Open-access TRADIÇÕES & CONTRADIÇÕES: RAÍZES MODERNISTAS DO PENSAMENTO DE SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA E DE RAÍZES DO BRASIL (1936)1

TRADITIONS & CONTRADICTIONS: MODERNIST ROOTS OF SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA’S THOUGHT AND ROOTS OF BRAZIL (1936)

Resumo

O artigo investiga o modo como tensões e ambiguidades do modernismo brasileiro estruturam, tanto do ponto histórico e estético quanto da lógica arquitetônica da construção do argumento proposto, o corpo textual da primeira edição de Raízes do Brasil. Propõe uma leitura minuciosa da edição original de 1936, procurando evidenciar a indivisibilidade dos debates estéticos e políticos, que parece alimentar uma espécie de acerto de contas com o modernismo, em um momento em que o movimento se ramificava em múltiplas e divergentes tendências. Atenção especial é conferida às correntes estéticas do modernismo resenhadas por Tristão de Athayde e D.H. Lawrence assim como suas implicações para o pensamento do jovem Sérgio Buarque.

Palavras-chave
Modernismo; Pensamento Social Brasileiro; Raízes do Brasil ; Sérgio Buarque de Holanda; Estilos de Pensamento

Abstract

The article examines the way in which the tensions and ambiguities of Brazilian modernism structure the textual body of the first edition of Raízes do Brasil, both from a historical and aesthetic point of view and from the architectural logic of the construction of the proposed argument. It proposes a close reading of the original 1936 edition, seeking to highlight the indivisibility of the aesthetic and political debates that seemed to fuel a kind of reckoning with modernism at a time when the movement was branching out into multiple and divergent tendencies. Special attention is paid to the aesthetic currents of modernism, as critiqued by Tristão de Athayde and D.H. Lawrence, and their implications for the young Sérgio Buarque’s thought.

Keywords
Modernism; Brazilian Social Thought; Roots of Brazil ; Sérgio Buarque de Holanda; Styles of Thoutght

“Antes de perguntar como uma obra literária se situa diante das relações de produção da época, eu gostaria de questionar como ela se situa dentro delas. Essa pergunta mira diretamente na função da obra dentro das relações de produção literária de uma época. Em outras palavras, ela mira diretamente na técnica literária das obras”.

(Walter Benjamin, O autor como produtor)

O mecanismo das tradições seletivas e as hipóteses modernistas

Disputas, polêmicas, interpretações, conflitos, contradições em torno do moderno e do modernismo calam fundo na cultura brasileira, na sua vida social e em sua civilização material. Exprimem as fantasias e as esperanças brasileiras de viver seu encontro marcado com a modernidade, com a contemporaneidade. Mal suspeitando a alta modernidade que se esconde nessa terra de contrastes, segundo Roger Bastide, ou melhor, de contrastes e confrontos, já assinalava Euclides da Cunha em 1907. Por tais razões, os debates em torno da Semana de Arte Moderna e do Movimento Modernista continuam a ter muito a dizer a respeito de nossas mazelas passadas e presentes.

O que talvez imponha a questão, proposta por Raymond Williams, em outros contextos, mas atinentes também à delimitação dos marcos temporais das políticas culturais modernistas: quando foi o modernismo? Um questionamento histórico a propósito de uma história problemática – isto é, nos termos de Williams, “um problema que é agora também uma ideologia dominante e enganosa”. Dito de modo mais explícito: “determinar o processo que fixou o momento do Modernismo é uma questão, como ocorre frequentemente, de identificar os mecanismos da tradição seletiva”. (WILLIAMS 1994, p. 31-2)

Até que ponto nossas visões do modernismo e da semana continuam tributárias das grandes visões que nos deixaram as suas principais lideranças? Por outro lado, o que ainda podemos aprender com o modernismo – ou modernismos – de 1922? Como fazer o balanço objetivo de seus erros e acertos, suas promessas e suas realizações, de seus ruídos e de seus silêncios? Quais as possibilidades de a experiência modernista ainda hoje sugerir pistas para se pensar criticamente a respeito do Brasil do século XXI?

Essas perguntas convidam a ensaiar algumas hipóteses a respeito da presença de traços modernistas, bem como da forma como se manifestam alguns mecanismos das tradições seletivas do modernismo, na estrutura do texto tanto quanto no eixo argumentativo da primeira edição de Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Holanda. Enseja-se aqui o estudo das raízes propriamente literárias de Raízes do Brasil, vinculando-as aos debates internos às correntes modernistas, bem como às políticas literárias do modernismo brasileiro na década de 1920.

Não se trata de ideia original, visto outros trabalhos reconhecerem a tessitura de “uma síntese modernista” em Raízes do Brasil.3 Mesmo sob o risco de transformar a visão hegemônica do modernismo paulista em “parâmetro geral e inescapável de validação da cultura brasileira em todo século XX”, como reiteradamente tem advertido o professor e crítico literário Luís Augusto Fischer, valeria a pena testar o efetivo alcance de um inusitado juízo exarado recentemente em seu livro A ideologia modernista. De acordo com este autor, Sérgio Buarque teria sido “uma figura essencial na linhagem de intelectuais que fizeram existir o modernismo paulista tal como ele veio a se consagrar”, “um defensor explícito de certa linhagem modernista”, a ponto de fazer ver em Raízes do Brasil “a defesa do modernismo paulista” (FISCHER, 2022, p. 11, 104 e 105).

Em alguma medida, há razões convincentes, senão suficientes, para validar a sagacidade de semelhante apreciação. Contudo, se as conclusões alcançadas na leitura aqui delineada permitem validar parcialmente a interpretação contida na obra do crítico gaúcho quanto à radicação de Raízes do Brasil no contexto do modernismo brasileiro, é conferido um sentido distinto ao juízo sugerido em A ideologia modernista. Um sentido porventura menos severo e extensivo, a rigor mais imanente ao texto do próprio Sérgio Buarque, do que o proposto por Fischer.

Alguma ensaística, algum modernismo: da candidez do método

O que este ensaio tem ou pode nos trazer de relevante para a compreensão do pensamento de Sérgio Buarque de Holanda, ou, talvez, do próprio modernismo, visto pelas lentes da experiência modernista deste autor? Essa é a pergunta fundamental de toda crítica, literária ou social. Para respondê-la, uma fértil tradição da crítica literária brasileira julga necessário articular dois planos de interpretação, teórica e empiricamente indissociáveis, que para fins de maior clareza didática costumam ser analítica e artificiosamente separadas.

Primeiro, deve-se verificar como uma obra incorpora em sua estruturação elementos colhidos na realidade social para a conformação de sua “realidade” ficcional ou imaginária. Isto é, como traduz em determinada forma literária os traços mais significativos das formas sociais que a obra procura representar e/ou problematizar. Depois, uma vez vencida a tarefa, é preciso interpretar a função que essa obra específica desempenha em meio a um corpo estruturado de referências, o qual se pode enfeixar na noção de “sistema literário”. Tal noção comporta a compreensão das relações existentes entre um conjunto de autores e obras que se ligam por uma linguagem e um leque temático – isto é, imagens, estilos e temas - comuns, que dão

lugar a um tipo de comunicação inter-humana (...) por meio do qual as veleidades mais profundas do indivíduo se transformam em elementos de contato entre os homens, e de interpretação das diferentes esferas da realidade... [junto aos] diferentes tipos de público, sem os quais uma obra não vive

(CANDIDO, 1993 [1959], p. 23).

Ao crítico e à crítica caberia, portanto, o esforço de elucidar – ou ao menos fornecer elementos – para se trazer à tona as formas pelas quais certos denominadores comuns permitiriam “reconhecer as notas dominantes duma fase” particular, de algum momento decisivo de saturação e transformação das expressões particulares de continuidade literária, senão mesmo de tradições culturais propriamente ditas. Trata-se, em suma, de reconstituir sentido pleno das palavras dentro de um quadro de referências mais ou menos preciso, no qual estas mesmas palavras assumem um papel fundamental de socialização e decantação de experiências culturais mais ou menos delimitadas. São questões dessa natureza que inspiraram a composição do presente trabalho.

Em outros termos: é possível admitir que aspectos significativos do pensamento e da obra de Sérgio Buarque se relacionam com um conjunto de outros tantos autores e obras que se encontram ligados por um referencial temático e uma linguagem “comuns”? Como as raízes de ideias centrais ao repertório sergiano refletem uma experiência particular de socialização da cultura de determinada geração, grupo, corrente de pensamento, enfim, de determinado momento ou fase da história social e literária do nosso país?

Apresentar o desenvolvimento desta hipótese de trabalho de forma minimamente satisfatória requer que se explicite, ainda que tentativamente, como uma primeira aproximação, de que maneiras essa inspiração “atua” e “ordena” o alcance crítico e os sentidos que se insinuam nestas hipóteses de trabalho. Nesse sentido, gostaria de compartilhar aqui algumas ideias que têm me acompanhado – ou, talvez me assombrado – nas últimas décadas, e que dizem respeito às conexões entre militância como crítico literário – embora não apenas literário – de Sérgio Buarque de Holanda no modernismo nos anos 1920 e a redação de seu ensaio Raízes do Brasil. Particularmente, no texto de sua primeira edição de 1936.

Ou seja, esboçar o modo como algumas experiências modernistas do jovem Sérgio Buarque de Holanda se manifestam na estrutura de seu famoso ensaio, no intuito de explicitar as conexões da visão da sociedade brasileira ali inscrita com inquietações originadas em temáticas/técnicas do modernismo brasileiro. A esse exercício serão dedicadas as páginas a seguir.

Com tradições & contradições: Raízes do Brasil sob lentes modernistas

Raízes do Brasil é um livro que, não obstante sua discrição e brevidade, inspira fortes reações aos seus leitores: um “clássico de nascença”, um “clássico por amadurecimento” ou simplesmente um “clássico denso e desafiador” (CANDIDO, 1969, p. XII; FELDMAN, 2013, p. 137; EUGENIO, 2011, p.69). Ou que sugere deslizamentos políticos e ideológicos que vão de “radical”, “democrata”, a “liberal-conservador” ou simplesmente “conservador”.4 Sem exceção, tais qualificações se encontram mais ou menos fundamentadas no próprio corpo do texto, bem como nas flutuações do espírito do contexto de escrita e decodificação – e de outras, não poucas, reelaborações e releituras – da obra.

Tanto é verdade que, em anos recentes, a elaboração de uma edição crítica de Raízes do Brasil veio a atender às necessidades de explicitação e de avaliação crítica das alterações sofridas pelo ensaio em suas sucessivas revisões, ampliações, supressões e reedições. Da perspectiva que nos interessa aqui, as alterações textuais identificáveis em diferentes edições do ensaio seriam suficientes para instaurar uma mudança radical no conteúdo do argumento de Raízes do Brasil, como sugerem alguns intérpretes? Talvez, sim; talvez não. E, de novo, tais juízos desencontrados podem encontrar embasamento no próprio texto do ensaio. Tendo, pessoalmente, a enxergar um sentido de permanência que se vislumbra no eixo estruturante do raciocínio buarquiano. Permanência que, a despeito da incidência de transfigurações de maior ou menor profundidade, se faz ecoar ao longo da lenta e contínua maturação do ensaio. Penso, aqui, menos nas reiteradas retificações no texto durante três décadas, do que nos dez anos que separam a debanda do jovem crítico das fileiras modernistas do aparecimento de seu livro de estreia em 1936. Um período decisivo marcado pela disposição do jovem Sérgio de “romper com todas as diplomacias nocivas” e “suprimir as políticas literárias” em nome da afirmação de “uma expressão artística [nacional] livre de compromissos” mesquinhos, intrinsecamente fiel ao “nosso natural inquieto e desordenado” (HOLANDA, 1926 e 1936).

Uma das hipóteses que guiam o presente trabalho se assenta na sugestão de que as tensões e ambiguidades do próprio corpo textual de Raízes do Brasil em grande medida são tributários das tradições e contradições do ideário e da experiência, do convívio social e da sociabilidade artística e literária do modernismo dos anos 1920. Penso mesmo em uma secretasenão mesmo discretafidelidade aos compromissos estéticos e aos valores modernistas presentes no modo como as tensões e ambiguidades do próprio modernismo animam, tanto do ponto de vista histórico e estético, quanto da lógica arquitetônica da construção do argumento proposto no corpo textual de Raízes do Brasil. Em termos diretos, tal fato significa trabalhar com a hipótese de que o modernismo brasileiro constitui “um campo vasto e heterogêneo, mas estruturado”, no qual poderemos encontrar tanto a origem das preocupações de Sérgio Buarque como a matéria das ideias por ele plasmadas na composição original de sua interpretação do Brasil (SCHWARZ, 1977, p. 24).

A ênfase da análise concentra sua atenção na forma como Sérgio Buarque traz para dentro do texto muitos dos impasses presentes no calor dos debates em curso desde a primeira hora da aventura modernista. Devidamente retidos pelo trabalho da escrita, tais elementos projetam-se como ambiguidades e contradições na trama significativa do ensaio, sugerindo indicações e pistas a respeito de outras interpretações igualmente plausíveis no curso de sua leitura. Tomando a estrutura da obra como ponto de referência, a compreensão da integridade do texto passa pelo entendimento dos mecanismos que captam as articulações entre texto e contexto, fundindo-os dialética e materialmente na interpretação (CANDIDO, 1965, p. 3-17).

Na perspectiva aqui adotada, a apreensão de muitas das ambiguidades presentes em Raízes do Brasil não pode prescindir do rastreamento de “um conjunto de princípios que correspondem a um sistema mais ou menos coerente de ideias e noções consagradas e familiares à primeira geração modernista”, que não raro pareciam assumir “colorações dogmáticas” e inflexíveis, “contra as quais Sérgio Buarque procura se posicionar” (CASTRO, 2002, p. 124). Outro modo para apreender tais ambiguidades – mais sociológico, mas distinto do adotado aqui – é encontrado em Moraes & Jackson, que, na linha de Bourdieu, enxergam nas ambiguidades de Raízes do Brasil as objetivações da “ambivalência da origem social e geográfica” de Buarque de Holanda, da sua filiação remota às frações decadentes das “oligarquias do açúcar de Pernambuco e Alagoas” e das estratégias de “reconversão social” e de “recuperação possível da posição social de seus antepassados”. Ou seja, vinculando-as às experiências estruturadas e estruturantes “relativamente comu[ns] para jovens egressos de famílias que experimentaram forte declínio econômico e social” (MORAES & JACKSON, 2021, p. 343 e 332). Aqui, entretanto, enfatiza-se a análise das ambiguidades gravadas no texto buarquiano para situar o lugar real de suas estratégias discursivas e a especificidade da posição de Raízes do Brasil no processo literário do modernismo.

A tarefa que cabe à crítica, portanto, é a de averiguar de que forma as tensões modernistas se objetivam no corpo desse ensaio. As mediações necessárias para tal operação crítica devem, prioritariamente, ser buscadas em uma leitura imanente ao ensaio, não sendo algo que seja acrescentado ao seu texto ou às ideias a ele aproximadas – embora, às vezes, estas possam vir a ser chamadas ao auxílio do andamento da análise.Em particular, naquilo que permite situar o texto buarquiano nas correntes de intensa pesquisa e experimentação que imprimiram o sentido mais íntimo de modernidade à problematização das formas de vida promovida pela literatura modernista (LAFETÁ, 1974, p. 11-23).

O fato de “constituirmos o único esforço bem-sucedido, e em larga escala, de transplantação da cultura europeia”, como se lê na abertura da edição de 1936, se transformar, duas décadas mais tarde, em simples “tentativa de implantação”, em condições “se não adversas, largamente estranhas à sua tradição milenar”, instauraria de fato uma flagrante divergência entre ser, simultaneamente, bem-sucedido e “definitivamente estrangeiro às condições tropicais”, como propõem algumas leituras? Aplainadas ou suavizadas tais eventuais divergências textuais, as tensões delas derivadas teriam alguma relação com as tensões, divergências e ambiguidades peculiares à experiência histórica e cultural do modernismo brasileiro? Que consequências ou implicações extrair destas interpretações?

Para tentar responder às perguntas acima, lançarei mão do conceito de estilo de pensamento, o qual, segundo o cânone da sociologia do conhecimento, se constitui a partir da identificação de um princípio formal estruturador não apenas do padrão de comportamento manifesto dos indivíduos, mas também de modos característicos de conceber o mundo, que se desenvolvem e se diferenciam no interior de processos sociais concretos por meio dos quais se explicitam maneiras diversas de participação nas lutas e conflitos de uma época: “é contra esse pano de fundo que a contribuição especial de cada indivíduo aparece e adquire significado” (MANNHEIM, 1953, p. 76).

É possível ensaiar uma caracterização do estilo de pensamento modernista a partir das linhas de força da estilização formal da realidade próprias aos procedimentos e técnicas de representação típicos do modernismo (MERQUIOR, 1974, p. 77-102). Estes, segundo José Guilherme Merquior, não podem deixar de reter as marcas do experimentalismo e da irreverência crítica, do espírito de paródia e da visão grotesca da vida, da apropriação inventiva de práticas cosmopolitas, aliadas à disposição para rupturas culturais locais. Outra maneira de organizar o “campo vasto e heterogêneo, não obstante estruturado”, do horizonte expressivo do modernismo é compreendê-lo, acompanhando Affonso Romano de Sant’anna, como uma resultante de “pelo menos três tipos de linguagem que constituirão o solo inicial do movimento: a linguagem da mimese, a paráfrase e a paródia” (SANT’ANNA, 1975, p. 55-68).

De modo parcial e esquemático, para os propósitos dessa apreciação, retenha-se que, para Sant’anna, as linguagens da mimese e da paráfrase têm um núcleo especular comum, diferenciando-se pelo fato de a primeira ter como suporte a oralidade ou a coloquialidade, buscando estabelecer a continuidade entre expressão literária e modos de vida assim como de fala populares ou nacionais, e a segunda traduzir a continuidade expressiva de textos anteriormente escritos e sua atualização, “com pequenas alterações de superfície”, pela “reafirmação, em palavras diferentes, do mesmo sentido de uma obra”, reduplicando um exercício de reprodução ideológica da realidade (SANT’ANNA, 1975 e 1995). Já a linguagem da paródia insinua “uma ruptura”, “um corte com os modelos anteriores”, operando “uma inversão e um deslocamento”, de sorte a retomar outros textos, “mas de maneira assimétrica e invertida, denunciando a ideologia aí subjacente”. Ou seja, “por sua natureza irônica”, “não é um endosso”, é uma apropriação crítica da linguagem parodiada (SANT’ANNA, 1975, p. 59).

Vejamos, então, um dentre tantos outros exemplos de como estas balizas encontram-se plasmadas em passagens textuais da primeira edição de Raízes do Brasil. Logo no parágrafo de abertura, lemos:

Todo estudo compreensivo da sociedade brasileira há de destacar o fato verdadeiramente fundamental de constituirmos o único esforço bem-sucedido, e em larga escala, de transplantação da cultura europeia para uma zona de clima tropical e subtropical. Sobre território que, povoado com a mesma densidade da Bélgica, chegaria a comportar um número de habitantes igual ao da população atual do globo, vivemos uma experiência sem símile. Trazendo de países distantes nossas formas de vida, nossas instituições e nossa visão de mundo, e timbrando em manter tudo isso em ambiente muitas vezes desfavorável e hostil, somos ainda uns desterrados em nossa terra

(HOLANDA, 1936, p. 3).

Para olhos atentos, a menção à Bélgica e sua densidade demográfica parecerá estranha e fora do lugar. No mínimo, uma referência destoante. Há mesmo quem enxergue aqui uma curiosa paráfrase do texto de Por que me ufano do meu país (ROCHA, 2008, p. 247). Mas qual o sentido de trazer à frente do texto semelhante referente ausente, essa reduplicação ideológica de antigos ufanismos? Questão ainda mais pertinente pelo fato de anteceder o famoso juízo de sermos “ainda uns desterrados em nossa terra”, apesar do bem-sucedido esforço de transplantação da cultura europeia para um “extenso território, dotado de condições naturais, se não adversas, largamente estranhas à sua tradição milenar”, como lemos em edições mais recentes.

Todavia, o assombro quanto ao excêntrico referente belga pode receber outra iluminação. Por exemplo, caso se atente que mais do que paráfrase (ou reafirmação) do texto do Conde Afonso Celso, a passagem refere-se à estilização parodística de um trecho de Evolução do povo brasileiro, de Oliveira Vianna. Justamente um trecho em que Oliveira Vianna discorre sobre a “incoercível” força diferenciadora da “ação das particularidades locais do solo” face às tendências da “ação das correntes de civilização”, essencialmente “niveladoras” e “uniformizadoras” (VIANNA, 1938 [1922], p. 48 e ss.). A partir do exemplo belga, Oliveira Vianna procurava mostrar o “funesto (...) preconceito da absoluta semelhança entre nós e os outros povos civilizados”, que nos condenava, “há cerca de cem anos”, a uma sucessão de “decepções dolorosas e fracassos desconcertantes”. O confronto dos perfis demográficos da Bélgica e do Brasil, os respectivos modos de distribuição populacional ao longo do território, era tomado como índice da ilusória identidade que muitos pressupõem “existir entre nós e outros povos civilizados”, entre nosso povo e as instituições e/ou inclinações democráticas:

Nem seria possível admitir que sejam idênticas as condições orgânicas de dois povos, um dos quais, a Bélgica, por exemplo, concentra em cada quilômetro quadrado de território uma massa formigante de mais de 200 indivíduos, e outro que, em cada quilômetro quadrado, não consegue senão distribuir escassamente 4 indivíduos. Ora, todos nós sabemos que a densidade da população é um fator poderosamente influente na gênese e no funcionamento das instituições sociais, desde as cooperativas locais de consumo, produção ou crédito até o quadro geral dos poderes públicos

(VIANNA, 1938 [1922], p. 48-9).

Tomando em conta a chave de leitura “parodística”, começa a se esboçar, desde o parágrafo de abertura de Raízes do Brasil, não apenas a questão do desterro, mas também o problema do mal-entendido da democracia – assim como de “muitas invenções fraudulentas da mitologia liberal”, na expressão assertiva presente no texto original do ensaio, mas subtraída a partir da segunda edição. E, também aqui, talvez comece a despontar a temática das “insuficiências do ‘americanismo’”, da “consciência americana” ou do “espírito do lugar”, para falar como D. H. Lawrence, referência crucial no capítulo final, em momento decisivo do argumento de Raízes do Brasil.5

Para uma compreensão mais qualificada do tipo de enquadramento sugerido nessa chave de leitura, seria imprescindível um rápido exame a propósito da sutil alusão aos Studies in Classical American Literature, de Lawrence, nas páginas finais do ensaio buarquiano.6 Aparição surpreendente, ainda mais quando se toma em consideração o fato de que ela é sintomaticamente mobilizada para a caracterização do sentido profundo da “Nossa Revolução”, conforme o algo enigmático título do capítulo de encerramento de Raízes do Brasil. Capítulo que tem suscitado inquietações, mesmo nas mais eruditas e requintadas interpretações, em especial quando mais preocupadas em rastrear as filiações ideológicas e as inclinações políticas do ensaio do que em respeitar o curso do tortuoso raciocínio de Sérgio Buarque, permeado de dúvidas e reticências em seu andamento (MATA, 2016).

Salvo raríssimas exceções, as interpretações correntes não costumam se debruçar na análise da centralidade da presença de Lawrence no travejamento não apenas do capítulo derradeiro, mas também na economia interna dos argumentos do ensaio buarquiano em sua totalidade. Além do trabalho citado na última nota, cabe mencionar os estudos recentes de André Martins, com os quais existem proximidades relativas às questões esboçadas no presente artigo – desenvolvido à margem, antes do conhecimento do trabalho deste jovem pesquisador –, mas que se distinguem quanto à ênfase e ao direcionamento conferindo ao núcleo da análise (MARTINS, 2020 e 2022).

Se nos trabalhos de Martins também se faz presente o esforço de “reconstituição aproximativa” do argumento e do “conteúdo” peculiar assumido pelo “conceito de revolução mobilizado no texto” de Sérgio Buarque, a sua preocupação maior está em reconstituir a especificidade da

intenção política do capítulo final da primeira edição de Raízes do Brasil, (...) para uma melhor compreensão da posição de Sérgio Buarque de Holanda diante do pensamento autoritário dos anos 1930, bem como da inserção de Raízes do Brasil no debate modernista sobre a cultura brasileira

(MARTINS, 2022, p. 1).

Sem descuidar desse último ponto, a ênfase de seu artigo recai principalmente sobre o primeiro aspecto, visto sua intenção de afastar “a impressão de que o autor oferece ao leitor um argumento filiado a variantes consolidadas de pensamento autoritário” (MARTINS, 2022, p. 21).7 Já aqui, no presente trabalho, opera a lógica inversa: não desprezando totalmente as possíveis relações entre as posições adotadas por Sérgio Buarque face às correntes autoritárias das décadas de 1920/30, o foco da análise recai sobre o modo como o estudo da mentalidade ibérica – ou, mais precisamente, da atitude ibérica diante do Novo Mundo – vai tecendo uma trama discursiva que se configura como uma modalidade de interpretação alegórica das diferentes correntes do modernismo ao longo dos anos 1920, flagrando por meio de “uma admirável metodologia dos contrários” (CANDIDO, 1969) toda sorte de heranças que se agitam no vazio, à custa de fantasmagorias, tendentes a “escamotear a nossa liberdade” e nosso “estouvamento de povo moço e sem juízo”, impingindo “germes de atrofia” aos hesitantes passos de uma revolução antes anunciada que propriamente realizada (HOLANDA, 1926).

Um mundo de essências íntimas, irredutível e desdenhoso das invenções humanas

Afinal, de que espécie de revolução falava Sérgio Buarque? Uma revolução inconclusa, decerto, mas em pleno curso. Revolução “longe, talvez, de ter atingido o desenlace final”, não obstante ser aparentemente indiscutível já haver sido “transposta a sua fase aguda” (HOLANDA, 1936, p. 137). Até que ponto essas últimas palavras não poderiam, em 1936, ser dirigidas também ao movimento modernista? Um dos primeiros estudos eruditos sobre esse período da nossa história literária não hesitou em usar a expressão “A Revolução Modernista” como título (BRITO, 1959, p. 431-82). Quase uma década antes, em 1927, Prudente de Moraes Neto, comparsa inseparável de Sérgio Buarque da primeira hora modernista carioca, titubearia em “acreditar que havia uma luta entre dois partidos e que a gente se batia pelo modernismo da mesma maneira que se teria batido, por exemplo, pela abolição” (MORAES NETO, 1927, p. 4). A analogia teria, segundo Prudente, quando muito validade parcial, e na medida em que a vaga modernista fosse associada à campanha “abolicionista ou qualquer outra campanha política ou social”, conjunturas em que “se luta por alguma coisa, por um ideal objetivo qualquer” – no caso, as exigências de renovação das “formas literárias” e da expressividade da linguagem desgastada pelo uso. No entanto, a camaradagem em torno de certos desígnios comuns, alcançados à custa de uma “série de progressos individuais”, só poderia ser tomada como revolucionária diante do “inacreditável atraso intelectual em que vivíamos e a mais ou menos imbecilidade ambiente”, na expressão cortante do jovem modernista. Todavia, concluía, transpostas do plano subjetivo para o plano objetivo e social, tais inclinações deram origens a equívocos e ilusões gerais “a propósito das tendências nacionalistas da literatura moderna”, dos rumos da cultura e das acomodações na sociedade brasileira (MORAES NETO, 1927, p. 4).

Em meados de 1924, momento considerado outro marco do modernismo em vários estudos, há o rompante de Graça Aranha diante do estupefato auditório da Academia Brasileira de Letras a conclamar que o movimento modernista não devia se “limitar unicamente à arte e à literatura”, mas deveria “ser total”, atendendo a “uma ansiada necessidade de transformação filosófica, social e artística” (ARANHA, 1925, p. 44).8 Esse episódio, tido por Mário da Silva Brito como “o equivalente carioca da paulistana Semana de Arte Moderna”, assinala tanto a consolidação de divergentes tendências modernistas quanto o início de desentendimentos públicos que começavam a se acentuar. A própria circunstância do deslocamento das polêmicas entre “modernistas” e “passadistas” para o confronto interno “entre os próprios componentes do grupo inovador” significava uma reconfiguração das perspectivas do debate (BRITO, 1959, p. 464 e 469), dando vazão às discussões em torno do “problema da civilização brasileira”, da construção da moderna consciência da nacionalidade, assinalando os estreitos vínculos entre política e letras, conforme a tese formulada por Tristão de Athayde naquele mesmo ano de 1924, em um importante volume coletivo, revelador de outras facetas da inquietação frente ao moderno (ATHAYDE, 1924).

Os termos propostos por Tristão de Athayde para estabelecer os vínculos entre política e letras podem auxiliar, servindo como ponto de referência, à fixação do ponto de vista de análise aqui proposto.9

Quando os problemas elementares de uma nação ainda se acham em jogo, a arte é um artifício, uma exceção ou um esboço. Essa é a situação de nossas letras até hoje.

(ATHAYDE, 1924, p. 259)

Tendo em mente “o impulso inicial de mimetismo de nossas letras, como de nossas instituições políticas”, Tristão pondera que “os males das instituições transplantadas são análogos aos males das letras importadas”, sendo esses “justamente o dado essencial de nosso problema de civilização e portanto de nosso problema estético” (ATHAYDE, 1924, p. 290).

O cerne da questão estava na “discordância dos tempos de crescimento”, na variedade de ritmos que pautavam tanto a inteligência como o progresso material, as ideias políticas como as obras literárias. A ausência de “um problema nacional que concilie os espíritos”, de “um ideal que equilibre essa variedade de ritmos”, impedia o país de progredir “uniformemente”, de “cria[r] literariamente em cadência”. Estávamos, dizia Tristão, “diante ‘de uma multiplicidade de tempos de crescimento’, que torna o nosso tempo anárquico na aparência”, como a denunciar “o fio fatal da evolução interior”:

Um mundo muito moderno se sobrepõe, ou antes se insere aqui, a um mundo muito passado. (...) Mas tudo se explica – de um lado, pelo individualismo que a propaganda política e as campanhas intelectuais propagaram, e de outro, pela velha lei do dualismo virtual de tendências, que tem acompanhado as nossas letras e, em geral, todas as literaturas americanas

(ATHAYDE, 1924, p. 268).

De modo que o vínculo entre política e letras é compreendido como resultado de um amplo arco temporal de uma nacionalidade que se formara às avessas, de cima para baixo, que começara por onde haveria de terminar. Obra, portanto, de um “oficialismo prolongado”, personificado “nas três figuras de monarcas” – D. João VI, o indeciso; Pedro I, o impetuoso e Pedro II, o sereno. Ao primeiro, coube assentar a transplantação de instituições e de “[m]uito que forma hoje o mecanismo central da nação”; ao seu filho, Pedro I, exercer o papel de “força imediata da Independência”, pressentido o ímpeto dos acontecimentos, sacrificando “uma herança segura a uma aventura incerta”; ao neto, Pedro II, após o interregno da abdicação de Pedro I, vencida “a onda desagregadora, mantida a unidade pelo sentido Imperial dos varões da Regência”, imprimir ao Poder Moderador “uma força moral e uma força de equilíbrio” oportunas diante das disputas parlamentares, conferindo uma “serenidade artificial” ao Império que a República iria desnudar, revelando o seu avesso – um artificialismo social que levara as forças reais do país à inanição –, transmudando-se, finalmente, este oficialismo hipertrofiado num individualismo desenfreado, “que continha, a um tempo, os germens do progresso e da dissolução” (ATHAYDE, 1924, p. 242-44). Idêntica curva acompanha a evolução literária que também teria como eixos o oficialismo, o artificialismo e o individualismo, mais ou menos associados ao americanismo dos tempos coloniais, ao romantismo do período imperial, ao naturalismo do início do período republicano e às tintas regionalistas em tensão com os ímpetos cosmopolitas das primeiras décadas do século XX (ATHAYDE, 1924, p. 259-292).

Caberia notar que o esquema oficialismo-artificialismo-individualismo está de certa forma também presente no fio condutor da análise de Raízes do Brasil, ainda que apareça em uma sequência invertida, como forma de captar a aludida “multiplicidade de tempos de crescimento” de um mundo muito moderno a se sobrepor a um mundo muito passado, conforme as palavras acima citadas de Tristão de Athayde. Em 1936, já nos primeiros capítulos do livro de Sérgio Buarque, o individualismo desponta na caracterização da mentalidade ibérica, não como um fenômeno propriamente moderno, antes como indício de um individualismo pré-renascentista, precipitado pela situação fronteiriça da península ibérica, indecisa entre a Europa e a África. O artificialismo ganha força com a desagregação da herança do passado agrário, com os novos tempos dissolvendo a sociabilidade de uma sociedade de raízes rurais, chegando enfim ao oficialismo imperial que se prolonga como uma espécie de “derivativo cômodo para o horror à realidade”, onde tudo conspirava para a “fabricação de uma realidade artificiosa e livresca, onde nossa vida verdadeira morria de asfixia” (HOLANDA, 1936, p. 125-6), nas primeiras décadas da vida republicana. Chegava-se, assim, na antessala da Nossa Revolução – “A grande revolução brasileira”, resultante indefinida de “um processo demorado”, ainda em curso. Processo que teria seus pontos culminantes na “transmissão da família real portuguesa, a independência política, a Abolição e a República”, compreendidos, em sua longa duração, “como os acidentes diversos de um mesmo sistema orográfico”, que principiara a erodir em 1888, quando deixam “de funcionar os freios tradicionais contra o advento de um novo estado de coisas, que só então se faz inevitável”, constituindo-se no “marco mais visível entre duas épocas” (HOLANDA, 1936, p. 136).

Uma revolução que se manifestava na lenta corrosão de “todo o ciclo das influências ultramarinas específicas de que foram portadores os portugueses”, que começou a ter lugar no exato momento em que “o mundo rural se achou desagregado e começou a ceder rapidamente à invasão impiedosa do mundo das cidades” (Idem, p. 137). Ou seja, quando o choque entre a nova sociabilidade dos centros urbanos e a sociabilidade tradicional dos núcleos agrários repunha, reconfigurando e atualizando o choque do encontro do Velho com o Novo Mundo, uma tópica clássica do modernismo.

No último capítulo de Raízes do Brasil, enfim, a questão do antagonismo entre a “herança ibérica” e o incipiente “americanismo”, que se vai tecendo ao longo de todo o texto do ensaio, formula-se nos seguintes termos:

Se a forma de nossa cultura ainda permanece nitidamente ibérica e lusitana, deve atribuir-se tal fato sobretudo às insuficiências do “americanismo”, que se resume até agora, em grande parte, numa sorte de exacerbamento de manifestações estranhas, de decisões impostas de fora, exteriores à terra. O americano ainda é interiormente inexistente. “Na atividade americana o sangue é quimicamente reduzido pelos nervos”, disse um dos poetas mais singulares e mais lúcidos de nosso tempo.

(HOLANDA, 1936, p. 137)

Não por acaso, nesse momento Sérgio Buarque recorre às lúcidas e singulares sugestões de D. H. Lawrence, citando seus Studies in Classic American Literature. É neste ensaio que o poeta e romancista inglês se propõe a escrutinar o que reputava ser o elo ausente dos novos tempos – o homem americano (LAWRENCE, 2012 [1923], p.8).10 A peculiar apropriação dessas ideias por parte de Sérgio Buarque muito teria a dizer sobre o travejamento lógico, do ponto de vista histórico e estético, do papel que joga a oposição entre as noções de iberismo e americanismo na composição de Raízes do Brasil. Decerto seria extremamente redutora uma análise que privilegiasse apenas o que decorre de uma experiência especificamente literária na estrutura deste ensaio, quando não mesmo implicaria no desdenhar de todo esforço analítico da formação da sociedade brasileira que se inscreve no texto todo. Contudo, parece se tratar de uma chave de análise que tanto não pode ser descartada quanto não pode ser tomada como um ponto de vista exclusivo. Agora, atendo-se ao essencial, bastaria salientar o fato de que muitos dos impasses da “Nossa revolução” se anunciam e se deixam surpreender justamente em função de que este americanismo ainda interiormente inexistente deveria substituir e preencher o vazio deixado pelo “lento cataclismo, cujo sentido parece ser o do aniquilamento das raízes ibéricas de nossa cultura para inauguração de um estilo novo, que crismamos talvez ilusoriamente de americano, porque os seus traços se acentuam com maior rapidez” no Novo Mundo (HOLANDA, 1936, p. 137).

Nesse ponto, Sérgio Buarque parece acompanhar de perto o juízo de Lawrence. Na avaliação deste último, o verdadeiro dia americano ainda não tinha chegado, ou ao menos não havia amanhecido (LAWRENCE, 2012 [1923], p. 20). Aos olhos do autor dos Studies in Classic American Literature, o não reconhecimento dessa verdade singela fazia do homem americano um ser que foge de si mesmo, um escaped slave, escravo de subterrâneas dependências com relação ao seu espectro europeu (Idem, ibidem). Essa é a razão pela qual Lawrence retornava às fontes da velha arte narrativa americana para colher nos antigos clássicos desta literatura um sentimento diferente que os envolve, procurando flagrar a “passagem da velha psique para uma coisa nova, um deslocamento”, promovendo um mergulho em busca desta “qualidade exótica que corresponde ao continente americano e a nenhum lugar outro lugar no mundo”, deste ser mais profundo, ou simplesmente “O espírito do lugar” (LAWRENCE, 2012 [1923], p. 11-21).

Note-se que, já em seu primeiro artigo publicado, Sérgio Buarque se predispunha às sondagens de “todos os fatores que têm contribuído e ainda podem contribuir para a completa emancipação espiritual do Novo Mundo” (HOLANDA, 1920, p. 2). O linguajar e a inspiração ainda eram fortemente tributários do cânone literário forjado pela geração de 1870, tendo à frente Sílvio Romero e José Veríssimo. Havia, contudo, a abertura para o pensamento crítico hispano-americano, com suas notas dissonantes de um outro modernismo, cujo ímpeto renovador remonta à reação idealista e sentimental contra “os excessos do romantismo” e de outras tantas “limitações impostas pela retórica tradicional”, convertidos em clichês pela repetição das banalidades naturalistas e dos lugares comuns parnasianos (GARCÍA CALDERÓN, 1910, p. XIII; HENRÍQUEZ UREÑA, 1954, p. 12-14).

Neste seu artigo de estreia, na esteira das Ideas e impresiones do escritor peruano Francisco García Calderón, o jovem Sérgio está no encalço da “Originalidade literária”, pensada e imaginada como a criação de um “americanismo literário”, nascido da assimilação de “todas as novidades, e da diversidade das imitações” que cedo daria lugar a uma produção cultural autônoma, inspirando-se pela obediência à “influência da terra” e pela “submissão às vozes profundas da raça”. Tais palavras de García Calderón são praticamente parafraseadas no desfecho do artigo de estreia de Sérgio Buarque.11 Ao seu modo, Sérgio Buarque acolhia o diagnóstico do ensaísta peruano, segundo o qual “depois da fervorosa idade das imitações, surgirá a produção autônoma” (GARCÍA CALDERÓN, 1979 [113], p. 301).

Contudo, amadurecido pelas escaramuças modernistas, na segunda metade da década de 1920, o crítico e militante modernista Buarque de Holanda acabaria por se convencer de que este tipo de “produção autônoma” apenas seria atingida ao se “transpor integralmente para o plano da criação artística o nosso estilo nacional, o nosso sistema de duração, sem esquecer que os claros e sombras devem merecer os mesmos direitos” (HOLANDA, 1925, p. 5). De variadas formas, se viu inclinado a “imaginar de mil jeitos a nova síntese por ora imprevisível (...) entre esses dois elementos que hoje já começam a nos aparecer antagônicos: de um lado, a herança da cultura europeia ainda tão acentuada e, do outro, esse ‘espírito da terra’ que os mais aptos ainda não principiaram a compreender” (HOLANDA, 1988 [1927], p 89-92).

Tais passagens, cada qual ao seu modo, trazem elementos interessantes para ajudar a situar alguns debates modernistas subjacentes às teses do ensaio buarquiano. Em primeiro lugar, temos as manifestações iniciais da maturação de um projeto de elaboração de uma Teoria da América, imaginada desde início dos anos 1920, conforme relembraria Sérgio Buarque, no trigésimo aniversário da Semana de Arte Moderna, ao falar da incumbência de escrever sobre os aspectos filosóficos e sociológicos do pensamento de Graça Aranha para aquele que seria o número final de Klaxon (CASTRO, 2014, p. 427-456).

Em segundo lugar, é precisamente o desejo de transposição integral de um sistema de duração peculiar a serviço da criação de um tipo próprio de cultura ou de um estilo nacional que parece prenunciar os desencontros do “único esforço bem-sucedido, e em larga escala, de transplantação” cultural em ambientes senão adversos, largamente estranhos à “tradição milenar” europeia em solo americano. Finalmente, chama a atenção o fato de que o último trecho citado pertence ao artigo “Notas do Espirito Santo”, em que Sérgio Buarque salienta o “poder de iniciativa e de realização”, fazendo “cooperar todas as forças que a riqueza natural do Estado” era capaz de mobilizar para o surgimento de “uma cidade moderna” e “de aspecto confortável”, quase que a realizar “admiravelmente” o “prognóstico que a (...) visão” de Graça Aranha associou à terra da promissão. Isso para não mencionar que aquele trecho traz menção explícita ao “espírito da terra”, ecoando o título do primeiro capítulo dos Estudos sobre a literatura americana, de D. H. Lawrence, ensaio que se inscreveria, anos mais tarde, como já mencionado, em passagem decisiva de Raízes do Brasil.

A propósito, voltando a este ponto – aliás, fundamental à presente discussão: qual o papel desempenhado pelos apontamentos de Lawrence na arquitetura do pensamento buarquiano que se plasmará no seu seminal ensaio de 1936? Dirigindo sua atenção para o estudo da literatura clássica americana, Lawrence buscava sondar as raízes expressivas de uma nova era escondida sob o véu da velha arte narrativa do continente, entrevendo como os velhos representantes da literatura norte-americana guardariam o frescor dos embates com “diferentes eflúvios vitais, diferentes vibrações, diferentes exalações químicas, diferentes polaridades com diferentes estrelas” que confeririam “uma realidade indiscutível” ao “espírito do lugar”. Frescor este que estaria alçando a literatura americana para “uma nova fronteira”:

Os desvarios mais ousados do modernismo ou do futurismo francês por enquanto ainda não alcançaram o timbre de extrema consciência atingido por Poe, Melville, Hawthorne e Whitman. Os europeus modernos estão todos tentando ser radicais. Os grandes americanos mencionados simplesmente o eram.

(LAWRENCE, 2012 [1923], p. 9)

Daí que a moderna literatura tenha se revelado hostil às suas mensagens: é tão difícil ouvir uma nova voz quanto escutar e compreender uma linguagem desconhecida, que desponta daquilo que chamava o espírito da terra. De modo que, enquanto todos os artistas modernos da Europa batiam-se por ser extremos, aqueles grandes escritores americanos simplesmente o eram. E o eram justamente porque sabiam obedecer ao ritmo dual da atividade artística do lugar para “[i]naugurar uma nova e ampla área de consciência”, despojando-se “da velha consciência” que se transformara “numa prisão muito apertada” condenada e condenando ao apodrecimento (LAWRENCE, 2012 [1923], p. 9). Ou seja, de acordo com Lawrence,

Até aqui tivemos apenas a falsa aurora. Quer dizer, na consciência americana progressista um único desejo predominou: o de acabar com o que é velho. O de acabar com os senhores, o de exaltar o desejo do povo. Mas se o desejo do povo não passa de farol, a exaltação não serve para grande coisa. Portanto, em nome do desejo do povo, livre- se dos senhores. E depois que estiver livre dos senhores, tem de enfrentar essa conversa fiada do desejo do povo. Nesse momento você faz uma pausa e reflete, e tenta recuperar sua própria integridade. (...) Até o momento a consciência americana não foi mais que uma falsa aurora. O ideal negativo da democracia. Mas por baixo, e em oposição a esse ideal explícito, surgem os primeiros indícios e revelações DELA. DELA, a íntegra alma americana

(LAWRENCE, 2012 [1923] p. 20-1).

Também aqui no Brasil, os primeiros indícios e revelações desse “momento da lição americana” – dessas achegas à recuperação da própria integridade americana12 – encontrava seus ecos em diferentes correntes literárias e contraditórias tendências modernistas, as quais, na avaliação do crítico Tristão de Athayde, “foram reunindo em torno de si os espíritos mais inclinados a este ou àquele ponto de vista” (ATHAYDE, 1928, p. 12). Grosso modo, tais tendências, segundo o mesmo Tristão de Athayde, aglutinavam os adeptos da estética do “dinamismo”, que seguiam “mais ou menos o programa sedutor do sr. Graça Aranha”, e, “de outro lado”, abarcados sob o rótulo impreciso de “primitivistas”, a trupe do “movimento de São Paulo, hoje [1926] repercutindo no Rio e em Minas”, reunindo elementos díspares, cada um dos quais “irredutível aos demais, como espíritos extremamente originais e independentes que são” (ATHAYDE, 1929 [1926], p. 19).13 Embora reconhecesse a marca da originalidade e da “probabilidade de produzir obras novas e valiosas” em ambas as correntes, Tristão de Athayde não deixava de identificá-las como parciais e incompletas, “partes tomadas pelo todo”, em suas respectivas especificidades.

De um lado, os Dinamistas, com seus propósitos de “estilização violenta e livre” do meio americano, sacudindo “o mistério verde das florestas” e de todos os “terrores” cósmicos para que se pudesse “refletir o colorido violento dos trópicos”, rompendo com toda sorte de subordinação às “tradições ancestrais” e “com o passado” informe, para a afirmação triunfante do progresso, do futuro, da libertação absoluta do indivíduo radicalmente transformado pela civilização da máquina. Segundo Tristão, o programa dinamista teria encontrado sua expressão criadora nos poemas de Ronald de Carvalho de Toda América (1926). Poemas, aliás, que versificavam os vaticínios do capítulo final apensado à terceira edição revista e aumentada da Pequena história da literatura brasileira, em 1925. Nesse novo capítulo, Ronald de Carvalho vai aclamar a chegada do momento de substituição da “lição europeia” pela “lição americana” (CARVALHO, 1925, p. 415). Em termos, ademais, que parecem glosar os ensinamentos de Graça Aranha em A Esthetica da Vida (1919) e no Espírito Moderno (1925), quase que sumarizados ou parafraseados pela cristalina prosa do poeta de Luz gloriosa:

Vencer a natureza pela disciplina da inteligência, eis a primeira lei que a realidade brasileira impõe ao homem moderno. (...) O homem moderno do Brasil deve, para criar uma literatura própria, evitar toda espécie de preconceitos. Ele tem diante dos olhos um grande mundo virgem, cheio de promessas excitantes. Organizar esse material, dar-lhe estabilidade, reduzi-lo a sua verdadeira expressão humana, deve ser a sua preocupação fundamental. Uma arte direta, pura, enraizada profundamente na estrutura nacional, uma arte que fixe todo o nosso tumulto de povo em gestação, eis o que deve procurar o homem moderno do Brasil. Para isso, é mister que ele estude não somente os problemas brasileiros, mas o grande problema americano. O erro primordial das nossas elites, até agora, foi aplicar ao Brasil, artificialmente, a lição europeia. Estamos no momento da lição americana. Chegamos afinal, ao nosso momento.

(CARVALHO, 1925, p. 409 e 415)

Nada poderia ser mais distante dos ideais sustentados pelos chamados “Primitivistas” do que semelhante intenção deliberada em fixar o nosso tumulto de povo em gestação, organizar esse material virgem segundo o dinamismo de disciplinas eivadas de preconceitos civilizados e promessas civilizatórias. Situados no lado oposto, estes outros lados primitivistas se batiam pelo abandono geral das “pretensões ridículas”, de “academias ou de progresso”, de “arte universal ou imitações futuristas”, as quais pouco ou nada teriam a nos ensinar a não ser “a confissão de sua própria falência”:

Nada disso, dizem eles. O brasileiro tem sofrido de “talento”. É a inteligência que o tem escravizado à velha carcaça europeia. O brasileiro não é independente porque não se resigna a começar do princípio. Se vive dos outros é que quis partir de onde os outros acabam. Quando deve refazer por si todo o trabalho que os outros fizeram. Começar por onde eles começaram. E para isso o que lhe falta é a coragem de aniquilar-se. A coragem de sacudir de si todo o aprendizado, todo o acumulado, todo o intencional. De deixar de ser inteligente. De descivilizar-se.

(ATHAYDE, 1929 [1926], p. 21)14

De forma que, segundo Tristão de Athayde, os trabalhos essenciais para realização de obras nacionais, enraizadas nas experiências socioculturais nativas, demandaria uma ida ao povo, a aproximação com as massas inconscientes, um apelo à “contribuição milionária de todos os erros” e à “[a]legria dos que não sabem e descobrem”, como escrevera Oswald de Andrade em seu Manifesto da Poesia Pau-Brasil.

Embora reconheça a irredutibilidade entre os dois pontos de vista categoricamente opostos, o autor dos rodapés literários de O Jornal manifestava-se descrente a respeito da longevidade de tais tendências antagônicas, antevendo certa artificialidade no modo como demarcavam suas diferenças: “Nem a nossa salvação está na civilização, nem é exato que toda civilização faliu”, ponderava Tristão, vendo em semelhantes gestos apodíticos “simples desespero de momento” ou “negações” provocadas “pelo sofrimento excessivo” (ATHAYDE, 1929 [1926], p. 22).

A adesão intransigente aos preceitos dinamistas redundaria em uma concepção demasiado “materialista da civilização”, um retrocesso ingênuo ao racionalismo estéril – em outras palavras, seria insistir “no naturalismo mais ou menos disfarçado”, falseando “todo o nosso caráter” e “[r]ecalcando sentimentos naturais de nossa alma”. Em suma, seria artificializar, “mais uma vez, a nossa arte, pela supressão de suas raízes e pela inserção de caracteres estranhos”, precipitando e falseando, portanto, “a nossa formação”. Por outro lado, a opção deliberada pelo primitivismo representaria um retorno “a um ponto de partida ilusório e falso”, seria propor a realização de uma “literatura apenas às avessas”, disseminado “um escárnio infecundo, um pessimismo inútil e meramente destruidor”. Tanto uma como a outra perspectiva, tomadas em suas singularidades, “nos levariam a uma arte apenas dos sentidos exteriores”, em nada distinta do parnasianismo ou do naturalismo. O crítico se revelava cético quanto à viabilidade de que essas duas orientações pudessem “prosseguir vitoriosamente em sua pureza”. Todavia, semelhante juízo não impedia Tristão de Athayde de assentir que toda arte nacional “realmente nova e sinceramente criadora não” teria como “deixar de lado nenhum desses dois elementos essenciais de nossa formação incompleta” (Idem, p. 22-23).

O que me parece, apenas, é que mesmo aceitando os dois elementos parciais, mesmo fundindo-os, não se terá chegado a um estado de espírito criador e expressivo. Falta a meu ver uma terceira condição fundamental de nossa arte. O elemento espiritual. Uma mística criadora. Só ela poderá fundir realmente esses dois elementos de nossa realidade. (...) A mística, que poderá dar à nossa arte moderna um valor de espírito que o puro dinamismo quantitativo não poderá trazer-lhe, e uma seriedade que sempre faltará aos artifícios do primitivo, do terra a terra, do simplesmente popular... (Idem, p. 23).

Ora, é justamente a discussão a respeito do caráter desse elemento espiritual, da natureza desse estado de espírito criador e expressivo que comanda toda a polêmica estabelecida a partir de meados da década de 1920 entre Tristão de Athayde e o grupo “primitivista” paulista, dentro do qual o crítico carioca também incluía o jovem Sérgio Buarque. Enquanto o primeiro tomava partido do ser – da estabilidade e permanência “clássicas” do mergulho consciente no Ser –, os segundos optavam pela instabilidade do vir a ser, da imersão moderna no efêmero e no inconsciente. Tristão, portanto, opunha ao apelo dissolvente do que lhe parecia “uma literatura suicida”, manifestação de “uma pura expressão do inconsciente”, espécie de neo-romantismo “profundo do nosso subconsciente, do romantismo das forças de dissolução, de anarquia e hesitação” por ele designada de “supra-realismo”, a via da renovada espiritualidade por uma improvável “ida ao clássico”. Afinal, segundo Tristão, “ir ao clássico é renunciar à desordem”, uma reação à renúncia da inteligência e aos perigos de que o instinto a tudo se apodere (ATHAYDE, 1966 [1925], p. 902-26).

As tensões entre instinto e inteligência também atravessam toda a discussão de D. H. Lawrence em seus Studies in Classic American Literature. No entanto, em Lawrence não há espaço para a pacificação do espírito criador, nem para conciliações espúrias. Aliás, é da tensão com a realidade vivida que tal elemento espiritual extrai seu potencial criador, uma vez que nada do que é vivo se exprime impunemente em palavras. Esse parece ser o fundamento das especulações a respeito do “espírito do lugar”, em particular do “espírito do lugar” do continente americano, onde a tensão entre o europeu e o nativo parecem estruturar todo o imaginário da ocupação e da conquista. Para Lawrence, há também uma irredutibilidade entre o espírito do europeu (white man) e o do nativo (red man), senão mesmo uma incompatibilidade entre eles, como se observa em suas análises dos romances de Crèvecoeur e de Fenimore Cooper. Nesse último autor, em particular, ainda que sob uma aura mítica, vislumbra-se não a possibilidade de fusão física entre o europeu e o americano, mas de uma modificação mística, na qual um venha a deixar de ser “o oposto e o negativo do espírito” do outro.

Daí, em Fenimore Cooper, a nota da vibração do ritmo dual de toda atividade artística americana, tensionada pela “desintegração e descarte da velha consciência” e a “formação de uma nova consciência por debaixo da anterior”. Mas ainda há muito de evasão da realidade nesta solução mítica, pois ela é apenas “a realização de um desejo”. É um mito que antes se volta “à aventura progressiva da alma integral” idealizada, que “não se ocupa dos produtos da desintegração”, razão pela qual Lawrence se ocupou em acompanhar o processo da literatura clássica americana, num arco que vai da desumana esterilidade do utilitarismo de Benjamin Franklin, com seu “primeiro simulacro de americano”, passando pela dilaceração aterradora do espírito puritano e sua inocência perdida em Hawthorne, pelo fanatismo da caçada maníaca de Moby Dick, com a qual Melville simbolizou a condenação e o suicídio da natureza mais profunda e vital – ou sanguínea, na linguagem de Lawrence – da consciência mental branca europeia na América, até chegar à “mensagem essencial” de Whitman, trazendo a “estrada aberta” para a imaginação americana “deixar a alma livre, abandonada a si mesma”, entregando “seu destino a ela mesma e aos acasos da grande estrada” (LAWRENCE, 2012 [1923], passim). Percorrendo tal itinerário, Lawrence procura observar de perto os impasses, as tensões e as hesitações da gestação de uma nova consciência americana, livre das amarras europeias e de seu peso morto. Porém, advertiria o mesmo Lawrence, “as coisas velhas precisam morrer e se desintegrar, porque a velha psique branca precisa ser gradualmente destruída para que toda e qualquer outra coisa possa acontecer”:

Uma coisa curiosa quanto ao Espírito do Lugar é o fato de que nenhum lugar exerce toda a sua influência sobre o recém-chegado enquanto o velho morador não estiver morto ou absorvido. É o que se passa na América

(LAWRENCE, 2012 [1923], p. 95 e 56).

Talvez seja esta a razão da sutil e discreta ascendência das ideias do poeta e romancista sobre o pensamento do jovem Sérgio Buarque. Afinal, não se trata, pois, da simples falência da civilização, mas do modo como seu desenvolvimento no Novo Mundo agiu no sentido de aniquilar, assimilar precariamente ou absorver o espírito nativo, tanto quanto no de desfibrar o espírito europeu. É este o ponto de apoio para a sutil distinção sugerida por Lawrence entre a verdadeira arte discursiva americana e a miserabilidade mentirosa do artista. Apontar as contradições entre o desejo do artista e a solução formal de obras que contrariam um caminho predeterminado seria a função primordial da crítica, cuja finalidade última, segundo Lawrence, é salvar a obra da personalidade tirânica de quem a criou. Em poucas palavras, a verdade artística se esconde no que as formas e seus respectivos conteúdos depõem ou explicitam sobre a intenção vaidosa e atitude dissimulada de seus artífices, revelando, a contrapelo, as verdades, potencialidades e demissões de uma época.

As emulações do espírito da terra, do “daimon, ou demônio, da América”, na avaliação de Lawrence, permanecem latentes enquanto o peso silenciado e silencioso da resiliência dos “peles-vermelhas” (Red Indian) não se voltasse sobre os espíritos dos recém-chegados à América:

No momento em que os últimos núcleos de vida vermelha desaparecerem da América, os homens brancos serão obrigados a enfrentar o demônio do continente em toda a sua grandeza. No momento o demônio do lugar e os fantasmas não apaziguados dos índios mortos agem no fundo do inconsciente ou na alma subconsciente do americano branco, provocando o grande mau humor americano, a agitação frenética – à maneira de Orestes – que domina a alma ianque, o mal-estar íntimo que às vezes atinge as raias da loucura. (...) Por enquanto o espírito oculto da América atingiu o americano, a alma americana, de forma dissimulada. Mas no decorrer da geração atual é previsível que os peles-vermelhas remanescentes submerjam no grande pântano branco. Então o Daimon da América passará a agir abertamente, e veremos mudanças consideráveis

(LAWRENCE, 2012 [1923], p. 56-57).

Para quem tenha alguma familiaridade com o texto de Raízes do Brasil, não é difícil reconhecer ecos dessa passagem nas enigmáticas palavras finais do ensaio buarquiano, onde a presença de “um demônio pérfido e pretensioso”, que se ocuparia “em obscurecer aos nossos olhos” algumas “verdades singelas”, inspirando os homens a se verem “diversos do que são” e incutindo-lhes “novas preferências e repugnâncias”, desdenhosas de “nosso próprio ritmo espontâneo”:

Poderemos ensaiar a organização de nossa desordem segundo esquemas sábios e de virtude provada, mas há de restar um mundo de essências mais íntimas que, esse, permanecerá sempre intacto, irredutível e desdenhoso das invenções humanas. Querer ignorar esse mundo será renunciar ao nosso próprio ritmo espontâneo, à lei do fluxo e do refluxo, por um compasso mecânico e uma harmonia falsa. (...) Há uma única economia possível e superior aos nossos cálculos para compor um todo perfeito de partes tão antagônicas. O espírito não é uma força normativa, salvo onde pode servir à vida social e onde lhe corresponde. As formas exteriores da sociedade devem ser como um contorno congênito a ela e dela inseparável: emergem continuamente das suas necessidades específicas e jamais das escolhas caprichosas. Há, porém, um demônio pérfido e pretensioso, que se ocupa em obscurecer aos nossos olhos estas verdades singelas. Inspirados por ele, os homens se veem diversos do que são e criam novas preferências e repugnâncias. É raro que sejam das boas

(HOLANDA, 1936, p. 161).

Dessa perspectiva, as noções de desterro, americanismo e democracia vão aparecendo ao serem tecidas como vetores do tratamento e da problematização do tema central da dinâmica sociocultural do Novo Mundo: o choque da civilização europeia com a rústica realidade americana. Daí que, retomando o fio do argumento, na página de abertura do ensaio pode-se ler em seu segundo parágrafo o enunciado jocoso, meio desconfiado, com que Sérgio Buarque prepara a armadilha contra o triunfalismo ufanista imperante nos anos heroicos do modernismo, ao indagar “até que ponto poderemos alimentar no nosso ambiente um tipo próprio de cultura”, sem antes investigar “até onde representamos nele as formas de vida, as instituições e a visão do mundo de que somos herdeiros e de que nos orgulhamos” (HOLANDA, 1936, p. 3).

É preciso reconhecer o tom irônico dessas palavras, ao menos considerá-las muito dúbias, apenas definíveis após a identificação do que seria tal herança, seus agentes e suas consequências. E para a realização dessas tarefas que se dedica a sequência dos capítulos do livro, com os quatro primeiros condensando um mergulho histórico no passado colonial, o quinto trazendo a síntese da herança rural de quatro séculos de latifúndio, cabendo aos dois últimos acompanhar o anúncio dos “novos tempos” e os balbucios da “nossa revolução”...

É nessa costura que se alinhavam as tradições e contradições que dão ritmo e pulsação a Raízes do Brasil. A irreverência crítica, temperada pela chave parodística e pela apropriação seletiva de variadas linhagens culturais, parece ser o artifício buarquiano para enquadrar e flagrar os desencontros de inúmeros modernistas em suas próprios atos e palavras, revelando a falácia e o exclusivismo arbitrário de determinados “salvacionismos patrióticos” e “nacionalismos estéticos”.

De modo que os indicadores da intensidade e radicalidade das correntes modernistas estariam reservados àquelas realizações onde, ao invés do exotismo ornamental, do nacionalismo grandiloquente, se gravassem os aspectos e tendências mais salientes da estética subjacente à arte moderna (MERQUIOR, 1974; CANDIDO, 1970). Do ponto de vista dos procedimentos e técnicas formais, isto significa sublinhar as marcas do experimentalismo e da irreverência crítica, do espírito de paródia e da visão grotesca da vida, da apropriação inventiva de práticas culturais cosmopolitas, aliadas à disposição para rupturas culturais locais.

Salvo melhor juízo, a organização textual do ensaio buarquiano parece cumprir tais requisitos. É claro que a hipótese mereceria um desdobramento empírico – materialmente possível – mais detalhado, trazendo outros exemplos. Mas os elementos até aqui trazidos ao debate já permitem sugerir a plausibilidade da leitura aqui esboçada. Todavia, fazem sentido hoje tais debates? Difícil responder que sim, nem menos fácil dizer que não. Primeiro porque se mudaram os índices e as poéticas, a cretinice e o sentimentalismo continuam os mesmos. Segundo porque os golpes na suposta “pureza do nosso aristocratismo espiritual” tornaram-se mais duros, a mão forte das oligarquias e os favores da vida mais dissolventes.

De forma que, talvez, ainda valha a pena retomar um diálogo profundo com a experiência modernista e as reflexões em torno ao campo temático do pensamento social brasileiro para ajudar a pensar de que modo aspectos fundamentais e delicados da experiência histórica brasileira estão contemplados ou não no radar das correntes de pensamento estético e social derivadas do(s) modernismo(s) de 22. Enfim, ainda há espaço para muita pesquisa a respeito das diferentes linguagens e filiações modernistas; de suas tradições e contradições, do modo como estas se inscrevem nos trabalhos de suas figuras mais representativas.

  • 1
    Artigo não publicado em plataforma preprint. Trata-se de uma versão revista e bastante ampliada de comunicação oral apresentada na “Escola São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA) - Modernismo: Disputas em torno do moderno e de projetos de Nação”, realizada no IEB-USP, de 3 a 7 de julho de 2023. O autor agradece à organização da ESPCA e aos pareceres anônimos pela oportunidade de discussão e aprimoramento das ideias propostas. Todas as fontes e bibliografia utilizadas são referenciadas.
  • 3
    Desde os pioneiros artigos de AVELINO (1987) e GUERRA (1989), passando pelo primeiro estudo sistemático sobre Raízes do Brasil escrito por MONTEIRO (1999) – de onde retiramos a designação “uma síntese modernista” – e pelos trabalhos de PRADO (1998), EUGENIO (1999 e 2011), WEGNER (2000) e CARVALHO (2003), entre outros, este tema tem chamado a atenção de pesquisadores, mesmo sem receber ainda uma investigação mais sistemática e exaustiva.
  • 4
    A respeito destes pontos WAIZBORT (2011), ROCHA (2012), SALLUM JR. (2012) e os livros de SOUZA (2015 e 2022).
  • 5
    A discussão deste aspecto será retomada adiante, no momento em que a questão do antagonismo entre a “herança ibérica” e o incipiente “americanismo” irá receber tratamento mais circunstanciado.
  • 6
    A partir daqui se retomam e desenvolvem hipóteses apresentadas em trabalho anterior, no qual pela primeira vez sugeri a relevância da presença de D. H. Lawrence para a estrutura do texto de Raízes do Brasil (CASTRO, 2008, p. 208). Este trabalho recebeu pouca atenção de estudiosos da obra de Sérgio Buarque, quando muito mencionado de passagem, ainda assim menos para discutir os fundamentos da interpretação nele proposta do que para corroborar a tese que lhe é alheia da “penetração de um vitalismo, mais ou menos difuso, mais ou menos arquitetado teoricamente, mais ou menos transparente, (...) flagrante no contexto das primeiras décadas do século, cumprindo ainda o papel de reação, de extração romântica e conservadora, a processos de transformação e modernização social de variada lavra” (WAIZBORT, 2011, p. 57).
  • 7
    Cabe ressaltar que a rigorosa pesquisa de André Jobim Martins mereceria tratamento analítico mais apurado para fazer justiça à qualidade de seu trabalho e para aquilatar adequadamente as diferenças quanto a abordagem de temas correlatos. Diferenças que o próprio Martins admite: “O caminho aqui traçado é tematicamente aparentado (...), mas, como se verá, toca em problemas e diálogos diferentes, especialmente com relação ao estudo de Castro. (...) Seja como for, aqui as questões suscitadas pelos textos serão significativamente diversas, o que quem conheça esses trabalhos perceberá ao longo da presente exposição” (MARTINS, 2020, p. 24).
  • 8
    Paralelamente à manifestação pública da conferência proferida por Graça Aranha no Salão Nobre da ABL, em 19 de junho de 1924, existiram outras confissões privadas, como a de Rubem Borba Morais, escrevendo a Joaquim Inojosa, advertindo-o em carta de 19 de outubro de 1924, que “[a] luta entre o modernismo e o passadismo não é só literária; no meu entender é também política”. (apud MORAES, 1978, p. 76).
  • 9
    Bem como outras sistematizações e caracterizações de Tristão de Athayde a propósito da cena modernista dos anos 1920, que serão evocadas adiante, mesmo que não venham a ser esmiuçadas em toda a potencialidade elucidativa que abrigam, o que exigiria um outro artigo, especialmente a elas dedicado. Ver a este respeito os trabalhos de MONTEIRO (2023) e de MARTINS (2020), p. 120-143.
  • 10
    Cotejamos esta versão com a edição original de 1923. Em alguns trechos alteramos a tradução da edição brasileira.
  • 11
    As passagens de Garcia Calderón foram consultadas em edições mais recentes (CALDERÓN, 1979 [1913], p. 134 e 304). Para a transcrição livre desse trecho pelo jovem Sérgio consultar o artigo original citado acima.
  • 12
    Vale lembrar que o famoso capítulo sobre “O homem cordial” se encerra com uma sugestão quanto ao fato de a “vida íntima do brasileiro” não ser “bastante coesa”, nem disciplinada o suficiente “para envolver e dominar toda a sua personalidade, integrando-a, como peça consciente no conjunto social”, sucumbindo à vacuidade dos “mais rigorosos formalismos” e de toda sorte “de ideias e gestos” que os acompanham. (HOLANDA, 1936, p. 110).
  • 13
    Na versão original, publicada em O Jornal (RJ), em 21/11/1926, o crítico incluiria neste grupo “o sr. Oswald de Andrade, o sr. Sérgio Buarque de Holanda, o sr. Manuel Bandeira, etc.”, acrescentando na versão recolhida em livro o “sr. Antonio Alcantara Machado”. Já na segunda edição, de 1929, o nome de Sérgio Buarque seria suprimido da lista (ATHAYDE, 1929, p. 19).
  • 14
    A menção ao lado oposto e aos outros lados remete ao artigo de Sérgio Buarque originalmente publicado na Revista do Brasil (SP), 15 de outubro de 1926, no qual o jovem Sérgio rompe com antigos aliados modernistas. (HOLANDA, 1996 [1926], p. 224-228. Para uma apreciação cuidadosa deste episódio remeto ao livro de Pedro Meira Monteiro (MONTEIRO, 1999, p. 250-270).

Fontes e Bibliografia

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  • Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 1925.
  • O Jornal, Rio de Janeiro, 1926 e 1927.
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Bibliografia

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  • ATHAYDE, Tristão de. Estudos (1ª Série). 2ª edição. Rio de Janeiro: Terra do Sol, 1929.
  • ATHAYDE, Tristão de. Estudos (2ª Série). Rio de Janeiro: Terra do Sol, 1928.
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Editado por

  • Editores Responsáveis
    Miguel Palmeira e Stella Maris Scatena Franco

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jun 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    07 Maio 2024
  • Aceito
    23 Jan 2025
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