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Prevalência de consumo abusivo de bebidas alcoólicas na população adulta brasileira: Pesquisa Nacional de Saúde 2013 e 2019

Prevalencia del abuso de alcohol en la población adulta brasileña: Encuesta Nacional de Salud 2013 y 2019

Resumo

Objetivo:

Descrever a prevalência do consumo abusivo de bebidas alcoólicas na população adulta brasileira, segundo características sociodemográficas, em 2013 e 2019.

Métodos:

Estudo transversal, utilizando dados do consumo abusivo de álcool entre adultos (≥ 18 anos) da Pesquisa Nacional de Saúde, analisados descritivamente.

Resultados:

Foram incluídos 60.202 participantes em 2013 e 88.531 em 2019. A prevalência de consumo abusivo de bebidas alcoólicas, em 2019 (17,1%; IC95% 16,6;17,5), foi superior a 2013 (13,1%; IC95% 13,1;14,2). Nos dois anos, verificaram-se maiores prevalências entre o sexo masculino, os adultos de 18 a 39 anos, indivíduos com alta escolaridade, residentes em áreas urbanas e nas regiões Centro-Oeste e Sudeste e de raça/cor da pele preta.

Conclusão:

O indicativo da crescente prevalência do consumo abusivo de bebidas alcoólicas no Brasil e as diferenças nas prevalências, segundo características sociodemográficas, evidenciam a necessidade de incentivo a políticas públicas e ações de enfrentamento ao seu uso.

Palavras-chave:
Consumo de Bebidas Alcoólicas; Fatores de Risco; Inquéritos Epidemiológicos; Epidemiologia Descritiva

Resumen

Objetivo:

Describir la prevalencia del consumo excesivo de alcohol en la población adulta brasileña, según características sociodemográficas, en 2013 y en 2019.

Métodos:

Estudio transversal utilizando datos sobre abuso de alcohol en adultos (≥ 18 años) de la Encuesta Nacional de Salud, analizados de forma descriptiva.

Resultados:

Se incluyeron 60,202 participantes en 2013 y 88.531 en 2019. La prevalencia del consumo excesivo de alcohol, en 2019 (17,1%; IC95% 16,6;17,5), fue mayor que en 2013 (13,1%; IC95% 13,1;14,2). En los dos años, hubo mayor prevalencia entre lo sexo masculino, adultos de 18 y 39 años, personas con estudios secundarios y de piel negra. Además, se encontraron prevalencias más altas entre los residentes en áreas urbanas y en las regiones del Medio Oeste y Sudeste.

Conclusión:

El indicio de la creciente prevalencia del abuso de alcohol en Brasil y las diferencias, según características sociodemográficas, muestran la necesidad de impulsar políticas públicas y acciones para combatir su uso.

Palabras clave:
Consumo de Bebidas Alcohólicas; Factores de Riesgo; Encuestas Epidemiológicas; Epidemiología Descriptiva

Abstract

Objective:

To describe the prevalence of heavy episodic drinking in the Brazilian adult population, according to sociodemographic characteristics, in 2013 and in 2019.

Methods:

A cross-sectional study using data on heavy episodic drinking among adults (≥ 18 years) from the National Health Survey, analyzed descriptively.

Results:

60,202 participants were included in 2013 and 88,531 in 2019. The prevalence of heavy episodic drinking, in 2019 (17.1%; 95%CI 16.6;17.5), was higher than 2013 (13.1%; 95%CI 13.1;14.2). In the two years, there was a higher prevalence among male sex, adults 18 to 39 years old, individuals with high schooling and Black skin color. In addition, higher prevalence were found among residents in urban areas and in the Midwest and Southeast regions.

Conclusion:

The indication of the growing prevalence of alcohol abuse in Brazil and the differences in prevalence, according to sociodemographic characteristics, show the need to encourage public policies and actions to combat its use.

Keywords:
Alcohol Drinking; Risk Factors; Health Surveys; Epidemiology Descriptive

Contribuições do estudo

Principais resultados

Identificou-se aumento da prevalência do consumo abusivo de bebidas alcoólicas na população brasileira, de 13,1%, em 2013, para 17,1%, em 2019, além de diferenças segundo características sociodemográficas.

Implicações para os serviços

Os resultados do estudo contribuem para o incentivo a políticas públicas e seu fortalecimento, bem como a ações de enfrentamento desse importante fator de risco para a carga de doenças e de mortalidade no cenário nacional.

Perspectivas

Fortalecimento da perspectiva de saúde integral e reforço às estratégias intersetoriais, envolvendo órgãos de saúde e de regulação.

Introdução

O álcool é uma substância psicoativa, de uso lícito, tratado com grande aceitação no meio social, porém seu consumo contribui para danos entre indivíduos, na comunidade e para o sistema de saúde.11. World Health Organization (WHO). Global status report on alcohol and health 2018. Geneva: WHO; 2018. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603.
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Seu uso é um importante fator de risco para o desenvolvimento de doenças e mortalidade em todo o mundo.11. World Health Organization (WHO). Global status report on alcohol and health 2018. Geneva: WHO; 2018. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603.
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,22. Monteiro MG. Políticas públicas para a prevenção dos danos relacionados ao consumo de álcool. Epidemiol Serv Saude 2016;25(1):171-4. doi: 10.5123/S1679-49742016000100017
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A Organização Mundial da Saúde (OMS) calculou que mais de 40% da população com 15 anos ou mais de idade, em todo o mundo, era consumidora de bebidas alcoólicas em 2016, o que correspondia a mais de 2 bilhões de pessoas.11. World Health Organization (WHO). Global status report on alcohol and health 2018. Geneva: WHO; 2018. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603.
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O volume e os padrões de ingestão de bebidas alcoólicas, que variam segundo sexo, faixa etária, status socioeconômico e efetividade das políticas públicas, impactam no consumo das populações e nas consequências para a saúde.11. World Health Organization (WHO). Global status report on alcohol and health 2018. Geneva: WHO; 2018. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603.
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2. Monteiro MG. Políticas públicas para a prevenção dos danos relacionados ao consumo de álcool. Epidemiol Serv Saude 2016;25(1):171-4. doi: 10.5123/S1679-49742016000100017
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-33. Garcia LP, Freitas LRS de. Consumo abusivo de álcool no Brasil: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Epidemiol Serviços Saude 2015;24(2):227-37. doi: 10.5123/S1679-49742015000200005.
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Avançar no conhecimento sobre o impacto prejudicial do uso do álcool para a saúde dos indivíduos e populações torna-se imperativo, haja vista as evidências de associação da substância com a mortalidade e a ocorrência de uma ampla variedade de doenças crônicas (cânceres, doenças cardiovasculares, doenças do fígado), algumas doenças transmissíveis (HIV, tuberculose e pneumonia), assim como acidentes e violências.11. World Health Organization (WHO). Global status report on alcohol and health 2018. Geneva: WHO; 2018. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603.
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2. Monteiro MG. Políticas públicas para a prevenção dos danos relacionados ao consumo de álcool. Epidemiol Serv Saude 2016;25(1):171-4. doi: 10.5123/S1679-49742016000100017
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-33. Garcia LP, Freitas LRS de. Consumo abusivo de álcool no Brasil: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Epidemiol Serviços Saude 2015;24(2):227-37. doi: 10.5123/S1679-49742015000200005.
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O consumo de álcool foi relacionado como causa associada a mais de 200 doenças e agravos e causa necessária de 40, conforme a Classificação Internacional de Doenças.11. World Health Organization (WHO). Global status report on alcohol and health 2018. Geneva: WHO; 2018. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603.
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Os conceitos de consumo abusivo de álcool (binge drinking) e uso pesado episódico de álcool (heavy episodic drinking) foram criados a partir de evidências de que, acima de determinada quantidade, o indivíduo tem maior risco de apresentar adversidades relacionadas a sua ingestão.11. World Health Organization (WHO). Global status report on alcohol and health 2018. Geneva: WHO; 2018. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603.
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Contudo, a definição de consumo excessivo, a delimitação de porção de uma bebida padrão e o teor alcoólico variam amplamente entre os países e mesmo dentro deles.

De 2013 a 2019, somente no Brasil, o álcool se manteve como o sétimo fator de risco mais relevante para mortalidade, e o sexto mais importante para os anos de vida perdidos ajustados por incapacidade (Disability Adjusted Life Years - DALY), sendo responsável por 5,5% (77 mil) de todas as mortes e 5,7% do total de DALYs (3,16 milhões).44. IHME. GBD compare. Seattle, WA: Institute for Health Metrics and Evaluation; 2019. Considerando os danos atribuídos ao uso abusivo do álcool, o Brasil lançou, em 2011, o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis no Brasil (2011-2022).55. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. Entre outras metas, esse Plano preconiza a redução da ingestão abusiva de bebidas alcoólicas em 10% até 2022,55. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. assim definida como sendo o consumo igual ou maior do que cinco doses em uma única ocasião para homens, e igual ou maior do que quatro para mulheres.

O consumo de bebida alcoólica também envolve um gasto considerável, não apenas para os consumidores, mas para toda a sociedade.66. Thavorncharoensap M, Teerawattananon Y, Yothasamut J, Lertpitakpong C, Chaikledkaew U. The economic impact of alcohol consumption: a systematic review. Subst Abuse Treat Prev Policy 2009;25;4: 20. doi: 10.1186/1747-597X-4-20.
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De acordo com uma revisão sistemática, a carga econômica do álcool para a sociedade é substancial, contabilizando de 0,45% a 5,44% do produto interno bruto.66. Thavorncharoensap M, Teerawattananon Y, Yothasamut J, Lertpitakpong C, Chaikledkaew U. The economic impact of alcohol consumption: a systematic review. Subst Abuse Treat Prev Policy 2009;25;4: 20. doi: 10.1186/1747-597X-4-20.
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Para reduzir a carga causada pelo uso prejudicial do álcool e oferecer vantagens para a redução dos riscos de populações vulneráveis, a OMS identificou ações que incluem: aumentar impostos sobre as bebidas alcoólicas; impor restrições à sua exposição, publicidade e disponibilidade física nos ambientes; além de medidas de fiscalização sobre beber e dirigir.11. World Health Organization (WHO). Global status report on alcohol and health 2018. Geneva: WHO; 2018. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603.
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Nessa perspectiva, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) lançou em 2019, no Brasil, a iniciativa Safer, que tem por objetivo impulsionar ações em âmbitos nacional e local para refrear o consumo de álcool, centradas em intervenções distribuídas em cinco áreas estratégicas, apoiadas sobre o seu custo-benefício e, consequentemente, no seu impacto na saúde pública.77. Monteiro MG. A iniciativa SAFER da Organização Mundial da Saúde e os desafios no Brasil para a redução do consumo nocivo de bebidas alcoólicas. Epidemiol Serv Saude 2020;29(1):e2020000. doi: 10.5123/S1679-49742020000100011.
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As evidências disponíveis são suficientes para colocar o tema como pauta prioritária de políticas públicas que visem à elaboração de intervenções regulatórias para diminuir a ingestão deste produto. Dessa forma, o monitoramento do consumo de álcool, especialmente por inquéritos e pesquisas populacionais, pode indicar a magnitude do problema e contribuir para a adoção de medidas que colaborem no enfrentamento. Assim, o objetivo deste estudo foi descrever a prevalência do consumo abusivo de bebidas alcoólicas na população adulta brasileira, segundo características sociodemográficas, em 2013 e 2019.

Métodos

Trata-se de estudo transversal descritivo baseado nos dados obtidos através da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) conduzida em 2013 e 2019. A PNS é um inquérito de saúde de base populacional, que coleta dados representativos da população domiciliar brasileira, objetivando fornecer informações sobre os fatores condicionantes, determinantes e de necessidades em saúde, sendo fundamental para o direcionamento de ações e para a elaboração de estratégias e políticas públicas para a saúde.88. Stopa SR, Szwarcwald CL, Oliveira MM de, Gouvea ECDP, Vieira MLFP, Freitas MPS de, et al. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: histórico, métodos e perspectivas. Epidemiol Serv Saúde 2020;29(5):e2020315. doi: 10.1590/S1679-49742020000500004.
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A amostragem da pesquisa foi realizada em três estágios por conglomerados. Inicialmente foi realizada a estratificação das unidades primárias (setores censitários ou conjuntos de setores), seguida de amostragem aleatória simples de domicílios presentes no Cadastro Nacional de Endereços para Fins Estatísticos. Finalmente, para a realização da entrevista selecionou-se, de forma aleatória, um morador de ≥ 18 anos de idade (2013) e com 15 ou mais anos (2019). 88. Stopa SR, Szwarcwald CL, Oliveira MM de, Gouvea ECDP, Vieira MLFP, Freitas MPS de, et al. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: histórico, métodos e perspectivas. Epidemiol Serv Saúde 2020;29(5):e2020315. doi: 10.1590/S1679-49742020000500004.
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A coleta das entrevistas foi realizada entre agosto de 2013 e fevereiro de 2014 (PNS 2013), e entre agosto de 2019 e março de 2020 (PNS 2019), utilizando dispositivos móveis de coleta. Maior detalhamento sobre as informações da PNS pode ser encontrado em publicação específica.88. Stopa SR, Szwarcwald CL, Oliveira MM de, Gouvea ECDP, Vieira MLFP, Freitas MPS de, et al. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: histórico, métodos e perspectivas. Epidemiol Serv Saúde 2020;29(5):e2020315. doi: 10.1590/S1679-49742020000500004.
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Para o presente estudo, com o propósito de manter a comparabilidade dos dados, foram incluídos apenas os indivíduos com idade de ≥ 18 anos. Foram utilizados dados públicos disponibilizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (https://bit.ly/3ySZ9cG, acessado em novembro de 2020), sem identificação dos participantes.

Para a amostra de 2013, a prevalência de consumo abusivo de bebidas alcoólicas foi calculada considerando-se como numerador o número de participantes do sexo masculino, que referiram a ingestão, em uma única ocasião, nos últimos 30 dias anteriores a data da entrevista, de cinco ou mais doses de bebida alcoólica e, do sexo feminino, de quatro ou mais doses. O conteúdo de uma dose de bebida alcoólica equivalia a cerca de 12g de álcool puro, ou seja, cerca de 60g para homens e de 48g para mulheres. De forma diferente, para 2019, considerou-se como consumo abusivo a ingestão de cinco ou mais doses de bebida alcoólica para homens e mulheres, em consonância com as recomendações da OMS que caracteriza o consumo abusivo de álcool, em ambos os sexos, pelo consumo de cerca de 60g de álcool em uma única ocasião no período de 30 dias.11. World Health Organization (WHO). Global status report on alcohol and health 2018. Geneva: WHO; 2018. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603.
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Para tanto, utilizou-se a questão: Nos últimos 30 dias, o(a) Sr.(a) chegou a consumir cinco ou mais doses de bebidas alcoólicas em uma única ocasião? Definiu-se uma dose de bebida como o equivalente a uma dose de cachaça, uma taça de vinho, uma lata de cerveja, uma dose de uísque ou qualquer outra bebida alcoólica destilada. Dessa forma, validou-se como consumo abusivo de álcool cada caso em que os indivíduos responderam positivamente a esta questão, independentemente do número de vezes da ocorrência. Para as estimativas das prevalências, utilizou-se como denominador o total de indivíduos com idade ≥ 18 anos entrevistados em cada ano.

As prevalências e seus intervalos de confiança de 95% (IC95%) foram estimados para a população adulta brasileira, em 2013 e 2019, estratificados segundo: sexo (masculino; feminino), faixa etária (18 a 24 anos, 25 a 39 anos, 40 a 59 anos; ≥ 60 anos), nível de escolaridade (sem instrução e fundamental incompleto; fundamental completo e médio incompleto; médio completo e superior incompleto; superior completo), raça/cor da pele (branca; preta; parda; amarela; indígena), região (Norte; Nordeste; Sudeste; Sul; Centro-Oeste) e situação do domicílio (urbana, rural). Para as Unidades da Federação (UFs), prevalências e IC95% foram calculados segundo sexo e faixa etária.

As variáveis selecionadas estão descritas de acordo com as prevalências e IC95%, considerando-se a diferença na comparação das categorias a não sobreposição dos intervalos. Todas as análises foram conduzidas utilizando-se o software Stata, versão 14.2, nas funções do módulo survey, para gerar estimativas ponderadas para a população adulta do país.

Cabe informar que a PNS foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa do Conselho Nacional de Saúde, de acordo com o Parecer nº 3.529.376, emitido em 23 de agosto de 2019. O termo de consentimento livre e esclarecido foi obtido no momento da entrevista e assinado diretamente no dispositivo de coleta.

Resultados

A PNS de 2013, coletou entrevistas de 60.202 pessoas com idade ≥ 18 anos, correspondendo a 48,3% do sexo masculino e 51,7% do feminino. Na PNS de 2019, foram 88.531 pessoas entrevistadas da mesma idade, sendo 46,8% do sexo masculino e 53,2% do feminino.

A prevalência do consumo abusivo de álcool nos 30 dias anteriores à entrevista, em 2019, foi 17,1% (IC95% 16,6;17,5), apresentando-se superior aos resultados obtidos em 2013, de 13,7% (IC95% 13,1;14,2).

Comparando-se os dados de 2013 e 2019, as prevalências foram superiores em todas as categorias das variáveis sociodemográficas estudadas em 2019. Maiores proporções foram verificadas entre o sexo masculino, sendo em 2013 de 21,6% (IC95% 20,7;22,5), e de 26% (IC95% 25,2;26,8) em 2019. Entre o sexo feminino, passou de 6,6% (IC95% 6,1;7,1) em 2013 para 9,2% (IC95% 8,7;9,7) em 2019. Na análise das faixas etárias, as maiores prevalências foram verificadas entre os adultos de 18 a 24 anos (17,2%; IC95% 15,7;18,8 em 2013, e 22,9%; IC95% 21,3;24,5 em 2019), e de 25 a 39 anos (18,9%; IC95% 17,9;19,8 em 2013, e 23,7%; IC95% 22,7;24,7 em 2019), conforme consta da Tabela 1.

Tabela 1
Prevalência (%) de consumo abusivo de álcool, nos 30 dias anteriores à entrevista, em pessoas com idade ≥ 18 anos, segundo características sociodemográficas, Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013 (n = 60.202) e 2019 (n = 88.531), Brasil

Em relação à escolaridade, observaram-se menores prevalências entre pessoas sem instrução ou com ensino fundamental incompleto: de 11,1% (IC95% 10,5;11,8) em 2013, e 12,7% (IC95% 12,0;13,4) em 2019. Quanto à raça/cor da pele, maiores prevalências de consumo abusivo foram encontradas entre pessoas que referiram raça/cor da pele preta (16,6%; IC95% 14,9;18,4 em 2013, e 19,6%; IC95% 18,3;20,8 para 2019) em comparação àqueles que referiram raça/cor da pele branca (12,4%; IC95% 11,7;13,2 em 2013, e 16,0%; IC95% 15,3;16,8 em 2019) (Tabela 1).

Em 2019, as regiões Centro-Oeste (19,6%; IC95% 18,4;20,7) e Sudeste (17,4%; IC95% 16,5;18,2) apresentaram as maiores prevalências, ao passo que a região Sul (14,7%; IC95% 13,8;15,6) aparece com a menor, mantendo-se o mesmo ordenamento em 2013. Adultos residentes em áreas urbanas referiram maior consumo abusivo de álcool (14,2%; IC95% 13,6;14,8 em 2013, e 17,6%; IC95% 17,1;18,1 em 2019), em comparação aos residentes em áreas rurais (Tabela 1).

O aumento nas prevalências de consumo abusivo de álcool também foi verificado na maioria das UFs (Figura 1). Destacamos aquelas com maiores prevalências em 2013: Bahia (18,9%; IC95% 16,8;20,9), Mato Grosso do Sul (18,4%; IC95% 16,1;20,6) e Amapá (17,6%; IC95% 14,6;20,6). Em 2019, as UFs com maiores prevalências foram: Sergipe (23,7%; IC95% 21,6;25,8), Mato Grosso do Sul (21,7%; IC95% 19,7;23,6) e Mato Grosso (21,5%; IC95% 19,0;24,0).

Figura 1
Prevalência (%) de consumo abusivo de álcool, nos 30 dias anteriores à entrevista, em pessoas com idade ≥ 18 anos, nas Unidades da Federação, Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013 (n = 60.202) e 2019 (n = 88.531), Brasil

Em 2013, as maiores prevalências entre o sexo masculino foram observadas na Bahia (29,4%; IC95% 25,6;33,2), no Rio Grande do Norte (28,7%; IC95% 24,7;32,7) e no Piauí (28,5%; IC95% 24,5;32,5); enquanto em 2019, estados como Sergipe (35,8%; IC95% 32,3;39,3), Rio Grande do Norte (32,8%; IC95% 28,9;36,7) e Mato Grosso do Sul (32,7%; IC95% 28,6;36,8) apresentaram indicadores superiores a 30%. Quanto ao sexo feminino, em 2013, as maiores prevalências ocorreram em Goiás (10,9%; IC95% 8,6;13,1), no Amapá (10,2%; IC95% 6,8;13,5) e em Mato Grosso do Sul (9,9%; IC95% 7,7;12,1); em 2019, na Bahia (13,0%; IC95% 11,0;15,0), em Sergipe (13,0%; IC95% 10,8;15,1) e em Mato Grosso do Sul (12,2%; IC95% 10,0;14,4), conforme a Figura 2.

Figura 2
Prevalência (%) de consumo abusivo de álcool, nos 30 dias anteriores à entrevista, em pessoas com idade ≥ 18 anos, nas Unidades da Federação, segundo sexo, Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), 2013 (n = 60.202) e 2019 (n = 88.531), Brasil

Quando estratificadas por UFs e faixa etária, em 2019, as maiores prevalências foram observadas na faixa entre 18 e 24 anos, principalmente na Bahia (32,7%; IC95% 25,0;40,4), em Tocantins (30,3%; IC95% 21,7;38,9) e no Rio Grande do Sul (28,6%; IC95% 22,3;35,0). Para aqueles entre 25 e 39 anos, Sergipe (32,9%; IC95% 29,3;36,6), Mato Grosso (31,1%; IC95% 26,4;35,9) e Mato Grosso do Sul (29,3%; IC95% 26,0;32,7); entre 40 e 59 anos, Sergipe (22,0%; IC95% 19,0;25,0), Mato Grosso do Sul (20,5%; IC95% 17,9;23,1) e Tocantins (19,3%; IC95% 15,5;23,1); com ≥ 60 anos, Amapá (9,0%; IC95% 4,1;14,0), Rio Grande do Norte (8,8%; IC95% 6,3;11,3) e Mato Grosso do Sul (8,5%; IC95% 6,0;10,9) (Figura 3A; Figura 3B).

Figura 3A
Prevalência (%) de consumo abusivo de álcool, nos 30 dias anteriores à entrevista, em pessoas com idade ≥ 18 anos, nas Unidades da Federação, segundo faixas de idade, Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013 (n = 60.202) e 2019 (n = 88.531), Brasil

Figura 3B
Prevalência (%) de consumo abusivo de álcool, nos 30 dias anteriores à entrevista, em pessoas com idade ≥ 18 anos, nas Unidades da Federação, segundo faixas de idade, Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013 (n = 60.202) e 2019 (n = 88.531), Brasil

Discussão

Em 2019, a prevalência de consumo abusivo de bebidas alcoólicas na população adulta brasileira foi superior à de 2013, para todo o país e na maioria das UFs. O aumento da prevalência foi verificado também nas categorias das características sociodemográficas estudadas. Nos dois anos de pesquisa, verificaram-se maiores prevalências entre o sexo masculino, adultos jovens, pessoas que residiam em áreas urbanas e nas regiões Centro-Oeste e Sudeste e de raça/cor da pele preta. Indivíduos sem instrução ou com ensino fundamental incompleto apresentaram prevalências mais baixas em comparação aos outros grupos de escolaridade.

O presente estudo revelou achados consistentes com publicações prévias que mostraram que indivíduos do sexo masculino apresentam maior consumo abusivo de bebida alcoólica do que do feminino.99. Machado IE, Monteiro MG, Malta DC, Lana FCF. Pesquisa Nacional de Saúde 2013: relação entre uso de álcool e características sociodemográficas segundo o sexo no Brasil. Rev Bras Epidemiol 2017; 20(3):408-422. doi: 10.1590/1980-5497201700030005.
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,1010. Pakovik L, Todorovic J, Santric-Milicevic M, Bukumiric D, Terzic-Supic Z. The association between social characteristics, alcoholic beverage preferences, and binge drinking in a Serbian adult population. Nordisk Alkohol Nark 2019 Feb;36(1):36-50. doi: 10.1177/1455072518803281.
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Contudo, apesar do sexo masculino ter se mantido em 2019 com maior prevalência, observou-se maior aumento no período entre o sexo feminino, cerca de 39%. Vale ressaltar que, em 2013, foi considerado como consumo abusivo para o sexo feminino a ingestão de 4 ou mais doses de bebidas alcoólicas e em 2019 esse valor passou para 5 ou mais doses. Sendo assim, mesmo com a necessidade de maior consumo para a classificação como abusivo, houve aumento na prevalência no período para o sexo feminino.

Análises da evolução temporal do consumo abusivo de bebidas alcoólicas entre adultos residentes nas capitais brasileiras indicaram, de 2006 a 2013, tendência estacionária de consumo para toda a população e para ambos os sexos.1111. Munhoz TN, Santos IS, Nunes BP, Mola CL, Silva ICM, Matijasevich A. Tendências de consumo abusivo de álcool nas capitais brasileiras entre os anos de 2006 a 2013: análise das informações do VIGITEL. Cad Saude Publica 2017 ago. 07;33(7):e00104516. doi: 10.1590/0102-311X00104516.
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Entretanto, entre 2006 e 2019, observou-se um aumento tanto para a população total quanto para o sexo feminino, sem que esse movimento ocorresse para o masculino.1212. Malta DC, Silva AG da, Prates EJS, Alves FTA, Cristo EB, Machado IE. Convergência no consumo abusivo de álcool nas capitais brasileiras entre sexos, 2006 a 2019: o que dizem os inquéritos populacionais. Rev Bras Epidemiol 2021;24(Suppl 1). doi: 10.1590/1980-549720210022.supl.1.
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Estudo qualitativo conduzido por Rodríguez, Moreno e Gómez (2019),1313. Rodríguez MAF, Moreno SD, Gómez YF. The influence of gender roles in alcohol consumption: a qualitative study of adolescents and young adults in Asturias. Adicciones 2019;31(4):260-273. doi: 10.20882/adicciones.1003.
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relacionando gênero e consumo de bebida alcoólica, sugeriu que a inclusão do consumo de bebidas alcoólicas à rotina das mulheres, nas últimas décadas, esteve ligado à incorporação delas em espaços de lazer e práticas tradicionalmente consideradas masculinas. Além disso, nos últimos anos, as mulheres têm experimentado maior exposição ao marketing do álcool, com ampla divulgação de produtos como bebidas mais doces, efervescentes e voltadas especificamente para o público feminino.1414. Pan American Health Organization. Regional Status Report on Alcohol and Health in the Americas 2020. Washington, DC: Paho 2020. Disponível em: https://iris.paho.org/handle/10665.2/52705.
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Aferir a existência de uma maior prevalência de ingestão abusiva de bebida alcoólica, entre grupos etários mais jovens, também é coerente com outros estudos nacionais e internacionais.99. Machado IE, Monteiro MG, Malta DC, Lana FCF. Pesquisa Nacional de Saúde 2013: relação entre uso de álcool e características sociodemográficas segundo o sexo no Brasil. Rev Bras Epidemiol 2017; 20(3):408-422. doi: 10.1590/1980-5497201700030005.
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,1212. Malta DC, Silva AG da, Prates EJS, Alves FTA, Cristo EB, Machado IE. Convergência no consumo abusivo de álcool nas capitais brasileiras entre sexos, 2006 a 2019: o que dizem os inquéritos populacionais. Rev Bras Epidemiol 2021;24(Suppl 1). doi: 10.1590/1980-549720210022.supl.1.
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,1515. Chen CM, Dufour MC, Yi HY. Alcohol Consumption Among Young Adults Ages 18-24 in the United States: results from the 2001-2002. NESARC Survey. Alcohol Res Health 2004;28(4):269-80. PMCID: PMC6601671. De acordo com os dados do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions, realizada na população adulta americana em 2001-2002, mais de três quartos dos jovens adultos com idades entre 21 e 24 anos eram consumidores de álcool, assim como quase dois terços daqueles com idades entre 18 e 20 anos.1515. Chen CM, Dufour MC, Yi HY. Alcohol Consumption Among Young Adults Ages 18-24 in the United States: results from the 2001-2002. NESARC Survey. Alcohol Res Health 2004;28(4):269-80. PMCID: PMC6601671. Pesquisas de natureza qualitativa têm tentado entender o significado do abuso de álcool entre jovens, e diversas delas sugerem que o comportamento está conectado à ideia de que o consumo abusivo é característica e normativa deste estágio de vida, intimamente relacionada à aquisição de maturidade.1616. García PO, Mira EC. Estilos de consumo de sustancias adictivas en función del género. Una aproximación desde el análisis de discurso. Acta Sociol Sociol 2014;64:121-144. doi: 10.1016/S0186-6028(14)70485-2.
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,1717. Romo-Avilés N, Marcos-Marcos J, Gil-García E, Marquina-Márquez A, Tarragona-Camacho A. Bebiendo como chicos: consumo compartido de alcohol y rupturas de género en poblaciones adolescentes. Revista Española de Drogodependencias 2015; 40(1):13-28. Ademais, soma-se a isso a existência de intensas estratégias de marketing voltadas para esse público, destacando-se a livre propaganda de cerveja e o acesso facilitado ao álcool em bares, festas e comércio, justificada pela alta aceitação social no Brasil.1818. Malta DC, Machado IE, Porto DL, Silva MMA da, Freitas PC de, Costa AWN da, et al. Consumo de álcool entre adolescentes brasileiros segundo a Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE 2012). Rev bras epidemiol 2014;17( Suppl 1):203-214. doi: 10.1590/1809-4503201400050016.
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Por outra parte, o crescimento expressivo desse consumo entre indivíduos com idade mais avançada também está em consonância com estudos nacionais99. Machado IE, Monteiro MG, Malta DC, Lana FCF. Pesquisa Nacional de Saúde 2013: relação entre uso de álcool e características sociodemográficas segundo o sexo no Brasil. Rev Bras Epidemiol 2017; 20(3):408-422. doi: 10.1590/1980-5497201700030005.
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,1212. Malta DC, Silva AG da, Prates EJS, Alves FTA, Cristo EB, Machado IE. Convergência no consumo abusivo de álcool nas capitais brasileiras entre sexos, 2006 a 2019: o que dizem os inquéritos populacionais. Rev Bras Epidemiol 2021;24(Suppl 1). doi: 10.1590/1980-549720210022.supl.1.
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e internacionais.1414. Pan American Health Organization. Regional Status Report on Alcohol and Health in the Americas 2020. Washington, DC: Paho 2020. Disponível em: https://iris.paho.org/handle/10665.2/52705.
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Entre as razões para esse achado, aponta-se o uso de álcool relacionado ao baixo envolvimento social, adoecimento, luto, mudanças de rotinas e problemas de ordem econômica.1919. Veerbeek MA, Ten Have M, Dorsselaer SA, Oude Voshaar RC, Rhebergen D, Willemse BM. Differences in alcohol use between younger and older people: results from a general population study. Drug Alcohol Depend 2019;202:18-23. doi: 10.1016/j.drugalcdep.2019.04.023.
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Tanto em 2013 quanto em 2019, o consumo abusivo de bebidas alcoólicas foi maior nas faixas de menor escolaridade. Foi observado aumento da prevalência em todas as categorias analisadas, ainda que desigual entre elas: o maior incremento ocorreu na população que referiu ensino superior completo, com um aumento de 30,8%; já a menor prevalência foi observada entre aqueles sem instrução ou com ensino fundamental incompleto. Tal constatação pode ser explicada pelo menor acesso à bebida alcoólica decorrente do menor poder aquisitivo dessa faixa de escolaridade.2020. Thompson A, Wright AK, Ashcroft DM, Staa TP, Pirmohamed M. Epidemiology of alcohol dependence in UK primary care: results from a large observational study using the Clinical Practice Research Datalink. PLoS One 2017;12(3):e0174818. doi: 10.1371/journal.pone.0174818.
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Para as demais faixas, foi verificado que o consumo abusivo de bebida alcoólica guardou relação inversamente proporcional à escolaridade, ou seja, quanto mais anos de estudo, menor a prevalência de consumo abusivo. Os dados da PNS 2019 apresentaram, ainda, que a prevalência de consumo de bebida alcoólica, uma ou mais vezes por semana, é diretamente proporcional à escolaridade, isto é, quanto mais anos de estudo, maior o consumo.2121. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional de Saúde 2019: percepção do estado de saúde, estilos de vida, doenças crônicas e saúde bucal. Rio de Janeiro: IBGE; 2020. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101764.pdf.
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Embora possa parecer paradoxal, tais constatações se explicam pelo risco aumentado de abuso e/ou dependência de álcool entre populações de menor nível socioeconômico.2222. Mäkelä P. Alcohol-related mortality as a function of socio-economic status. Addiction 1999;94(6):867-886. doi: 10.1046/j.1360-0443.1999.94686710.x.
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,2323. Grant BF, Goldstein RB, Saha TD, Chou SP, Jung J, Zhang H, et al. Epidemiology of DSM-5 Alcohol Use Disorder: Results From the National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions III. JAMA Psychiatry. 2015;72(8):757-66. doi: 10.1001/jamapsychiatry.2015.0584. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26039070/.
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Assim, embora o consumo de bebida alcoólica seja menos frequente entre as populações de menor nível socioeconômico, estas são mais propensas a serem afetadas negativamente pelo álcool, levando a desfechos como o consumo abusivo, a dependência, a ocorrência de doenças causadas pelo álcool e a morte.2222. Mäkelä P. Alcohol-related mortality as a function of socio-economic status. Addiction 1999;94(6):867-886. doi: 10.1046/j.1360-0443.1999.94686710.x.
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Neste sentido, o aumento da prevalência, tanto do consumo habitual quanto do consumo abusivo, entre 2013 e 2019, e a observação de que o maior crescimento ocorreu entre a população com ensino médio completo ou superior incompleto, podem ser explicados pelo efeito da crise econômica mundial, que afetou a população brasileira, mas de forma desigual entre os diferentes níveis socioeconômicos.2424. Stuckler D, Basu S, Suhrcke M, Coutts A, McKee M. The public health effect of economic crises and alternative policy responses in Europe: an empirical analysis. Lancet 2009;374(9686):315-23. doi: 10.1016/S0140-6736(09)61124-7.
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Um estudo que analisou os dados da PNS 2013 identificou que indivíduos que referiram raça/cor de pele preta e parda estiveram associados ao maior comportamento de uso pesado episódico de álcool em ambos os sexos.99. Machado IE, Monteiro MG, Malta DC, Lana FCF. Pesquisa Nacional de Saúde 2013: relação entre uso de álcool e características sociodemográficas segundo o sexo no Brasil. Rev Bras Epidemiol 2017; 20(3):408-422. doi: 10.1590/1980-5497201700030005.
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Estudos sobre populações específicas - idosos, trabalhadores rurais e trabalhadores urbanos - apresentam resultados diversificados nesse aspecto, com maiores frequências de uso episódico excessivo entre brancos e pardos.2525. Cunha NO, Giatti L, Assunção AA. Factors associated with alcohol abuse and dependence among public transport workers in the metropolitan region of Belo Horizonte. Int Arch Occup Environ Health 2016;89(6):881-90. doi: 10.1007/s00420-016-1124-8. doi: 10.1007/s00420-016-1124-8.
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26. Alves MC, Jesus JP de, Diaz LAF. Autodeclaração da raça/cor no SUS: reflexões conceituais a partir da campanha realizada pelo estado do Rio Grande do Sul. Revista Identidade! 2017;22(1):5-15. Disponível em: http://www.periodicos.est.edu.br/index.php/identidade/article/view/3025/2881.
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-2727. Smolen JR, Araújo EM de. Raça/cor da pele e transtornos mentais no Brasil: uma revisão sistemática. Cienc Saude Colet 2017; 22(12):4021-4030. doi: 10.1590/1413-812320172212.19782016.
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A inconsistência desses resultados pode ser atribuída a diferenças nos métodos e medidas para avaliação do uso nocivo de álcool, mas também às dificuldades de empregar raça/cor da pele autorreferida como descrição étnico-racial no Brasil, dado seu impacto sobre as condições de saúde, em especial, sobre o uso de álcool e outras drogas.2626. Alves MC, Jesus JP de, Diaz LAF. Autodeclaração da raça/cor no SUS: reflexões conceituais a partir da campanha realizada pelo estado do Rio Grande do Sul. Revista Identidade! 2017;22(1):5-15. Disponível em: http://www.periodicos.est.edu.br/index.php/identidade/article/view/3025/2881.
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,2727. Smolen JR, Araújo EM de. Raça/cor da pele e transtornos mentais no Brasil: uma revisão sistemática. Cienc Saude Colet 2017; 22(12):4021-4030. doi: 10.1590/1413-812320172212.19782016.
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O padrão observado em 2019, com maior consumo abusivo de álcool nas regiões Centro-Oeste e Sudeste, difere dos resultados encontrados pela Vigitel 2019, que apontou Salvador, Distrito Federal e Palmas como as capitais com maior prevalência.55. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. Já o estudo de Marques et al. (2019)2828. Marques MV, Silva Junior DN, Santos EGO, Santos SSAN, Neves SMB, Amador AE. Distribuição espacial das mortes atribuíveis ao uso de álcool no Brasil. J Health Biol Sci 2020;8(1):1-11 doi: 10.12662/2317-3076jhbs.v8i1.2934.p1-11.2020.
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identificou “bolsões” de altas taxas de mortalidade por causas atribuíveis ao consumo de álcool em certos municípios das regiões Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste. Outro estudo verificou que, entre 2010 e 2012, as maiores taxas de mortalidade por causas plenamente atribuídas ao uso de álcool ocorreram nas regiões Nordeste e Centro-Oeste.2929. Garcia LP, Freitas LRS, Gawryszewski VP, Duarte EC. Uso de álcool como causa necessária de morte no Brasil, 2010 a 2012. Rev Panam Salud Publica. 2015;38(5):418-424.

Uma vez que o consumo em cada localidade pode ser influenciado por condicionantes regionais e culturais,11. World Health Organization (WHO). Global status report on alcohol and health 2018. Geneva: WHO; 2018. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603.
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,33. Garcia LP, Freitas LRS de. Consumo abusivo de álcool no Brasil: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Epidemiol Serviços Saude 2015;24(2):227-37. doi: 10.5123/S1679-49742015000200005.
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,2929. Garcia LP, Freitas LRS, Gawryszewski VP, Duarte EC. Uso de álcool como causa necessária de morte no Brasil, 2010 a 2012. Rev Panam Salud Publica. 2015;38(5):418-424. padrões consistentes podem não ser observados. Ainda assim, o aumento verificado para a maioria das UFs, para ambos os sexos e categorias de idade estudadas, reforça a relevância do problema do consumo abusivo de álcool na população brasileira. Estudos analisando a evolução desse consumo destacaram a tendência desigual por localidade e estratos populacionais, principalmente pelo aumento do consumo em grupos que antes apresentavam menores prevalências. 1212. Malta DC, Silva AG da, Prates EJS, Alves FTA, Cristo EB, Machado IE. Convergência no consumo abusivo de álcool nas capitais brasileiras entre sexos, 2006 a 2019: o que dizem os inquéritos populacionais. Rev Bras Epidemiol 2021;24(Suppl 1). doi: 10.1590/1980-549720210022.supl.1.
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Quanto às limitações do estudo, destaca-se que a determinação do consumo abusivo de álcool baseada na condição referida pelo entrevistado, sem aferição da quantidade de álcool ingerida, além das variações quanto ao teor alcoólico de cada bebida, pode gerar imprecisões nas estimativas. Entretanto, essas informações autorreferidas são amplamente utilizadas em inquéritos de saúde, mostrando-se como indicador útil, de abordagem confiável e válida, para o monitoramento desse fator de risco na população. A mudança nos valores para mensuração do indicador entre o sexo feminino - passando de quatro ou mais doses em 2013, para cinco ou mais doses em 2019 - também constitui uma importante limitação do estudo, por dificultar a comparabilidade entre as informações obtidas. Ademais, ainda que essa diferença, possivelmente, tenha reduzido aquelas classificadas para o desfecho, verificou-se que esse comportamento se mostrou crescente para o grupo.

A despeito dessas limitações, destaca-se que a precisão das estimativas apresentadas no estudo considera a amostragem realizada pela PNS, que bem representa a população total adulta do país, das grandes regiões, das UFs, das capitais brasileiras e do Distrito Federal.

A elevada e crescente prevalência do consumo abusivo de bebidas alcoólicas no Brasil, confirmada no presente estudo, evidencia a necessidade de incentivo a políticas públicas e ações de enfrentamento a esse importante fator de risco para a carga de doenças e mortalidade, com cenário alarmante no contexto nacional. No âmbito do setor saúde, é importante o fortalecimento da perspectiva de saúde integral, com o fortalecimento de ações que vão desde a promoção da saúde ao aprimoramento da rede de atenção, tanto por meio da qualificação do rastreio e diagnóstico do consumo abusivo, como da oferta adequada à reabilitação psicossocial. Além disso, os indicativos na ampla literatura sobre a temática corroboram que ações intersetoriais, envolvendo órgãos de saúde e de regulação, podem produzir resultados eficazes. Dessa forma, consideramos que a iniciativa Safer poderá auxiliar os tomadores de decisão na adoção de estratégias, protegendo a saúde pública frente a interesses externos.

Neste sentido, e à luz dos resultados do presente estudo, recomenda-se, principalmente, reforço às estratégias que visem à redução da disponibilidade de bebidas alcoólicas por meio de restrições em locais e horários de vendas, a regulação da propaganda nos meios de comunicação social e a adoção de políticas regulatórias fiscais, evidentemente aliadas ao reforço às demais estratégias vigentes.

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Editado por

Editora associada

Maryane Oliveira Campos

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    22 Abr 2021
  • Aceito
    19 Nov 2021
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