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TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO BRASILEIRA EM REDE: EMAÚS, CESEEP E MOVIMENTO FÉ E POLÍTICA (1970-1990)1 1 Artigo não publicado em Plataforma preprint. Todas as fontes e bibliografia utilizadas são referenciadas no artigo. Apoio de Bolsa PQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, processo: 304444/2019-7 e do programa Cientista do Nosso Estado da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro – FAPERJ, processo: E-26/202-768/2017

A BRAZILIAN LIBERATION THEOLOGY NETWORK: EMAÚS, CESEEP AND THE FAITH AND POLITICS MOVEMENT

Resumo

Lideranças da Teologia da Libertação (TdL) brasileira, entre fins da década de 1970 e ao longo dos anos 1980, levaram adiante iniciativas para criar uma rede de entidades autônomas, com o propósito de formar quadros e instrumentalizar militantes políticos. Duas delas são o objeto deste trabalho: o Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (CESEEP), fundado em 1982 e sediado em São Paulo, e o Movimento Nacional Fé e Política (MF&P), lançado em 1989 e ancorado no Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis (CDDH). O estudo dessas entidades envolve seu posicionamento no campo da TdL e suas estratégias de ação voltadas para processos de formação política.

Palavras-chave
Teologia da Libertação; rede civil; formação política; militância política; socialismo

Abstract

From the late 1970s and throughout the 1980s, leaders of the Brazilian liberation theology spurred initiatives to create a network of autonomous entities to elaborate frameworks and instrumentalize political activists. This study examines two of them, namely: the Ecumenical Center for Services to Evangelization and Popular Education (CESEEP), founded in 1982 and based in São Paulo, and the National Faith and Politics Movement (MF&P), launched in 1989 and anchored in the Center for the Defense of Human Rights of Petrópolis (CDDH). Such investigation involves understanding their place within Liberation Theology and their action strategies for political formation.

Keywords
Liberation Theology; civil network; political formation; political activism; socialism

“É uma teia de aranha: são muitas as instituições que te chamam para falar”

A epígrafe deste artigo foi retirada de uma entrevista que realizamos com o professor e teólogo Faustino Teixeira – um dos principais estudiosos do papel e da trajetória das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) na história da Igreja Católica brasileira – na qual ele discorre sobre o trabalho realizado por assessores que atravessam o país para atender às dioceses católicas e a grupos cristãos que compõem, animam e nutrem a Teologia da Libertação (TdL) no país.

No âmbito da expressiva produção sobre a TdL no Brasil, impulsionada pela projeção internacional adquirida pela Igreja Católica brasileira nas décadas de 1970 e 1980, destacam-se alguns estudos clássicos que tiveram como propósito estudar, em perspectiva ampla e integrada, os processos responsáveis pela formação do que então foi chamado de “Igreja Popular” e cuja marca distintiva foi a influência marcante da TdL em consonância direta com o chamado espírito e as resoluções da Conferência de Medellín (1968).3 3 A respeito do uso da noção “Igreja Popular” por essa literatura, conferir em particular Mainwaring (2004). Leonardo Boff, em seu estudo Eclesiogênese: a reinvenção da Igreja também se vale da expressão para relacioná-la à Igreja nascida do povo. (BOFF, 2008, p. 227-246). Para análise mais ampla sobre o uso da noção no âmbito da TdL, ver Valério (2012, p. 33-77). São dessa lavra trabalhos de autores como Bruneau (1974)BRUNEAU, Thomas C. O catolicismo brasileiro em época de transição. São Paulo: Loyola, 1974., Mainwaring (2004)MAINWARING, Scott. Igreja Católica e política no Brasil (1916-1985). São Paulo: Brasiliense, 2004. e Alves (1979)ALVES, Márcio Moreira. A igreja e a política no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1979., tais como os livros seminais de Löwy (1996LÖWY, Michael. A guerra dos deuses: religião e política na América Latina. Petrópolis: Vozes, 1996.; 2019LÖWY, Michael. Cristianismo de Liberación. Perspectivas marxistas y ecosocialistas. Barcelona: El Viejo Topo, 2019.) sobre as afinidades eletivas entre o marxismo e o cristianismo e sobre a constituição de um campo político-religioso e social ao qual denominou “Cristianismo da Libertação”. Desde então, a produção sobre o tema tem avançado em várias direções a par de se ver reduzida a motivação primeira marcada por perspectivas mais globalizadoras. Daí, é possível observar o conhecido fenômeno da pulverização do objeto que se deu pari passu à institucionalização desse campo interdisciplinar que engloba saberes como teologia, filosofia, ciências sociais, história etc.

Nossas investigações, situadas na interseção da História Política com a História Intelectual, têm tido como objetivo – em interlocução direta com a vertente fundadora acima apontada – construir uma interpretação acerca dos processos que alimentam teórica, política e espiritualmente essa “teia de aranha” que permanece ativa e espraiada pelo território do país,4 4 Cabe observar que, neste artigo, focamos na formação de uma rede de entidades no Brasil cujo polo de irradiação foi o Emaús. Investigaremos, em trabalhos futuros, as conexões desse grupo com entidades religiosas internacionais, em particular com a rede ecumênica liderada e alimentada pelo CMI. Para tal, é mister o diálogo com uma corrente de estudos acadêmicos que, nos últimos anos, chama atenção para o caráter transnacional que marca a origem e o desenvolvimento da TdL nas décadas de 1960 e 1970 em um contexto de aproximação e troca entre correntes católicas europeias e latino-americanas. Essa produção coloca em questão concepções hegemônicas produzidas no âmbito da TdL que propaga a polaridade entre as teologias latino-americana e europeia. A esse respeito, ver Chaouch (2007), Valério (2012) e Andreo (2019). Conferir ainda o uso e a aplicação da noção de “rede religiosa transnacional” em García Vettorazzi (2020). a despeito dos problemas políticos-religiosos que a TdL brasileira – e não só ela – vem enfrentando nas últimas décadas e que podem ser atribuídos, em parte, à estratégia de neutralização levada a efeito pelo Vaticano nos pontificados de João Paulo II e Bento XVI. Três elementos foram – e permanecem – constitutivos dessa teia, que engloba entidades da Pastoral Social vinculadas à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), as CEBs articuladas nos Intereclesiais e uma rede civil de órgãos voltados para a educação popular e a formação política.

Para abrir uma fenda nesse campo, optamos, na primeira etapa de trabalho, por estudar um importante nó dessa teia: o Grupo Emaús, uma articulação da esquerda cristã, criada em 1974, que reuniu frades dominicanos, teólogos, agentes de pastoral e cientistas sociais em torno de um projeto de fundamentar, alimentar e dar sentido a uma práxis transformadora e libertadora. Esse projeto se desdobra em três frentes de atuação. A primeira delas se refere ao trabalho de assessoria junto às CEBs por ocasião da realização dos chamados Encontros Intereclesiais a cada dois ou três anos. As conexões Emaús/Interelesiais e CEBs foram (e são) orgânicas, e compõem um quadro particular na TdL brasileira (SUSIN, 2017SUSIN, Luiz Carlos. Brésil. In: CHEZA, Maurice et al. (dir.). Dictionnaire historique de la théologie de la libération. Namur: Lessius, 2017, p. 99-105.).

Emaús agregou vários teólogos e professores que atuavam na formação de quadros no âmbito da Igreja Católica ou de denominações cristãs. Tendo em vista avançar nesses processos de formação sob a égide da TdL, o grupo de Emaús propôs e colocou de pé o Centro de Estudos Bíblicos (Cebi), em 1979, e o Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (Ceseep), em 1982. Em paralelo, teve presença importante também na concepção, organização e publicação da coleção Teologia e Libertação.5 5 Entrevista ao autor com Frei Betto realizada em Rio de Janeiro, 2014.

Uma terceira vertente de atuação do grupo diz respeito ao trabalho desenvolvido pelo Movimento Nacional Fé e Política (MF&P), uma articulação em nível nacional criada em 1989 e voltada para formar e agregar militantes cristãos diretamente envolvidos na vida político-partidária. Para divulgar as diretrizes e reuniões do movimento, a coordenação do MF&P criou os Cadernos Fé e Política, que circularam nas décadas de 1980 e 1990. No novo milênio, o MF&P tem se voltado para a realização de grandes encontros nacionais, resultando em publicações que reúnem informações, entrevistas e palestras de cada evento. Serão aqui classificadas como “livros dos encontros do Fé e Política”.

Emaús, portanto, surgiu como um grupo estratégico restrito e reservado, visando oferecer subsídios e indicar caminhos para um campo político-religioso então em franca expansão. Nunca apostou na sua institucionalização e sempre procurou obstar qualquer vinculação orgânica com denominações religiosas ou político-partidárias, ainda que reunisse católicos em franca maioria, assim como militantes e/ou simpatizantes do Partido dos Trabalhadores (PT). Mais tarde, no novo século, vários membros do Emaús se distanciaram do PT. De qualquer maneira, Emaús permaneceu e permanece como uma “formação cultural independente”, conforme a tipologia proposta por Raymond Williams (1992)WILLIAMS, Raymond. Cultura. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992..

Na segunda etapa da investigação, colocamos o foco no Ceseep e no MF&P, dois outros nós da teia que, embora tenham sido criados sob a inspiração de Emaús, não mantiveram com ele nenhum vínculo político-institucional ou de hierarquia, possuindo estatutos e coordenação próprios. O estudo dessas entidades seguirá o seguinte roteiro: um primeiro aspecto diz respeito às condições de criação e de estabelecimento de cada uma delas, identificando lideranças, projeto fundacional e primeiras iniciativas; outro aspecto se refere ao trabalho de formação política conduzido pelas entidades, aqui compreendida de forma estrita e voltada ao estudo dos instrumentos de análise e dos conteúdos de natureza político-sociais que foram mobilizados pela direção e pelos assessores/professores das duas entidades em tela; e, por fim, abrimos o objeto no sentido de melhor situá-las na teia acima mencionada.

Foge ao escopo deste trabalho qualquer pretensão no sentido de estudar o conjunto das atividades do Ceseep e do MF&P – dois organismos criados há décadas. Daí, tendo em vista atender nossos objetivos, lastreamos a pesquisa em entrevistas que foram realizadas com figuras-chave dessas duas entidades,6 6 Foram entrevistados: José Oscar Beozzo e Luiz Eduardo Wanderley, membros do Emaús e da direção executiva do Ceseep; Maria Helena Arrochelas, membro do Emaús e responsável pelo Curso Flor e Canto – Encontros Ecumênicos de Formação (Petrópolis, RJ); Faustino Teixeira, membro do Emaús; Frei Betto, Leonardo Boff e Pedro A. Ribeiro de Oliveira, membros do Emaús e do MF&P. As entrevistas, no projeto, são tratadas como fontes que nos dão pistas para o conhecimento do passado, como também para o conhecimento do presente. A esse respeito, ver ensaio de Verena Alberti: Narrativas na história oral (2003). Ver ainda, da mesma autora, reflexões metodológicas reunidas no livro Ouvir contar: textos de história oral (2004). assim como na consulta sistemática de duas publicações: os livros da coleção Teologia Popular, editados anualmente pelo Ceseep por ocasião do Curso de Verão, e os Cadernos de Fé e Política.7 7 Foram selecionados para a análise textos vistos como exemplares da maneira pela qual cada uma das entidades veio a construir seu perfil no campo da Teologia da Libertação, examinados levando em consideração o tema proposto e a abordagem utilizada. Foram considerados temas representativos na mostra: a questão da mulher e da escravização negra; relações religião e política; questões urbanas (livros do Curso de Verão (Ceseep)); questões do socialismo contemporâneo e proposições acerca da formação política (Cadernos Fé e Política (MF&P)).

Ceseep: escola de formação

A criação do Ceseep foi fruto de ampla articulação que envolveu um conjunto de lideranças e de entidades católicas e evangélicas. A proposta, oriunda do Emaús, tinha como primeiro objetivo responder a dois desafios de ordem prática: o primeiro era o de atender à crescente demanda pelo trabalho de assessoria religiosa junto a inúmeros agrupamentos e organismos sensibilizados pela TdL, fossem católicos (a maioria) ou evangélicos. Caberia ao centro o papel de preparar e formar essa nova leva de assessores que deveriam se espalhar pelo país.8 8 Entrevista ao autor com José Oscar Beozzo realizada em São Paulo, em 10 de janeiro de 2018. A par disso, o centro deveria ser responsável por dar suporte aos processos de formação de segmentos do episcopado latino-americano, dado que a alta hierarquia da Igreja Católica no continente, desde meados da década de 1970, vinha promovendo o fechamento sucessivo de centros de formação que porventura tivessem alguma identificação com a TdL. Dessa forma, o Ceseep deveria atuar nas duas pontas: na preparação da hierarquia católica e na formação de lideranças com vistas a atuar nas bases.

Três decisões foram fundamentais para viabilizar a entidade. A primeira foi a escolha do Pe. José Oscar Beozzo para levar adiante o projeto de constituição do centro, cabendo a ele o trabalho de reunir apoio e aplainar arestas por parte de entidades religiosas que porventura se sentissem atingidas pela medida. Para tal, Beozzo deveria manter azeitadas as relações com o cardeal de São Paulo, D. Paulo Evaristo Arns – figura de proa da chamada ala progressista da Igreja Católica brasileira.9 9 A tipologia que divide o episcopado brasileiro, sob a ótica político-ideológica, entre “conservadores”, “moderados” e “progressistas”, tem sido revista por autores como o historiador Sergio Coutinho, que propõe outra tipologia baseada em pressupostos teológicos relacionados à Cristologia, à Eclesiologia e à Antropologia Cristã. Segundo ele, os bispos se dividem em: 1) Neopelagianos, ou seja, os assim descritos pelo Papa Francisco em Evangelii Gaudium: “são autorreferenciais” que focam na “segurança doutrinal ou disciplinar” com forte pretensão de dominar o espaço da Igreja” por meio de um cuidado exibicionista da liturgia, da doutrina e do prestígio da Igreja”; 2) Neoagostinianos, vistos também como autorreferenciais, possuem uma “postura cautelosa na relação Igreja-mundo, defendem a “identidade católica” com foco cristocêntrico (…) e um arraigado eclesiocentrismo normativo (clericalismo e corporativismo)”; 3) Neotomistas, ou seja, têm o Reino de Deus como centro e estão comprometidos “com a missão de pregar, servir e testemunhar o reinado de Deus na história dos homens e no mundo dos pobres, e se identificam com o projeto do papa Francisco de uma ‘Igreja em saída’” (PAPA FRANCISCO apud COUTINHO, 2015). Nomes como o de Dom Paulo Evaristo Arns, portanto, comporiam essa terceira vertente voltada para uma presença mais ativa da instituição na sociedade. Beozzo assim o fez. A aliança com o cardeal foi selada pela presença do Frei Gilberto Gorgulho, teólogo dominicano e bastante próximo a Arns, na presidência do centro.

A segunda decisão dependeu da primeira: o Ceseep seria sediado na cidade de São Paulo. A presença de Dom Eugênio Salles à frente da Arquidiocese do Rio de Janeiro inviabilizaria qualquer iniciativa nesse sentido: Salles era inimigo declarado da TdL. E, por fim, a mais importante: o Ceseep atuaria como entidade autônoma, não fazendo parte de qualquer estrutura religiosa. Teria direção eleita e estatutos próprios. O Ceseep, forjado na “usina” de projetos de Emaús, atuaria, portanto, em faixa própria, sem a necessidade de se submeter à hierarquia católica, porém mantendo com ela vínculos de proximidade. Para isso, levava em conta o poder de articulação de seu coordenador.

Para erguer um centro “civil” fora da órbita direta da Igreja Católica, houve também a necessidade de afirmar o caráter ecumênico da nova entidade. Dois nomes importantes do universo evangélico estiveram ao lado de José Oscar Beozzo para levar adiante o projeto de colocar o Ceseep de pé. Jether Ramalho foi um deles. Membro do Emaús, Ramalho foi figura-chave nos contatos do centro com correntes evangélicas que se reuniam em torno do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), entidade que contribuiu sobremaneira com o centro.10 10 Beozzo relata que o CMI contribuiu com US$ 40 mil para o estabelecimento do centro. Entrevista ao autor com José Oscar Beozzo realizada em São Paulo, em 10 de janeiro de 2018. Couberam a ele os primeiros contatos para trazer o teólogo uruguaio Julio de Santa Ana para o centro (RAMALHO, 2010RAMALHO, José Ricardo (org.). Uma presença no tempo: a vida de Jether Ramalho. São Leopoldo: Oikos, 2010.; BEOZZO, 2011aBEOZZO, José Oscar. Jether: criador de sonhos e possibilidades acadêmicas. In: POSSANI, Lourdes de Fátima P. & SANCHES, Wagner Lopes. Formação ecumênica e popular feita em mutirão: Curso de Verão 25 anos. São Paulo: Paulus, 2011a, p. 57-58.). Santa Ana, leigo metodista, possuía larga carreira internacional, tendo assumido responsabilidades gerenciais em várias instituições de cunho ecumênico, como a Igreja e Sociedade na América Latina (Isal), o Conselho Ecumênico das Igrejas (COE) e o CMI. Aceito o convite para integrar a coordenação executiva do centro, ao lado de Beozzo, Santa Ana fixou residência no Brasil em meados da década de 1970, quando veio a participar de reuniões do Emaús, da fundação do Ceseep, além de ministrar cursos na Universidade Metodista de São Paulo (Umesp) (TEIXEIRA, 2017TEIXEIRA, Faustino. Julio de Santa Ana. In: CHEZA, Maurice et al. (dir.). Dictionnaire historique de la théologie de la libération. Namur: Lessius, 2017, p. 419-421.).

Luiz Eduardo Wanderley, sociólogo, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e membro do Emaús, foi outra figura basilar na criação e estruturação do Ceseep. Nome histórico do campo da educação popular, foi um dos formuladores das bases conceituais e metodológicas que passaram a nortear os cursos voltados para a formação de lideranças e grupos populares, além de ter sido um dos protagonistas na adoção de um programa de formação voltado para grandes públicos – daí o advento do Curso de Verão, uma das mais importantes iniciativas do centro.11 11 Entrevista ao autor com Luiz Eduardo Wanderley realizada em São Paulo, 2018.

O Ceseep, tendo à frente os nomes acima mencionados, surge, portanto, como uma entidade sui generis no campo da formação política e religiosa no Brasil, que então vinha passando por transformações aqui e na América Latina, seja no campo católico, seja no evangélico. Sua criação respondia aos reclamos de três movimentos: um grupo de bispos latino-americanos, identificados com as resoluções de Medellín e interessados em manter seus encontros e vínculos religiosos; o ecumênico, que, naquela quadra, tomava corpo no Brasil com a criação do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs no Brasil (Conic), em 1982, reunindo instituições como a Aliança de Batistas do Brasil, a Igreja Católica Apostólica Romana, a Episcopal Luterana, a Presbiteriana Unida, a Sirian Ortodoxa de Antioquia, e a Metodista (atualmente fora do Conselho); e, por fim, atender o amplo movimento social, então em franca expansão.

O centro, no decorrer das décadas de 1980 e 1990, organizou um leque de cursos regulares com o intuito de atender a seus diferentes públicos. A respeito desses cursos, cabe assinalar o seguinte:12 12 Os dados relativos aos cursos do CESEEP foram extraídos do Relatório de Avaliação do CESEEP elaborado pelo Instituto de Estudos Especiais da PUC-SP (IEE, 2005).

  1. O Encontro Latino-Americano de Estudos – Curso para Bispos – cumpre uma função própria no conjunto de atividades de formação desenvolvidas pelo Ceseep. Cabe ao centro, nesse caso, tão somente abrigar e oferecer apoio logístico aos sacerdotes que possuem coordenação e organização próprias.13 13 Entrevista ao autor com José Oscar Beozzo realizada em São Paulo, em 10 de janeiro de 2018. Para o Ceseep, o encontro foi e tem sido um ativo importante para firmar a imagem do centro como importante polo de formação pastoral e política;

  2. O Curso Latino-Americano de Formação Pastoral, criado em 1983, inaugurou as atividades de formação do centro e, desde então, tem sido visto como um dos mais importantes da instituição. Previsto para durar quatro meses e voltado para servir de espaço de reflexão para agentes pastorais de todo o continente, o curso, em 23 anos de existência, formou 800 pessoas, sendo 450 brasileiros e 350 estrangeiros de 35 países, de acordo com o relatório da Instituto de Estudos Especiais (IEE) da PUC-SP de 2005IEE. Instituto de Estudos Especiais – PUC-SP. Relatório de avaliação do CESEEP. São Paulo: PUC-SP, 2005. sobre as atividades do Ceseep acima mencionado. Desse universo, constituído em grande parte por lideranças eclesiais e de movimentos sociais, estima-se que nove entre dez professaram o catolicismo e seis entre dez eram religiosos;

  3. Os cursos do Ceseep, ao longo das décadas de 1980 e 1990, se desdobraram em outras quatro frentes. Uma delas foi o Curso Latino-Americano de Ecumenismo, criado em 1989, e voltado para “promover a interrelação de homens e mulheres que, apesar de aderirem a diferentes famílias espirituais, entendem que devem procurar a unidade entre si, para dar expressão a sua fé e com a virtude de promover a fraternidade e a comunhão” (CHAMADA, ANO, P.). A programação agrega disciplinas em torno do estudo da história e das bases teológicas do ecumenismo, e o curso tem contato com um público majoritariamente católico, assim como os demais do Ceseep. Os alunos evangélicos geralmente advêm de igrejas vinculadas ao chamado protestantismo histórico.

Outra frente foi a criação de um curso para militantes cristãos dirigido diretamente para a formação de lideranças atuantes nos meios populares, pastorais e movimentos sociais e políticos. Em 17 anos (entre 1988 e 2005), o curso formou cerca de 500 alunos, originários de vários países da América Latina, em sua grande maioria leigos católicos. Com a duração de duas semanas, propõe instrumentalizar os alunos em teorias que lhes permitam discutir em profundidade questões econômicas, políticas e sociais contemporâneas.

O Curso Latino-Americano de Pastoral e Relações de Gênero, criado em 1995, abriu a mais nova frente de trabalho do centro, agora dirigida para criar um espaço de reflexão específico e privilegiado para a discussão e divulgação de teologias feministas que têm desenvolvido análises fundamentadas nas relações de gênero. Desde então, a categoria gênero tem servido como eixo estruturante para o desenvolvimento do curso, tendo sido examinada sob diferentes abordagens científicas e teológicas. O alunado tem sido composto, em sua maioria, por 30 a 40 mulheres brasileiras leigas e católicas.

Por fim, o centro investiu, em 1988, em um campo novo: o da formação concentrada de centenas de alunos. Tratava-se do Curso de Verão, atualmente em sua 36ª edição. No horizonte da direção do centro, estava a intenção de dar instrumentos pastorais, bíblicos, teológicos e sociológicos para centenas de jovens leigos e lideranças comunitárias. O empreendimento representava toda sorte de desafios: recursos financeiros, hospedagem e local amplo o suficiente para receber centenas de cursistas, além do aval das igrejas evangélicas parceiras do Ceseep e da Arquidiocese de São Paulo.

O Ceseep, como das demais vezes, contou com o respaldo da Igreja Católica de São Paulo e de organismos evangélicos, com destaque para o apoio efetivo do Conic. O curso cobria dez dias e os conteúdos foram divididos em quatro grandes seções: bíblica, teológica, pastoral e Igreja e sociedade. A experiência teve início em janeiro daquele ano e reuniu 406 cursistas; no ano seguinte, esse número chegou a 1430. Depois, manteve-se na faixa de 500 a 600 cursistas em média. O perfil predominante dos cursistas, entre 1988 e 2005, conforme dados reunidos no relatório da PUC-SP (IEE, 2005IEE. Instituto de Estudos Especiais – PUC-SP. Relatório de avaliação do CESEEP. São Paulo: PUC-SP, 2005.), foi o seguinte: mulheres, solteiras, leigas, católicas, brasileiras, na faixa etária entre 20 e 34 anos.

Um dos resultados diretos da experiência bem-sucedida do Curso de Verão foi a criação de uma rede de formação ecumênica e popular constituída pelo Curso de Verão de Goiânia, o Curso de Verão na Terra do Sol (Fortaleza), o Curso de Inverno (Rio de Janeiro), o Curso Bíblico do Instituto Teológico de Lins (Lins, SP) e o Curso Bíblico “Flor e Canto” – Encontros Ecumênicos de Formação (Petrópolis, RJ).14 14 Entrevista ao autor com Maria Helena Arrochelas realizada em Petrópolis, 2018. Essa rede, desde os anos 1990, se reúne uma vez por ano para fins de acompanhamento pela coordenação do Ceseep e de troca de experiências.

Feita a apresentação do Ceseep e de algumas de suas principais iniciativas, tratemos de avançar para o segundo ponto do roteiro acima apontado relativo ao trabalho de formação política conduzido pelo centro. Conforme mencionado, o foco recairá no Curso de Verão, e nossa análise toma como principal referência os textos reunidos no livro que tem sido publicado anualmente para balizar as aulas do curso. Para os objetivos deste texto, tomamos como objeto tão somente as contribuições relativas à seção “Igreja e sociedade”, visando identificar e analisar os conteúdos sociopolíticos que dão substrato ao projeto político-civilizacional da entidade e do curso em tela. A pergunta de pesquisa é: quais são os elementos-chave da narrativa sociopolítica que intelectuais/assessores vinculados à TdL e ao centro mobilizam para formar o jovem laicato brasileiro e latino-americano?

A experiência do Curso de Verão, segundo uma de suas coordenadoras, professora Lourdes de Fátima Possani (2011)POSSANI, Lourdes de Fátima. Metodologia da educação popular: a formação em foco. In: POSSANI, Lourdes de Fátima P. & SANCHES, Wagner Lopes. Formação ecumênica e popular feita em mutirão: Curso de Verão 25 anos. São Paulo: Paulus, 2011, p. 155-177., pode ser dividida em quatro fases, entre os anos de 1988 e 2011. A primeira corresponde aos quatro primeiros anos (1988-1991), nos quais predominou a programação de conteúdos formulada pelo grupo Emaús. Nas demais fases, foram introduzidas novidades metodológicas importantes no sentido de melhor adaptar o curso aos pressupostos norteadores da educação popular cujas referências obrigatórias foram os escritos e proposições de autores como Paulo Freire, Carlos Rodrigues Brandão e Luiz Eduardo Wanderley. Para fins de análise, escolhemos examinar livros que cobrem etapas diferentes na história do Curso de Verão.

Dois aspectos nos chamaram atenção quando começamos a examinar os textos relativos à primeira fase do curso. Um deles é a correspondência direta com os temas da Campanha da Fraternidade (CF), celebrada a cada ano pela CNBB. Já outros textos focaram mais claramente questões políticas e sociais que marcavam aquela conjuntura de mudanças marcada pela promulgação da nova Constituição e pela realização de eleições diretas para a presidência da República após quase três décadas de pleitos indiretos. Despontava o que se chamava de “Nova República”.

Os temas da CF, na ocasião, colocaram em pauta questões sociais de largo alcance, tais como a do negro na sociedade brasileira (CF 1988, lema: Ouvi o clamar desse povo!), a da presença e da discriminação da mulher (CF 1990, lema: Mulher e Homem – imagem de Deus) e a das condições dos trabalhadores (CF 1991, lema: Solidários na dignidade do trabalho) (CNBB, 2019CNBB. Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Campanha da Fraternidade. Brasília, DF: CNBB, 2019. Disponível em: <https://campanhas.cnbb.org.br/campanha-da-fraternidade>. Acesso em: 30 jun. 2022.
https://campanhas.cnbb.org.br/campanha-d...
). Caberia aos assessores convidados, em poucas páginas, abordar aspectos centrais dessas questões a par de levantar itens para o debate com os alunos do Curso de Verão. Assim o fizeram, por exemplo, o Pe. Antônio Aparecido da Silva, professor da Faculdade de Teologia Nossa Senhora de Assunção, no texto intitulado “Comunidade negra: passado e presente” (SILVA, 1988SILVA, Antônio Aparecido da. Comunidade negra: passado e presente. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de Verão, ano 1. São Paulo: Paulus, 1988, p. 150-158.), e Maria Clara Bingemer, teóloga, professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e membro do Emaús, no texto “Mulher e Homem: Imagem de Deus (Fraternidade e Mulher: Reflexões em vista da CF-90)” (BINGEMER, 1988BINGEMER, Maria Clara. Mulher e homem: Imagem de Deus (Fraternidade e mulher: Reflexões em vista da CF 1990). In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de Verão, ano 1. São Paulo: Paulus, 1988, p. 197-210.).

Os dois textos seguiram o mesmo padrão argumentativo: apresentação do problema, breve contextualização histórica, destacando a importância dos movimentos sociais dos negros e das mulheres, e, por fim, algumas palavras sobre questões relativas às relações da Igreja Católica com esses dois atores sociais. A esse respeito, há espaço para algumas investidas críticas sobre como a Igreja tem lidado historicamente com essas questões, tal como registra Bingemer, ao asseverar que “a presença da mulher na Igreja ainda deixa muito a desejar, sobretudo nos chamados níveis de decisão”. Se, no nível da execução, aponta a autora, “a presença feminina é majoritária, no nível da deliberação e decisão tudo está quase que totalmente concentrado nas mãos dos homens, seja nas paróquias, nas diversas comissões de pastoral ou nas dioceses” (1988, p. 202). Bingemer, porém, conclui com um tom positivo ao chamar atenção para o fato de que “a Igreja hoje começa a dar passos, inclusive em nível oficial, para o processo de igualdade da mulher em relação ao homem dentro do povo de Deus. Os frutos deste processo fazem perceber uma nova cidadania para a mulher dentro da Igreja que começa a despontar” (1988, p. 208).

Antônio Aparecido da Silva, em seu texto, aborda de forma ainda mais cautelosa a delicada relação da Igreja Católica com a questão negra. Como figura ativa da instituição a lidar com esse tema, dado a exercer o papel de Assessor Nacional dos Agentes de Pastoral Negros, optou por apontar para a emergência, a partir dos anos de 1970, de uma nova sensibilidade na Igreja em relação à população negra, destacando a importância da CF daquele ano na organização do movimento negro e na divulgação de suas pautas (SILVA, 1988SILVA, Antônio Aparecido da. Comunidade negra: passado e presente. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de Verão, ano 1. São Paulo: Paulus, 1988, p. 150-158., p. 156-157). Em texto posterior, intitulado “Cultura negra e evangelização”, publicado no livro do ano 5 do Curso de Verão, publicado em 1992, Antônio Aparecido mostrou-se bem mais incisivo quando tratou das diversas dimensões da marginalização negra, entre as quais a religiosa. Pe. Toninho, como também era conhecido, assim se referiu ao problema:

Do púlpito à coorte, as práticas religiosas de origem africana foram estigmatizadas e satanizadas, sofrendo, inclusive, a repressão policial. Graças unicamente à proteção divina e à resistência negra, permanecem hoje mais florescentes que ontem. Mesmo com o clima mais favorável para o ecumenismo e o diálogo que se criou após o Concílio Vaticano II, ainda são fortes os preconceitos e a distância de católicos e protestantes em relação à religiosidade de origem africana. (SILVA, 1991SILVA, Antônio Aparecido da. Cultura Negra e evangelização. In: BEOZZO, José Oscar (org.) Curso de verão, ano 5. São Paulo: Paulus, 1991, p. 91-109., p. 99)

Passemos agora a examinar alguns textos da primeira fase do Curso de Verão, classificados como conjunturais. Selecionamos dois deles: “Fé e Política”, de autoria de Clodovis Boff, publicado no livro 1 do Curso de Verão (1988)BOFF, Clodovis. Fé e Política. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de verão, ano 1. São Paulo: Paulus, 1988, p. 141-149.; e “Observações sobre as causas da injustiça socioeconômica e política no Brasil”, de Herbert de Souza, o Betinho, publicado no livro 2 do Curso de Verão (1989). Ambos apresentam reflexões e proposições a respeito dos desafios que se colocavam aos movimentos sociais tendo em vista o avançar do “tempo da política”, das candidaturas e das eleições.

Clodovis Boff, teólogo com passagem pelo Emaús e figura referência da TdL brasileira, apresenta um texto curto, em forma de roteiro, voltado para sensibilizar e instrumentalizar o cristão interessado em política. O religioso, desde o começo, se afasta de concepções conservadoras ou basistas que tendiam a compreender a política como um elemento de desagregação social e comunitária, e, em movimento contrário, aproxima o universo cristão do mundo da política. Segundo ele, Fé e Política são fenômenos intercambiáveis uma vez que “Política é antes uma dimensão interna da Fé – dimensão constitutiva. É a própria Fé feita em práxis histórica, Fé enquanto realizada no social” (BOFF, C., 1988BOFF, Clodovis. Fé e Política. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de verão, ano 1. São Paulo: Paulus, 1988, p. 141-149., p. 145). Mas também alerta: “A Fé inclui a Política, mas também a supera. Essa é dialética viva que sempre deve ser mantida. O perigo é reduzir a Fé à política (tentação dos engajados) ou reduzi-la à vida privada (tentação burguesa)” (p. 145, grifos do autor).

O religioso, em seguida, trata da missão da Igreja e dos cristãos no mundo da política. Nesse caso, o que temos no texto são recomendações diretas, em forma de pregação. Segundo ele, a posição correta da presença da Igreja no universo da política deve ser a “pastoral”, a “evangelizadora”, a qual consiste em: “evangelizar o político”, educando as consciências; “celebrar as esperanças do povo”; e “solidarizar-se com as lutas justas do povo oprimido través de apoio público, presença física etc.” (BOFF, C., 1988BOFF, Clodovis. Fé e Política. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de verão, ano 1. São Paulo: Paulus, 1988, p. 141-149., p. 147, grifos do autor).

O texto do sociólogo Betinho (SOUZA, H., 1989SOUZA, Herbert J. de. Observações sobre as causas da injustiça socioeconômica e política no Brasil. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de verão, ano 2. São Paulo: Paulus, 1989, p. 133-205.) segue por outro caminho. O que temos é um trabalho longo, de mais de 80 páginas, no qual o autor passa em revista os problemas estruturais brasileiros. Trata, por exemplo, da situação histórica de dependência econômica, da formação do povo brasileiro, da força do autoritarismo, das questões agrária, urbana e ecológica, e dos desafios e problemas da então chamada Nova República. O autor, seguindo o padrão dos demais textos, discute ainda o tema da presença das igrejas na conjuntura, chamando atenção para a importância dessa reflexão naqueles tempos que via como de encruzilhada e de mudança. Betinho mantém o tom sóbrio e analítico com que percorre o trabalho, assinalando que o cristianismo, em 2 mil anos de história, esteve “entre a utopia e a submissão à ordem, entre a democracia e o autoritarismo, entre Deus e o diabo, a liberdade e inquisição” (p. 203). E faz a pergunta inevitável: com quem as igrejas efetivamente estão?.

Ele vai além quando discute a questão tratada por Clodovis Boff acerca da participação dos cristãos e das igrejas no processo político. Para Betinho, o foco deveria ser, antes de tudo, a defesa da construção democrática. Com base nisso, propõe que não se deveria “buscar na fé o fundamento da ação política”, dado que isso “só pode ser suficiente para quem tem fé e, como o mundo também é composto pelos sem fé, seria muito importante que os cristãos buscassem fundamentar sua presença na política num tipo de princípio que, sem contrariar a fé, não a tivesse como princípio” (SOUZA, H., 1989SOUZA, Herbert J. de. Observações sobre as causas da injustiça socioeconômica e política no Brasil. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de verão, ano 2. São Paulo: Paulus, 1989, p. 133-205., p. 203). E conclui: “É aí que pode entrar a questão da democracia” (p. 203). Para Betinho, portanto, é mister que igrejas e cristãos se abram efetivamente para erigir um Estado e uma sociedade fundada na democracia e na laicidade.

Temos, assim, um painel de textos que nos ajuda a pensar a respeito das diretrizes estabelecidas pela direção do Ceseep para conduzir a seção do Curso de Verão mais diretamente relacionada aos processos de formação política. E, nesse caso, uma vez mais, transparece o jogo de acomodações entre a direção e a hierarquia eclesial católica, particularmente de São Paulo, que teria marcado a formação e os primeiros anos do centro. Uma pista nesse sentido diz respeito à própria denominação da seção do Curso em questão: “Igreja e sociedade”. Ou seja, ao que se sugere, definiu-se que a análise de determinados fenômenos sociopolíticos, tais como racismo, a questão da mulher, o papel dos movimentos sociais, entre outros, independentemente da abordagem, fosse ela sociológica ou teológica, deveria colocar em pauta necessariamente o olhar da Igreja sobre eles.

Outra diretriz, conectada a essa, foi a de vincular as aulas/textos dessa seção do Curso aos temas da CF, celebrada anualmente pela Igreja Católica. Portanto, o que temos são orientações emanadas por um centro autônomo e ecumênico que foram diretamente atravessadas por referências estabelecidas pelo mundo eclesial, institucional, católico. A direção do centro, por seu turno, reuniu condições para convocar majoritariamente membros do Emaús, o que significava a preeminência de leituras cristãs sobre esses fenômenos vinculadas à TdL. Foi o que fizeram vários autores que atuaram nas quatro seções do curso, tais como Maria Clara Bingemer, Clodovis Boff, Leonardo Boff, Carlos Mesters, Tereza Cavalcanti, Luiz Alberto Gomez de Souza, José Oscar Beozzo, entre outros.

José Oscar Beozzo, em texto escrito a título de balanço sobre a experiência do Curso de Verão, registra que essa primeira fase do Curso foi seguida de outra de mais dois anos, até que o centro se sentisse seguro para promover importantes mudanças de rumo naquele que era, então, o carro-chefe do Ceseep (BEOZZO, 2011bBEOZZO, José Oscar. O curso de verão e seus conteúdos. Ceseep: um projeto de formação social e pastoral. In: POSSANI, Lourdes de Fátima P. & SANCHES, Wagner Lopes. Formação ecumênica e popular feita em mutirão: Curso de Verão 25 anos. São Paulo: Paulus, 2011b, p. 211-238.). Algumas dessas mudanças devem aqui ser mencionadas. A primeira: o Curso passou a ser organizado em apenas duas seções: uma voltada para o mapeamento da realidade e outra reunindo reflexões bíblica, teologia e pastoral. Segundo o religioso, o centro assim o fez por considerar esse formato mais coerente com o método “Ver, Julgar e Agir”, que via como patrimônio de católicos e evangélicos envolvidos nas questões sociais (BEOZZO, 2011bBEOZZO, José Oscar. O curso de verão e seus conteúdos. Ceseep: um projeto de formação social e pastoral. In: POSSANI, Lourdes de Fátima P. & SANCHES, Wagner Lopes. Formação ecumênica e popular feita em mutirão: Curso de Verão 25 anos. São Paulo: Paulus, 2011b, p. 211-238.). Na prática, a alteração, como se verá a seguir, terminou por dar nova ênfase à abordagem sociológica e consequentemente à formação política.

Essa nova organização do Curso teve reflexos diretos no formato e na proposta do livro anual que, a partir daí, foi ordenado em torno de um tema central que deveria envolver as duas seções acima apontadas. A medida teve como efeito reduzir a dispersão e dar maior organicidade ao material impresso.

Outra mudança, igualmente importante, disse respeito a ajustes na metodologia do Curso de Verão. O desafio agora consistia em manter a organização do curso com base em um livro preparado antecipadamente pela direção do centro e pelos assessores, a ser entregue aos alunos no início das atividades, ao mesmo tempo em que fossem criados mecanismos de consulta com o intuito de ouvir as demandas prévias do alunado. Afinal, o centro se orientava por princípios da educação popular, que concebe o ato educativo tomando como referência central as práticas e os saberes do alunado. A solução encontrada, então, segundo Beozzo, foi a de enviar previamente “um questionário aos participantes acerca da prática e reflexão tanto pessoal quanto de sua comunidade ou movimento em torno do tema a ser abordado. No primeiro dia, em cada um dos blocos, partilhava-se [com os assessores] o resultado deste levantamento prévio” (BEOZZO, 2011bBEOZZO, José Oscar. O curso de verão e seus conteúdos. Ceseep: um projeto de formação social e pastoral. In: POSSANI, Lourdes de Fátima P. & SANCHES, Wagner Lopes. Formação ecumênica e popular feita em mutirão: Curso de Verão 25 anos. São Paulo: Paulus, 2011b, p. 211-238., p. 223).

Apontados esses ajustes de curso, cabe-nos agora verificar se essa nova fase do curso trouxe também mudanças de enfoque e de abordagem quanto ao que aqui circunscrevemos como “formação política”. Iremos testar essa questão estudando a seção “mapeamento da realidade” em dois livros anuais: o de 1995, ano 8 do Curso de Verão, cujo tema central foi “A cidade, um desafio para as Igrejas e movimentos populares”; e o de 2003, ano 16, cujo tema foi “Saúde: cuidar da vida e da integridade da criação”.

Quatro textos compõem a seção intitulada “Visão sociológica da cidade” do livro de 1994, todos eles escritos por pesquisadores do Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais (Ceris), órgão de levantamento de dados e de promoção de pesquisas vinculado à CNBB. Dois autores são cientistas sociais, e um é estatístico.

Temos um texto panorâmico, de autoria de Andréa Damacena e Marcelo Pitta (1994), no qual são apresentados dados populacionais, sociais e econômicos sobre as regiões brasileiras, três deles abordando diferentes dimensões do fenômeno urbano no país. Damacena (1995) escreve ainda um trabalho no qual aponta para a importância do poder local no contexto de uma nova cultura política nas cidades, enquanto Rogério Valle discorre sobre as novas condições do trabalho nos meios urbanos (VALLE, 1994aVALLE, Rogério. O futuro do trabalho nas cidades. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de verão, ano 8. São Paulo: Paulus, 1994a, p. 29-38.) e sobre a expansão do pentecostalismo nas cidades brasileiras (VALLE, 1994bVALLE, Rogério. O pentecostalismo no Meio Urbano. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de verão, ano 8. São Paulo: Paulus, 1994b, p. 47-54.).

Todos os textos são curtos, divididos em tópicos, analíticos e lastreados em dados e pesquisas. A linguagem é direta, não há maiores discussões teórico-conceituais, o foco se concentra na apresentação dos temas e não há um item específico sobre o olhar da Igreja Católica sobre aquelas questões, conforme se viu na primeira fase do Curso de Verão. O único fenômeno religioso examinado, no caso a presença do pentecostalismo na cidade, é visto em si e não em contraste comparativo com o catolicismo.

Esse mesmo perfil de texto pode ser visto no livro do Curso de Verão de 2002. Uma vez mais, o tema central do Curso, e do livro, foi resultado direto de consulta prévia aos alunos. Temos agora na seção intitulada “Socioeconômica-política e cultural” um único texto de autoria de Roberto Gouveia Nascimento, médico sanitarista e deputado estadual por São Paulo pelo PT (NASCIMENTO, 2002).

Nascimento (2002) divide sua exposição em três partes. Na primeira, apresenta um breve histórico sobre a criação e o estabelecimento do Sistema Único de Saúde (SUS), chamando atenção para seu caráter inovador e para os problemas que o sistema vem enfrentando na última década, marcada pelo avanço de proposições neoliberais. Em seguida, expõe ao leitor um conjunto de dados relativos às condições de saúde no país, mencionando nossas várias mazelas no setor (mortalidade infantil, avanço de doenças como malária, tuberculose, aids etc.). Por fim, na seção “Construindo a cidadania”, apresenta algumas iniciativas legislativas do seu mandato voltadas para levar adiante a adoção de uma nova política para o setor de saúde no Estado de São Paulo.

Esse padrão textual e de análise teve continuidade nos anos seguintes, quando foram abordados temas como “Água e vida” (2003) e “Educação para justiça” (2004), consolidando um novo modelo de formação política conduzida pelo centro que poderia assim ser resumido em comparação com o anterior: maior organicidade e menor dispersão temática; definição interna de temas de discussão e de conteúdos em diálogo direto com o público-alvo; e maior diversificação na escolha dos assessores, o que fez reduzir a dependência dos “pais fundadores” do Grupo Emaús.

As mudanças no Curso de Verão, acima apontadas, devem ser vistas em uma perspectiva mais ampla e relacionada à afirmação do Ceseep como uma “escola de formação”, com parâmetros, métodos e conteúdos próprios. Na última seção deste texto, iremos retomar esse ponto.

Movimento Nacional Fé e Política: formar e celebrar

O MF&P, lançado em 1989, é outro nó da teia de entidades criada, animada e mantida por leigos e religiosos vinculados à TdL brasileira, tendo sido formado por membros do Emaús interessados em criar instrumentos que favorecessem uma participação organizada dos cristãos no mundo da política e dos partidos. Em sua carta de princípios, o MF&P se define como um movimento ecumênico, não confessional e não partidário, aberto aos que consideram a política como campo preferencial da vivência de sua fé. Tem como proposta contribuir para a formação política e espiritual de militantes que atuam em partidos ou movimentos populares e se dedicam à causa dos pobres e oprimidos e que afirmam as classes populares como sujeito da sua história, na construção de uma sociedade democrática e socialista.

Compunham o núcleo original do movimento nomes como Leonardo Boff e Márcia Miranda, então à frente do Centro de Defesa dos Direitos Humanos – Petrópolis (CDDH), entidade âncora do MF&P no seu estabelecimento; Frei Betto, frade dominicano; Ivo Lesbaupin, ex-frade dominicano, professor universitário e filiado ao Iser Assessoria (outro celeiro de quadros para o MF&P); e Pedro A. Ribeiro de Oliveira, sociólogo, professor universitário, assessor de movimentos sociais e presença constante na coordenação do movimento desde a década de 1990. Também assinaram a ata de fundação do movimento: Marcos Arruda, economista e educador; Clodovis Boff, religioso e teólogo; Waldemar Boff, educador popular; D. Waldyr Calheiros, bispo de Volta Redonda; Adair Leonardo Rocha, professor universitário; Benedita da Silva, deputada federal pelo PT-RJ; Chico Alencar, vereador pelo PT-RJ; Patrus Ananias, vereador pelo PT-MG; Carlos Vereza, quadro do PT-ES; Teresa Côgo, educadora; Teresinha Toledo, da Pastoral Operária do ABC; Gilberto Carvalho, quadro histórico da Comissão Nacional da Pastoral Operária, entre outros.15 15 Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 1, p. 6, 1989.

Pedro A. Ribeiro de Oliveira, em texto publicado em 2004, chama atenção para dois momentos marcantes na história do movimento. O primeiro deles comporta a conjuntura que antecede ao lançamento do movimento e se estende até meados da década de 1990, quando o MF&P levou adiante um projeto de institucionalização da entidade visando realizar eventos e desenvolver cursos voltados para a formação política (OLIVEIRA, 2004OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro de (org.). Fé e política – fundamentos. Aparecida: Ideias & Letras, 2004.). Foi esse o contexto da publicação de quinze exemplares dos Cadernos Fé e Política. Estavam em pauta os seguintes temas e questões: Quais deveriam ser os princípios que fundamentam a atuação dos cristãos no universo da política e dos partidos? Como instrumentalizar o militante cristão de modo que pudesse compatibilizar a atuação no partido e na comunidade religiosa? Os cristãos deveriam atuar em conjunto tendo em vista compor uma tendência no partido como as demais? Haveria a necessidade de se criar uma pastoral específica para os militantes?

Parte dessas questões já fora objeto de debates entre membros do Emaús e assessores das CEBs, daí resultando na publicação intitulada Cristãos: como fazer política, lançada em 1987 (BOFF, C.; CDDH, 1987BOFF, Clodovis & CDDH. Centro de Defesa dos Direitos Humanos – Petrópolis. Cristãos: como fazer política. Petrópolis: Vozes, 1987.), assim como em livros e cursos do Curso de Verão em sua primeira fase, conforme tivemos a oportunidade de ver acima por conta dos textos de Clodovis Boff e Betinho. Portanto, o tema estava maduro para a criação de uma entidade como o MF&P.

Por ocasião da criação da entidade, a coordenação do MF&P precisou enfrentar resistências por parte de alguns segmentos das esquerdas que supunham que o movimento pudesse contribuir para criar uma cunha cristã no PT ou mesmo reproduzir experiências históricas anteriores nas quais o religioso, o confessional, poderia se sobrepor ao público, atingindo o Estado laico e democrático. Oliveira, a respeito dessas questões, sublinha que:

Desde o primeiro momento ficou claro que não deveríamos formar um partido próprio, nem ser uma tendência no interior do PT. Deveríamos, contudo, organizar-nos para não dispersar nossa capacidade de influência nos movimentos sociais e no próprio PT, onde éramos muito numerosos na base, mas pouco presentes nas cúpulas. (OLIVEIRA, 2004OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro de (org.). Fé e política – fundamentos. Aparecida: Ideias & Letras, 2004., p. 9)

Os Cadernos Fé e Política cumpririam papel central na montagem e na divulgação do movimento. Os exemplares apresentavam um formato simples e eram compostos por uma breve apresentação, a cargo dos redatores, e seções que foram se tornando fixas: “Reflexões sobre fé e política”, a qual reunia os artigos de fundo, “Testemunho de Fé e Política”, “Fatos de Fé e Política” e “Crônica”, de autoria de Maurício Abdalla Guerrieri. A publicação contou inicialmente com o apoio do CDDH e do Serviço de Educação e Organização Popular (Seop). Mais tarde, obteve o suporte também da Ação Quaresmal (Suíça), Evangelisches Missionswerk (Alemanha) e do Solidaridad (Holanda).

Formulamos quatro questões de pesquisa para estudar o conteúdo dos Cadernos Fé e Política. A saber: identificar temas recorrentes a fim de examinar a linha editorial da publicação; verificar a autoria dos artigos; analisar intervenções relativas ao socialismo real naquele contexto de crise acelerada do modelo soviético, seja no Leste Europeu, seja na própria União Soviética; e, por fim, estudar proposições a respeito dos processos de formação política.

Dois temas foram os mais debatidos: o primeiro foi o que examina as relações e as conexões entre fé e política, dando prosseguimento às discussões acima mencionadas, que tomaram corpo no âmbito das esquerdas cristãs desde meados dos anos 1980. O que estava em jogo era indicar caminhos e assegurar instrumentos teóricos para as “tribos cristãs” que atuavam diretamente no universo da política. O segundo tema disse respeito às experiências socialistas contemporâneas – as quais veremos a seguir. Outros temas importantes no temário da publicação foram: “Mística”, “Democracia”, “Ecologia” e “Mercado/Capitalismo/Neoliberalismo” e “Igreja Católica (hierarquia)”. Por outro lado, foram isoladas as menções a questões como “Educação Popular”, “Movimentos Populares”, “Reforma Agrária” e “Marxismo”. O mesmo a dizer da análise de políticas públicas levadas a efeito por governos locais do PT e análise de resultados eleitorais. Foram também esporádicos os testemunhos de cristãos que ocupavam espaços políticos formais, assim como raras as análises que trataram da situação política brasileira.

Foram contabilizados 37 autores, sendo 34 homens e somente três mulheres. Coube ao núcleo de fundadores do MF&P assinar a maior parte dos artigos, destacando-se a presença de Leonardo Boff – responsável por dez deles, alguns em parceria com outros autores –, Frei Betto, Marcos Arruda e Pedro A. Ribeiro de Oliveira.

Quanto ao tema do socialismo real, temos um conjunto expressivo de artigos que agrupamos em dois grupos. O primeiro reúne intervenções sobre experiências socialistas europeias (Polônia e Alemanha Oriental) e latino-americanas (Cuba e Nicarágua), de autoria de Lúcia Ribeiro de Souza, Frei Betto e Marcos Arruda. O segundo grupo abre o objeto de análise e trata de questões concernentes à crise e às perspectivas do socialismo no mundo contemporâneo, e são da lavra de Ivo Lesbaupin e de Rogério Valle.

Lúcia Ribeiro de Souza (1989)SOUZA, Herbert J. de. Observações sobre as causas da injustiça socioeconômica e política no Brasil. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de verão, ano 2. São Paulo: Paulus, 1989, p. 133-205. apresenta um relato quente sobre uma conjuntura específica que teve a oportunidade de testemunhar: a derrota político-eleitoral do governo e do partido comunista polonês e a consequente ascensão de um novo governo originário do Solidariedade. O texto chama atenção para o caráter múltiplo e inconcluso daquele processo que, a fim de colocar por terra um projeto centralista e autoritário, abria caminho para um futuro incerto, pós-socialista. Quais as bases daquela nova experiência política? A Polônia iria se integrar à economia de mercado e ao universo capitalista? Qual o projeto que sustentaria o pós-totalitarismo? Essas e outras interrogações são apontadas pela autora que não se arrisca em apontar caminhos futuros (SOUZA, L., 1989SOUZA, Herbert J. de. Observações sobre as causas da injustiça socioeconômica e política no Brasil. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de verão, ano 2. São Paulo: Paulus, 1989, p. 133-205.).

Selecionamos dois textos de Frei Betto sobre o tema em questão. O primeiro deles (FREI BETTO, 1990FREI BETTO [Carlos Alberto Libânio Christo]. O fracasso do socialismo alemão e os desafios à esquerda. Cadernos Fé e Política, Petrópolis, n. 4, p. 27-40, 1990.) foca na crise e na derrocada do socialismo na Alemanha Oriental, que teve como marco a derrubada do Muro de Berlim e a consequente reunificação do país conduzida por líderes da Alemanha Ocidental. O autor se mostra mais assertivo e propositivo do que Ribeiro de Souza quando examina aquele processo. Segundo ele, a crescente insatisfação dos alemães era resultado direto da estatização da economia que barrava a inovação e acentuava o atraso científico em relação à Europa Oriental, assim como do modelo de partido único que, para o autor, inibia “os mecanismos de participação democrática” e inibia “a oposição política” (FREI BETTO, 1990FREI BETTO [Carlos Alberto Libânio Christo]. O fracasso do socialismo alemão e os desafios à esquerda. Cadernos Fé e Política, Petrópolis, n. 4, p. 27-40, 1990., p. 28).

Frei Betto também não se furta em apontar para problemas de fundo quanto à leitura e às práticas que foram adotadas em nome do marxismo na Alemanha e em outros países da Europa Oriental quando do advento das chamadas “Democracias Populares”. Para o religioso, uma das principais contradições era a seguinte: “a RDA [República Democrática Alemã] era um país socialista, mas sua população não tinha nada de revolucionária. O socialismo não conseguiu resolver o problema da relação do Estado com a sociedade civil. As organizações de massa e os sindicatos eram mera correia de transmissão do partido” (FREI BETTO, 1990FREI BETTO [Carlos Alberto Libânio Christo]. O fracasso do socialismo alemão e os desafios à esquerda. Cadernos Fé e Política, Petrópolis, n. 4, p. 27-40, 1990., p. 34). O religioso conclui o artigo defendendo a necessidade de um trabalho de educação política voltado para reforçar o caráter democrático originário do socialismo de inspiração marxista (FREI BETTO, 1990FREI BETTO [Carlos Alberto Libânio Christo]. O fracasso do socialismo alemão e os desafios à esquerda. Cadernos Fé e Política, Petrópolis, n. 4, p. 27-40, 1990.).

Outro foi o tom adotado pelo religioso quando examinou a experiência socialista cubana. No texto, intitulado “Cuba e o Dom da Vida”, Frei Betto sublinha a importância das conquistas sociais da Revolução Cubana, que então comemorava 33 anos, e levanta argumentos de natureza teológica e política que justificam sua posição. Como cristão, defende que a vida é um dom divino: “A vida – esse milagre que permite ao Universo contemplar-se a si mesmo e que a ciência descreve sem saber explicar sua irrupção no curso da natureza – é o que Deus mais preza” (FREI BETTO, 1992FREI BETTO [Carlos Alberto Libânio Christo]. Cuba e o dom da vida. Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 7, p. 31-36, 1992., p. 32). E é exatamente esse direito que o regime revolucionário cubano tem historicamente assegurado, bastando ver os índices relativos à mortalidade infantil, os mais baixos do continente, e à crescente expectativa de vida (FREI BETTO, 1992FREI BETTO [Carlos Alberto Libânio Christo]. Cuba e o dom da vida. Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 7, p. 31-36, 1992., p. 34). O religioso assevera ainda que qualquer análise sobre a Revolução deve partir de um olhar latino-americano (e não europeu) e cabe também levar em conta os constrangimentos e os obstáculos enfrentados pelo regime cubano, entre os quais, o histórico bloqueio promovido pelos Estados Unidos (FREI BETTO, 1992FREI BETTO [Carlos Alberto Libânio Christo]. Cuba e o dom da vida. Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 7, p. 31-36, 1992., p. 34).

Frei Betto, no artigo, menciona brevemente alguns aspectos do regime cubano com os quais está em desacordo, tais como o predomínio do partido único, a ausência de movimentos populares autônomos e a estatização da economia, mas logo retoma o fio do argumento para reforçar seu posicionamento favorável ao processo revolucionário daquele país (FREI BETTO, 1992FREI BETTO [Carlos Alberto Libânio Christo]. Cuba e o dom da vida. Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 7, p. 31-36, 1992.). Arremata o texto apregoando que, para os que têm fome de justiça, Cuba representaria “um sonho de futuro” (p. 36).

Coube a Marcos Arruda (1990)ARRUDA, Marcos. O que aconteceu com a Nicarágua Sandinista? Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 4, p. 42-51, 1990. tratar sobre a Nicarágua, ou melhor, sobre um tropeço na revolução nicaraguense configurado na derrota sofrida pela Frente Sandinista de Libertação Nacional nas eleições presidenciais de 1990, vencidas pela líder oposicionista Violeta Chamorro. No texto, Arruda (1990)ARRUDA, Marcos. O que aconteceu com a Nicarágua Sandinista? Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 4, p. 42-51, 1990. analisa a conjuntura política daquele país apontando para as principais razões que explicariam o insucesso do processo revolucionário nicaraguense, entre as quais a atuação decisiva do imperialismo norte-americano no apoio a grupos contrarrevolucionários armados, assim como a problemas relativos ao fracasso da política econômica do governo sandinista. Segundo Arruda, os nicaraguenses teriam votado “com o estômago e não com o coração” (ARRUDA, 1990ARRUDA, Marcos. O que aconteceu com a Nicarágua Sandinista? Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 4, p. 42-51, 1990., p. 45).

O texto de Arruda mostra-se bem representativo da maneira pela qual setores das esquerdas vinculadas à TdL viam a crise multidimensional do socialismo naquele fim dos anos 1980 e começo da nova década. Por um lado, apontavam, como o próprio Arruda e Frei Betto, os inúmeros problemas que minaram por dentro a experiência socialista europeia e soviética, a qual viam como “estatocracias”, ou seja, regimes fundamentalmente ditatoriais. Arruda, por sinal, vai mais longe, e vê a crise como positiva, dado que ela abria a possibilidade histórica de colocar termo não no socialismo, mas, sim, no que chama de “socialismo nominal” (ARRUDA, 1990ARRUDA, Marcos. O que aconteceu com a Nicarágua Sandinista? Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 4, p. 42-51, 1990., p. 50). O caso da Nicarágua, por seu turno, era visto sob outra perspectiva, bem mais favorável. Segundo Arruda (1990)ARRUDA, Marcos. O que aconteceu com a Nicarágua Sandinista? Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 4, p. 42-51, 1990., a revolução sandinista, em dez anos, havia mostrado a possibilidade de se construir uma alternativa política não dogmática, mais democrática e bem mais flexível em comparação com o modelo soviético aplicado na Europa Oriental. A despeito da derrota eleitoral, Arruda (1990)ARRUDA, Marcos. O que aconteceu com a Nicarágua Sandinista? Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 4, p. 42-51, 1990. vislumbra possibilidades para o avanço do processo revolucionário naquele país. A aposta na Nicarágua como referência se mantinha.

Dois textos foram também selecionados tendo em vista abordar a crise do socialismo em perspectiva transnacional. O primeiro deles, de Ivo Lesbaupin (1990)LESBAUPIN, Ivo. Fim do socialismo? Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 4, p. 17-24, 1990., tem como proposta responder aos que defendiam teses em torno do “fim da História” simbolizado pela derrocada do socialismo marxista e pelo triunfo do capitalismo liberal. Lesbaupin expõe seu argumento em torno de três eixos: primeiro, que o fenômeno do socialismo é plural e a crise do sistema se apresenta de forma diversa na União Soviética, no Leste Europeu e na América Latina; segundo, que a afirmação de que Marx e o marxismo estão mortos tem como objetivo último “jogar fora todo potencial crítico ao capitalismo, presente na obra de Marx” (p. 22) e prossegue:

Se afirmarmos que a derrocada daqueles regimes socialistas obriga a repensar algumas ideias de Marx, não há aí nada de incoerente. Mas se acrescenta que não há, portanto, mais nada no pensamento de Marx a ser considerado, esta afirmação tem o objetivo bem preciso de deixar o capitalismo acima de toda e qualquer crítica. (LESBAUPIN, 1990LESBAUPIN, Ivo. Fim do socialismo? Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 4, p. 17-24, 1990., p. 22)

E, terceiro, que o “socialismo burocrático” já vai tarde e o advento de uma nova sociedade no Terceiro Mundo virá impulsionada pela luta dos trabalhadores (LESBAUPIN, 1990LESBAUPIN, Ivo. Fim do socialismo? Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 4, p. 17-24, 1990.).

Rogério Valle, cientista político da PUC-Rio, apresenta outro quadro analítico para lidar com o tema da crise em questão no texto intitulado “A técnica aniquilará o ideal Socialista?” (VALLE, 1991VALLE, Rogério. A técnica aniquilará o ideal socialista? (Sequelas de um debate no ISER). Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 5, p. 47-52, 1991.). A questão tratada pelo autor é a seguinte: a evolução técnica – marcante nos países capitalistas dito avançados – “vai nos jogar nos braços do capitalismo”? Ou, dito de outra forma, “teriam os computadores acabado com o “Socialismo Real”? (VALLE, 19917VALLE, Rogério. A técnica aniquilará o ideal socialista? (Sequelas de um debate no ISER). Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 5, p. 47-52, 1991., p. 4). O autor responde ao problema abrindo um diálogo com as proposições de Habermas acerca do papel exercido nas sociedades pelo “agir estratégico e instrumental” – do mundo da produção, da economia, do trabalho e da técnica – e pelo “agir comunicativo” – da informação, do espaço público, da interação social (VALLE, 1991VALLE, Rogério. A técnica aniquilará o ideal socialista? (Sequelas de um debate no ISER). Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 5, p. 47-52, 1991.). Para Valle, a crise do Leste Europeu e o avanço técnico colocou no horizonte a possibilidade de pensar em novas proposições políticas em torno da seguinte premissa: a luta para que o “agir comunicativo ganhe espaço também dentro do Sistema, do mundo da produção, da organização financeira e da administração pública” (p. 51). Isso significaria que deveriam participar das decisões “todos aqueles que, e só aqueles que, são afetados pelas suas decisões, seja no trabalho, no lazer, na educação, nas condições de moradia etc.” (p. xx).

Valle (1991)VALLE, Rogério. A técnica aniquilará o ideal socialista? (Sequelas de um debate no ISER). Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 5, p. 47-52, 1991. arremata assinalando que vê essas proposições como adequadas à evolução das sociedades e das técnicas modernas e propõe que o debate político não gire apenas em torno das “grandes coisas” (o geral), mas também as “pequenas” (particular). E conclui sublinhando que nada disso que propôs esteve nos regimes políticos que soçobraram no Leste Europeu e mais: o problema, afirma, não é a técnica, mas a “burocracia criada por ‘partidos revolucionários’ que tinham o monopólio [e o controle] das decisões” (p. 52).

O cardápio de textos acima sumariado encerra várias questões acerca da maneira pela qual as esquerdas cristãs acompanharam e vivenciaram aquela quadra histórica de transformações que colocou em xeque as experiências políticas fundamentadas no socialismo marxista. A hora, portanto, era de desafios e de inventividade, buscando manter em pé a defesa estratégica da construção de uma sociedade socialista em novas bases. Os textos em questão, como foi possível observar, ainda que abordassem um leque variado de temas e de proposições, tinham em comum, em primeiro lugar, um estilo próprio, jornalístico, e voltado diretamente para o enfrentamento político-ideológico. Por vezes, adotando o tom testemunhal, transparecendo dúvidas e expectativas no acompanhamento daqueles episódios que reviraram o mundo. Mas, de maneira geral, temos escritos que poderíamos caracterizar como de intervenção, explicitando convicções e proposições e apontando para o que há de ser.

O segundo aspecto comum saliente diz respeito à opção preferencial de vários autores pelo combate ao “socialismo nominal” e pela clara defesa das experiências socialistas latino-americanas, em particular a nicaraguense e a cubana. Tal postura pode ser atribuída, entre outras razões, às estreitas conexões que Frei Betto e Leonardo Boff, figuras chaves do MF&P, mantinham com o regime castrista desde os anos 1980.

Por fim, tratemos de examinar brevemente a questão da formação política no MF&P. Interessa-nos, neste ponto, verificar se o movimento chegou a formular algum modelo a esse respeito. No levantamento realizado nos Cadernos, observamos que o tema foi mencionado nos relatórios do movimento que eram transcritos na publicação, e, de forma lateral, em alguns artigos de fundo. Em um deles, o tema ganhou expressão e pode nos servir de base para verificar o que o grupo pensava sobre o assunto. O artigo, de autoria de Leonardo Boff e Márcia Miranda, intitula-se “A contribuição dos militantes cristãos na política partidária” (1989) e está integrado ao debate acima referido sobre a inserção dos cristãos no universo político.

Boff e Miranda, ao defender a criação de uma articulação que reúna e organize os militantes políticos cristãos, propõem ainda que seja formada uma estrutura como um Instituto de Formação Política, o qual poderia ficar a cargo da articulação cristã ou de outra entidade nos moldes do Instituto Cajamar, um centro de formação política mantido pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) e vinculado ao PT. Foram fixados alguns parâmetros para a atuação desse instituto, tais como: abertura a todas as grandes questões lidas sob a ótica dos oprimidos; reconhecer o povo como sujeito da transformação social; inclusão em tudo da atuação e da contribuição das mulheres; e que a democracia “não seja considerada apenas como uma forma de relação social, mas um modo de ser que pervade todas as dimensões da vida, na família, na escola, na comunidade eclesial, na vida partidária e, evidentemente, na política” (BOFF, L.; MIRANDA, 1989BOFF, Leonardo & MIRANDA, Márcia. Qual a contribuição dos militantes cristãos na política partidária? Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 2, p. 21-28, 1989., p. 20). Os autores propõem ainda, por fim, que seja fornecido aos militantes um instrumental analítico que faça com que eles dominem o código político e construam uma “visão revolucionária do mundo”, a fim de superar o idealismo cristão, o basismo, o empiricismo, o paralelismo de discursos e o machismo (p. 20).

O MF&P, como se pode observar, surgiu em uma conjuntura político-social específica em que movimentos sociais de diferentes tonalidades se agrupavam em torno de um projeto encarnado em Lula e organizado em instâncias partidárias (em especial no PT) e sindicais (particularmente na CUT). O MF&P, nesse quadro, vislumbrou a possibilidade de reunir, em torno de si e do seu projeto, um conjunto de militantes cristãos devidamente aparelhados para atuar no universo da política. Colocou-se, portanto, como um núcleo organizador e aglutinador da “tribo cristã”, que deveria reunir condições para atuar diretamente na formação de quadros para o campo popular e partidário. Em suma, o movimento surgiu com uma pauta desafiadora: montar uma entidade em nível nacional, produzir análises que ajudassem a orientar o campo popular em um momento de crise profunda do socialismo, e, por fim, construir uma estrutura formal de formação política de quadros, conforme o desenho acima proposto por Boff e Miranda.

Em fins da década de 1990, os fundadores do movimento chegaram à conclusão de que não havia como manter essa pesada agenda institucional, intelectual e de formação. Prova disso, entre outras, foi a interrupção da publicação dos Cadernos em 1996. Pedro A. Ribeiro de Oliveira, então na coordenação do movimento, assim contextualizou essa nova fase no MF&P:

Tinha de ser uma rede, um conjunto de grupos de Fé e Política espalhados pelo país, cada um na sua. O quanto possível, articularíamos essa grande rede através dos cadernos e encontros. (…) Mas era muito esforço e pouco resultado: participavam dos encontros muito menos pessoas do que esperávamos, e era muito difícil vender os cadernos que tanto nos custava produzir. (OLIVEIRA, 2004OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro de (org.). Fé e política – fundamentos. Aparecida: Ideias & Letras, 2004., p. 9)

Nos dizeres de Oliveira, após a reavaliação em fins da década de 1990, o movimento optou pela realização de grandes encontros com vistas a animar e a dinamizar os diferentes grupos que compunham a rede em sua espiritualidade. E foi assim em Santo André, em 2000, como também em Poços de Caldas, em 2002, e assim tem sido desde então. Costumam ser encontros que reúnem milhares de pessoas oriundas das várias regiões do país, grande parte delas de forma autônoma, ou seja, sem o suporte eclesial.16 16 Conferir histórico dos encontros do MF&P no site http://fepolitica.org.br/encontros-nacionais/. Acesso em 07/05/2021.

Oliveira concebe o MF&P, a partir de então, como um movimento espiritual nos seguintes termos:

O Movimento é propriamente espiritual. (…) Ele luta, sim, por uma sociedade que supere o capitalismo, mas sua maneira de lutar é dando força espiritual para que cada um dos membros, animado pelo Espírito Santo, seja fiel à missão de anunciar e construir o Reino de Deus. Nossas orações, celebrações e retiros espirituais sempre foram momentos de experiência espiritual dos quais saímos mais fortes para a “nobre luta pela Justiça Social”, na feliz expressão de João Paulo II. (OLIVEIRA, 2004OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro de (org.). Fé e política – fundamentos. Aparecida: Ideias & Letras, 2004., p. 12)

Amarrando os nós: considerações finais

O presente texto colocou em foco o Ceseep e o MF&P, dois organismos criados sob a égide do Grupo Emaús e da TdL e na esteira de um impulso democratizador no país, responsável pelo advento de um regime civil e pela promulgação da chamada Constituição Cidadã de 1988. Ambos foram constituídos por militantes cristãos com o propósito de formar quadros engajados em projetos de transformação social, podendo então contar com o apoio efetivo de importantes lideranças da Igreja Católica e de denominações protestantes históricas sediadas no Brasil e no exterior. Ceseep e MF&P, após décadas de atuação, permanecem como importantes instrumentos de formação no campo político-religioso orientado diretamente pela TdL no país.

Cabe, por fim, avançarmos nesta última seção na seguinte questão: qual foi o lugar ocupado por essas entidades no campo acima referido? E mais: o que nos sugere o estudo cruzado da trajetória de ambas para melhor compreender acerca da construção e da implementação do projeto político-civilizacional da TdL no país?

Quanto à experiência do Ceseep, cremos que apresentamos alguns dados que demonstram o papel chave que a entidade exerceu e continua a exercer na constituição e na alimentação do campo de formação política acima mencionado. Melhor prova nesse sentido tem sido a capacidade do Ceseep de favorecer a criação e a disseminação de uma rede de cursos pelo país, “apadrinhados” pela entidade. Sugerimos que vale examinar, em pesquisas futuras, as razões que poderiam explicar não apenas essa centralidade, como também as condições que fazem com que o centro permaneça de pé por cerca de 40 anos, em atividades ininterruptas. Duas podem ser as linhas de investigação acerca dessa longevidade. A primeira: o centro foi desenhado e formado para atender a demandas de bispos e agentes de pastoral, católicos e protestantes, brasileiros e latino-americanos, leigos e religiosos. Tais propósitos exigiram erguer uma entidade que deveria, a fim de manter cursos regulares e voltados para distintos públicos, experimentar a flexibilidade curricular e a capacidade de diálogo intra e inter-religioso. Para tal, contou com um núcleo executivo preparado para cumprir sua missão original. A segunda: o Ceseep, pelas características acima mencionadas, manteve relações muito particulares com as entidades religiosas que estiveram na sua origem, podendo valer-se do apoio fundamental da Igreja Católica de São Paulo e de denominações protestantes, ao mesmo tempo em que buscou afirmar sua autonomia como entidade civil, popular e ecumênica.17 17 Outra variável a ser investigada na pesquisa diz respeito às mudanças que foram levadas adiante pelo Arcebispo e depois Cardeal Claudio Hummes, sucessor de Dom Paulo Evaristo Arns, na condução da Arquidiocese de São Paulo. O novo dirigente da Igreja de São Paulo, à luz das novas orientações do Vaticano durante o pontificado de João Paulo II, manteve postura defensiva e discreta na relação com os movimentos sociais, quando comparada à de seu antecessor. Há de se verificar o possível impacto dessa nova política nas atividades do CESEEP.

O MF&P surgiu em outra conjuntura, em fim dos anos 1980, quando se encontrava na ordem do dia, no âmbito da TdL, a formação de militantes políticos cristãos, e teve origem na iniciativa de algumas das principais lideranças das esquerdas católicas brasileiras, entre as quais sobressai o nome de Leonardo Boff – então em rota de colisão direta com a cúpula do Vaticano. Várias dessas lideranças mantinham algum grau de proximidade com o PT, havendo, inclusive, no grupo fundador, quadros orgânicos do partido.

O MF&P, portanto, ocupou e ocupa um espaço diferente do Ceseep no campo político-religioso acima mencionado. Porquanto haja origem comum, essas duas entidades construíram trajetórias bem demarcadas; a segunda, o Ceseep, firmou-se como uma estrutura formal, como uma escola de formação, mantendo laços estreitos com o mundo eclesial. O MF&P, por sua vez, foi erigido com uma plataforma política mais explícita e radical do que o Ceseep: era um grupo político-religioso voltado para a construção do socialismo e defensor de estratégias de maior intervenção no debate político-ideológico. Desde a sua criação, manteve vínculos mais tênues com o mundo eclesial, ainda que seu âmbito contasse com alguns religiosos, entre os quais Frei Betto e Clodovis Boff. A entidade, desde o novo século, mantém a proposta de oferecer instrumentos à “tribo cristã” por meio de eventos que reforcem uma espiritualidade comprometida com seu projeto revolucionário.

Por fim, cabe abrir o objeto e abordar o último ponto do nosso roteiro, qual seja: o que essa discussão encerra de importante para o estudo da TdL brasileira? Fiquemos, por ora, com três assertivas que podem ser vistas como hipóteses para futuras investigações sobre o tema: 1) foi alta a aposta da TdL brasileira em criar estruturas de formação, com características diferentes, tendo em vista formar quadros em entidades de natureza civil, como o Ceseep, o MF&P e o CEBI (outro organismo saído das reuniões do Emaús); 2) essa “rede civil”, conforme os objetivos estratégicos e o perfil de cada organismo, operou com diferentes modelos de formação política, conforme podemos ver acima; 3) a TdL teve e manteve como elemento constitutivo uma atuação em dupla via: ora pela institucionalidade – daí a maior proximidade com o mundo eclesial –, ora pela formação de grupos e entidades de caráter civil, buscando, com isso, assegurar maior liberdade de ação.

  • 1
    Artigo não publicado em Plataforma preprint. Todas as fontes e bibliografia utilizadas são referenciadas no artigo. Apoio de Bolsa PQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, processo: 304444/2019-7 e do programa Cientista do Nosso Estado da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro – FAPERJ, processo: E-26/202-768/2017
  • 3
    A respeito do uso da noção “Igreja Popular” por essa literatura, conferir em particular Mainwaring (2004)MAINWARING, Scott. Igreja Católica e política no Brasil (1916-1985). São Paulo: Brasiliense, 2004.. Leonardo Boff, em seu estudo Eclesiogênese: a reinvenção da Igreja também se vale da expressão para relacioná-la à Igreja nascida do povo. (BOFF, 2008BOFF, Leonardo. Eclesiogênese: a reinvenção da Igreja. Rio de Janeiro: Record, 2008., p. 227-246). Para análise mais ampla sobre o uso da noção no âmbito da TdL, ver Valério (2012, p. 33-77)VALÉRIO, Mairon Escorsi. O continente pobre e católico: o discurso da teologia da libertação e a reinvenção religiosa da América Latina (1968-1992). Tese de doutorado em História, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012..
  • 4
    Cabe observar que, neste artigo, focamos na formação de uma rede de entidades no Brasil cujo polo de irradiação foi o Emaús. Investigaremos, em trabalhos futuros, as conexões desse grupo com entidades religiosas internacionais, em particular com a rede ecumênica liderada e alimentada pelo CMI. Para tal, é mister o diálogo com uma corrente de estudos acadêmicos que, nos últimos anos, chama atenção para o caráter transnacional que marca a origem e o desenvolvimento da TdL nas décadas de 1960 e 1970 em um contexto de aproximação e troca entre correntes católicas europeias e latino-americanas. Essa produção coloca em questão concepções hegemônicas produzidas no âmbito da TdL que propaga a polaridade entre as teologias latino-americana e europeia. A esse respeito, ver Chaouch (2007)CHAOUCH, Malik Tahar. La teología de la liberación en América Latina: una relectura sociológica. Revista Mexicana de Sociología, Ciudad de México, v. 69, n 3, p. 427-456, 2007., Valério (2012)VALÉRIO, Mairon Escorsi. O continente pobre e católico: o discurso da teologia da libertação e a reinvenção religiosa da América Latina (1968-1992). Tese de doutorado em História, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012. e Andreo (2019)ANDREO, Igor Luis. Christus: aggiornamento católico e teologia da libertação em uma revista jesuítica mexicana (1968-1973). Antíteses, Londrina, v. 12, n. 23, p. 431-465, 2019. ISSN 1984-3356. Disponível em: <https://bit.ly/3z5E2Uc>. Acesso em: 14 jul. 2022. doi: http://dx.doi.org/10.5433/1984-3356.2019v12n23p431.
    https://bit.ly/3z5E2Uc...
    . Conferir ainda o uso e a aplicação da noção de “rede religiosa transnacional” em García Vettorazzi (2020)GARCÍA VETTORAZZI, María V. Redes religiosas transnacionales, teología de la liberación y pastoral indigenista em México y Guatemala, 1968-1975. Península, Yucatán, v. 15, n. 1, p. 9-40, 2020..
  • 5
    Entrevista ao autor com Frei Betto realizada em Rio de Janeiro, 2014.
  • 6
    Foram entrevistados: José Oscar Beozzo e Luiz Eduardo Wanderley, membros do Emaús e da direção executiva do Ceseep; Maria Helena Arrochelas, membro do Emaús e responsável pelo Curso Flor e Canto – Encontros Ecumênicos de Formação (Petrópolis, RJ); Faustino Teixeira, membro do Emaús; Frei Betto, Leonardo Boff e Pedro A. Ribeiro de Oliveira, membros do Emaús e do MF&P. As entrevistas, no projeto, são tratadas como fontes que nos dão pistas para o conhecimento do passado, como também para o conhecimento do presente. A esse respeito, ver ensaio de Verena Alberti: Narrativas na história oral (2003)ALBERTI, Verena. Narrativas na História Oral. In: Simpósio Nacional de História, 22, 2003, João Pessoa. Anais Eletrônicos. João Pessoa: ANPUH, 2003, p. 1-10.. Ver ainda, da mesma autora, reflexões metodológicas reunidas no livro Ouvir contar: textos de história oral (2004).
  • 7
    Foram selecionados para a análise textos vistos como exemplares da maneira pela qual cada uma das entidades veio a construir seu perfil no campo da Teologia da Libertação, examinados levando em consideração o tema proposto e a abordagem utilizada. Foram considerados temas representativos na mostra: a questão da mulher e da escravização negra; relações religião e política; questões urbanas (livros do Curso de Verão (Ceseep)); questões do socialismo contemporâneo e proposições acerca da formação política (Cadernos Fé e Política (MF&P)).
  • 8
    Entrevista ao autor com José Oscar Beozzo realizada em São Paulo, em 10 de janeiro de 2018.
  • 9
    A tipologia que divide o episcopado brasileiro, sob a ótica político-ideológica, entre “conservadores”, “moderados” e “progressistas”, tem sido revista por autores como o historiador Sergio Coutinho, que propõe outra tipologia baseada em pressupostos teológicos relacionados à Cristologia, à Eclesiologia e à Antropologia Cristã. Segundo ele, os bispos se dividem em: 1) Neopelagianos, ou seja, os assim descritos pelo Papa Francisco em Evangelii Gaudium: “são autorreferenciais” que focam na “segurança doutrinal ou disciplinar” com forte pretensão de dominar o espaço da Igreja” por meio de um cuidado exibicionista da liturgia, da doutrina e do prestígio da Igreja”; 2) Neoagostinianos, vistos também como autorreferenciais, possuem uma “postura cautelosa na relação Igreja-mundo, defendem a “identidade católica” com foco cristocêntrico (…) e um arraigado eclesiocentrismo normativo (clericalismo e corporativismo)”; 3) Neotomistas, ou seja, têm o Reino de Deus como centro e estão comprometidos “com a missão de pregar, servir e testemunhar o reinado de Deus na história dos homens e no mundo dos pobres, e se identificam com o projeto do papa Francisco de uma ‘Igreja em saída’” (PAPA FRANCISCO apud COUTINHO, 2015COUTINHO, Sérgio. Papa Francisco e a Igreja no Brasil. O desafio da conversão pastoral e um novo modelo de Igreja. Entrevista especial com Sérgio Coutinho. Instituto Humanitas Unisinos, São Leopoldo, 18/05/2015. Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/542659-o-desafio-da-conversao-pastoral-e-de-um-novo-modelo-de-igreja-entrevista-especial-com-sergio-coutinho>. Acesso em: 5 jan. 2017.
    http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/5...
    ). Nomes como o de Dom Paulo Evaristo Arns, portanto, comporiam essa terceira vertente voltada para uma presença mais ativa da instituição na sociedade.
  • 10
    Beozzo relata que o CMI contribuiu com US$ 40 mil para o estabelecimento do centro. Entrevista ao autor com José Oscar Beozzo realizada em São Paulo, em 10 de janeiro de 2018.
  • 11
    Entrevista ao autor com Luiz Eduardo Wanderley realizada em São Paulo, 2018.
  • 12
    Os dados relativos aos cursos do CESEEP foram extraídos do Relatório de Avaliação do CESEEP elaborado pelo Instituto de Estudos Especiais da PUC-SP (IEE, 2005IEE. Instituto de Estudos Especiais – PUC-SP. Relatório de avaliação do CESEEP. São Paulo: PUC-SP, 2005.).
  • 13
    Entrevista ao autor com José Oscar Beozzo realizada em São Paulo, em 10 de janeiro de 2018.
  • 14
    Entrevista ao autor com Maria Helena Arrochelas realizada em Petrópolis, 2018.
  • 15
    Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 1, p. 6, 1989.
  • 16
    Conferir histórico dos encontros do MF&P no site http://fepolitica.org.br/encontros-nacionais/. Acesso em 07/05/2021.
  • 17
    Outra variável a ser investigada na pesquisa diz respeito às mudanças que foram levadas adiante pelo Arcebispo e depois Cardeal Claudio Hummes, sucessor de Dom Paulo Evaristo Arns, na condução da Arquidiocese de São Paulo. O novo dirigente da Igreja de São Paulo, à luz das novas orientações do Vaticano durante o pontificado de João Paulo II, manteve postura defensiva e discreta na relação com os movimentos sociais, quando comparada à de seu antecessor. Há de se verificar o possível impacto dessa nova política nas atividades do CESEEP.

Referências Bibliográficas

Referências Bibliográficas
  • Cadernos Fé e Política, Petrópolis, v. 1, 1989.
  • Entrevista ao autor com Faustino Teixeira realizada em Juiz de Fora, 2018.
  • Entrevista ao autor com Frei Betto realizada em Rio de Janeiro, 2014.
  • Entrevista ao autor com José Oscar Beozzo realizada em São Paulo, em 10 de janeiro de 2018.
  • Entrevista ao autor com Luiz Eduardo Wanderley realizada em São Paulo, 2018.
  • Entrevista ao autor com Maria Helena Arrochelas realizada em Petrópolis, 2018.
  • Entrevista ao autor com Pedro A. Ribeiro de Oliveira realizada em Juiz de Fora, 2017.
  • Entrevista ao autor com Pedro A. Ribeiro de Oliveira realizada em Juiz de Fora, 2018.
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    » https://bit.ly/3z5E2Uc» http://dx.doi.org/10.5433/1984-3356.2019v12n23p431
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  • BEOZZO, José Oscar. O curso de verão e seus conteúdos. Ceseep: um projeto de formação social e pastoral. In: POSSANI, Lourdes de Fátima P. & SANCHES, Wagner Lopes. Formação ecumênica e popular feita em mutirão: Curso de Verão 25 anos São Paulo: Paulus, 2011b, p. 211-238.
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  • BOFF, Clodovis. Fé e Política. In: BEOZZO, José Oscar (org.). Curso de verão, ano 1. São Paulo: Paulus, 1988, p. 141-149.
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Editado por

Editores Responsáveis
Miriam Dolhnikoff e Miguel Palmeira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Set 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    18 Maio 2021
  • Aceito
    14 Jan 2022
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