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Celso Furtado, o Golpe de 1964 e a Ditadura Militar

Celso Furtado, the Coup of 1964 and the Military Dictatorship

RESUMO

O artigo discute a interpretação de Celso Furtado sobre o Golpe Civil-militar de 1964 e os reflexos dos governos militares para a sociedade brasileira. Por meio de recursos filológicos, o trabalho analisa um conjunto de textos produzidos entre 1962 e 2004, a partir de três perspectivas: (a) a ruptura política como um desdobramento do subdesenvolvimento; (b) as implicações do processo de globalização e a influência da hegemonia externa na política do Brasil e seus desdobramentos; e (c) os desajustes estruturais entre o Centro-Sul e o Nordeste. Por fim, o artigo insere Furtado como um autor importante para o debate historiográfico relacionado à Ditadura Civil-militar.

PALAVRAS-CHAVE
Pensamento social brasileiro; Ditadura Civil-militar; Celso Furtado

ABSTRACT

This paper addresses the Celso Furtado’s interpretation of the 1964 Brazilian Coup and the effects related to military governments in Brazil. Using philological methods, this study discusses the work of Furtado, written between 1962 and 2004, considering three approaches: (a) the political rupture as an outgrowth of underdevelopment; (b) the effects of the globalization processes and the role of a hegemonic external government for the Brazilian policy; and (c) the structural maladjustments among the Brazilian Center-South and Northeast. At the end, this paper also proposes that Furtado is an important author to be considered for the historiographic debate related to Military Dictatorship.

KEYWORDS
Brazilian social thought; Civil-military Coup; Celso Furtado

As comemorações do centenário de Celso Furtado representam um impulso renovador de estudos sobre suas obras e a atuação política deste intelectual, que contribuiu de forma substantiva para entender e caracterizar o subdesenvolvimento no Brasil. Como um profissional de ação, Furtado acreditava que as políticas de desenvolvimento produzem transformações nas estruturas sociais.

Contudo, em abril de 1964, a sua atuação foi abruptamente interrompida com o seu imediato exílio pós-Golpe Civil-militar - período em que ele inclusive escreveu textos esparsos nos quais analisou essa tomada de poder e os desdobramentos dos governos militares. De fato, embora Furtado não tenha uma obra específica sobre o assunto, suas interpretações aparecem em livros como: Subdesenvolvimento e estagnação na América Latina (1966), no capítulo Da república oligárquica ao estado militar (1967), Um projeto para o Brasil (1968), Análise do ‘modelo’ brasileiro (1972FURTADO, Celso. Análise do ‘modelo’ brasileiro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1972.), A hegemonia dos Estados Unidos e o subdesenvolvimento da América Latina (1973), no capítulo Para o Nordeste: 15 anos perdidos (1979), O Brasil pós-milagre (1981), A fantasia organizada (1985), A fantasia desfeita (1989), Os ares do mundo (1991), Diários intermitentes (2019), Correspondência intelectual (2021), além de entrevistas concedidas. Ademais, os livros A Pré-revolução brasileira (1962) e Dialética do desenvolvimento (1964) também são relevantes neste estudo porque ajudam a situar o contexto social, político e econômico nos anos anteriores ao Golpe, a partir da perspectiva do Furtado.

No contexto da Ditadura, esses escritos representam um testemunho de época e, dada a influência política e intelectual desse autor, têm um significativo valor, justamente por tratar-se de uma personalidade que criou a teoria do subdesenvolvimento, produziu uma grande quantidade de textos em que discutia os problemas do Brasil e atuava como um técnico empenhado em propor políticas públicas de desenvolvimento. Entretanto, a despeito dessa profunda atuação, suas análises políticas sobre o Golpe e a Ditadura são pouco explicitadas em seus textos e, até certo ponto, pouco abordadas pelos comentadores de sua obra, exceção feita talvez por um conjunto de autores como Cepêda (2001CEPÊDA, Vera. O pensamento político de Celso Furtado: desenvolvimento e democracia. In: BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos; REGO, José Marcio (orgs.). A grande esperança em Celso Furtado. São Paulo: Editora 34, 2001., 2015CEPÊDA, Vera Alves. Contextos e funções da democracia no pensamento furtadiano (1944-1964). Perspectivas, São Paulo, v. 46, 2015, p. 155-188.), Boianovsky (2014)BOIANOVSKY, Mauro. A formação política do Brasil segundo Furtado. Revista de Economia Política, v. 34, n. 2, 2014, p. 198-211., Pinto (2014)PINTO, Gustavo L. Henrique. Celso Furtado e o golpe de 1964: entre a fantasia desfeita e a crítica política do exílio. In: IV Congresso Internacional de História Cultura, sociedade e poder, 2014. Disponível em: http://www.congressohistoriajatai.org/anais2014/Link%20(104).pdf. Acesso em: 6 jan. 2021.
http://www.congressohistoriajatai.org/an...
, Bianconi (2016)BIANCONI, Renata. Estagnação latino-americana e estratégia brasileira de desenvolvimento: análises do início do exílio de Celso Furtado. História Econômica & História de Empresas, v. 19, n. 1, 2016, p. 155-188. e Saes (2020)SAES, Alexandre Macchione. Celso Furtado, 100 anos: Análise do ‘modelo’ brasileiro. (1972). Boletim Informações FIPE, São Paulo, 2020, p. 70-77., que apontam alguns aspectos em direção a esse eixo analítico.

Em face desses apontamentos, o presente artigo traz para a discussão as visões de Furtado em relação ao Golpe de 1964, à Ditadura e seus desdobramentos, tanto em uma perspectiva ampla do Brasil quanto em uma específica do Nordeste. Isso porque, embora as consequências da Ditadura tenham sido sentidas em todo o país, no Nordeste, em particular, elas tiveram um significado maior porque interromperam importantes reformas estruturais que, de acordo com Furtado, suscitariam o desenvolvimento socioeconômico daquela região (FURTADO, 2014FURTADO, Celso. (1989). Obra autobiográfica. Edição definitiva. Coordenação de Rosa Freire D’Aguiar. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.; 2004FURTADO, Celso. O golpe 1964 e o Nordeste. Cadernos do Desenvolvimento. Rio de Janeiro, v. 7, n. 11, 2004. [1989]). A despeito de todo destaque que o Nordeste e a Sudene tiveram nas obras iniciais desse autor, por um lado, o artigo constata que, durante o exílio, houve um desaparecimento dessa temática nas publicações voltadas ao debate público. Por outro lado, o artigo investiga a presença dessa mesma temática a partir de escritos mais íntimos como diários e cartas, de forma a tentar compreender tal afastamento.

Para isso, de modo geral, o presente artigo optou por uma temporalidade cronológica de 1962 até 2004 em relação à produção dos textos do Furtado - uma longa periodização que se faz necessária para apreender a totalidade de seu pensamento, bem como as rupturas e as continuidades que não seriam apreendidas em um conjunto de obras específicas ou isoladas. Assim, o artigo recupera o percurso que separa textos anteriores ao Golpe de 1964, os primeiros artigos no exílio, algumas análises sobre os governos militares, perpassa os textos autobiográficos e conclui com os últimos escritos sobre esse assunto pouco antes de sua morte.

Para tal, o artigo vale-se de recursos filológicos de pesquisa (AUERBACH, 1969AUERBACH, Eric. Philology and Weltliteratur. The Centennial Review, v. 13, n. 1, p. 1-17, 1969.; MCGANN, 2013MCGANN, Jerome. “Philology in a New Key”. Critical Inquiry, v. 39, n. 2, 2013, p. 327-346.; MUSSI; KAYSEL, 2020MUSSI, Daniela; CRUZ, André Kaysel Velasco e. Os populismos de Francisco Weffort. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 104, 2020, p. 1-21.), ou seja, da análise de diferentes versões de escritos de um autor, bem como da conexão específica dos documentos estudados e o ambiente intelectual e político no qual o autor se insere, para melhor apreender o desenvolvimento de seu pensamento acerca de um tema. Recentemente, Wasques (2021)WASQUES, Renato Nataniel. O pensamento de Celso Furtado sobre Estado e planejamento. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, n. 1, v. 78, 2021, p. 156-181., ao analisar o pensamento de Celso Furtado sobre o Estado e o planejamento, também realizou uma leitura “endógena” da obra furtadiana, ou seja, partiu dos próprios escritos do autor, deixando os textos “falarem” por si, para produzir uma análise consistente e, ao mesmo tempo, em diálogo, com a literatura existente.

Diante dessas questões, o artigo contribui para compreender as reflexões de Celso Furtado no tocante à ruptura política promovida pelo Golpe como um desdobramento do subdesenvolvimento, bem como discute as implicações dos governos militares no contexto da globalização pós-Segunda Guerra Mundial e do imperialismo para a política brasileira, que perduram até o século XXI. Ademais, o artigo traz elementos que fortalecem a relação entre o desenvolvimento nacional e o regional no pensamento furtadiano e, por fim, insere Furtado no debate historiográfico concernente à Ditadura Civil-militar.

Atuação política e intelectual anterior ao golpe de 1964

Entre 1949 e 1964, Furtado formulou uma série de estratégias, por meio do planejamento econômico, para promover o desenvolvimento dentro de um projeto nacional desenvolvimentista (BIELSCHOWSKY, 1988BIELSCHOWSKY, Ricardo. Pensamento econômico brasileiro: o ciclo ideológico do desenvolvimentismo. Rio de Janeiro: Ipea/Inpes, 1988.). Com tais propósitos, atuou em várias instituições: em 1949, Furtado integrou a Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal), instituição da Organização das Nações Unidas (ONU), na qual elaborou uma proposta de planejamento para o Brasil. Em 1953, presidiu o Grupo Misto Cepal-Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), ou apenas Cepal-BNDE, que criou o Esboço de um programa de desenvolvimento, no período de 1955-1962 - documento utilizado como o alicerce do Plano de Metas do Governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961). Em 1958, presidiu o BNDE e foi nomeado para o cargo de interventor no Grupo de Trabalho do Desenvolvimento do Nordeste (GTDN). No BNDE, comandou o estudo Uma política de desenvolvimento para o Nordeste, origem do Conselho de Desenvolvimento do Nordeste (Codeno) - entidade precursora da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), criada em 1959, na qual exerceu o cargo de superintendente. Em 1962, foi Ministro do Planejamento do governo João Goulart e, nesta qualidade, um idealizador do Plano Trienal.

Concomitantemente, Furtado escreveu um conjunto de textos, em especial A Pré-revolução brasileira, de 1962, e Dialética do Desenvolvimento, de 1964, que ajudam a situar o contexto político e econômico da época e apresentam um diagnóstico sobre o subdesenvolvimento brasileiro, bem como as propostas para superá-lo. Nesses dois textos, o subdesenvolvimento é visto como um desdobramento da acelerada transformação econômica causada pela transição do modelo agrário ao industrial.

O capitalismo industrial foi resultado da diferenciação estrutural decorrente da economia cafeeira (FURTADO, 2009 [1959]FURTADO, Celso. (1959). A Operação Nordeste. Rio de Janeiro: Instituto Superior de Estudos Brasileiros, 2009.), que produziu um novo centro dinâmico no Centro-Sul e, aos poucos, engendrou transformações - a inserção da mão de obra assalariada, as ferrovias, os bancos e a derivação de capital para o setor industrial - que colaboraram para a emergência de uma nova realidade social, política e econômica. Essa industrialização nascente, no último quartel do século XIX, ganhou folego a partir de 1930 e passou a gerar renda interna por meio de salários, criando um mercado interno consumidor. Contudo, ao mesmo tempo em que ela incrementava o crescimento econômico da nação, também explicitava desajustes estruturais entre um setor moderno urbano-industrial concentrado e um setor arcaico de base agrária, formando estruturas dualistas em estágios distintos e dificultando avanço do desenvolvimento.

Além de disparidades entre o campo e a cidade, esse processo de industrialização provocava discrepâncias regionais significativas, sobretudo entre o Centro-Sul e o Nordeste. A política macroeconômica aplicada entre 1930 e 1940 favoreceu a indústria do Centro-Sul (FURTADO, 2014FURTADO, Celso. (1989). Obra autobiográfica. Edição definitiva. Coordenação de Rosa Freire D’Aguiar. São Paulo: Companhia das Letras, 2014. [1989]), enquanto o Nordeste se tornou um consumidor de produtos industrializados, havendo assim maior transferência de renda desta região para o Centro-Sul. Por fim, o desenvolvimento acelerado da década de 1950 criou as condições para que ocorresse uma suntuosa concentração de renda geográfica, setorial e social (FURTADO, 1962FURTADO, Celso. A Pré-Revolução Brasileira. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1962.), que aprofundou as disparidades e delimitaram os obstáculos ao desenvolvimento nacional (FURTADO 1962FURTADO, Celso. A Pré-Revolução Brasileira. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1962., 1964FURTADO, Celso. Dialética do Desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1964.). Assim, a relação centro-periferia, que serviu para Prebisch 2000 [1949]PREBISCH, Raul. (1949). O desenvolvimento econômico da América Latina e alguns dos seus problemas principais. In: BIELSCHOWSKY, R. (Org.). Cinquenta anos de pensamento na Cepal. Rio de Janeiro: Record, 2000.) explicar as relações de dominação e dependência entre diferentes países, também estava presente dentro do Brasil. Enquanto o Centro-Sul retinha boa parte dos excedentes oriundos da industrialização, o Nordeste, em pleno século XX, permanecia predominantemente monocultor, com grande contingente de desempregados e aprofundamento das mazelas sociais.

Na concepção furtadiana, a transformação dessa realidade nacional só ocorreria através de ação estatal por meio de políticas em torno de reformas estruturais, consubstanciadas nas “reformas de base”. As desigualdades regionais também seriam combatidas através de uma política orientada para a realidade do Nordeste, que fosse capaz de criar um sistema econômico dinâmico que desarticulasse a estrutura agrária vigente na década de 1960 e, por outro lado, provocasse um rápido crescimento industrial capaz de construir novas bases sociais (FURTADO, 1962FURTADO, Celso. A Pré-Revolução Brasileira. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1962.). A Sudene seria a instituição para realizar a transformação do Nordeste, segundo Furtado, que nela ocupou o cargo de superintendente de 1959 a 1964.

Contudo, o projeto de superação do subdesenvolvimento encontrava uma série de entraves políticos característicos do próprio subdesenvolvimento. Para Furtado, em países subdesenvolvidos, o processo político tendia a apresentar-se sob a forma de uma luta pelo poder entre as elites dominantes, que buscavam o controle da máquina estatal em benefício próprio, uma vez que inexistia um processo endógeno capaz de propor consciência de classe (FURTADO, 1964FURTADO, Celso. Dialética do Desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1964.). Tais reflexões sobre o sistema de poder foram publicadas em Dialética do Desenvolvimento, poucos meses antes da tomada de poder de 1964, diante de um clima de tensão crescente e ameaças. Nessa conjuntura, Furtado defendia que o desenvolvimento só seria alcançado por meio de uma democracia livre (CEPÊDA, 2015CEPÊDA, Vera Alves. Contextos e funções da democracia no pensamento furtadiano (1944-1964). Perspectivas, São Paulo, v. 46, 2015, p. 155-188.), em que o povo fosse o protagonista de seu futuro e sua história. Entretanto, o Golpe quebrou o Estado de direito e instaurou um Estado de exceção. Os Atos Institucionais (AIs) cassaram os direitos políticos de pessoas rotuladas como comunistas, subversivas e perigosas e levaram ao exílio muitos brasileiros. Furtado, junto com uma leva de intelectuais e políticos, foi incluído já no AI-1.

O INTERNO E O EXTERNO: A CONSTRUÇÃO DE UMA INTERPRETAÇÃO SOBRE O GOLPE

Após o Golpe, Furtado saiu do Brasil com seu passaporte diplomático2 2 Adquirido por ser membro do Conselho da Aliança para o Progresso (FURTADO, 1989). . Seu primeiro destino foi Santiago, Chile, onde realizou uma série de conferências a pedido do Instituto Latino-Americano do Planejamento Econômico e Social, ligado à Cepal. Depois disso, foi para a Universidade de Yale, Estados Unidos (EUA), visando seguir carreira acadêmica. A despeito de sua recepção favorável na academia, não esteve livre de pressões do governo brasileiro e de tentativas para cercear sua circulação internacional. Além de tudo, nos EUA, suas concepções sobre o subdesenvolvimento foram encaradas com ceticismo3 3 Em Yale, se “entendia por desenvolvimento econômico o avanço no sentido da reprodução dos padrões de consumo, urbanização e lazer que [conformavam] o viver dos norte-americanos”. Entretanto, Furtado analisava o subdesenvolvimento de maneira crítica, como parte do processo de desenvolvimento dos países centrais e não uma fase, conforme o referencial neoclássico de Yale. (FURTADO, 1991, p. 94). . Assim, em 1965, Furtado foi para a França e se vinculou à Universidade de Paris, na qual permaneceu até 1985, com períodos de ensino e pesquisa em outros países (BIANCONI, 2016BIANCONI, Renata. Estagnação latino-americana e estratégia brasileira de desenvolvimento: análises do início do exílio de Celso Furtado. História Econômica & História de Empresas, v. 19, n. 1, 2016, p. 155-188.; JURGENFELD, 2018JURGENFELD, Vanessa. Teoria do subdesenvolvimento de Celso Furtado: criatividade e contraposição a interpretações neoclássicas. Tese (Doutorado) - IE/Unicamp, Campinas, 2018.). Ao longo de todo o exílio, continuou seus estudos sobre o Brasil e publicou textos esparsos sobre os determinantes do Golpe e os desdobramentos para a sociedade brasileira.

OS CONDICIONANTES INTERNOS: AS ESTRUTURAS DO SUBDESENVOLVIMENTO

No exílio, sua primeira reflexão sobre a tomada de poder pelos militares foi materializada ainda em 1964 no texto Obstáculos políticos ao crescimento econômico, e publicado na Revista Civilização Brasileira4 4 Texto apresentado, em 1964, na conferência “Political Obstacles to the Economic Development of Brazil”, em Londres. Posteriormente, publicado na Revista Civilização Brasileira, V. I, n. I, em 1965, com o título Obstáculos políticos ao crescimento econômico. , em 1965. Nesse artigo, por um viés que resgata o processo histórico de industrialização do Brasil, o autor defendeu que os conflitos internos entre os líderes populistas, a classe média, a oligarquia agrária e a burguesia industrial abriram espaço para a tomada de poder.

Dentro dessa perspectiva, a industrialização brasileira, que ocorreu a partir de 1930, criou uma série de postos de empregos nos centros urbanos - especialmente nos da Sudeste - e atraiu uma população rural que se somou aos imigrantes nesses centros, aumentando a população urbana. Concomitantemente a essas modificações estruturais, ocorreu a emergência de uma massa urbana alfabetizada, que ganhou um protagonismo na esfera política, uma vez que, após a Constituição Federal de 1946 e a garantia de voto aos alfabetizados, passou a negociar seu voto com políticos populistas, em troca de melhorias imediatas nas suas condições de vida. Essa nova conjuntura aumentou a proporção da população votante urbana, mas manteve a massa da população rural analfabeta aparte do sistema político (FURTADO, 1965FURTADO, Celso. Obstáculos políticos ao crescimento econômico. In: Revista Civilização Brasileira, v. 1, n. 1, 1965.).

Ademais, essa industrialização não rompeu com a velha oligarquia latifundiária e nem provocou mudanças institucionais que lhe dessem vazão. O sistema federativo, que concentrava grande força política no Senado - influenciado, sobretudo, pelos pequenos Estados agrícolas e pelas elites das regiões mais atrasadas (entre elas, o Nordeste) -, manteve-se praticamente intocado e com grande força para legislar. Nesse sentido, Furtado destacou que havia um grande conflito interno no país, uma vez que os interesses dos grupos ligados ao setor primário-exportador impediam a execução de programas coerentes com o processo de industrialização (FURTADO, 1965FURTADO, Celso. Obstáculos políticos ao crescimento econômico. In: Revista Civilização Brasileira, v. 1, n. 1, 1965.).

Para Furtado, nos anos anteriores ao Golpe, exacerbaram-se divergências entre as massas urbanas sob lideranças populistas e a velha estrutura agrária de poder que controlava o Estado. Esse conflito interno tornou impraticável a concepção de qualquer programa coerente, ao mesmo tempo que pôs em xeque o funcionamento das instituições e criou as condições favoráveis à ação dos militares em 1964.

Para Furtado, o populismo era uma manifestação do descompasso entre o ritmo do crescimento econômico e a inércia das instituições políticas - inércia que ocorria, inclusive, por causa da fraca ideologia industrialista do poder político e porque o processo de industrialização não conseguiu romper com os grupos oligárquicos rurais, se contrapondo ao modelo clássico de desenvolvimento capitalista. Como visto acima, em Dialética do Desenvolvimento, publicado às portas do Golpe, Furtado já argumentava sobre esse poder do populismo e sua apreensão sobre o seu esgotamento. Destacou que, como havia um risco à classe dominante de ocorrer grandes reivindicações do povo pelas promessas feitas, a resposta dessa classe para impedir tais reivindicações seria por meio de uma Ditadura, de modo a consolidar a sua posição e a reduzir a importância do povo como massa de manobra (FURTADO, 1964FURTADO, Celso. Dialética do Desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1964.). De certa forma, foi o que aconteceu após 1964.

Em relação a esse conjunto de ideias, Furtado se apoiou no texto de Weffort (1965)WEFFORT, Francisco. Política e massas. In: COHN, Gabriel; IANNI, Octavio; SINGER, Paul (orgs.). Política e revolução social no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,1965.. Possivelmente, ambos conversaram sobre esse tema em 1964, após o exílio de Furtado, dado que os dois desempenharam funções no Ilpes e na Cepal nesse ano, em Santiago, no Chile. Um ponto de convergência entre os dois autores é que ambos concordavam acerca do processo histórico que levou à formação dessa massa urbana. Entretanto, Weffort (1965)WEFFORT, Francisco. Política e massas. In: COHN, Gabriel; IANNI, Octavio; SINGER, Paul (orgs.). Política e revolução social no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,1965. entendia que, depois de 1930, nenhum dos grupos dominantes (oligarquia agrária, classes médias e a emergente burguesia industrial) conseguia capitanear politicamente os interesses dos diferentes estratos sociais em disputa. Nesse contexto, emergiu uma “nova democracia” legitimada pelas massas urbanas que passaram a formular reivindicações, a chamada democracia de massas, mas que também legitimavam o poder de líderes populistas - tidos como agentes dinamizadores da estrutura política. Nesse sentido, ele defendia que o populismo se caracterizava mais pela construção de um Estado democrático atomizado, enquanto Furtado (1965)FURTADO, Celso. Obstáculos políticos ao crescimento econômico. In: Revista Civilização Brasileira, v. 1, n. 1, 1965. entendia que o populismo se caracterizava pela negociação entre políticos populistas e massas heterogêneas. A despeito disso, o estudo posterior de Weffort (1967)WEFFORT, Francisco. [1967]. 1968. O populismo na política brasileira. In: FURTADO, Celso (org.). Brasil: Tempos Modernos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. Originalmente publicado em Les Temps Modernes, # 257. reafirma um alinhamento à interpretação de Furtado sobre o surgimento e o papel das massas urbanas.

Pouco mais tarde, Furtado também fez críticas contundentes sobre o papel político desempenhado por uma classe média urbana, no livro Subdesenvolvimento e Estagnação da América Latina, publicado logo depois, em 1966. Tratava-se, segundo ele, de uma classe média distinta das classes médias do modelo europeu “clássico”, que era marcada pela presença da pequena burguesia, que se autoempregava e era portadora de um espírito individualista, constituindo uma segunda via da ideologia liberal. A classe média brasileira, por sua vez, constituída principalmente por funcionários públicos, era heterogenia e não traduzia suas aspirações em pauta política que contribuísse com a construção do país no sentido do desenvolvimento nacional (1968 [1966]FURTADO, Celso. (1966). Subdesenvolvimento e estagnação na América Latina. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.).

Os ecos dessas formulações reaparecem em 1967, no artigo Brasil: da República oligárquica ao Estado militar, escrito para um número especial da revista francesa Les Temps Modernes - edição dedicada ao Brasil, organizada pelo próprio Furtado, a convite de Jean-Paul Sartre5 5 Grande parte das tratativas em torno desta publicação foi realizada por meio de cartas entre Sartre, Furtado e os autores convidados, dentre esses Francisco C. Weffort, Florestan Fernandes, Fernando H. Cardoso, Hélio Jaguaribe. O livro Correspondência intelectual (2021) publicou tais cartas que, agora, revelam com mais detalhes a organização desses textos e possibilitam um estudo mais acurado em torno desse tema. , e traduzida para o português, em 1968, sob o título Brasil: tempos modernos (FURTADO, 1979 [1967]FURTADO, Celso. (1967). Brasil: da República Oligárquica ao Estado Militar. In: Brasil: Tempos Modernos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.). Neste texto, por meio de uma digressão na análise histórica, Furtado avança sua investigação sobre a ascensão e as diretrizes da classe militar na política nacional. Destacou que, no período imperial, as Forças Armadas se empenharam em manter a unidade nacional. Já na República Oligárquica, elas foram utilizadas pelos políticos de classe média contra as oligarquias agrárias. O período entre 1930 e 1964, por sua vez, se caracterizou pelo anseio de uma classe média por uma democracia formal em contraposição ao controle de poder exercido por uma oligarquia fundiária. Essa disputa causou tensões entre o parlamento - eleito pelos grupos oligárquicos - e o presidente da República - representante das massas que requisitavam modernização.

Em particular, o processo de industrialização, pós-1950, provocou transformações e deslocou o eixo central da política brasileira, abrindo possibilidades para tais reformas. Com essa possibilidade, as classes dirigentes entraram em pânico e apelaram às Forças Armadas, que por sua vez desempenharam um papel de garantidores do status quo, distinto ao que haviam exercido em décadas anteriores. Neste texto, Furtado apresenta algumas mudanças de opinião sobre o papel da classe média em relação ao texto de 1966. Nesse sentido, Boianovsky (2014)BOIANOVSKY, Mauro. A formação política do Brasil segundo Furtado. Revista de Economia Política, v. 34, n. 2, 2014, p. 198-211. sugere que o posicionamento das Forças Armadas em 1964, que colocou fim no experimento democrático-populista brasileiro, pode ser um reflexo das modificações ocorridas na própria classe média. A outra “novidade” da análise furtadiana é a coalização de forças entre as classes médias e as Forças Armadas. Ao trazer este novo elemento, o autor estava particularmente preocupado com os desdobramentos da política econômica imposta pelos militares que, em sua perspectiva, causariam um processo de reversão e de estagnação na economia e na sociedade brasileira.

Em 1972, ao analisar o novo “modelo” de desenvolvimento adotado pelos governos militares, Furtado retomou suas análises sobre o papel do populismo e aprofundou algumas análises, sobretudo no tocante às Forças Armadas. Na ocasião, defendeu que o colapso da produção cafeeira possibilitou a ascensão de grupos industriais hegemônicos nacionais. Nesse contexto, a industrialização facilitou o contato de líderes populistas com as massas, criando a possibilidade de uma fonte de poder distinta das bases tradicionais. O poder central, por sua vez, apoiou-se na aliança entre a classe política e as Forças Armadas. Contudo, o equilíbrio dessa aliança ruiu na medida em que líderes como Vargas e, sobretudo, Goulart buscaram autonomia a partir do apoio das massas desprivilegiadas. Nesse sentido, a ruptura de 1964 deslocou a classe política (relegando-a em segundo ou terceiro plano) e possibilitou a consolidação de grupos industriais no poder. Para Furtado, as afinidades dos militares com os grupos industriais eram explicadas tanto pela natureza hierárquica e autoritária quanto pelo modo de organização. Ou seja, ambos tendiam a legitimar-se por meio de um discurso baseado na eficiência e na tecnocracia - características opostas à oligarquia cafeeira que, para os militares, era liberal e cosmopolita e renunciava o exercício do poder nacional.

Convém ressaltar que, com o passar dos anos, as ideias sobre o populismo receberam um conjunto de críticas. Dentre estas, Santos (2003) afirma que Furtado não demonstrou que o poder Legislativo foi sistematicamente contrário às propostas modernizadoras do Executivo. O autor sugere que Furtado interpretou o episódio de 1964 em termos das tendências econômicas e sociais de longo prazo, mas ignorou um conjunto de variáveis estritamente políticas. Além disso, por meio de análise empírica, historiadores como Gomes (1994)GOMES, Ângela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1994., Ferreira (2003)FERREIRA, Jorge. O governo Goulart e o golpe civil-militar de 1964. In: Ferreira, Jorge; DELGADO, Lucília de Almeida Neves (Orgs.) O Brasil republicano: o tempo da experiência democrática - da democratização de 1945 ao golpe civil-militar de 1964. Livro 3. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. e Gomes e Ferreira (2014)GOMES, Ângela de Castro, FERREIRA, Jorge 1964: o golpe que derrubou um presidente, pôs fim ao regime democrático e instituiu a ditadura no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2014. se contrapõem a teoria do populismo de maneira geral. De acordo com esses autores, esse conceito não explica todos os fenômenos históricos da época e até mesmo ignora as lutas políticas dos trabalhadores. Segundo essa linha de pensamento, o populismo foi mais uma criação dos anos posteriores ao Golpe. Isso porque foi vinculado, tanto por grupos de esquerda quanto de direita, ao ex-presidente João Goulart como uma forma de responsabilizá-lo sobre a tomada de poder. Essas críticas levaram autores como Toledo (2004)TOLEDO, Caio Navarro de. As falácias do revisionismo. Crítica Marxista, n.º 19, 2004, p. 27-48. a realizar uma nova defesa da interpretação da política de massas.

OS CONDICIONANTES EXTERNOS: A INFLUÊNCIA DOS ESTADOS UNIDOS

Os impactos de 1964 trouxeram novas percepções sobre aspectos até então pouco explorados por Furtado, como a multinacionalização e as reconfigurações da economia mundial (espalhamento das indústrias, inclusive, pelos países subdesenvolvidos), questões apontadas nos ensaios de 19656 6 O texto Obstáculos políticos ao crescimento econômico foi posteriormente publicado no livro Subdesenvolvimento e Estagnação da América Latina (1968 [1966]) sob o título Análise do caso do Brasil (BIANCONI, 2016). e explicitadas progressivamente em textos e debates acadêmicos pós-1966, momento em que o autor ampliou sua interpretação sobre o Golpe de 1964 e a Ditadura. Ele passou a discutir a interferência dos EUA e das suas empresas transnacionais nesse processo. Em Subdesenvolvimento e Estagnação da América Latina, de 1966, o autor reproduziu o texto que já havia escrito em 1965, em que tratava de determinantes internos, e incluiu outros capítulos para tratar dos determinantes externos. Assim, o livro de 1966 mostrava sua intenção de entender o processo por meio de uma visão mais global. Nessas páginas ele destacou o papel das poderosas transnacionais e seu poder de influência, dado que essas empresas eram capazes de impedir políticas de desenvolvimento capitaneadas por Estados Nacionais e que constituíam internamente (por meio de filiais) um superpoder sem o interesse direto no desenvolvimento nacional.

Essa interpretação foi retomada em 1968, no livro Um projeto para o Brasil, em que Furtado abordou as várias expressões do poder imperialista7 7 O termo imperialismo raramente aparece na obra de Furtado, que preferia utilizar hegemonia dos EUA. De todo modo, o imperialismo está presente em sua obra, independentemente do termo (PAULA, 2019). , bem como a presença de grandes corporações multinacionais no Brasil - corporações estas que representavam o interesse dos EUA e a garantia de sua “segurança” enquanto país guardião do capitalismo, preservando o American Way of Life no seu território e fora dele. Por fim, essas questões também foram recuperadas em A hegemonia dos Estados Unidos e o subdesenvolvimento da América Latina, de 19738 8 Livro com textos escritos entre 1964 e 1968 que já haviam subsidiado a escrita de Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina (1966) e Um Projeto para o Brasil (1968). . Neste livro, Furtado corrige imprecisões dos ensaios anteriores e avança suas análises sobre o embate entre EUA e União Soviética no contexto da “Guerra Fria”. Para o autor, essa disputa suscitou a emergência de um mundo bipolarizado entre essas duas nações, em que cada bloco, ao seu modo, buscava neutralizar a influência de seu rival em áreas que considerava estratégica, levando-os a interferir diretamente nos países vizinhos. Assim, utilizando-se de prerrogativas em torno da “segurança”, os EUA interferiram diretamente na autonomia dos países subdesenvolvidos da América Latina.

Por outro lado, nesse ínterim, Furtado também avança nas análises sobre a interferência dos EUA e das empresas transnacionais em associação com as burguesias internas e a classe média na construção do Golpe e na Ditadura, reflexão também proposta no capítulo Brasil: da República Oligárquica ao Estado Militar. Para além da interpretação de 1966, que exaltava a assistência técnica dos EUA, em 1967 ele acrescentou que o Golpe resultou de uma aliança entre EUA, grupos oligárquicos, classe média urbana e Forças Armadas, e que essa aliança representou duas ideias em comum: “ideário liberal na substância e autoritário na forma” (FURTADO, 1979 [1967]FURTADO, Celso. (1967). Brasil: da República Oligárquica ao Estado Militar. In: Brasil: Tempos Modernos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979., p. 18). Em Um projeto para o Brasil, Furtado também sustentou que o pacote de “ajuda” oferecido pelos EUA era validado pelos governos militares brasileiros (FURTADO, 1968FURTADO, Celso. Um projeto para o Brasil. Rio de Janeiro: Saga, 1968.). Embora Furtado tenha denominado o Golpe como militar e em suas obras trouxesse apenas o termo “Ditadura militar” ou “regime” e não “Ditadura Civil-militar”, ele passaria a caracterizá-lo como uma ação coordenada entre os Estados Unidos, as Forças Armadas e uma parcela da sociedade civil. Mais tarde, Dreifuss (1981)DREIFUSS. René Armand. 1964: a conquista do Estado: Ação Política, Poder e Golpe de Classe. Rio de Janeiro: Vozes, 1981. defendeu que, de fato, existiu um projeto de classe circunscrito no Golpe e que, a parcela civil, na prática, era composta por empresários, tecnocratas e burguesias que defendiam um projeto específico.

A partir desta perspectiva analítica, além dos aspectos políticos, Furtado analisou os aspectos econômicos do governo de Castelo Branco, que implementou uma política deflacionária ortodoxa e que, por isso, foi acusado por muitos intelectuais da época de aliar os interesses nacionais aos do Fundo Monetário Internacional (SKIDMORE, 1989SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Castelo a Tancredo, 1964-1985. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.). Furtado foi um desses críticos e, de maneira geral, sustentou que a forma de governo imposta pela Ditadura levaria a um retrocesso da industrialização e a um possível retorno da economia alicerçada no setor primário - movimento que o autor denominou pastorização da sociedade brasileira (FURTADO, 1969).

De modo geral, a ideia de pastorização estava diretamente associada à tese de estagnação defendida em Brasil: da República Oligárquica ao Estado Militar e Subdesenvolvimento e estagnação da América Latina, fruto de suas reflexões sobre os fatores que desencadearam a crise que o Brasil enfrentava na primeira década de 1960. Nesse contexto, o autor apontava que a dinâmica da industrialização subdesenvolvida, ao alcançar a produção de bens duráveis e de capital, enfrentava desequilíbrios tanto em relação ao processo de substituição de importação quanto ao tamanho da demanda, devido à concentração de renda. Para Furtado, a política econômica imposta pelos militares estancaria o crescimento econômico brasileiro e desencadearia o processo de pastorização.

Essa ideia foi uma inspiração de Furtado a partir de seu estudo sobre o modelo econômico concebido pelos EUA para a Alemanha, pós-Segunda Guerra Mundial. Na ocasião, os EUA cogitavam uma reconstrução desse país baseada em atividades agrícolas, o chamado Plano Morgenthau, que visava “forçar uma regressão da economia alemã no sentido de uma ‘ruralização’, o que rebaixa o padrão de vida de sua população aos níveis que prevaleciam nos países pobres da área mediterrânea” (FURTADO, 1985FURTADO, Celso. A Fantasia Organizada. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1985., p. 25). Esse plano nunca foi implementado, em parte pelo medo de que com ele ocorresse um avanço do socialismo, e deu lugar ao Plano Marshall.

Por analogia ao Plano Morgenthau, Furtado entendia que o governo brasileiro, sob influência dos EUA, implementaria uma política de revalorização do setor primário, que geraria um crescimento das exportações ao mesmo tempo que aumentaria o consumo de produtos importados. Esse projeto levaria a maior parte da mão de obra de volta para o campo, sobretudo se não houvesse mecanização. As áreas urbanas, por sua vez, sofreriam redução de investimentos públicos e privados, particularmente no setor industrial, o que cessaria o processo de desenvolvimento (FURTADO, 1969). Para o autor, tratava-se de um retorno à ideia de vantagens comparativas ricardianas9 9 Ver: Ricardo (1988 [1817]), sobretudo capítulo VII. Ricardo defendia que cada país deveria aproveitar suas vantagens e nelas se especializar. Um país com vantagens naturais - solo, clima e relevo - deveria ser agrário-exportador, e um país que tivesse vantagens artificiais - capital e infraestrutura - se voltaria às manufaturas e aos bens de capital. , com a especialização do país na produção agrícola10 10 Tais ideias eram defendidas por alguns setores. Nos anos de 1940 ficou famoso o debate entre Eugênio Gudin e Roberto Simonsen (RODRIGUES, 2005). O primeiro defendeu as vantagens comparativas e o foco na agricultura. Já o segundo defendia a industrialização brasileira. Para Furtado, não era surpresa, se naquele contexto, o Brasil se associasse ao ideário liberal de Gudin. .

No entanto, as altas taxas de crescimento do período denominado “milagre econômico” brasileiro não se mostravam condizentes com as propositivas da tese estagnacionista furtadiana, levando-o a abandonar tal concepção11 11 Vale destacar que, embora Furtado tenha abandonado essa concepção, a tese estagnacionista furtadiana foi bastante criticada. Coutinho (2015) destaca que o livro Subdesenvolvimento e Estagnação da América Latina ficou mais conhecido pelas críticas do que pelo conteúdo discutido. Dentre os críticos, destacam-se trabalhos como os de Cardoso e Faletto (1970), autores que defenderam a abertura do país para o capital externo como forma de viabilizar o desenvolvimento econômico brasileiro, e Tavares e Serra (1971), que concentraram suas críticas à suposta estagnação da segunda fase de industrialização das economias latino-americanas. . Ademais, ao dialogar com o modelo europeu, Furtado ignorou acontecimentos internos do Brasil relacionados às políticas agrárias, que não condiziam com esse retrocesso. Em novembro de 1964, por exemplo, Castelo Branco sancionou o Estatuto da Terra. Apesar das polêmicas envoltas dessa Lei, ela estimulava a modernização agrícola do campo e defendia o desenvolvimento rural através de medidas políticas e agrícolas, regulando e disciplinando as relações jurídicas, sociais e econômicas concernentes ao campo (BRASIL, 1964BRASIL, Emenda Constitucional Nº 10 de 1964. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/emecon/1960-1969/emendaconstitucional-10-9-novembro-1964-364969-publicacaooriginal-1-pl.html. Acesso em: 8 jan. 2020.
https://www2.camara.leg.br/legin/fed/eme...
). Em termos gerais, a Lei deu base para um modelo agrícola-empresarial (agricultura mecanizada, monocultora, utilização de insumos) implementado com o apoio financeiro do Estado. Não surpreende que, com o passar do tempo, ao observar os desdobramentos, Furtado também abandou a ideia de pastorização.

Cerca de 20 anos mais tarde, em textos autobiográficos, Furtado refletiu sobre a própria formação, sua atuação política e as fontes que influenciaram na construção de suas reflexões. Nesses textos, o autor retoma problemas centrais do subdesenvolvimento brasileiro - como a reforma agrária e o dualismo da década de 1950 - discutindo tais problemáticas também a partir de sua atuação polícia. No segundo volume de suas memórias, A Fantasia Desfeita, de 1989, Furtado reavaliou o cenário do final dos anos de 1950 e início de 1960 e destacou que - com a organização das Ligas Camponesas, com a igreja católica voltada às demandas sociais e com a reorientação das políticas públicas do Estado para a superação do subdesenvolvimento - constitui-se uma aparente conjuntura que possibilitava a alteração da estrutura nordestina vigente (FURTADO, 1989FURTADO, Celso. (1989). A Fantasia Desfeita. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014.). A Sudene por si mesma já era um exemplo dessa mudança em curso, uma vez que teve o apoio de todos os presidentes da República do período - Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart - e inclusive dos EUA. Em julho de 1961, por exemplo, Furtado se reuniu com o presidente dos EUA John Kennedy e demais autoridades para expor o plano de desenvolvimento econômico e social para o Brasil e, em especial, para o Nordeste (FURTADO, 1989FURTADO, Celso. (1989). A Fantasia Desfeita. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014.).

Esse apoio dos EUA veio justamente no contexto do pós-Segunda Guerra Mundial, com a emergência da Guerra Fria e a preocupação norte-americana diante dos possíveis rumos que a América Latina poderia tomar em direção ao socialismo. Assim, para amenizar essa tensão social, os EUA apoiavam os governos latino-americanos, via Conselho Interamericano da Aliança para o Progresso - a Aliança para o Progresso (FURTADO, 1973FURTADO, Celso. A hegemonia dos Estados Unidos e o subdesenvolvimento da América Latina. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1973.), que, em dado momento, apoiaram a pauta da CEPAL para América Latina - ou seja, uma espécie de adesão dos EUA às ideias da CEPAL, diante de uma suposta ameaça comunista no continente12 12 Pollock (1978) explicita que os EUA fizeram um “aperto de mão cordial” com a Cepal entre 1958 e 1963. Essa era uma postura diferente porque houve tentativa de fechamento da Cepal pelos EUA três anos após a sua criação. Ver: Furtado (1985). .

Ainda em A Fantasia Desfeita, Furtado rememora o interesse dos norte-americanos nos problemas do Nordeste e nos projetos da Sudene, no período anterior ao Golpe, quando ele ocupava o cargo de Superintendente dessa instituição. O autor relata as visitas técnicas de equipes norte-americanas ao Nordeste e a Sudene. Nesse livro, ele também detalha seu auxílio à equipe de jornalistas norte-americanos que produziu o documentário Brazil: The Troubled Land13 13 De modo geral, o documentário retrata os conflitos agrários no campo nordestino na primeira metade da década de 1960. Contextualiza os trabalhadores rurais, a organização das Ligas Camponesas, os projetos da Sudene para o Nordeste e o posicionamento dos latifundiários diante desta frente progressista. Disponível gratuitamente em: https://www.youtube.com/watch?v=o4reXhCCF54. . Por fim, Furtado descreve sua ida, aos EUA, para pleitear apoio financiamento aos projetos da Sudene. Essas tratativas com autoridades norte-americanas seriam retomadas no encontro de Punta del Este, que ocorreria naquele mesmo ano.

Logo, se nesse primeiro momento o Brasil e os EUA pareciam minimamente alinhados quanto às propostas para o desenvolvimento do Nordeste, em termos práticos e, para a surpresa do próprio Furtado14 14 Ao analisar as negociações entre Brasil, Estados Unidos e a Aliança para o Progresso, Loureiro (2020) aponta que as condições existentes e as relações estabelecidas entre essas instituições nunca foram, de fato, favoráveis ao projeto da Sudene. , as propostas que os EUA apresentaram após o encontro de Punta del Este eram distintas daquelas que estavam sendo defendidas e executadas pela Sudene. As políticas externas norte-americanas se transformaram em ações imediatistas travestidas de “soluções”: a abertura de chafarizes nas áreas de favelas; a perfuração de poços e a canalização de água; e até mesmo a implantação da “casa do trabalhador”, uma entidade posta como alternativa para a organização dos trabalhadores rurais, mas que na prática buscava mitigar a força dos sindicatos existentes e das Ligas Camponesas. Com essa nova orientação, os objetivos da Sudene estavam explicitamente em desacordo com os objetivos das autoridades americanas (FURTADO, 1988; 1991).

Diante do novo contexto, Furtado justificou que, embora a Sudene aceitara a ajuda financeira norte-americana para colocar em prática os projetos propostos, o povo brasileiro tinha, sim, a consciência de seus problemas e, por isso mesmo, devia discuti-los e resolvê-los pelas vias nacionais, sem sofrer pressões e influências externas (FURTADO, 1989FURTADO, Celso. (1989). A Fantasia Desfeita. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014.). Já no terceiro volume de suas memórias, de 1991, Furtado expressou um entendimento mais crítico sobre a atuação da Aliança para o Progresso, ao destacá-la como parte de esforços Norte-americanos para bloquear a renovação social em vários países (FURTADO, 1991FURTADO, Celso. Os Ares do Mundo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.).

Antes do Golpe de 1964, a relação de Furtado com os EUA, sobretudo via Aliança para o Progresso, não deixa de ser um ponto polêmico e pouco explorado em sua obra. Furtado entendia o desenvolvimento de uma nação como uma questão democrática e, ademais, nunca negou suas dificuldades para aceitar o socialismo - uma vez que este, pelas experiências até então existentes, viera aliado a modelos de governo não democráticos. Contudo, não é correto identificar que o socialismo se dê unicamente pelas experiências vigentes e nem tampouco supor que o capitalismo seja necessariamente democrático e uma solução para os países periféricos, vide o exemplo da Ditadura Civil-militar. Além disso, Furtado não economizava críticas aos ideais marxista-leninistas - que, no início da década de 1960, ganhavam força, inclusive entre os jovens nordestinos. Para justificá-las, ele associava o marxismo-leninismo à “inevitabilidade da revolução violenta, liderada por um partido de profissionais da revolução, devendo a nova ordem ser assegurada por um regime ditatorial, o qual perdurará durante um período de transição de duração indefinida” (FURTADO, 1962FURTADO, Celso. A Pré-Revolução Brasileira. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1962., p. 24-25).

Por outro lado, também é importante destacar que o Furtado se opunha mais às interpretações marxistas do que às ideias de Marx propriamente ditas - ou seja, não negava a influência de Marx e mesmo de marxistas como Karl Mannheim. Aluno de Auguste Cornu no curso de marxismo do Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po), Furtado estudou atentamente os quatro volumes de “O Capital” e nunca deixou de reconhecer a importância dessa obra para pensar a sociedade moderna (FURTADO, 2014). Apesar disso, em A Fantasia Organizada, de 1985, destacou que o marxismo nunca o atraiu como doutrina, mas sim por sua macroeconomia.

Suas convicções sobre o marxismo-leninismo também o levaram, em A Fantasia Desfeita, a tecer críticas sobre esses ideais. Por exemplo, Furtado - de uma conversa pessoal com Che Guevara, então Ministro da Indústria de Cuba, que ocorrera no Encontro da Aliança para o Progresso, de 1961 em Punta del Este - relatou as seguintes impressões sobre as Ligas Camponesas, Francisco Julião e seu interlocutor:

[Che] imaginava as ligas camponesas como vigorosas organizações de massa, capacitada para colocar em xeque qualquer iniciativa da direita visando modificar a relação de forças em benefício próprio. Superestimava Julião como líder e como organizador, e subestimava as estruturas de poder enraizadas secularmente no Nordeste. A ideia que eu fazia de Julião era muito distinta: um homem sensível e poeta, sujeito a crises psicossomáticas periódicas, capaz de perder o rumo por uma mulher, mais um advogado astuto e brilhante do que um líder capaz de dirigir as massas e nações violentas. (FURTADO, 1988 [2014, p. 359]).

Ainda no mesmo livro, sobre a organização e o posicionamento dos integrantes das Ligas Camponesas diante dos embates políticos, Furtado complementou: os camponeses “apareciam armados de foice, aqui e ali, para “apoiar” as greves e coisas similares. Havia algo de patético naquela corte de homens esquálidos, maltrapilhos, exibindo uma arma cuja eficácia desaparecera com a invenção da pólvora” (FURTADO, 1988 [2014, p. 420]).

Embora essas representações do agricultor pobre, do Francisco Julião e do Che Guevara causem estranheza à primeira leitura e revelem certo preconceito de época, elas também retratam uma realidade que o Furtado buscava superar. Em sua concepção, nem o modelo cubano e nem o movimento das Ligas Camponesas eram soluções adequadas para os problemas do Nordeste. A solução viria, sim, por meio de uma compatibilização entre a industrialização e o desenvolvimento socioeconômico, dentro de um processo democrático. Tratava-se, para ele, de transformar o capitalismo em um sistema civilizado no Brasil, para conduzir o país a uma socialdemocracia, com a forte presença de um Estado Nacional que direcionasse os meios e os fins para o desenvolvimento.

OS EFEITOS DA DITADURA CIVIL-MILITAR

No exílio, além das discussões sobre o Golpe, Furtado analisou a realidade do desenvolvimento econômico brasileiro sob o comando dos governos militares. Algumas de suas reflexões em que já apontava um processo crescente na concentração de renda foram publicadas em Um projeto para o Brasil, de 1968. Contudo, foi em Análise do ‘modelo’ Brasileiro, de 1972, que o autor realizou críticas contundentes ao modelo econômico e social dos militares, o qual reforçou a concentração de renda entre as classes altas e manteve as desigualdades.

Para além destas já conhecidas críticas, Furtado retomou argumentos explicitados em 1965 e 1966 ao chamar a atenção sobre as decisões políticas desses governos. Nesse aspecto, ele defendeu que, na falta de uma burguesia nacional, a estratégia de desenvolvimento imposta pelos militares permitiu que as empresas multinacionais desempenhassem um papel central dentro da economia nacional. Até certo ponto, o sistema político brasileiro foi atrelado ao sistema econômico externo, permitindo que essas empresas se tornassem a um só tempo as principais acumuladoras e as principais tomadoras de decisão, ou seja, o destino da nação era pensando por grupos externos aos interesses nacionais, que alienavam os sistemas internos de decisão. Por meio de uma nota de rodapé, o autor afirmou que não bastava fazer políticas supostamente nacionalistas como projetos da Transamazônica se o centro de decisão não estava nas mãos do governo brasileiro. Para Furtado, essa seria uma das grandes diferenças no modelo de transformação vislumbrado antes de 1964, com o ‘modelo’ construído após o Golpe.

De modo geral, Análise do ‘modelo’ brasileiro foi redigida de forma técnica, para evitar censura (FEDER, 1972FEDER, Franklin Lee. Resenha de Análise do ‘modelo’ brasileiro. Revista de Administração de Empresas, v. 12, n. 4, 1972, p. 93-94.). Ainda assim, o editor do livro teve sua livraria desapropriada pelos militares pouco tempo depois desta publicação; fato que reforça, mais uma vez, que os governos militares não permitiam diálogo e participação no comando da nação. Contudo, somente após passar um semestre como professor da PUC-SP, em 1975, que Furtado reavaliou seu papel como pensador de um projeto de desenvolvimento, concluindo que o Projeto de Brasil de sua geração foi destruído. Assim, se com a Análise do ‘modelo’ brasileiro existia um resquício de esperança de intervir no debate público, após 1975 não havia mais esse tipo de esperança (FURTADO, 2019FURTADO, Celso. Diários intermitentes, 1937-2002. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.; SAES, 2020SAES, Alexandre Macchione. Celso Furtado, 100 anos: Análise do ‘modelo’ brasileiro. (1972). Boletim Informações FIPE, São Paulo, 2020, p. 70-77.). Após essa incursão, Furtado ateve suas análises às questões teórico-filosóficas, com ênfase no subdesenvolvimento do terceiro mundo como um todo, sem concentrar esforços nas problemáticas do Brasil (SAES, 2020SAES, Alexandre Macchione. Celso Furtado, 100 anos: Análise do ‘modelo’ brasileiro. (1972). Boletim Informações FIPE, São Paulo, 2020, p. 70-77.).

A retomada efetiva das análises da economia e da política brasileira aconteceu anos mais tarde, diante de uma nova conjuntura: a Lei da Anistia, de 1979, que abriu espaço para um processo de redemocratização, e o início da crise econômica da década de 1980, que reverteu parte da trajetória de crescimento dos anos anteriores. Entre 1981 e 2004, Furtado realizou uma defesa obstinada sobre a necessidade de autonomia das decisões nacionais, com vista a disciplinar o capital transnacional e colocá-lo a serviço do país (GRANDI, 2020GRANDI, Guilherme. Celso Furtado, 100 anos: O Brasil pós-milagre. (1981). Boletim Informações FIPE, p. 69-76, 2020.). Essa defesa refletia suas interpretações sobre os efeitos da Ditadura e os reflexos do capital internacional. Em O Brasil Pós-milagre, de 1981, por exemplo, Furtado reforçou algumas teses já defendidas em Análise do ‘modelo’ brasileiro. Por outro lado, ele também acrescentou que o caráter dependente do subdesenvolvimento se desdobrava internamente. Nesse sentido, o autor voltou a enfrentar tais problemáticas a partir da região Nordeste, como forma de compreender as questões nacionais, mas também como forma de avaliar especificamente os desdobramentos dos governos militares nesta região.

O período do exílio, como um todo, provocou uma ruptura nos escritos de Furtado: o Nordeste e a Sudene desaparecem de suas reflexões destinadas à discussão pública, ainda que temas como o da questão agrária e da acumulação de capital predatória no campo, liderada por empresas transnacionais, permaneçam em livros como Um projeto para o Brasil, Análise do ‘modelo’ brasileiro e O mito do desenvolvimento econômico (1974FURTADO, Celso. O Mito do desenvolvimento econômico. São Paulo: Círculo do Livro, 1974.). Essa temática só reapareceu nos escritos de Furtado em 1979, também no contexto da lei de Anistia, a partir de um pequeno texto intitulado Para o Nordeste: 15 anos perdidos, publicado originalmente no Le Monde, para discutir os 15 anos do Golpe Militar no Brasil, e republicado em O Nordeste e a Saga da Sudene, de 2009. Na ocasião, Furtado realizou uma crítica clara a esses governos e defendeu que o “problema do Nordeste” era tão ou mais grave do que há 15 anos.

Embora não seja possível apontar com precisão os motivos que suscitaram seu afastamento explícito desse tema, seu terceiro livro autobiográfico e seus escritos íntimos redigidos durante o exílio - publicados mais recentemente como Correspondências intelectuais, de 2019, e Diários Intermitentes, de 2021 - revelam a fissura que o Golpe causou em Furtado. Em Os Ares do Mundo, o autor afirmou que a decisão em fixar residência nos EUA estava atrelada, para além das questões acadêmicas, à necessidade de se isolar e de se esquivar de conversas sobre o Golpe e seus desdobramentos, motivações também relevadas em cartas escritas aos amigos Charles Wagley e Albert O. Hirschman (FURTADO, 2021FURTADO, Celso. Correspondência intelectual. São Paulo: Companhia das Letras. 2021.). Em Diários Intermitentes, seu registro mais íntimo, o Nordeste e a Sudene aparecem em poucas ocasiões: em 1964, já no exílio, quando ele contextualiza a tomada de poder e a intervenção na Sudene e, em 1974, quando ele retornou à Recife pela primeira vez desde 1964. Nesta ocasião, Furtado circulou os arredores da nova sede da Sudene e registrou sua perplexidade com o gigantismo do edifício e com os rumos da Instituição, que, em sua perspectiva, priorizou grandes empreendimentos industriais para render lucros a grupos internacionais ou do Sul do país, enquanto o drama socioeconômico da população permanecia igual a tempos pretéritos. Nesse sentido, historiadores como Le Goff (1990)LE GOFF, Jacques. História e memória. Campinas: Editora da UNICAMP, 1990. e Ricoeur (2007)RICOEUR, Paul. A Memória, a História, o Esquecimento. Campinas: Editora da Unicamp, 2007. apontam que os silêncios, os não ditos, são também reveladores da história coletiva e individual.

De modo geral, foi só a partir de O Brasil Pós-milagre que o autor reinsere o Nordeste em suas análises de forma consistente. Em sua perspectiva, as políticas econômicas e sociais dos militares reforçaram algumas disparidades regionais, sobretudo, entre o Sudeste e o Nordeste. Isso porque o parque industrial mais moderno ficou localizado no Sudeste - sobretudo, em São Paulo - enquanto o parque industrial nordestino atendia demandas dos mercados externos à região e processava produtos primários, o que se traduzia em baixa criação de empregos regionais. Ademais, o Nordeste permanecia como um fornecedor de matéria-prima e mão de obra para o restante do Brasil, e seu mercado, concentrado, era abastecido pelas empresas localizadas no Centro-Sul, privando-o de iniciativas empresariais próprias e agravando as disparidades e o nível de vida da população (FURTADO, 1981FURTADO, Celso. O Brasil Pós-milagre. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.).

Em Cultura e Desenvolvimento em Época de Crise, de 1984FURTADO, Celso. Cultura e Desenvolvimento em Época de Crise. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984., Furtado reconheceu que, entre 1960 e 1970, o Nordeste alcançou uma taxa de crescimento elevada, um aumento na industrialização e uma ampliação da acumulação de capital. Entretanto, todas essas condições contribuíram para que a região fosse um caso exemplar de mau desenvolvimento, porque o esforço de crescimento não significou desenvolvimento nacional. Apesar de haver espaço para o aumento da classe média naquela região, o subemprego manteve-se em nível alto, cerca de 80% da população nordestina, em 1979.

Ainda nesta mesma perspectiva analítica, Furtado chamou a atenção para a nova realidade do campo nordestino, em entrevista concedida para a Fundação Perseu Abramo, já nos idos de 1998. Em sua perspectiva, as políticas agrárias dos militares tornaram os estabelecimentos rurais nordestinos mais resistentes às fortes estiagens. De maneira geral, os militares investiram em infraestrutura (maquinários, aberturas de açudes, entre outros) e no alargamento do sistema de crédito e de cooperativismo. Entretanto, todos os projetos desse tipo foram destinados às propriedades regularizadas, ou seja, os pequenos ocupantes foram, devido às exigências legais impostas, impedidos de receber o auxílio. Embora esses projetos tenham possibilitado que em épocas de seca o gado dos fazendeiros fosse salvo devido aos açudes e aos caminhões pipas, a população de baixa renda permaneceu imersa em seu drama social.

Seu último artigo, O golpe de 1964 e o Nordeste, de 2004, escrito um pouco antes de sua morte, ressaltou que o Nordeste acumulou o maior atraso social do país e que o Golpe aniquilou as possibilidades de transformação das estruturas agrárias e sociais nordestinas. Os efeitos da Ditadura foram catastróficos, segundo o autor, com consequências que se prolongavam até os anos 2000. Ainda em sua perspectiva, a Ditatura cometeu o crime de liquidar com a prática da democracia e condenou pelo menos duas gerações a desconhecer, senão a menosprezar, os instrumentos políticos que permitem o verdadeiro desenvolvimento das sociedades. Para os nordestinos, em particular, seu dano foi ainda mais nefasto, uma vez que interrompeu o processo de construção de um novo projeto social, político e econômico que estava em curso naquela região, antes do Golpe, e do qual ele, inclusive, fazia parte.

A ascensão dos militares ao poder levou para dentro do Estado uma nova concepção de poder político e econômico e, nesse contexto, a Sudene foi esvaziada e transformada em uma instituição de fachada. Diante dessa constatação, os últimos textos de Furtado, de certa forma, deixam transparecer seu pesar ao avaliar que o Brasil entrava no século XXI como um país subdesenvolvido e com graves problemas. Vale destacar, que essa última análise, até certo ponto, influenciou trabalhos como os de Carvalho (1987)CARVALHO, Inaia Maria Moreira de. O Nordeste e o regime autoritário: discurso e prática do planejamento regional: São Paulo: Hucitec, 1987. e Araújo (2000)ARAÚJO, Tânia Bacelar de. Ensaios sobre o desenvolvimento brasileiro: heranças e urgências. Rio de Janeiro: Reva, 2000., entre outros que investigam os reflexos da Ditadura para o Nordeste.

Por fim, também vale destacar que, a despeito de todas as críticas realizadas por Furtado aos governos militares e seus desdobramentos, de acordo com o meu esforço de revisão, não encontrei nas obras publicadas durante esse ínterim críticas explícitas do autor em relação à política de exílio, perseguição, censura e morte praticada pelos militares. Nesse sentido, Furtado colocou a política econômica como elemento central de sua análise no pós-1964, seguindo uma tendência dos intelectuais latino-americanos que concentrou a crítica ao modelo econômico, dada a ampliação da desigualdade social e a reversão das políticas que levariam ao desenvolvimento.

Por outro lado, as críticas diretas aos temas sensíveis (censura, perseguição, tortura e assassinatos) aparecem mais explicitamente em seu terceiro livro de memórias Os ares do Mundo. Neste, o autor contextualiza seus breves retornos ao Brasil nos “anos de chumbo”, aborda as perseguições que sofreu e as dificuldades para que livros como Um projeto para o Brasil circulassem. A despeito disso, ressaltou que redigia tais memórias para que ficasse registrado que o governo brasileiro perseguia não apenas as pessoas que se envolvessem com as “guerrilhas”, mas todos aqueles que ousavam pensar livremente.

Nesse contexto, Correspondência intelectual aprofunda essa outra face das críticas aos militares feitas por Furtado e seus interlocutores. Nestes textos, assuntos como a duração do regime, a Lei de Segurança Nacional, a perseguição, as prisões, as sanções às universidades, os bloqueios às viagens internacionais, as adversidades com passaportes e vistos e até mesmo as dificuldades financeiras e emocionais dos exilados eram relatadas e debatidas. A despeito da peregrinação no exílio, as cartas também indicam que Furtado foi um intermediador ativo entre instituições e exilados à procura de trabalho em países que ofereciam abrigo.

Em síntese, Furtado sempre realizou uma análise lúcida sobre a realidade brasileira. Desde o início de seu exílio, ao contrário de muitos de seus interlocutores, ele defendeu que a Ditadura perduraria por muito tempo, uma vez que as classes dominantes que tomaram o poder não colocariam seus interesses em risco. Mesmo com toda perseguição que sofreu ao longo do período ditatorial, as cartas, as obras autobiográficas e os diários mostram que, ainda assim, Furtado buscou contribuir para o desenvolvimento do Brasil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De maneira geral, há um consenso de que a Ditadura Civil-militar iniciou em abril de 1964, por meio de um Golpe de Estado e uma centralização do poder Executivo nas mãos das Forças Armadas, e de que os seus opositores sofreram perseguições e torturas, foram mortos ou desapareceram. A análise desse passado traumático não é simples. Não apenas pelo seu significado histórico, mas porque os seus ecos ainda reverberam na sociedade contemporânea gerando disputas em segmentos sociais. A vida e as reflexões de Celso Furtado também foram marcadas por tais acontecimentos. Nesse sentido, seus escritos sobre esse passado são, ao mesmo tempo, parte de sua história e parte da história do Brasil.

Diante disso, o presente artigo busca discutir a interpretação de Celso Furtado sobre o Golpe Civil-militar de 1964 e os reflexos dos governos militares para a sociedade brasileira. Por meio de recursos filológicos, o artigo situa o autor no seu momento de produção, em paralelo com o seu contexto político e econômico, e reflete como ele apreendeu, incorporou, modificou e até mesmo abandonou elementos conceituais em textos produzidos entre 1962 e 2004, a partir de três perspectivas.

A primeira aponta que o próprio subdesenvolvimento pôs em xeque o funcionamento das instituições e criou as condições favoráveis ao Golpe. A segunda, por sua vez, mostra como, a partir de 1966, Furtado passou a analisar o processo de internacionalização da economia mundial e a perceber as implicações na política brasileira, questões que o acompanharam até o final de sua vida. Já a terceira perspectiva pontua a relação entre o desenvolvimento nacional e o regional, uma vez que o Golpe não pode ser entendido em seus escritos sem que se atente para as questões do Nordeste, ou seja, para ele a questão regional também era uma questão nacional, ideia que o autor manteve ao longo de sua vida e, inclusive, reforçou em seus últimos trabalhos. De maneira geral, o artigo se propõe a inserir Furtado no debate historiográfico relacionado à Ditadura Civil-militar.

  • 2
    Adquirido por ser membro do Conselho da Aliança para o Progresso (FURTADO, 1989FURTADO, Celso. (1989). A Fantasia Desfeita. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014.).
  • 3
    Em Yale, se “entendia por desenvolvimento econômico o avanço no sentido da reprodução dos padrões de consumo, urbanização e lazer que [conformavam] o viver dos norte-americanos”. Entretanto, Furtado analisava o subdesenvolvimento de maneira crítica, como parte do processo de desenvolvimento dos países centrais e não uma fase, conforme o referencial neoclássico de Yale. (FURTADO, 1991FURTADO, Celso. Os Ares do Mundo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991., p. 94).
  • 4
    Texto apresentado, em 1964, na conferência “Political Obstacles to the Economic Development of Brazil”, em Londres. Posteriormente, publicado na Revista Civilização Brasileira, V. I, n. I, em 1965, com o título Obstáculos políticos ao crescimento econômico.
  • 5
    Grande parte das tratativas em torno desta publicação foi realizada por meio de cartas entre Sartre, Furtado e os autores convidados, dentre esses Francisco C. Weffort, Florestan Fernandes, Fernando H. Cardoso, Hélio Jaguaribe. O livro Correspondência intelectual (2021) publicou tais cartas que, agora, revelam com mais detalhes a organização desses textos e possibilitam um estudo mais acurado em torno desse tema.
  • 6
    O texto Obstáculos políticos ao crescimento econômico foi posteriormente publicado no livro Subdesenvolvimento e Estagnação da América Latina (1968 [1966]FURTADO, Celso. (1966). Subdesenvolvimento e estagnação na América Latina. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.) sob o título Análise do caso do Brasil (BIANCONI, 2016BIANCONI, Renata. Estagnação latino-americana e estratégia brasileira de desenvolvimento: análises do início do exílio de Celso Furtado. História Econômica & História de Empresas, v. 19, n. 1, 2016, p. 155-188.).
  • 7
    O termo imperialismo raramente aparece na obra de Furtado, que preferia utilizar hegemonia dos EUA. De todo modo, o imperialismo está presente em sua obra, independentemente do termo (PAULA, 2019PAULA, João Antonio de. Cultura e Desenvolvimento: 100 anos de Celso Furtado, um intelectual cosmopolita. Nova Economia. v. 29, n. esp, 2019, p. 1075-1089.).
  • 8
    Livro com textos escritos entre 1964 e 1968 que já haviam subsidiado a escrita de Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina (1966) e Um Projeto para o Brasil (1968).
  • 9
    Ver: Ricardo (1988RICARDO, David. (1817). Princípios de economia política e tributação. São Paulo: Nova Cultural, 1988. [1817]), sobretudo capítulo VII. Ricardo defendia que cada país deveria aproveitar suas vantagens e nelas se especializar. Um país com vantagens naturais - solo, clima e relevo - deveria ser agrário-exportador, e um país que tivesse vantagens artificiais - capital e infraestrutura - se voltaria às manufaturas e aos bens de capital.
  • 10
    Tais ideias eram defendidas por alguns setores. Nos anos de 1940 ficou famoso o debate entre Eugênio Gudin e Roberto Simonsen (RODRIGUES, 2005RODRIGUES, Carlos Henrique Lopes. A questão do protecionismo no debate entre Roberto Simonsen e Eugênio Gudin. Dissertação (Mestrado em Economia) - Instituto de Economia/Unicamp, Campinas, 2005.). O primeiro defendeu as vantagens comparativas e o foco na agricultura. Já o segundo defendia a industrialização brasileira. Para Furtado, não era surpresa, se naquele contexto, o Brasil se associasse ao ideário liberal de Gudin.
  • 11
    Vale destacar que, embora Furtado tenha abandonado essa concepção, a tese estagnacionista furtadiana foi bastante criticada. Coutinho (2015)COUTINHO, Maurício. Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina, de Celso Furtado. Revista de Economia Contemporânea, v.19, n. 3, 2015, p. 448-474. destaca que o livro Subdesenvolvimento e Estagnação da América Latina ficou mais conhecido pelas críticas do que pelo conteúdo discutido. Dentre os críticos, destacam-se trabalhos como os de Cardoso e Faletto (1970)CARDOSO, Fernando Henrique; FALETTO, Enzo. Dependência e desenvolvimento na América Latina: Ensaio de Interpretação Sociológica. Rio de Janeiro: LTC Editora, 1970., autores que defenderam a abertura do país para o capital externo como forma de viabilizar o desenvolvimento econômico brasileiro, e Tavares e Serra (1971)TAVARES, Marica da Conceição; SERRA, José. Más allá del estancamento: una discusión sobre el estilo de desarrollo reciente. El Trimestre Económico, México, v. 38, n. 152, 1971, p. 905-950., que concentraram suas críticas à suposta estagnação da segunda fase de industrialização das economias latino-americanas.
  • 12
    Pollock (1978) explicita que os EUA fizeram um “aperto de mão cordial” com a Cepal entre 1958 e 1963. Essa era uma postura diferente porque houve tentativa de fechamento da Cepal pelos EUA três anos após a sua criação. Ver: Furtado (1985)FURTADO, Celso. A Fantasia Organizada. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1985..
  • 13
    De modo geral, o documentário retrata os conflitos agrários no campo nordestino na primeira metade da década de 1960. Contextualiza os trabalhadores rurais, a organização das Ligas Camponesas, os projetos da Sudene para o Nordeste e o posicionamento dos latifundiários diante desta frente progressista. Disponível gratuitamente em: https://www.youtube.com/watch?v=o4reXhCCF54.
  • 14
    Ao analisar as negociações entre Brasil, Estados Unidos e a Aliança para o Progresso, Loureiro (2020)LOUREIRO, Felipe. A Aliança Para o Progresso e o Governo João Goulart (1961-1964): Ajuda Econômica Norte-americana a Estados Brasileiros e a Desestabilização da Democracia no Brasil Pós-guerra. São Paulo: Editora Unesp, 2020. aponta que as condições existentes e as relações estabelecidas entre essas instituições nunca foram, de fato, favoráveis ao projeto da Sudene.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Abr 2022

Histórico

  • Recebido
    22 Out 2021
  • Aceito
    12 Jan 2022
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