestésico durante o procedimento e melhora da cicatrização no 10º dia após o parto99. Kettle C, Dowswell T, Ismail KM. Continuous and interrupted suturing techniques for repair of episiotomy or second degree tears. Cochrane Database Syst Rev. 2012;(11):CD000947. DOI: http://dx.doi.org/10.1002/14651858.CD000947.pub3
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. Outras publicações também mostraram o aumento da satisfação da mulher1010. Brasil. Ministério da Saúde; Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS. Diretriz Nacional de Assistência ao Parto Normal [Internet]. Brasília; 2016 [citado 2018 set. 29]. Disponível em: http://conitec.gov.br/images/Consultas/2016/Relatorio_Diretriz-PartoNormal_CP.pdf
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Alguns autores consideram que o fio de sutura Vicryl® de rápida absorção deveria ser a primeira escolha para a sutura do períneo. Esse produto apresenta como principais vantagens a preservação da força de tensão entre 10 e 42 dias e ação bactericida contra Staphylococcus aureus e epidermidis1111. Barros M, Gorgal R, Machado AP, Correia A, Montenegro N. Princípios básicos em cirurgia. Acta Med Port. 2011;24(S4):1051-6.-1212. Kettle C, Tohill S. Perineal care. BMJ Clin Evid [Internet]. 2015 [cited 2018 Oct 16];2015:1401. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4356152/
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Com os avanços tecnológicos, outro material que tem sido estudado para o reparo de incisão cirúrgica ou trauma tecidual é a cola cirúrgica. Desde 1998, a Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos da América, aprovou a primeira cola cirúrgica adesiva que contém o ácido cianoacrilato, conhecida como Dermabond®, utilizada para aproximar a pele. Esse órgão também aprovou o uso da cola cirúrgica contendo o ácido histoacril. Estudos recentes têm demonstrado que as colas cirúrgicas podem ser aplicadas com sucesso em diferentes lesões de pele e mucosas, tais como: ferida labial, úlceras aftosas, ferimentos faciais após cirurgia de Mohs e lesões da pele ungueal1313. Strauss EJ, Weil WN, Jordan C, Paksima N. A prospective, randomized, controlled trial of 2-octylcyanoacrolate versus suture repair for nail bed injuries. J Hand Surg Am. 2008;33(2):250-3. DOI: https://doi.org/10.1016/j.jhsa.2007.10.008
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As vantagens para o uso da cola são o tempo curto de aplicação, a facilidade na execução e seu caráter hemostático e bacteriostático. Além disso, esta é biodegradável e tem força tênsil adequada1414. Singh PK, Degala S, Shetty S, Rai VS, Das A. To evaluate the efficacy and effectiveness of N-butyl-2-cyanoacrylate glue (TRU SEAL) in closure of oral and maxillofacial laceration and surgical incisions. J Maxillofac Oral Surg. 2019;18(1):131-8. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s12663-018-1111-6
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. Entretanto, devido à rápida polimerização dos monômeros de cianoacrilato, o produto apresenta uma significativa dissipação de calor durante o uso, podendo resultar na formação de uma película endurecida e quebradiça de cola no local da aplicação1515. Bragat V, Becker ML. Degradable adhesives for surgery and tissue engineering. Biomacromolecules. 2017;18:3009-39. DOI: http://dx.doi.org/10.1021/acs.biomac.7b00969
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Com a finalidade de diminuir as morbidades comuns durante o puerpério, novos materiais e técnicas são necessários para um melhor reparo perineal.

Nesse sentido, o objetivo deste estudo foi comparar a intensidade da dor perineal, o processo de cicatrização e a satisfação em puérperas entre 10 e 20 dias após o parto normal, submetidas ao reparo de lacerações de primeiro e segundo graus e de episiotomia com cola Glubran-2® ou com o fio de sutura Vicryl® de rápida absorção.

Método

Tipo de estudo

Trata-se de um estudo transversal sobre a intensidade da dor, a cicatrização perineal e a satisfação da mulher com o reparo perineal, entre 10 a 20 dias pós-parto normal. Está alinhado a um ensaio clínico controlado e randomizado, o qual utilizou a cola cirúrgica Glubran-2® e o fio Vicryl® de rápida absorção no reparo perineal de mulheres que tiveram parto normal com lacerações perineais de primeiro e segundo graus ou episiotomia, e tem como título “Ensaio clínico sobre o uso da cola cirúrgica no reparo de episiotomias e lacerações perineais” e por objetivo “avaliar a eficácia da cola cirúrgica Glubran-2® no reparo da episiotomia e lacerações perineais de primeiro e segundo graus no parto normal”.

População

No ensaio clínico, as participantes foram divididas em quatro grupos: Grupo Experimental 1 (GE1) - formado por parturientes com laceração de primeiro grau submetidas ao reparo perineal com cola Glubran-2®; Grupo Experimental 2 (GE2) - formado por parturientes com laceração de segundo grau ou episiotomia submetidas ao reparo perineal com cola Glubran-2®; Grupo Controle 1 (GC1) - formado por parturientes com laceração de primeiro grau submetidas à sutura contínua com fio Vicryl® de rápida absorção; Grupo Controle (GC2) - formado por parturientes com laceração de segundo grau ou episiotomia submetidas à sutura contínua com fio Vicryl® de rápida absorção. A amostra foi calculada para detectar uma diferença mínima significativa de dois pontos no escore de dor entre os dois métodos de reparo perineal, que resultou em uma amostra mínima de 140 parturientes, sendo 35 em cada grupo. O ensaio clínico foi conduzido em três etapas, preliminares ao presente estudo: Etapa 1, realizada durante o trabalho de parto e parto; Etapa 2, entre 12 e 24 horas após o parto; e Etapa 3, entre 36 e 48 horas pós-parto. Nessa etapa, a participante foi informada sobre o estudo transversal e sobre a data de retorno entre 10 a 20 dias pós-parto (Etapa 4); ou seja, os dados que foram coletados na Etapa 4 corresponderam ao estudo transversal. Em todas as etapas, os dados foram coletados por meio dos prontuários, de entrevistas com as participantes e de avaliações perineais.

Critérios de inclusão

Os critérios de inclusão do ensaio clínico foram: estar em trabalho de parto e não ter parto vaginal anterior. Foram excluídas do estudo as mulheres que tiveram parto vaginal com períneo íntegro ou com lacerações perineais espontâneas de terceiro ou quarto grau, tiveram cesariana ou desistiram de continuar no estudo. Para o estudo transversal, foram considerados os seguintes critérios de inclusão: ter participado do ensaio clínico e ser avaliada entre 10 a 20 dias após o parto. Os critérios de exclusão foram perda de participantes que, embora fizessem parte do ensaio clínico, não retornaram ao serviço e não aceitaram a visita domiciliar.

Materiais utilizados

Os materiais utilizados no ensaio clínico foram a cola cirúrgica Glubran-2®, cola sintética de base cianoacrílica, modificada pela adição de um monômero e sintetizada pelo próprio fabricante, GEM S.r.l, na Itália. É um produto médico cirúrgico que pode ser utilizado na pele, na região interna e externa, conforme os requisitos da Diretiva Europeia 93/42/CEE. O outro material utilizado no EC foi o fio de sutura Vicryl® de rápida absorção (poliglactina 910), sendo um fio cirúrgico sintético, estéril, absorvível, composto de um polímero obtido a partir de 90% de glicolida e 10% de L-lactida, da marca Ethicon - Johnson & Johnson Produtos Profissionais Ltda1616. Greenberg JA, Clark RM. Advances in suture material for obstetric and gynecologic surgery. Rev Obstet Gynecol. 2009;2(3):146-58.-1717. Kull S, Martinelli I, Briganti E, Losi P, Spiller D, Tonlorenzi S, et al. Glubran2 surgical glue: in vitro evaluation of adhesive and mechanical properties. J Surg Res. 2008;157(1):15-21. DOI: http://dx.doi.org:10.1016/j.jss.2009.01.034
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Exposição e desfechos

Considerou-se como exposição o reparo perineal com cola cirúrgica ou com fio de sutura, que foi realizado no ensino clínico. Como desfechos, consideraram-se a intensidade da dor, a cicatrização perineal e a satisfação da mulher com o reparo perineal, avaliados entre 10 a 20 dias no pós-parto. Dada a natureza da exposição e dos desfechos, no ensino clínico não houve possibilidade de realizar o cegamento, pois tanto as mulheres como as pesquisadoras poderiam observar o tipo de reparo perineal, durante a avaliação do processo de cicatrização.

A intensidade da dor perineal foi avaliada mediante o uso da EVN, que consiste em uma linha horizontal com valores em centímetros de 0 a 10, sendo zero classificado como sem dor e dez, a pior dor imaginável1818. McCaffery M, Beebe A. Pain: clinical manual for nursing practice. St. Louis: Mosby; 1989.. A mulher recebeu a escala e apontou o número correspondente à intensidade da dor. Para fins de análise estatística, a dor foi categorizada como: sem dor (0), dor leve (1-4), dor moderada (5-7) e dor intensa (8-10)1919. Pimenta CAM, Cruz DALM, Santos JLF. Instrumentos para avaliação da dor: o que há de novo em nosso meio. Arq Bras Neurocir. 1998;7(1):15-24..

O processo de cicatrização do períneo foi avaliado através da escala REEDA, a qual avalia o processo de recuperação tecidual pós-trauma perineal através de cinco itens da cicatrização: hiperemia, edema, equimose, secreção e aproximação das bordas da ferida (coaptação). Para cada item avaliado, foi atribuída uma pontuação de zero a três, sendo que a pontuação máxima de 15 corresponde ao pior resultado de cicatrização do períneo88. Davidson N. REEDA: evaluating post partum healing. J Nurse Midwifery. 1974;19(2):6-8. DOI: https://doi.org/10.1111/j.1542-2011.1974.tb00384.x
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Para mensurar a hiperemia, o edema, a equimose e a coaptação das bordas, foi utilizada a régua Peri-Rule®. Essa ferramenta é de plástico maleável e graduada em centímetros, sendo recomendada para mensurar a profundidade e a extensão do trauma perineal2020. Metcalfe A, Tohill S. Perineal tear assessment and the development of the Peri-rule. In: Henderson C, Bick D. Perineal care: an international issue. Nottingham: Quay Books; 2005. p. 87-97.. Essa régua foi envolvida em uma camada de filme PVC e reutilizada após higienização com água e sabão, seguida por antissepsia com álcool a 70%.

Para avaliar o nível de satisfação da mulher com o tipo de reparo perineal, foi utilizada uma escala com respostas classificadas em cinco pontos, correspondendo a: muito insatisfeita, insatisfeita, indiferente, satisfeita e muito satisfeita. Para essa avaliação, foi oferecido um espelho para que a mulher visualizasse seu períneo.

Assim, as variáveis independentes foram o tipo de material utilizado para o reparo perineal realizado no ensino clínico e as variáveis dependentes foram a dor e cicatrização perineal e satisfação da mulher com o reparo.

Coleta de dados

O estudo foi realizado no Centro do Parto Normal (CPN) do Pronto Socorro e Maternidade Municipal Zoraide Eva das Dores (PSMMZED), referência para gestantes com risco habitual, localizado no Município de Itapecerica da Serra, São Paulo, Brasil.

Em 2017, o CPN atendeu uma demanda de aproximadamente 140 partos por mês, sendo que 73% são partos normais e 27% cesarianas. Em relação às condições perineais, verificou-se que, dentre as que tiveram parto normal, 43,7% apresentaram períneo íntegro, 4,5% foram submetidas a episiotomia e 51,8% tiveram lacerações perineais, sendo 65,7% lacerações de primeiro grau, 33,6% lacerações de segundo grau e 0,7% lacerações de terceiro grau (fonte: estatísticas do Centro de Parto Normal. Registro de Partos, Itapecerica da Serra, 2017). Os profissionais responsáveis por assistirem os partos normais são enfermeiras obstétricas. Os médicos obstetras são solicitados em caso de intercorrência.

A coleta de dados do ensino clínico e do estudo transversal foi realizada no próprio local do estudo. Entretanto, quando a participante não pôde retornar ao serviço por qualquer dificuldade, os dados foram coletados em seu domicílio. As pesquisadoras do estudo transversal são também membros da equipe do ensaio clínico e receberam treinamento para realizar o reparo perineal e para avaliar os desfechos perineais. Os dados foram coletados mediante instrumento elaborado para o estudo.

Análise e tratamento dos dados

O armazenamento e a digitação dos dados registrados no formulário foram feitos no banco de dados, conduzindo-se sua importação para o Excel®. Foi utilizado o software Statistical Package for the Social Sciences SPSS® 13.0 para a realização da análise estatística. Na análise descritiva das variáveis quantitativas contínuas, foi utilizada a análise de variância (ANOVA), a fim de se analisarem as diferenças entre as médias dos grupos e efetuar-se o cálculo das medidas de tendência central e dispersão (média e desvio-padrão). Para variáveis categóricas (tabelas de contingência) foi utilizado o teste de qui-quadrado de Pearson.

Na tabulação cruzada da análise categórica, foi utilizado o teste qui-quadrado aproximado na simulação de Monte Carlo. Nas situações em que foram observados valores de p <0,05, foi realizado um teste de resíduos de qui-quadrado no qual se obtêm escores de z para cada combinação da tabela de contingência, sendo considerados significativos os escores maiores que dois (2) ou menores (-2). As comparações, quando significativas, foram realizadas pelos testes de comparações de médias utilizando o Sidak.

Aspectos éticos

O ensaio clínico foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, sob o Parecer nº 2.384.491/2017) e seguiu todas as determinações da Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde, assegurando que os direitos humanos dos envolvidos na pesquisa foram protegidos. A inclusão das mulheres no estudo ocorreu após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e do Termo de Assentimento, para as participantes com menos de 18 anos de idade.

RESULTADOS

Foram avaliadas 110 puérperas, das quais 55 pertenciam aos grupos controle, sendo GC1 - 28 e GC2 - 27, do EC (reparo perineal com fio Vicryl®), e 55 aos grupos experimentais com GE1 - 29 e GE2 - 26 (reparo perineal com cola cirúrgica Glubran-2®).

As características sociodemográficas e o estado nutricional das mulheres envolvidas no estudo não mostraram diferença significante entre os grupos, indicando homogeneidade em relação às variáveis analisadas.

A cor da pele predominante e autorreferida foi a parda (n=57; 51,8%). A maioria das mulheres tinha ensino médio completo (n=61; 55,5%), exercia como ocupação as atividades do lar (n=56; 50,9%) e mantinha união estável com parceiro (n=93; 84,5%) em coabitação (n=84; 76,4%). Em relação ao estado nutricional, prevaleceu o peso adequado (n=44; 41,5%), porém mais de ¼ das mulheres (n=28; 26,4%) tinha baixo peso (Tabela 1).

Tabela 1:
Características das mulheres no total dos grupos controle (GC1 e GC2) e no total dos experimentais (GE1 e GE2), segundo variáveis categóricas e valor-p - Itapecerica da Serra, SP, Brasil, 2018.

A média do índice de massa corporal foi 28,1 (d.p.=4,4) e 27,3 (d.p.=4,2), no GC e GE, respectivamente. A idade média das mulheres foi de 22,0 (d.p.=4,6) anos no GC e 21,3 (d.p.=4,2) no GE. A média da idade gestacional foi de 37,7 (d.p.=7,5) semanas no GC e 39,3 (d.p.=1,1) semanas no GE. Em relação ao peso do recém-nascido, a média foi de 3.304,5 (d.p.=408,1) gramas no GC e 3.221,4 (d.p.=370,8) gramas no GE (dados não apresentados em tabela).

Na avaliação da intensidade da dor perineal referida pela mulher, houve diferença estatística ao se comparar o GC com o GE. Na análise das variáveis numéricas, as mulheres do GE apresentaram menos intensidade de dor perineal do que as mulheres do GC (p=0,001). Não houve significância quando comparada a dor perineal com o grau das lacerações perineais (p=0,905) e em relação à interação entre o tipo de reparo perineal e o grau de laceração (p=0,364). Nos subgrupos, foi verificada a diferença de médias de 1,36 pontos ao se comparar o GC1 (1,46; d.p.=2,00) com o GE1 (0,10 d.p.=0,55) e de 0,8 pontos entre o GC2 (1,14 d.p. 2,12) e o GE2 (0,34 d.p.=1,23) (Tabela 2).

A análise do escore total da escala REEDA não mostrou diferença estatística na comparação com o tipo de reparo perineal (p=0,267) e na interação entre tipo de reparo e grau de laceração (p=0,673). No entanto, houve significância ao combinar o escore da escala REEDA com o grau de laceração perineal (p<0,001), ou seja, as mulheres que apresentaram laceração de primeiro grau, independentemente do reparo perineal realizado, apresentaram melhores resultados no processo de cicatrização perineal do que as mulheres que tiveram laceração de segundo grau.

Em relação à coaptação das bordas do trauma perineal, avaliada pela escala REEDA, foi observada diferença estatística ao se comparar o tipo de reparo (p=0,007) e o grau de laceração (p=0,0001), ou seja, no GC, obtiveram-se melhores resultados na coaptação do que no GE, e a laceração de primeiro grau, quando comparada com a laceração de segundo grau, também apresentou melhores resultados de coaptação. Em relação à análise do tipo de reparo vs grau de laceração perineal, não houve diferença estatística (p=0,446) (Tabela 2).

Para verificar onde se encontrava a significância estatística dessa análise, foi utilizado o escore Z. Dessa forma, foi possível verificar que as mulheres que tiveram lacerações de segundo grau e foram submetidas ao reparo perineal com fio de sutura, em comparação com as submetidas ao reparo perineal com cola cirúrgica, apresentaram melhores resultados no processo de cicatrização perineal (p<0,05) (dados não apresentados em tabela).

Tabela 2:
Estatística da intensidade da dor perineal, processo de cicatrização (REEDA) e coaptação das bordas das mulheres dos grupos controle (GC1 e GC2) e experimentais (GE1 e GE2) entre 10 e 20 dias após o parto, segundo o tipo de reparo perineal e o grau de laceração perineal - Itapecerica da Serra, SP, Brasil, 2018.

Na análise de satisfação com o reparo perineal vs tipo de reparo perineal, foi observada significância (p=0,035). As mulheres que tiveram o reparo perineal realizado com cola referiram maior satisfação com o reparo do que as mulheres com reparo com fio de sutura, independentemente do grau de laceração perineal. No GC, 34,6% (n=19) das mulheres referiram estarem muito satisfeitas, ao passo que esse percentual foi de 54,5% (n=30) entre as mulheres do GE. Por sua vez, no GC, duas mulheres se disseram insatisfeitas e três muito insatisfeitas, enquanto nenhuma mulher do GE referiu insatisfação em relação ao reparo perineal (Tabela 3).

Tabela 3:
Estatística da satisfação das mulheres dos grupos controle (GC) e experimental (GE) entre 10 e 20 dias após o parto - Itapecerica da Serra, SP, Brasil, 2018.

Na análise do tipo de reparo perineal e grau de laceração perineal, utilizou-se o escore de Z para avaliação das análises realizadas. As mulheres submetidas ao reparo perineal com fio de sutura e que tiveram laceração de segundo grau apresentaram maior insatisfação, quando comparadas às submetidas ao reparo com cola cirúrgica (p=<0,05) (dados não apresentados em tabela).

DISCUSSÃO

Os dados do presente estudo são parte de um projeto mais amplo de ensaio clínico randomizado sobre o uso da cola cirúrgica para o reparo de traumas perineais no parto normal. Buscou-se comparar a intensidade da dor, a cicatrização perineal e a satisfação da mulher com o reparo perineal por cola cirúrgica ou por sutura contínua entre 10 a 20 dias após o parto.

As mulheres que participaram dos grupos de controle e experimental não diferiram quanto aos dados sociodemográficos e estado nutricional. Eram predominantemente jovens, com escolaridade até o ensino médio, de cor autorreferida parda, com parceiro, exerciam mais a atividade doméstica e mantinham o peso adequado. Esses dados são compatíveis com pesquisas de abrangência nacional e estadual com puérperas2121. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Perfil das Mães 2000 [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2000 [citado 2018 set. 29]. Disponível em: https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/perfil_maes/defaulttab.shtm-2222. Diniz CSG, Batista LE, Kalckmann S, Schlithz AOC, Queiroz MR, Carvalho PCA. Desigualdades sociodemogra´ficas e na assiste^ncia a` maternidade entre puérperas no Sudeste do Brasil segundo cor da pele: dados do Inque´rito Nacional Nascer no Brasil (2011-2012). Saúde Soc. 2016;25(3):561-72. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/s0104-129020162647
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A intensidade da dor perineal foi menor nos grupos experimentais (p>0,001) quando comparados aos grupos controle, tanto em lacerações de primeiro quanto de segundo grau. Em um ensaio clínico randomizado sobre o uso da cola cirúrgica octil-2-cianocrilato para reparos perineais de primeiro grau, em comparação com fio Vicryl® de rápida absorção em 102 mulheres (28 suturadas com fio Vicryl® de rápida absorção e 74 com cola cirúrgica), não se indica a cola octil-2-cianocrilato para lacerações de maior grau. Nesses casos, o autor optou por realizar sutura com Vicryl® de rápida absorção nas camadas mais profundas e depois finalizar com a cola. As mulheres desse estudo foram acompanhadas num período de 6 semanas, a fim de avaliar o resultado do reparo da cola e compará-la com a sutura. Foi observado um escore menor na escala visual analógica de dor (1,7 versus 4,1; p>0,001) imediatamente após o procedimento, mas sem diferença entre os dois métodos de reparo no escore de dor após 6 semanas do parto. Concluiu-se que o uso da cola apresentou resultados estéticos e funcionais similares ao da sutura com fio e apresentou vantagens como redução no tempo de reparo perineal, diminuição da dor, isenção de necessidade de anestesia local e maior satisfação da mulher2323. Feigenberg T, Maor-Sagie E, Zivi E, Abu-Dia M, Bem-Meir A, Sela HY, et al. Using adhesive glue to repair first degree perineal tears: a prospective randomized controlled trial. Bio Med Res Int. 2014;2014:526590. DOI: http://dx.doi.org/10.1155/2014/526590
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Outro ensaio clínico controlado comparando o reparo da pele em episiotomias, utilizando a cola cirúrgica Dermabond® e o fio de sutura Vicryl® de rápida absorção, com um total de 100 mulheres primigestas, também mostrou menor escore de dor significante durante e após o procedimento com a aplicação da cola (p<0,005)2424. Chamariya S, Prasad M, Chauhan A. Comparison of dermabond adhesive glue with skin suture for repair of episiotomy. Int J Reprod Contracept Obstet Gynecol. 2016;5(10):3461-5. DOI: http//dx.doi.org/10.18203/2320-1770.ijrcog20163423
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. A diminuição da dor em curto e em longo prazo com o uso da cola cirúrgica, quando comparada à sutura, novamente foi observada em estudo de revisão sistemática2525. Seijmonsbergen-Schermers A, Sahami S, Lucas C, Jonge A. Non suturing or skin adhesives versus suturing of the perineal skin after childbirth: a systematic review. Birth. 2015;42(2):100-15. DOI: https://doi.org/10.1111/birt.12166
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No entanto, em ensaio clínico controlado com 100 mulheres, comparando o uso da cola adesiva cirúrgica octyl-2-cianoacrilato (n=48) com o fio de sutura poliglactina 910 de rápida absorção (n=53) no reparo da pele em episiotomias, não houve diferença significante entre os grupos nos escores autorreferidos em relação à dor logo após o procedimento, nem após 7 e 30 dias do parto2626. Mota R, Costa F, Amaral A, Oliveira F, Santos CC, Ayres-de-Campos D. Skin adhesive versus subcuticular suture for perineal skin repair after episiotomy: a randomized controlled trial. Acta Obstet Gynecol Scand. 2009;88(6):660-6. DOI: https://doi.org/10.1080/00016340902883133
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No presente estudo, não houve diferença com relação aos escores da escala REEDA e o tipo de reparo perineal, nem com o tipo de reparo perineal e o grau de laceração perineal; porém, foi significante a diferença entre os escores da escala REEDA e o grau de laceração (p<0,001). Mulheres com laceração de primeiro grau, independentemente do tipo de reparo perineal realizado, apresentaram melhores resultados nos escores da escala REEDA que as com laceração de segundo grau. Por sua vez, em estudo randomizado longitudinal realizado na Índia, não houve diferença significante no processo de cicatrização entre os dois métodos de reparo da pele de episiorrafia2424. Chamariya S, Prasad M, Chauhan A. Comparison of dermabond adhesive glue with skin suture for repair of episiotomy. Int J Reprod Contracept Obstet Gynecol. 2016;5(10):3461-5. DOI: http//dx.doi.org/10.18203/2320-1770.ijrcog20163423
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No item coaptação perineal avaliado pela escala REEDA, foi observada diferença significante ao se comparar o tipo de reparo perineal (p=0,007) e o grau de trauma perineal (p=0,0001); ou seja, as mulheres que tiveram laceração de segundo grau e que foram submetidas ao reparo perineal com fio de sutura, em comparação com as que foram submetidas ao reparo perineal com cola cirúrgica, apresentaram melhores resultados no processo de cicatrização perineal (p<0,05). Estudo de revisão não apontou diferença na coaptação da pele entre reparo com sutura ou com cola cirúrgica2525. Seijmonsbergen-Schermers A, Sahami S, Lucas C, Jonge A. Non suturing or skin adhesives versus suturing of the perineal skin after childbirth: a systematic review. Birth. 2015;42(2):100-15. DOI: https://doi.org/10.1111/birt.12166
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As mulheres que tiveram o reparo perineal realizado com cola expressaram maior satisfação com o reparo do que as mulheres suturadas, independentemente do grau de laceração perineal (p=0,035).

É importante contribuir para a assistência de qualidade e a consequente satisfação das mulheres durante o parto e pós-parto. Portanto, realizar procedimentos que reduzam o medo e melhorem a satisfação da mulher com o parto tem sido o objetivo dos programas de humanização do parto2727. Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde. Diretrizes nacionais de assistência ao parto normal: versão resumida. Brasília: Ministério da Saúde; 2017.-2828. World Health Organization. WHO recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience. Geneva: WHO; 2018..

O reparo perineal com cola cirúrgica pode reduzir a intensidade de dor da mulher e proporcionar uma maior satisfação com o reparo perineal e com toda a experiência em relação ao parto e pós-parto. A satisfação das mulheres com o reparo perineal utilizando-se a cola cirúrgica também foi observada em outros estudos2323. Feigenberg T, Maor-Sagie E, Zivi E, Abu-Dia M, Bem-Meir A, Sela HY, et al. Using adhesive glue to repair first degree perineal tears: a prospective randomized controlled trial. Bio Med Res Int. 2014;2014:526590. DOI: http://dx.doi.org/10.1155/2014/526590
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24. Chamariya S, Prasad M, Chauhan A. Comparison of dermabond adhesive glue with skin suture for repair of episiotomy. Int J Reprod Contracept Obstet Gynecol. 2016;5(10):3461-5. DOI: http//dx.doi.org/10.18203/2320-1770.ijrcog20163423
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-2525. Seijmonsbergen-Schermers A, Sahami S, Lucas C, Jonge A. Non suturing or skin adhesives versus suturing of the perineal skin after childbirth: a systematic review. Birth. 2015;42(2):100-15. DOI: https://doi.org/10.1111/birt.12166
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,2929. Teixeira TT. Cola adesiva cirúrgica no reparo de lacerações perineais de primeiro grau no parto normal: estudo piloto aleatorizado controlado [dissertação]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2018 [citado 2019 jun. 21]. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7141/tde-23112018-130437/pt-br.php. Existe uma preocupação crescente em avaliar a satisfação dos usuários dos serviços de saúde, pois essa variável pode identificar lacunas existentes e desenvolver melhorias na assistência2424. Chamariya S, Prasad M, Chauhan A. Comparison of dermabond adhesive glue with skin suture for repair of episiotomy. Int J Reprod Contracept Obstet Gynecol. 2016;5(10):3461-5. DOI: http//dx.doi.org/10.18203/2320-1770.ijrcog20163423
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,3030. Al-Abri R, Al-Balushi A. Patient Satisfaction Survey as a Tool Towards Quality Improvement. Oman Med J. 2014;29(1):3-7. DOI:10.5001/omj.2014.02
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.

O uso da cola cirúrgica como uma opção para o reparo perineal de laceração de primeiro grau e da pele perineal em lacerações de segundo grau foi recentemente recomendada pelo Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas por disponibilizar de menor tempo para o reparo, menor escore de dor referida e maior satisfação com o resultado. Vale considerar que é uma recomendação nível B, na qual os dados são obtidos a partir de estudos com meta-análise menos robusta ou a partir de um único estudo randomizado ou de estudos não-randomizados3131. Waldman R. ACOG Practice Bulletin nº.198: prevention and management of obstetric lacerations at vaginal delivery. Obstet Gynecol. 2019;133(1):185. DOI: 10.1097/AOG.0000000000003041
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.

Um fator limitante desta pesquisa decorre de seu desenho transversal, que não permite uma análise mais abrangente das variáveis dependentes em outros momentos no puerpério, como 30 ou mais dias após o parto, para avaliar repercussões em longo prazo que possam advir do uso da cola cirúrgica para o reparo perineal de lacerações de primeiro e segundo grau. Nesse sentido, publicação recente recomenda que estudos de intervenção para o manejo de trauma perineal relacionado ao parto avaliem como desfechos principais dor autorreferida, processo de cicatrização e qualidade de vida, englobando a satisfação declarada por escalas contínuas com o procedimento proposto, e disfunção sexual3232. Pergialiotis V, Durnea C, Elfituri A, Duffy JMN, Doumouchtsis SK. Do we need a core outcomes at for childbirth perineal trauma research? A systematic review of outcome reporting in randomized trials evaluating the management of childbirth trauma. BJOG. 2018;125(12):1522-31. DOI: http://dx.doi.org/10.1111/1471-0528.15408
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. Outro fator limitante seria um viés de seleção pelo não retorno, mesmo após contatos telefônicos, de participantes do grupo de estudo que poderiam não ter ficado satisfeitas com o reparo realizado, embora os motivos alegados após contatos telefônicos tenham sido moradia fora do perímetro urbano e ausência de condições financeiras para o transporte para retornar à maternidade.

Existem raros trabalhos que avaliaram o processo de cicatrização entre 10 a 20 dias após o uso de cola cirúrgica em reparo perineal88. Davidson N. REEDA: evaluating post partum healing. J Nurse Midwifery. 1974;19(2):6-8. DOI: https://doi.org/10.1111/j.1542-2011.1974.tb00384.x
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,2929. Teixeira TT. Cola adesiva cirúrgica no reparo de lacerações perineais de primeiro grau no parto normal: estudo piloto aleatorizado controlado [dissertação]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2018 [citado 2019 jun. 21]. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7141/tde-23112018-130437/pt-br.php. Sendo assim, o estudo atual apresenta-se como base para que novas pesquisas sejam realizadas a fim de apresentar os benefícios e malefícios sobre o uso da cola cirúrgica no reparo perineal.

Em relação às implicações para a prática, verificou-se que a cola cirúrgica Glubran-2® é uma alternativa viável por diminuir a dor perineal e aumentar a satisfação da mulher com o reparo perineal, facilitando, assim, as atividades diárias da puérpera. No entanto, novos estudos devem ser conduzidos com diferentes tipos de cola para apoiar ou não esses achados. Também se sugere que sejam avaliadas a dispareunia, a função sexual, a incontinência urinária e a força muscular do assoalho pélvico, além de uma análise de custos.

CONCLUSÃO

O uso da cola cirúrgica Glubran-2® no reparo perineal em comparação com o uso do fio Vicryl® demonstrou desfechos positivos em relação à diminuição da intensidade da dor e maior satisfação das mulheres com o reparo perineal. Não houve significância estatística entre o tipo de reparo e o processo da cicatrização entre 10 a 20 dias pós-parto. A cola cirúrgica é uma opção clinicamente viável para reparo perineal.

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  • Apoio financeiro:

    Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Conselho Nacional para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Set 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    16 Out 2018
  • Aceito
    26 Set 2019
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