Resumo
OBJETIVO Verificar o conhecimento dos profissionais atuantes na Atenção Básica sobre as Práticas Integrativas e Complementares (PIC) e se as percebem como um recurso de cuidado em Saúde Mental.
MÉTODO Estudo quantitativo, realizado com 70 profissionais de uma Unidade Básica de Saúde no município de São Paulo entre maio e junho de 2016. Os dados foram coletados mediante questionário elaborado pelas pesquisadoras. Para análise estatística, considerou-se a distribuição de frequência das variáveis e o teste de Fisher.
RESULTADOS Os profissionais afirmam conhecer alguma PIC (73,9%), que usuários do serviço com questões de Saúde Mental se beneficiariam das mesmas (94,2%), que gostariam de receber capacitação (91,3%) e que as consideram uma possibilidade de recurso para o cuidado em Saúde Mental (92,8%).
Conclusão: O conhecimento dos profissionais precisa ser aprofundado. Ainda assim, os mesmos consideram as PIC como um recurso em Saúde Mental na Atenção Básica.
Palavras-chave: Terapias complementares; Atenção primária à saúde; Saúde mental.
Resumen
OBJETIVO Evaluar el conocimiento de los profesionales de la atención primaria de Terapias Complementarias (TC) y la perciba como un recurso de atención en salud mental.
MÉTODO Estudio cuantitativo, realizado con 70 profesionales de una Unidad Básica de Salud en la ciudad de São Paulo entre mayo y junio de 2016. Los datos recogidos a través de cuestionario elaborado por los investigadores. El análisis estadístico considera la distribución de frecuencias de las variables y la prueba exacta de Fisher.
RESULTADOS Los profesionales afirman conocer a TC (73,9%), que usuarios del servicio cometas de Salud Mental se beneficiarían de las mismas (94,2%), que les gustaría recibir capacitación (91,3%), y consideradas una posibilidad de Para el cuidado en Salud Mental por el 92,8%.
CONCLUSIÓN El conocimiento de los profesionales necesita ser profundizado. Sin embargo, los mismos consideran las TC como un recurso en Salud Mental en la Atención Básica.
Palabras clave: Terapias complementarias; Atención primaria de salud; Salud mental.
Abstract
OBJECTIVE To verify the knowledge of Primary Care professionals about Integrative and Complementary Practices (PIC – “Práticas Integrativas e Complementares”) and if they perceive these Practices as a care resource in Mental Health.
METHOD Quantitative study carried out with 70 professionals from a Basic Unit of Health in the city of São Paulo between May and June of 2016. The data were collected through a questionnaire elaborated by the researchers. For statistical analysis, the frequency distribution of the variables and the Fisher test were considered.
RESULTS The professionals said that they were aware of some PIC (73.9%), that users of the service with Mental Health issues would benefit from them (94.2%), that they would like to receive training (91.3%), and that they consider the practices a possible resource for care in Mental Health (92.8%).
CONCLUSION The professionals’ knowledge needs to be deepened. Still, they consider PIC as a resource for Mental Health in Primary Care.
Keywords: Complementary therapies; Primary health care; Mental health.
Introdução
As Práticas Integrativas e Complementares (PIC) são condizentes com o que a Organização Mundial de Saúde (OMS) denomina de medicina tradicional e medicina complementar/alternativa (MT/MAC). A OMS recomenda que os Estados membros elaborem políticas nacionais que incorporem essas práticas aos sistemas oficiais de saúde, com foco na Atenção Básica (AB)1.
Em conformidade com tais recomendações, em 2006 foi aprovada no Brasil a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), com intenção de implantar e adequar ações/serviços de medicina tradicional chinesa/acupuntura, homeopatia, plantas medicinais e fitoterapia, termalismo social/crenoterapia e medicina antroposófica1.
As PIC abrangem sistemas e recursos que valorizam a escuta acolhedora, o desenvolvimento de vínculo terapêutico, e a integração do ser humano com o meio em que vive. O processo saúde-doença é visto de forma ampliada e visa a promoção global do cuidado e, principalmente, do estímulo ao autocuidado2. A disponibilidade das PIC na AB, bem como sua consolidação como método terapêutico e de promoção de saúde, favorece a integralidade da atenção à saúde3.
O fato da PNPIC enfatizar a inserção dessas práticas na AB contribui para a ampliação do acesso as mesmas, com o aumento da resolutividade e com a construção de um cuidado continuado, humanizado e integral. Todavia, a instituição das PIC no Sistema Único de Saúde (SUS) é considerada um desafio para os gestores públicos, pois há poucos recursos humanos capacitados, financiamento insuficiente, faltam espaços para o desenvolvimento de novas práticas e ainda há dificuldade de integração entre as PIC e a lógica biomédica3.
As equipes da AB são um importante recurso de enfrentamento de agravos à saúde e é impossível falar de saúde integral sem incluir a Saúde Mental (SM), assim como não há meios de abordar a SM sem pensar nos dispositivos relativos ao contexto de vida das pessoas. É preconizado que aqueles que necessitam de acompanhamento devem ter o cuidado disponível em seu território e a AB é um importante articulador dos serviços da rede de SM4.
Foi nesse sentido que em 2011 institui-se a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) no SUS por meio da Portaria 3.088, com a finalidade de criar, ampliar e articular os pontos de atenção à saúde para o atendimento de pessoas com sofrimento mental e/ou uso de crack, álcool e outras drogas. A RAPS é constituída pelos componentes: atenção básica em saúde; atenção psicossocial especializada; atenção de urgência e emergência; atenção residencial de caráter transitório; atenção hospitalar; estratégias de desinstitucionalização; reabilitação psicossocial5.
Entende-se que a SM não está dissociada da saúde geral e suas demandas revelam-se em todos os serviços da RAPS, especialmente na AB. É necessário que o cuidado em SM seja incorporado à prática em todos os níveis de atenção, com intervenções capazes de considerar a subjetividade, a singularidade e a forma como o indivíduo percebe o mundo6.
Ao tornar-se uma política nacional do Ministério da Saúde, a Estratégia de Saúde da Família (ESF) define como objetivo a reorientação do modelo da assistência a partir da perspectiva psicossocial7, em consonância com o que está descrito na Política Nacional de Saúde Mental (PNSM) e na RAPS. Por meio do trabalho em território e formação de vínculo, que propiciam o contato direto com as demandas de SM, estrutura-se a possibilidade de cuidado contínuo na AB8.
A articulação entre SM e AB é capaz de possibilitar a construção de um projeto terapêutico que ofereça cuidado integral ao indivíduo, sendo esse um dos princípios do SUS. Dentro disso, o acolhimento e o vínculo são considerados os componentes principais de cuidado à SM na ESF por serem os meios por onde o cuidado se torna transversal4.
A AB no cuidado à SM quando na perspectiva da abordagem psicossocial e as PIC são convergentes por terem premissas em comum como: o sujeito em seu contexto social, tratamento de forma ampla e holística, o empoderamento do usuário e a aproximação da família e comunidade. O Ministério da Saúde reforça na publicação “Cadernos de Atenção Básica: Saúde Mental”, que as PIC são transversais nos diferentes pontos de atenção da rede de saúde e enfatizam que a AB constitui lugar ideal para seu desenvolvimento6. Ao qualificar a AB para ser um espaço das PIC no cuidado em SM é ofertado inúmeros benefícios à população9.
A realidade de cuidado em SM na AB aponta que as estratégias de cuidado se restringem a grupos de diferentes modalidades, psicoterapia e/ou terapia medicamentosa. Reconhecendo-as como importantes, mas não únicas possibilidades de cuidado em SM, considera-se que as PIC podem potencializar as ações de SM desenvolvidas no nível primário de atenção.
Conhecer como os profissionais de saúde concebem o uso das PIC e a política que a sustenta é relevante, uma vez que há intersecção entre as mesmas e os campos da atenção básica e da saúde mental. Ademais, possibilita enriquecer o arcabouço de instrumentais para constituir uma prática mais ampliada.
Assim, partindo do exposto, o presente estudo teve como objetivos verificar o conhecimento dos profissionais atuantes na Atenção Básica sobre as Práticas Integrativas e Complementares (PIC) e se as percebem como um recurso de cuidado em Saúde Mental.
Método
Pesquisa quantitativa descritiva, realizada entre os meses de maio e junho de 2016, em uma Unidade Básica de Saúde (UBS). Dos 80 trabalhadores que atuam na área da saúde desta unidade, 70 aceitaram participar do estudo. Como critério de inclusão foi considerado: ser profissional de saúde de nível fundamental, médio ou superior atuantes na AB; como critério de exclusão: profissionais de licença e/ou férias no período da coleta de dados. A escolha deste cenário se deu por ser campo de prática de um Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Mental vinculado ao Ministério da Saúde, e localiza-se na zona oeste do Município de São Paulo, Brasil.
O serviço onde a pesquisa foi realizada trata-se de uma UBS Integrada, que funciona em horário ampliado (segunda a sexta das 07h às 19h e sábado das 08h às 14h) e atende moradores, trabalhadores e estudantes do território, com atividades programadas ou demandas espontâneas, visando oferecer resolutividade e integralidade no cuidado aos usuários.
Conta com equipe de ESF e com equipe multiprofissional destinada ao cuidado das demandas de SM. São oferecidas aos usuários da unidade algumas PIC como Medicina Tradicional Chinesa/Acupuntura, Plantas Medicinais/Fitoterapia; alguns grupos envolvem técnicas de Meditação, Relaxamento e Trabalho Corporal.
Para a coleta de dados elaborou-se um questionário em três etapas contendo perguntas sobre dados sócios demográficos (idade, sexo, estado civil, formação profissional, tempo de atuação na área, tempo de atuação na unidade, carga horária semanal total); questões sobre a caracterização do conhecimento (ouvir falar ou conhecer alguma PIC, nível de conhecimento em relação a cada PIC, se desperta interesse, se já utilizou na vida pessoal, se conhece a PNPIC, se devem ser disponibilizadas no SUS, se são oferecidas na UBS que atua, se algum usuário do serviço já solicitou PIC, se a comunidade se interessaria, se indica o uso ao usuário, para quais questões recomendaria, se teve algum conteúdo durante a formação profissional ou se teve alguma capacitação/curso); relativo às PIC e a opinião dos profissionais acerca de sua aplicação no campo da SM (se poderia ser utilizada no tratamento de SM, se usuários com transtornos mentais poderiam se beneficiar do uso, se conhece alguém com transtorno mental que utiliza ou tenha utilizado, se gostaria de receber capacitação para aplicar as PIC em SM, se podem ser um recurso para cuidado da SM na AB, se podem atrapalhar o tratamento psiquiátrico, se há risco de abandono do tratamento, se usuários teriam boa adesão). Essas questões foram construídas tomando por base a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares2) e na proposta de Hill que descreve as correntes terapêuticas básicas das medicinas alternativas/complementares10.
Os dados foram inseridos no Software Excel®2007 e realizada análise estatística considerando a distribuição de frequência das variáveis descritas. Aplicou-se o teste exato de Fisher para associação entre diferentes variáveis, considerando p ≤ 0,05 estatisticamente significativos.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, de acordo com a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, sob o parecer de número 1.508.573.Respeitaram-se os preceitos éticos, todos que participaram o fizeram de maneira voluntária e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Resultados
A amostra da presente pesquisa caracterizou-se por 70 profissionais de uma Unidade Básica de Saúde do Município de São Paulo. A idade predominante (48,6%) dos participantes foi de 29-39 anos; o sexo feminino representou a maior parte (81,4%) dos sujeitos; a maioria dos participantes (38,6%) registraram ser casados. Em sua maioria os profissionais possuem entre 6-10 anos de experiência na área de atuação (40,0%); trabalham 1-3 anos na referida unidade (52,2%) e com carga horária semanal de trabalho de 40h (72,9%).
Com relação a formação dos profissionais obteve-se a seguinte representatividade: Agente Comunitário (18,6%), Assistente Social (4,3%), Auxiliar de Saúde Bucal (1,4%), Dentista (4,3%), Enfermeiro (14,3%), Farmacêutico (2,9%), Fisioterapeuta (4,3%), Fonoaudiólogo (1,4%), Médico (10,0%), Psicólogo (2,9%), Técnico de Enfermagem (22,8%), Técnico de Farmácia (5,7%), Técnico de Saúde Bucal (1,4%), Terapeuta Ocupacional (1,4%) e outra formação (4,3%), sendo esses últimos Agente de Promoção Ambiental, Nutricionista e Profissional de Educação Física, totalizando 70 sujeitos.
Quanto ao conhecimento dos profissionais acerca do termo “Práticas Integrativas e Complementares” obteve-se resposta afirmativa em 76,8%, enquanto sobre o conhecimento de alguma PIC, o resultado foi afirmativo em 73,9%.
O nível de conhecimento do profissional em relação às PIC citadas na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares encontra-se a seguir, na Tabela 1.
O conhecimento das PIC foi coletado de maneira a permitir ao profissional acrescentar outra (s) prática (s) além das descritas, tendo sido citadas por 5,71% dos profissionais ao menos uma das seguintes: Cromoterapia, Danças Circulares, Ginástica Laboral, Lian Gong, Meditação, Reiki e Tai Chi Pai Lin.
Quanto ao interesse acerca das PIC, 94,3% manifestou interesse pelo assunto. A utilização de PIC na vida pessoal apontou que 72,9% já utilizou PIC para tratamento de saúde, enquanto uma parcela menos representativa de 27,1% referiu nunca ter utilizado. Verificou-se uma tendência (p = 0,059) daqueles que afirmam ter utilizado alguma PIC na vida pessoal em acreditar que essas práticas devam ser disponibilizadas à população por meio do SUS.
Apenas 14,5% dos profissionais afirmam conhecer a PNPIC, enquanto 29,0% apenas ouviram falar sobre essa política e 56,5% desconhecem a mesma. O tempo de atuação na área mostrou-se significativo (p = 0,003) quando relacionado nesse sentido. Os profissionais entre 6-10 anos de experiência na saúde, que representam 40% da amostra, são os que mais conhecem a política, seguidos dos com mais de 10 anos de atuação, que representam 25,7% dos sujeitos. Os demais profissionais, que atuam há menos de 5 anos na saúde, são os que afirmam desconhecer a existência da política.
Quanto às práticas contempladas na PNPIC a Medicina Tradicional Chinesa/Acupuntura é conhecida por 92,9%, Crenoterapia/Termalismo por 2,9%, Plantas Medicinais/Fitoterapia por 75,7%, Homeopatia por 75,7% e Medicina Antroposófica por 12,9%.Quanto as práticas não contempladas na PNPIC a Aromaterapia é conhecida por 32,9%, Terapia pela Cor/Cromoterapia por 30%, Essências Florais/Terapia Floral por 62,9%, Hidroterapia por 40%, Iridologia por 7,1%, Massagem/Massoterapia por 84,3%, Meditação por 72,9%, Musicoterapia por 52,9%, Reflexoterapia/Reflexologia por 40%.
Os profissionais que conhecem a Medicina Tradicional Chinesa/Acupuntura tendem (p = 0,022) a desacreditar que as PIC possam atrapalhar o tratamento de pessoas que utilizam medicamentos psiquiátricos. Da mesma maneira que os profissionais que conhecem a Massagem/Massoterapia tendem (p = 0,012) a desacreditar que as PIC podem atrapalhar o tratamento medicamentoso dessas pessoas.
O número de profissionais que refere conhecer as PIC contempladas e não contempladas na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares está representado no Gráfico 1.
Dos sujeitos do presente estudo, 92,8% acreditam que as PIC devem ser disponibilizadas no Sistema Único de Saúde, enquanto 4,3% afirmaram que não e 2,9% declararam que não sabem responder à pergunta.
Em relação à disponibilização de alguma PIC na unidade, 91,3% responderam que sim, 5,8% responderam que não e 2,9% responderam que não sabem se alguma dessas práticas é oferecida na unidade. A solicitação das PIC por algum usuário do serviço ocorreu para 65,3% dos profissionais, 33,3% nunca recebeu esse tipo de solicitação, 1,4% não se lembra se isso aconteceu alguma vez e 1 não respondeu.
Entre os profissionais, 94,3% afirmam acreditar que a comunidade se interessaria por PIC, 4,3% não sabem, 1,4% acredita que não despertaria interesse da população e 1 deixou de responder.
Quanto à indicação de PIC aos usuários do serviço, 82,6% afirmaram exercer essa prática, 17,4% não exercem e 1 não respondeu. Sobre a finalidade da indicação constatou-se que 47,1% pensam em PIC para o cuidado a questões físicas, enquanto 62,9%para o cuidado de questões emocionais/mentais/comportamentais.
No que concerne à indicação de práticas que não foram citadas no questionário elaborado pelas pesquisadoras, 7,14% dos profissionais relataram que indicam pelo menos uma das seguintes práticas: Dança Circular, Lian Gong, Reiki, Tai Chi Pai Lin e Hipnose.
A frequência de indicação das PIC declarada pelos profissionais da Unidade Básica de Saúde encontra-se a seguir, na Tabela 2.
Não há evidências da correlação entre o nível de conhecimento dos profissionais acerca das PIC presentes na política nacional e a indicação das mesmas.
Quanto ao conteúdo de PIC na formação profissional, identificou-se que 68,2% dos profissionais não teve nada relacionado ao tema, 24,6% afirmam ter tido algum conteúdo e 7,2% não se recordam. Com relação a terem recebido alguma capacitação/curso sobre PIC, 23,2% responderam afirmativamente, 76,8% negam qualquer preparo após a inserção no trabalho.
Ainda com relação a formação, obteve-se que 91,3% gostariam de receber algum tipo de capacitação para utilizar PIC no cuidado prestado em questões de SM, 8,7% não gostariam e 1deles não respondeu.
Questionados sobre a utilização de PIC no tratamento de SM 92,8% afirmam que as práticas podem ser utilizadas nesses casos, 7,2% declarou não saber responder à pergunta e 1deixou em branco. Para 94,2%dos profissionais, pessoas com necessidades relativas a SM poderiam se beneficiar do uso de PIC, 5,8% declarou não saber responder à pergunta e 1 deixou em branco.
Conhecer alguém com questões no âmbito da SM que utilize ou tenha utilizado alguma PIC foi a resposta de 43,5%, enquanto 56,5% respondeu negativamente e 1não respondeu. Conhecerem alguém com questões de SM que utilize ou tenha utilizado PIC, demonstrou correlação (p = 0,023) com profissionais que referiram contato prévio com o termo “práticas integrativas e complementares”, e foi possível correlacionar o fato de conhecer alguém que as utilize ou tenha utilizado (p = 0,011) com o conhecimento de alguma delas.
Para 85,5% profissionais as PIC não atrapalham o tratamento de pessoas que utilizam medicamentos psiquiátricos, para 2,9% deles essas práticas podem atrapalhar, 11,6%declararam não saber responder e 1não assinalou nenhuma resposta. Pessoas que fazem tratamento com medicamentos psiquiátricos não abandonariam o uso dos mesmos para utilizar PIC de acordo com 46,4% dos profissionais, 11,6% acreditam que isso poderia acontecer, 42,0% declararam não saber responder e 1 optou por não responder.
Constatou-se associação (p = 0,045) entre ter ouvido falar de PIC e acreditar que pessoas que fazem tratamento psiquiátrico abandonariam o uso das medicações para utilizar somente PIC. Igualmente, foi significativo (p = 0,027) que aqueles que afirmaram conhecer alguma PIC também não acreditam haver risco de usuários deixarem de utilizar seus medicamentos psiquiátricos.
A boa adesão às PIC por parte de pessoas com questões relacionadas à SM não representa um fator limitante de acordo com 78,3% dos profissionais, enquanto 20,3% não souberam responder, 1,4% afirmou que não teriam boa adesão e 1não respondeu a essa pergunta.
As PIC foram consideradas uma possibilidade de recurso para o cuidado em SM na AB por 92,8% dos profissionais da UBS campo de pesquisa, 7,2% declarou não saber responder.
Discussão
Com relação ao conhecimento referido pelos profissionais acerca de cada uma das práticas incluídas na PNPIC, constatou-se que a mais conhecida é a Medicina Tradicional Chinesa/Acupuntura. Esta realidade deve-se ao fato de que na UBS, campo de pesquisa, é oferecida essa modalidade de PIC. Dentre as PIC não incluídas na PNPIC, destaca-se a Massagem/Massoterapia, possivelmente por ser a de caráter mais próximo do cotidiano da população.
A PNPIC prevê a divulgação de conhecimentos básicos de cada uma das PIC para os profissionais de saúde, gestores e usuários. No presente estudo, identificou-se fragilidade quanto à disseminação de informações sobre essas práticas e seu potencial em diferentes contextos de cuidado. Destaca-se ainda que, os profissionais declararam não ter tido qualquer conteúdo sobre PIC durante a sua formação e grande parte nega ter passado por algum curso/capacitação envolvendo o tema.
Concorda-se que, o conhecimento insuficiente sobre o assunto pode levar a concepções errôneas sobre o tema, prejuízos na sua aplicabilidade, desvalorização do alcance das PIC. Essa lacuna pode ser superada com atendimento ao que é preconizado pela PNPIC que prevê qualificação para os profissionais atuantes no SUS por meio de educação permanente, sendo esta de responsabilidade da gestão federal e estadual11.
As experiências de implementação da PNPIC têm ocorrido de forma desigual ou até descontinuada no país, por vezes sem ações de acompanhamento ou avaliação, com fornecimento inadequado de materiais e sem o devido registro das ações realizadas11. Nesse sentido, identificou-se que poucos profissionais desta pesquisa conhecem a PNPIC, o que é um paradoxo devido ao fato dos participantes serem trabalhadores do SUS, local onde é prevista a implantação e implementação dessa importante política pública, vigente desde 2006.
O desconhecimento por parte de alguns profissionais sobre determinadas PIC deve-se também à divergência de nomenclatura existente nesse campo. Esse achado é compreensível, uma vez que algumas práticas fazem parte da Portaria 971/2006 e diversas outras não estão regulamentadas. Portanto, somente com a inserção das mesmas na PNPIC possibilitaria que os profissionais se familiariza sem e as utilizassem em seus campos de atuação12.
Quanto ao tema PIC os mesmos mostram interesse sobre essa proposta e já as utilizaram na vida pessoal como tratamento de saúde. Por terem vivido a experiência do uso, mostram-se mais favoráveis a sua disponibilização no SUS. Ainda que reconhecendo que as PIC contribuem para as demandas emocionais/mentais/comportamentais, não se sentem capazes de aplicá-las às demandas de Saúde Mental. Diante disso, concorda-se que para superar a carência de equipes devidamente capacitadas para executar as PIC é necessário um corpo de profissionais qualificados para ministrar conteúdos sobre o tema13.
Achado relevante na presente pesquisa mostra que em relação aos profissionais que conhecem a Medicina Tradicional Chinesa/Acupuntura, contemplada na PNPIC, tendem a acreditar que esta não atrapalha o tratamento de pessoas que utilizam medicamentos psiquiátricos. Esse dado era esperado, uma vez que essa modalidade já é difundida como importante terapêutica no sistema público e privado de saúde no país. Da mesma forma, a Massagem/Massoterapia, não contemplada na PNPIC, os profissionais tendem a desacreditar que essa prática possa atrapalha o tratamento medicamentoso em SM, possivelmente por ser prática, acessível e amplamente utilizada.
Os profissionais concordam que as PIC devem ser oferecidas na rede pública de saúde, os usuários se interessam por essas práticas e as têm solicitado na unidade em que atuam. Nesse caminho, a PNPIC avançou com a recente publicação da Portaria 849/2017 que insere novas PIC: Arteterapia, Ayurveda, Biodança, Dança Circular, Meditação, Musicoterapia, Naturopatia, Osteopatia, Quiropraxia, Reflexoterapia, Reiki, Shantala, Terapia Comunitária Integrativa e Yoga, ressaltando que as mesmas atendem as diretrizes SUS14.
A disponibilização de alguma PIC na unidade, campo dessa pesquisa, demonstra êxito em respeito às diretrizes da PNPIC. Por ser classificada como uma UBS Integrada, modalidade recentemente instituída no município de São Paulo, oferece atendimento ampliado, contando inclusive com uma equipe de Saúde Mental, diferentemente de outras unidades. Da mesma forma, acredita-se que a valorização de tais práticas por parte da gestão é fator determinante para a verdadeira inclusão das PIC nos serviços do SUS, refletida na elevado interesse e solicitação de PIC e pelos usuários do território em questão.
Considera-se um achado importante que algumas PIC que não estavam contempladas na PNPIC, como Dança Circular e Reiki, foram citadas como práticas indicadas/orientadas por alguns profissionais da UBS a seus usuários. Dado relevante uma vez que essas duas modalidades passaram a fazer parte da PNPIC recentemente, posteriormente a coleta de dados da presente pesquisa, apontando que algumas práticas são inseridas no SUS antes mesmo de serem regulamentadas pela PNPIC.
Nesse sentido, é relevante destacar a existência de regulamentações locais acerca do tema como a Política Municipal de Práticas Integrativas e Complementares no SUS. Em sua descrição "[...] entende-se por práticas integrativas e complementares todas aquelas que, devidamente regulamentadas e desenvolvidas por meio de ações integradas de caráter interdisciplinar, se somam às técnicas da medicina ocidental modernas [..]", incluindo acupuntura, fitoterapia, homeopatia, práticas corporais e outros recursos terapêuticos complementares15.
A PNPIC tem como premissa o desenvolvimento das PIC em caráter multiprofissional. Nesse sentido faz-se relevante constar que o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) emitiu a Resolução 197/1997 que visava estabelecer e reconhecer as Terapias Alternativas como especialidade e/ou qualificação do profissional de enfermagem, no entanto a revogou por meio da Resolução 0500/201516-17. A Resolução 389/2011 lista as especialidades reconhecidas pelo mesmo conselho e nela consta "Enfermagem em Terapias Holísticas e Complementares" como uma das áreas18.
A introdução do tema PIC é algo essencial desde a graduação em Enfermagem, sendo possível fazê-la por meio de diferentes estratégias de ensino: palestras, cursos teóricos e grupos de discussão; disciplina optativa; inserção de disciplina no currículo; incentivo às pesquisas. Fica a cargo da universidade a responsabilidade de efetivar a inserção de uma dessas estratégias para abordar as PIC a fim de contribuir para a formação de profissionais com visão de integralidade e interdisciplinaridade do cuidado, como esperado de enfermeiros19.
A atuação da Enfermagem nesse campo certamente é de grande valia para a área e para a massiva implantação da PNPIC no SUS, por esses profissionais constituírem uma das maiores forças de trabalho do sistema público de saúde. Desse modo, salienta-se que os enfermeiros generalistas podem enriquecer significativamente sua prática profissional se agregarem ao seu conhecimento os saberes acerca das PIC.
Observa-se notório movimento em prol das PIC no país. O surgimento do Bacharelado em Naturologia, curso destinado a formar profissionais para o desenvolvimento de pesquisa e aplicação das PIC considerando o indivíduo em todos os seus aspectos, é um sinal da crescente validação das mesmas. O naturólogo é o profissional com visão multidimensional do processo de vida-saúde-doença capacitado a utilizar as PIC no cuidado e atenção à saúde20.
A publicação “Cadernos de Atenção Básica: Saúde Mental” do Ministério da Saúde valida que as PIC podem colaborar no cuidado em SM e reafirma que as mesmas devem estar presentes nos diferentes pontos de atenção, prioritariamente na AB6.
Diante disso, pensar na inclusão de PIC na elaboração do cuidado dos usuários seria um importante recurso para fazer SM na AB e garantir a integralidade na atenção à saúde, assim como preconizado no SUS e na própria PNPIC.
Conclusão
O presente estudo mostra-se relevante para reflexão sobre a implantação e implementação da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS e, especialmente, sua aplicabilidade em demandas no âmbito da Saúde Mental na Atenção Básica. Para os profissionais que participaram dessa pesquisa, é relevante que informações acerca da PNPIC sejam difundidas e que as PIC se tornem acessíveis à população.
Foi expressivo o número de profissionais que afirmou não ter tido acesso a nenhum conteúdo de PIC durante sua formação e nunca ter recebido nenhuma capacitação/curso sobre o tema, entretanto alguns afirmam indicar o uso das práticas e consideram que as mesmas poderiam contribuir com a SM quando aplicadas no nível básico de atenção à saúde.
São imperativos o interesse e a aceitação dos profissionais em relação às PIC. Portanto, investir na qualificação dos mesmos, para que se tornem aptos a conceber tais técnicas como mais um recurso terapêutico em SM, contribui para a oferta de cuidado mais amplo e para efetivação do princípio da integralidade preconizado pelo SUS.
Reconhece-se como limitação da presente pesquisa a restrição da leitura a uma única unidade de saúde. Por outro lado, mesmo que circunscrito, este estudo apresenta magnitude ao oferecer elementos que podem contribuir para ampliar o cuidado em SM na AB e incorporar as práticas da PNPIC a esse nível de atenção.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
2017
Histórico
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Recebido
31 Jan 2017 -
Aceito
04 Jul 2017