Resumos
A presença das mulheres rurais na produção agrícola familiar é um fato. Mesmo na invisibilidade, não se pode negar que elas estão ocupando terras, plantando, colhendo, e cultivando o desejo de ter uma terra livre e usufruí-la com seu trabalho. Presentes na casa, no quintal, na roça e na luta pela terra, as mulheres tiveram ainda de lutar pelo direito de serem reconhecidas como trabalhadoras. A emergência das mulheres rurais nos movimentos sociais proporcionou seu aparecimento como sujeito político, rompendo sua invisibilidade como trabalhadora. Nesse aprendizado e experimentação as mulheres rurais criaram seu próprio movimento, consolidado na década de 1980. Desde então realizam encontros nacionais, marchas e campanhas, criaram coletivos de mulheres e conquistaram direitos. Os Coletivos de Mulheres estão vinculados à Federação de Trabalhadores da Agricultura do Ceará (FETRAE - CE) ou ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e constituem espaços importantes de ressignificação das atividades produtivas das mulheres.
mulher rural; participação política; grupos produtivos; movimentos sociais rurais
Women are effectively engaged in family agricultural production. In spite of certain invisibility, women are occupying fields, planting and harvesting. At the same time, they are longing for a free land where they can work. They have always been active at home, in the backyards, in the small subsistence farms and now they are struggling to being recognized as rural workers. The involvement of rural women in social movements has conferred on them the status of political beings and as a result they are not invisible any longer. In the process of active experimentation and learning they founded their own social movement that has become well established since the 1980 decade. Since then, they have organized national meetings, campaigns and created organizations called "Women Collectives." These organizations are connected to either the Federation of Agricultural Workers in Ceará (FETRAECE - CE) or to the MST (Movement of Landless Workers). They represent important opportunities for giving new meanings to the productive activities of women.
Rural Women; Political Participation; Productive Groups; Rural Social Movements
DOSSIÊ
Mulheres rurais: tecendo novas relações e reconhecendo direitos
Rural women: establishment of new relations and recognition of rights
Celecina de Maria Veras Sales
Universidade Federal do Ceará
RESUMO
A presença das mulheres rurais na produção agrícola familiar é um fato. Mesmo na invisibilidade, não se pode negar que elas estão ocupando terras, plantando, colhendo, e cultivando o desejo de ter uma terra livre e usufruí-la com seu trabalho. Presentes na casa, no quintal, na roça e na luta pela terra, as mulheres tiveram ainda de lutar pelo direito de serem reconhecidas como trabalhadoras. A emergência das mulheres rurais nos movimentos sociais proporcionou seu aparecimento como sujeito político, rompendo sua invisibilidade como trabalhadora. Nesse aprendizado e experimentação as mulheres rurais criaram seu próprio movimento, consolidado na década de 1980. Desde então realizam encontros nacionais, marchas e campanhas, criaram coletivos de mulheres e conquistaram direitos. Os Coletivos de Mulheres estão vinculados à Federação de Trabalhadores da Agricultura do Ceará (FETRAE CE) ou ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e constituem espaços importantes de ressignificação das atividades produtivas das mulheres.
Palavras-chave: mulher rural; participação política; grupos produtivos; movimentos sociais rurais.
ABSTRACT
Women are effectively engaged in family agricultural production. In spite of certain invisibility, women are occupying fields, planting and harvesting. At the same time, they are longing for a free land where they can work. They have always been active at home, in the backyards, in the small subsistence farms and now they are struggling to being recognized as rural workers. The involvement of rural women in social movements has conferred on them the status of political beings and as a result they are not invisible any longer. In the process of active experimentation and learning they founded their own social movement that has become well established since the 1980 decade. Since then, they have organized national meetings, campaigns and created organizations called "Women Collectives." These organizations are connected to either the Federation of Agricultural Workers in Ceará (FETRAECE CE) or to the MST (Movement of Landless Workers). They represent important opportunities for giving new meanings to the productive activities of women.
Key words: Rural Women; Political Participation; Productive Groups; Rural Social Movements.
No Ceará, em uma breve viagem ao campo, é possível visualizar meninas entre 8 e 12 anos carregando água, alimentando os pequenos animais, cuidando da casa e dos irmãos mais novos. Embora elas estejam inseridas desde a infância no grupo de trabalho familiar, inclusive na roça, quando acompanham a família no período de colheita, elas crescem tendo de lutar para serem consideradas trabalhadoras rurais. Essa realidade se insere em uma luta mais ampla.1
O despertar pela luta coletiva do reconhecimento do trabalho das mulheres data da década de 1980. Um conjunto de eventos e de lutas das mulheres no mundo, no Brasil e, particularmente, no Ceará, no período de 1974 a 1985, chegou ao campo e marcou o percurso das mulheres rurais. As Conferências Mundiais, a aprovação da Década da Mulher (19751985) e a instalação do Ano Internacional da Mulher em 1975 foram acontecimentos impulsionadores na luta pelos direitos das mulheres.
Na segunda metade da década de 1980, a luta das trabalhadoras rurais abre novos espaços políticos em que a fala dessas mulheres começa a ser franqueada. As principais reivindicações foram pela sindicalização, documentação, direitos previdenciários e participação política.
Somente no ano de 1985 ocorreram 12 encontros de mulheres trabalhadoras rurais nas mais diversas regiões do país. No ano seguinte, em novembro de 1986, as mulheres rurais realizaram em Brasília o primeiro Encontro Nacional de Trabalhadoras Rurais.
Nos anos posteriores, houve um maior envolvimento das trabalhadoras rurais em encontros, seminários, campanhas sobre violência contra mulheres, sobre mortalidade materna, sobre direitos constitucionais. Algumas iniciativas isoladas de grupos e assessorias, já existentes em torno de trabalho e de organização das trabalhadoras rurais, unem-se aos novos movimentos emergentes.
Na década de 1990 inicia-se um período de adesão das instituições às desigualdades de gênero, com o enfoque na mulher. A Igreja Católica, por exemplo, com a Campanha da Fraternidade de 1990, cujo tema foi "Deus quer homem e mulher como companheiros, iguais nos direitos porque os dois são imagem e semelhança d'Ele", incentivou o debate sobre a condição da mulher, tanto na cidade como no campo.
Os eventos se multiplicam, passam a constituir acontecimentos importantes na vida das trabalhadoras rurais. Além do processo organizativo, as mulheres exercem o direito de falar, discordar, concordar, propor e reivindicar direitos.
A inserção das mulheres rurais no campo político (sindicatos, associações, movimentos sociais, partidos políticos) tem possibilitado um aprendizado coletivo. Para Pierre Bourdieu, "o campo político é entendido como campo de forças e como campo de lutas que têm em vista transformar a relação de forças que confere a este campo a sua estrutura em dado momento".2
O processo de organização das trabalhadoras rurais vai formando uma rede de comunicação e significados, resultando na criação da Articulação Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais em 1995.
No Nordeste, o movimento de mulheres rurais cresceu e acolheu multiplicidades de idéias expressas nos grupos organizados, entre eles o Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), os Coletivos Estaduais de Mulheres das Federações de Trabalhadores Rurais dos Estados, a Rede de Mulheres Trabalhadoras do Nordeste, o Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco e o Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Nordeste (MTR).
Ao ingressar em movimentos, as mulheres rurais criam possibilidades de se afirmarem como portadoras de um saber-poder no campo da política, que lhes proporcione também repensar seu cotidiano, e isso tem ocorrido no Ceará.
Cartografia política das trabalhadoras rurais organizadas do Ceará
A participação das mulheres exige uma determinada competência, um acúmulo de capital político, mas essa formação ocorre no cotidiano, na própria luta, como observa Bourdieu: "a competência prática é adquirida em situação, na prática: o que é adquirido é, inseparavelmente, o domínio prático da linguagem e o domínio prático das situações, que permitem produzir o discurso adequado numa situação determinada".3
Como o campo político é também perpassado pelas desigualdades de gênero, a competência aparece nesse campo como divisor dos tecnicamente competentes e dos que se representam por porta-vozes.4 As mulheres estão sempre incluídas entre os que precisam ser representados, entretanto, aquelas que estão inseridas nos movimentos sociais têm demonstrado que as diferenças entre mulheres e homens não podem afirmar falta de competência política das mulheres.
A organização das Trabalhadoras Rurais do Ceará se expressa em dois grandes movimentos, o MST e o movimento sindical (FETRAECE). O marco do movimento de mulheres, vinculado à FETRAECE, foi o I Congresso de Mulheres Trabalhadoras Rurais, realizado em 1991, quando se criou uma comissão com o objetivo de mobilizar as trabalhadoras rurais a se filiarem nos sindicatos.
Em 1993 a comissão se transforma no Coletivo Estadual de Mulheres da Federação de Trabalhadores Rurais do Estado do Ceará. Outro evento de referência para as trabalhadoras rurais do Ceará foi sediar o I Encontro Latino-Americano e do Caribe da Mulher Trabalhadora Rural, realizado em Fortaleza, em 1996, com a participação de 237 delegadas de 21 países.
O ano de 1997 foi marcado pela Campanha de Documentação Nenhuma Trabalhadora Rural Sem Documento, lançada pela Articulação Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais (ANMTR).
As organizações, os coletivos de trabalhadoras rurais, incentivaram a documentação e levantaram uma discussão sobre direitos, cidadania. As mulheres reconhecem que não basta serem produtoras, trabalhadoras; é preciso serem reconhecidas como tal. No Ceará, a Campanha começou com a realização de um Seminário e com a Audiência Pública na Assembléia Legislativa do Ceará em 12 de agosto de 1998.
Uma outra conquista no Ceará, em 1998, foi a aprovação da cota mínima de 30% de mulheres em todas as instâncias de direção e no congresso estadual da FETRAECE. Esse acontecimento representa um significativo avanço na luta contra a desigualdade de gênero no movimento sindical rural do Ceará.
O Coletivo Estadual de Mulheres da FETRAECE, entre 1993 e 2005, organizou nove coletivos regionais, o que corresponde a um por região, além de dezenas de comissões e coletivos municipais organizados nos sindicatos.
O crescimento de grupos de mulheres e o aparecimento de lideranças no Ceará têm reafirmado o aprendizado das mulheres. Ao participar do campo político elas percebem que é preciso entrar no jogo, e jogar é tratar com o imprevisível, o novo, o desconhecido. Não existe um modelo pronto para estabelecer uma negociação; é preciso saber tratar com o inesperado, é desenvolver um pensar intempestivo, que dê vazão à criatividade, à espontaneidade.
A organização das trabalhadoras estimula suas lideranças a pensar sobre as desigualdades de gênero, e, a partir desse olhar, as trabalhadoras começam a discutir sobre a invisibilidade do seu trabalho na agricultura familiar camponesa. As trabalhadoras rurais percebem que as atividades produtivas desenvolvidas no grupo familiar têm um significado econômico; não são simplesmente uma ajuda.
O MST tem também incorporado a discussão sobre as desigualdades de gênero na sua plataforma de luta. Por volta de 1997, o MST inclui em seus cursos de formação política os estudos de gênero. Segundo o Movimento, os estudos sobre as relações de gênero indicam como meta a construção de um novo homem e de uma nova mulher.
Essa discussão é efetivada na prática pelo MST quando, em 1999, aprova as linhas políticas sobre classe e gênero, em que são priorizadas a participação e a organização das mulheres na produção e na política. A concretização desse desejo de inclusão foi efetivada com a meta de criação de coletivos de gênero em todos os níveis de organização.
A operacionalização dessas linhas na formação está prevista através da paridade na representação, da garantia do debate sobre gênero em toda atividade de formação e da recomendação de formar coletivos de mulheres.
A criação de coletivos, tanto pela FETRAECE como pelo MST-CE, propiciou o encontro de lideranças e reflexões coletivas sobre as dificuldades específicas das trabalhadoras rurais que impedem o acesso delas aos diversos campos de decisão nos sindicatos, assentamentos e comunidades rurais. É também no interior dos coletivos de mulheres que as trabalhadoras discutem sobre sua atividade produtiva e percebem que é preciso destruir valores estabelecidos, para então descobrir a potência interna que leva à conquista de uma dimensão autônoma.
Se para algumas mulheres a inquietação inicial era possuir uma carteira para ter acesso aos direitos, que o sindicato prescreve aos trabalhadores, para outras significa tornar-se sócia-participante ou, ainda, assumir a luta dos sem-terra e ampliar seus projetos, suas aspirações, passando a buscar como luta a inserção de outras mulheres nos movimentos. Mas, ao se inserir no sindicato, elas se deparam com a hierarquia e dificuldade de inclusão das mulheres nas instâncias de poder das estruturas representativas.
Outro espaço de participação são os eventos políticos organizados pelo MST e pelo movimento sindical, como, por exemplo, os acampamentos, seminários, marchas e atos públicos no Dia Internacional da Mulher. Em 2000 as trabalhadoras rurais do Ceará participaram da Marcha Mundial das Mulheres, realizando a Marcha das Margaridas.
Com a marcha de 2000, as trabalhadoras conseguiram que os contratos e os títulos de terras da reforma agrária fossem em nome do homem e da mulher.
A participação das trabalhadoras em movimentos sociais funciona como espaço de aprendizagem do jogo político, e a assimilação vai se dando no próprio exercício da luta, participando, discutindo, negociando.5
A Marcha das Margaridas em 2003 reivindica o acesso à terra, além de um salário mínimo digno, saúde, com assistência integral à mulher do campo, e o fim da impunidade e da violência sexista.
Conquistas e desafios das trabalhadoras rurais no campo produtivo
A atividade da agricultura no Ceará, embora tenha importância econômica, concentra o maior índice de pobreza. Segundo Pedro Leite,6 77% da população empregada na agricultura do estado está abaixo da linha da pobreza. Ainda predomina uma agricultura de subsistência, rudimentar, com baixo nível tecnológico, embora alguns setores e pólos isolados utilizem tecnologia moderna.
Nessa realidade, mulheres trabalhadoras rurais do Ceará (pequenas agricultoras, posseiras, pescadoras artesanais, extrativistas, arrendatárias, meeiras, parceiras, assalariadas rurais, sem-terra, acampadas, assentadas e indígenas) produzem alimentos e garantem a subsistência da família, além de se ocuparem também com o plantio de ervas medicinais e com o artesanato. Suas atividades se confundem com os diversos espaços de trabalho; elas, ao mesmo tempo em que cuidam da casa, carregam água, cuidam também dos pequenos animais (galinhas, cabras e porcos) e das hortas. Além dessas atividades que se concentram principalmente na casa e no quintal, elas ainda desenvolvem trabalhos no roçado, principalmente no período do plantio e colheita.
Por não desenvolver todas as etapas do roçado, e por ser uma atividade liderada pelo homem adulto, esse trabalho é qualificado como ajuda, tanto no interior da família como nos sindicatos e órgãos públicos, o que inviabilizou durante muito tempo o reconhecimento das mulheres como trabalhadoras e, conseqüentemente, a garantia de seus direitos sociais.
Embora as mulheres estivessem presentes, ou mesmo liderado lutas pela conquista da terra, elas não eram beneficiadas pelos Planos e Projetos de Reforma Agrária. Em 2003, através da Portaria 981/2003, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), torna-se obrigatória a titulação da terra em nome do homem e da mulher, em situações de casamento ou união estável.
Para reparar as desigualdades de gênero, no que diz respeito aos direitos das trabalhadoras rurais, foram criados alguns projetos7 que contemplam demandas dessas mulheres.
A ampliação significativa da cidadania feminina no campo desencadeou-se principalmente com a Constituição de 1988, quando no artigo 226, §5°, foi reconhecida a igualdade entre homens e mulheres na família, e no artigo 189, parágrafo único, estabelecida a igualdade de direitos entre homens e mulheres na obtenção de título de domínio ou de concessão de uso de terras para fins de reforma agrária. Essas conquistas são fundamentais, expressam a luta das mulheres, no entanto elas esbarram em outros obstáculos, como a falta de documentos e escolaridade. A dificuldade de lidar com atividades do mundo público, como abrir conta bancária, por exemplo, é reforçada pelas práticas e costumes sexistas, que colaboram com a perpetuação da subordinação das mulheres rurais.
O reconhecimento legal das mulheres na produção da agricultura familiar é um grande passo, mas além das leis é necessário um conjunto de ações paralelas que empoderem as mulheres, para que possam usufruir os direitos conquistados. A burocratização que envolve os programas de crédito inviabiliza o acesso das mulheres.
O MST do Ceará acompanha cerca de 48 grupos de produção no estado, dos quais 30 grupos estão constituídos e 18 em formação. As atividades produtivas desenvolvidas por esses grupos são: horta coletiva; artesanato; criação de galinha; criação de cabra/ovelha; fabricação de xaropes e sabonetes naturais; criação de tilápia em cativeiro; minifábrica de rapadura e doce de caju. A comercialização desses produtos é realizada nas feiras da reforma agrária, no próprio assentamento, na sede do município ou nos espaços de atividades do MST. Desses grupos, apenas dois utilizam recursos externos. Nenhum deles pleiteou o PRONAF Mulher.
Observa-se que, "nas áreas de semi-árido de agricultura tradicional, a relação entre mercado e a agricultura familiar é perversa e inviável, não sendo possível competir com o mercado globalizado".8 No caso das mulheres, a situação é mais grave, pois, além de muitas delas não possuírem o título da terra e/ou documentação, o seu trabalho é desvalorizado e a decisão da comercialização é quase sempre centrada nos homens.
A participação das mulheres rurais em grupos de produção, coletivos, ocupação da terra e eventos políticos tem suscitado novos processos e reflexões sobre sua própria situação e aquilo que se passa em torno delas.
As experimentações no campo produtivo estão sendo iniciadas no Ceará pelos grupos de mulheres, principalmente aqueles assessorados pelas ONGs ESPLAR (Centro de Pesquisa e Assessoria) e CETRA (Centro de Estudos do Trabalho e de Assessoria ao Trabalhador), que trabalham na perspectiva de oferecer às mulheres alternativas de geração de renda . Os grupos assessorados pela ESPLAR são os coletivos regionais de mulheres da FETRAECE do Sertão Central e da Zona Norte, comissões de mulheres de Sindicatos de Trabalhadores Rurais, grupos de mulheres rurais de assentamentos rurais, grupo de mulheres fiadeiras e grupo de mulheres apicultoras e caprinocultoras.
O CETRA também trabalha com projetos de inclusão de mulheres no sentido de fortalecer as organizações das mulheres, visando à eqüidade da participação e das oportunidades no processo de desenvolvimento. Os projetos seguem quatro eixos temáticos de trabalho: "Terra, água e agroecologia"; "Educação e ação ambiental"; "Socioeconomia solidária"; e "Gênero e cidadania".
Considerações finais
Os grupos de produção, formados por mulheres rurais no Ceará, em geral, são antecedidos por uma formação política. Quando as mulheres começam a se organizar em comissões, em coletivos, elas percebem que, embora não tenham renda, desenvolvem atividades produtivas semelhantes às dos homens. É também no grupo que elas começam a rever suas relações e a perceber as desigualdades entre homens e mulheres.
A participação em movimentos sociais incentiva as mulheres mais atuantes a romper com a rígida divisão de papéis, com o lugar já predeterminado na família, no trabalho, e a ocupar espaço no campo político.
Os movimentos sociais, como espaço inovador das relações de poder, criam e recriam novas formas de reivindicar e de estabelecer relações com o poder institucional. No entanto, eles não se isentam de posições tradicionais de desigualdades de gênero.
Nesse sentido, a participação política é um aprendizado coletivo que se redefine no interior dos próprios movimentos.
A participação das mulheres nos movimentos sociais é também um espaço de luta, de contestação dos dispositivos de poder que organizam saberes dominantes, mas não deixa de ser uma possibilidade de escapar do controle familiar e de vivenciar outros códigos.
A partir do envolvimento em movimentos sociais as mulheres se sentem fortalecidas e começam a produzir seus processos de reação à submissão, passam a reconhecer que possuem um determinado capital específico suficiente para formar um grupo de produção, ter uma renda. Depois de experimentar uma atividade produtiva rentável, as mulheres não são as mesmas, já não se sentem tão prisioneiras, estão mais abertas às multiplicidades do mundo, sonham com liberdade e, assim, contagiam outras mulheres, afetando e sendo afetadas por esses desejos.
Referências bibliográficas
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- LEITE, Pedro Sisnando. Em busca do desenvolvimenrto rural do Ceará Ceará: SEAGRI-CE, 2005. Disponível em: http://www.seagri.ce.gov.br Acesso em: dez. 2005.
- PORTELLA, Ana Paula; SILVA, Carmem; FERREIRA, Simone. Mulher e trabalho na agricultura familiar. Recife: SOS CORPO Gênero e Cidadania, 2004.
- SALES, Celecina de Maria Veras. Conflito no feminino: trajetórias políticas de mulheres no campo 1995. Dissertação (Mestrado em Sociologia) Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza.
- ______. "Gênero e MST". In: AMARAL, Célia G. (Org.). Teoria e práxis dos enfoques de gênero. Salvador: Editora REDOR; Fortaleza: NEGIF/UFC, 2004. p. 101-117.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
26 Nov 2007 -
Data do Fascículo
Ago 2007