RESUMO
Lendo os diários de Lúcio Cardoso em diálogo com Roland Barthes sob uma perspectiva queer que vai além dos limites entre vida e arte, autor e obra, apresento dimensões estéticas e éticas da escritura relacionada à velhice, ao amor, à amizade, à sexualidade e à solidão relacionadas à experiência do solteirão que pode ampliar a compreensão do Modernismo brasileiro. O que implica uma forma de leitura diferente tanto das representações de não heteronormatividades, tiradas do armário da homossexualidade de artistas, bem como de formas de reinventar relações afetivas e sexuais. Proponho algumas observações sugeridas mais do que desenvolvidas em fragmentos diferentes de um artigo com início e fim, como se fora um diário de leitura.
PALAVRAS-CHAVE
Diários queer; Roland Barthes; Lúcio Cardoso
ABSTRACT
Reading journals by Lúcio Cardoso in dialogue with Roland Barthes under a queer perspective that goes beyond borders of life and art, author and oeuvre, I present aesthetic and ethic dimensions of writing related to old age, love, friendship, sexuality and loneliness as impossibilities related to the experience of the bachelor what may expand the understanding of Brazilian Modernism. It implies a way of reading different both from representations of nonheteronormativities, outing of the homosexuality of artists or ways of reinventing affective and sexual relations. I make some suggestions in fragments different from one article with a beginning and end as a journal of reading.
KEYWORDS
Journals queer; Roland Barthes; Lúcio Cardoso
Apesar da crítica feita ao autor e ao risco de homogeneização de uma obra a partir dessa categoria, ela ainda impera nos manuais de história da arte, nas biografias dos artistas, nas entrevistas (BARTHES, 1988). E ainda mais na contemporaneidade, quando o autor virou celebridade, youtuber, influencer digital.
Como pode um diário, prática de um mundo letrado, mas que também se atualiza nas redes sociais, contribuir para a compreensão de um artista, de seus escritos, sons e imagens? Evitando tanto biografismos quanto formalismos textuais redutores, qual o espaço da subjetividade de quem faz uma obra de arte e de quem lê, ouve, vê? O diário contribui para um outro tipo de crítica, uma outra leitura? Não tenho a pretensão de responder a essas perguntas de forma genérica, mas elas foram guias para este ensaio.
Diferentemente de vários autores modernistas brasileiros que redigiram e publicaram memórias, Lúcio Cardoso escreveu diários desde jovem, dos quais destaco: o Diário I (1949-1951), publicado, quando ele estava vivo, em 1960, e o Diário II (1951-1962), publicado postumamente, em 1970. Esses registros foram reunidos numa versão maior chamada Diários, em 2012, editada por Ésio Macedo Ribeiro, que será citada aqui, com uma versão revisada e mais completa chamada de Todos os diários, publicada em 2023, quando este ensaio já estava bem avançado. Lúcio Cardoso escreve o diário com uma preocupaçãonão só estética, mas também ética, associando escrita com um modo de vida em que o próprio fazer é confrontado com demandas do cotidiano, da sobrevivência e além. Sendo sempre um desafio os caminhos nas fronteiras da vida e obra que tento aqui enfrentar. Diário que seria encenação e não expressão do corpo e dos afetos, de uma experiência considerada como autêntica, como criticada por Joan Scott (1999).
Haveria espaço para uma leitura do diário através dos afetos e das sensações destinadas a tocarem futuros corpos? Lidando com o Modernismo, foco de minha pesquisa atual, como tocar corpos através do tempo? Como o tempo pode agregar, reunir como os espaços? Como podemos nos encontrar no tempo?
Apesar da existência de abordagens feministas (HOGAN, 2008), li, até agora, poucos textos que usam e desenvolvem a expressão “diário queer” (SOBOLCZYK, 2015). De todo modo, acredito ainda que uma leitura queer pode ser um lugar de discutir as experiências (SCOTT, 1999) intelectuais, afetivas e sexuais diversas de Lúcio Cardoso2 indo além da representatividade, do outing da homossexualidade, do uso naturalizado e acrítico do lugar de fala, em que as sensações e os afetos sejam considerados nas ambiguidades que a arte pode encenar numa perspectiva amoral e relativista, sendo parte de certa revisão do Modernismo que tenho tentado realizar nos últimos anos.
Lúcio Cardoso (2012, p. 372) questiona o próprio uso do diário ao se perguntar se ele teria “o risco de se tornar um simples anotado de sensações mesquinhas e melancólicas? Mas eu próprio serei muito diferente disto? Cansado de tudo?”. Ele próprio acaba por responder em outro momento colocando as mesmas dificuldades que tive ao ler: “um Diário não é jamais um relato constante, um rio contínuo e sem desfalecimento que fosse delineando a nossa vida... Um diário é apenas uma crônica de gemidos”, “sensações furtivas e precárias” (CARDOSO, 2012, p. 387; p. 469). E se o diário faz um retrato do autor, “a finalidade de um retrato não deve ser a de esclarecer, mas de contornar, sugerindo o enigma” (CARDOSO, 2012, p. 417). Gostaria, portanto, menos de oferecer respostas ou esclarecimentos e mais de estar à altura do enigma que nos foi oferecido ao lidar com o impossível da escrita, da vida, do sexo, do amor e da amizade. Enfim, o diário de releituras (CHARBEL, 2018) é também uma forma de ensaísmo.
No diário de Lúcio Cardoso, os desabafos sobre si, família, amigos, conhecidos são contidos e estetizados. Os comentários de livros e autores incluem tanto depoimentos sobre contemporâneos, como breves e rápidos posicionamentos sobre o que escreveram, misturados com inquietações sobre a criação, a necessidades de sobrevivência, a condição do artista bem como opiniões diversas sobre o momento histórico, político, o Brasil e Minas Gerais. Aqui, o diário de Lúcio Cardoso será lido a partir do diário Noites de Paris de Roland Barthes, publicado postumamente em Incidentes (1987).
Em meio a muitas dificuldades de escrita, como há muito não tenho, aqui seguem algumas notas de um trabalho em percurso.
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Uma lembrança me veio do fim de A aula de Roland Barthes:
Percebi então com estupefação (só as evidências podem estupefazer) que meu próprio corpo era histórico. Em certo sentido, meu corpo é contemporâneo de Hans Castorp, o herói da Montanha Mágica; meu corpo, que ainda não tinha nascido, tinha já vinte anos em 1907, ano em que Hans penetrou e se instalou no “país do alto”; meu corpo é bem mais velho do que eu, como se conservássemos sempre a idade dos medos sociais com os quais o acaso da vida nos pôs em contacto. (BARTHES, 1989, p. 44-45 - grifos meus).
Esses medos podem ser derivados de guerras, doenças pandêmicas mortais, perseguições e violências de toda ordem a nações, culturas, grupos, mas qual seria a natureza do medo evocado no diário de Lúcio Cardoso ao dizer
[...] este livro é um puro fruto do medo. Não ousei tudo o que imaginei tanto quanto o poderia ser. (Sempre tive medo. Tudo o que fiz, tudo que faço, este livro mesmo, é em reação ao medo que tenho. E do medo de chegar a um Universo branco e sem terrores, leva-me ao medo supremo, que é o de afrontar todos os medos, e saber que existo, ainda que isto me faça tremer, e de corpo e de alma...). (CARDOSO, 2012, p. 359).
Quais medos sociais criariam uma moldura para esses medos, aparentemente, de caráter mais existencial ou metafísico? Quando Lúcio avança já no Diário II, o que ele vê como repetições ganha um papel:
[...] consciente de que muita coisa em mim é insolúvel, destinada a não ter solução, possivelmente, e formando essa parte de sombra, de areia movediça e de sentimentos caóticos que sedimentam todo o meu ser e floresce num grande lírio negro - tangível dentro da pouca luz que consegui acumular pela minha diminuta vontade. (CARDOSO, 2012, p. 365).
Além dessa consciência de si para a qual o diário trouxe para além de uma dispersão, mas também uma persistência, para além dos medos, quando a cada dia
[...] recomeço, recomeço sempre. Não há nenhum cansaço nisto, mas uma espécie de desespero, um desejo único e misterioso de sobreviver, de existir ainda, de atingir o cerne que só eu conheço. Recomeçar é apenas tatear, os olhos úmidos, as mãos secas de tanto desperdício. (CARDOSO, 2012, p. 366).
De repente me dou conta de que sigo corpos contemporâneos, mas corpos mortos. Isso desestrutura mais ainda o que tento escrever. “No escuro da noite, o cadáver é luminoso: pela manhã ele escurece” (CARDOSO, 2012, p. 461). Fica algo do morto que sigo:
Desejo passar com as coisas e as pessoas que eu amo. Não teria gosto, para mim, sobreviver numa época de formas e de faces desconhecidas. A cada esquina que se transforma, a cada casa que vejo demolir, a cada amigo que desaparece, sinto que também eu me extingo um pouco. O que eu faço não tem importância: é sendo eu mesmo, e com dureza, no instante que sou, que mais tarde, quando já não for, ainda poderei resplandecer aos olhos dos outros. (CARDOSO, 2012, p. 463).
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Também me lembro de Fragmentos de um discurso amoroso, de Roland Barthes, em que a fala da solidão do discurso amoroso pode ser compreendida em relação à aposta ocidental na plasticidade ena inventividade da sexualidade após a revolução sexual dos anos 1960, no próprio começo do livro: “Assim sendo é um enamorado que fala e que diz: ‘Me abismo, sucumbo...’” (BARTHES, 1990, p. 7-9). O enamorado fala por figuras, cenas, referências artísticas, entre as quais uma das que mais me tocou foi a do jovem Werther, clássico personagem de Goethe e do romantismo, que se mata por um amor não correspondido. Seria o meu corpo de jovem tímido, protoimagem gay antes da revolução sexual, educado no fim da ditadura militar, contemporâneo de Werther?
Mas de quem o sujeito dos fragmentos do Discurso Amoroso estava enamorado? Poderia ser qualquer pessoa, em várias situações? De todo modo, o amado não responde, apenas o amante fala. Essa é outra dimensão da solidão que Barthes vê no amor. Nascido em 1915, o autorlança esse livro em 1977, aos 62 anos, três anos antes de sua morte precoce e inesperada. Mas porque Barthes se encontrou na velhice com o jovem Werther, com seu corpo jovem desejado, com seu corpo morto? “Ser contemporâneo significa [...]voltar a um presente que jamais vivemos” (AGAMBEN, 2009, p. 70)? E quanto a Lúcio Cardoso?
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Lúcio Cardoso nasce três anos antes de Barthes, em 1912, e morre em 1968, aos 56 anos, depois de passar seis anos com grande dificuldade de falar e de se locomover decorrente de um derrame cerebral que teve aos 50 anos, em 1962. Seu diário pode decepcionar, num primeiro momento, aos que procuram mais revelações íntimas, mas há uma constatação:
Às vezes, relendo essas desordenadas notas que escrevo ao sabor da inspiração, sinto a tristeza de supor tudo isto apenas um eco da minha solidão. E serão realmente sonhos, deformações de um homem que se sente irremediavelmente - por que castigo, por que privilégio? - fora do tempo? (CARDOSO, 2012, p. 255).
Esse pertencer não pertencendo ao seu tempo marca uma particularidade da experiência não só de Lúcio, mas de Barthes. Esse não pertencer, no caso de Lúcio, pode ser associado ao que diz, mais de uma vez: os fatos que não lhe interessam no diário, sobretudo os íntimos (CARDOSO, 2012, p. 244). Assim ele comenta:
Poderia citar fatos: estive com X, formos ao cinema, depois jantamos.Mas são estas coisas, exatamente, as que devem figurar aqui nestas páginas? Ou, ao contrário, devem elas cair no esquecimento? Prefiro o sentimento que me causaram, e se algum houve digno de nota, este é que deve figurar aqui, ainda que seja expresso numa linguagem capenga e só corresponda a uma parcela reduzida da verdade. (CARDOSO, 2012, p. 266).
Assim, seria o diário um espaço de experimentação para as várias formas de escrita em primeira pessoa (memória, depoimento, carta, confissão, além do próprio diário) que Lúcio usará em seu romance mais importante, Crônica da casa assassinada (1959), como para Barthes poderia ter sido em direção a seu romance nunca escrito?
Sem dúvida, o ideal como “diário” não é um processo constante de autoanálise - convenhamos que nem sempre há dentro de nós grandes novidades, já somos tão conhecidos - e sim alguma coisa que participe da invenção. Gênero híbrido, a ser tentado. (CARDOSO, 2012, p. 270).
Estabelecendo uma distinção, mesmo num diário a ser publicado, ao manter uma dimensão bruta, incerta, dispersa, confusa na escrita e sobre si:
Recopio o primeiro volume do meu Diário com grande morosidade, sentindo que envelheci, que minhas ideias mudaram. É difícil resistir à tentação de intervir, de reformar tudo - mas então já não seria um Diário e sim uma obra composta, um livro de ensaios. (CARDOSO, 2012, p. 380).
Nesse sentido, há uma busca de uma invenção que considero como um momento enigmático:
Alguém, há tempos, achou esquisito que eu afirmasse não ser um escritor, e sim uma atmosfera. Há dias em que me sinto um personagem, e não eu mesmo. Alguém está contando uma história em que sou um dos acessórios. Só me reconheço, só encontro de autenticamente meu, a obstinação com que levo esse ser imaginado a costear todas as rampas do precipício. (CARDOSO, 2012, p. 274).
Por um lado, ele formula uma proposta ao defender a atmosfera que foge do recurso mais comum a certa linhagem em que se inseriu de uma introspecção psicológica que ainda mantém um pé no século XIX. Desconheço a utilização da palavra atmosfera nesse momento, embora o termo tenha ganho peso, para além da literatura, no cinema e no teatro, em busca de uma criação em que o enredo se dilui em favor do espaço, da iluminação, do som, das cores, dos objetos. O que abre uma outra leitura também para sua Crônica para além do que possa ter de folhetinesco, melodramático, artificioso, barroco, camp. Por outro lado, também é importante afirmar que esse diário se diferencia de propostas autoficcionais que ganharam tanto interesse nas últimas décadas. Se há alguma verdade, ela nunca decorre da autenticidade da experiência, mas da força da ficção que amalgama vida e obra.
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Lúcio se refere, em outro trecho, a uma biografia de Samuel Johnson, no século XVIII: “Os papéis de Boswell com o sugestivo título Amores em Londres. Páginas e páginas sem nenhum interesse. Que se viva isto, vá lá, para quem tem o gosto, mas que se anote...” (CARDOSO, 2012, p. 404). E reforça de forma enfática: “A questão sexual, por exemplo, que alguns leitores provavelmente reclamariam, que adiantaria estampá-la, destituída de força, apenas para catalogar pequenas misérias sem calor e sem necessidade?” (CARDOSO, 2012, p. 358). Se não há aqui um discurso ativista do coming out, as relações sexuais e afetivas não deixam de ter um papel importante no diário. Seria uma explicação fácil considerar essa posição uma resposta de um escritor de certo reconhecimento público em que a exposição da sexualidade, em particular da homossexualidade, num diário destinado a ser publicado, a exposição da sexualidade poderia ter um custo alto em termos de carreira e reconhecimento nos anos 1950 e mesmo nos anos 1960. Há uma peculiar defesa do segredo, que poderia ser considerado como sinônimo do armário, forma de não falar, em público, da sexualidade nem politizá-la, mas que também é um outro registro de fala, uma outra forma de resgatar o que seria chamado negativamente de silêncio e invisibilidade: “Tudo o que é definitivo em nós, o que equivale a dizer o mais importante, no segredo é o que se concebe” (CARDOSO, 2012, p. 198). O segredo não é algo oculto que não se quer ou não se pode revelar, mas algo misterioso que compõe as relações e natureza dos afetos:
Nada é mais enigmático do que aquilo que aproxima e separa os seres; não falo, é claro, do amor, amizade ou qualquer outro sentimento catalogável [...] há um diálogo subterrâneo, que se manifesta sem cessar, e que nos transforma neste mundo, em tentos de uma partida jogada no invisível. (CARDOSO, 2012, p. 321).
Não há nenhuma relação apresentada na sua cotidianidade, sejam amigos, sejam anônimos, são sempre encontros fortuitos. E o que ele leva para si dessa experiência que tira a família do centro e assume os riscos dessa deriva afetiva: “Deixar cair no esmorecimento o excesso de relações que um oprime. As obrigações que viam são tolas e inúteis, e eu cada vez tenho mais necessidade de tempo, de todo o meu tempo” (CARDOSO, 2012). Ou quando usa X, ou para aqueles que nem merecem ser nomeados por X, parece que pode ser entendido como intencional para não revelar alguém íntimo, alguém amado, desejado, com quem manteve alguma relação, em particular do mesmo sexo:
Ontem, num bar com Vito Pentagna, conversamos longamente sobre X. Talvez eu tenha exagerado os meus sentimentos, mas hoje, procurando examinar com atenção o que se passa comigo, sinto que não tenho muito o que discordar do que disse: mais ou menos os meus sentimentos permanecem os mesmos. Não sei o que mais lamentar - mas nesta fidelidade, apesar de tudo, encontro uma garantia contra as minhas tendências à desordem e à dispersão. É pelo menos o que recolho de melhor nesta pesada prova que já tem a duração de dois anos. (CARDOSO, 2012, p. 370).
E ainda:
Saber distanciar-se é uma arte tão grande quanto a de saber aproximar-se. Nunca temos qualidade suficiente para a quantidade de amor que exigimos. Amar, sim - mas sempre que exigimos retribuição há, no fundo, uma espécie de chantagem. É como querer exigir de alguém que pague[,] como de primeira, mercadoria de segunda classe. (Mas, quem sabe, é que talvez a mercadoria de primeira classe não exist[a].). (CARDOSO, 2012, p. 464).
Assim, a palavra homossexualismo, talvez pelo seu valor historicamente negativo, aparece só sob o respaldo de uma citação de Montherlant, que não à toa fez do segredo um espaço de encenação mas que evoca aqui e curiosamente um esforço de naturalização diversa do que aparece nas narrativas de Lúcio, inadequado, sempre marcado pelo excesso, pela desmesura, pelo ilegal, pelo artifício
Montherlant diz - e não pode haver testemunho mais insuspeito - que o homossexualismo é “a própria natureza”. No que tem razão, pois no ato de duas pessoas do mesmo sexo se unirem, há um esforço da natureza para se realizar até mesmo sem os meios adequados. (CARDOSO, 2012, p. 463).
Mas apesar disso há um curioso embate que por vezes invade a escrita, por vezes a ela se opõe: “Rolo na cama, sem sono, levanto-me, abro a janela - o mar no escuro. Persegue-me o sentimento de uma obra que não foi feita. Quando enfim serei inteiramente eu mesmo, a ponto de preferir meu trabalho às minhas inclinações?” (CARDOSO, 2012, p. 415). Se ainda é aceitável historicamente que só em 1926 um escritor do porte de Gide em Se o grão não morre (1982) se declare homossexual, estamos mais do que numa margem além do negativo (clichê, estereótipo) e do positivo (integrado, assimilacionista, politicamente correto, bem comportado, trans-lesbo-homonormativo), a escrita antes e depois se faz num território selvagem (HALBERTSAM, 2020, p. 268), de várias formas, entre elas de exploração aquém e além da invisibilidade, do silêncio, da criminalização e da monstruosidade.
Também a palavra travesti aparece num fragmento inacabado cuja página onde teria sido continuado, segundo o editor do diário, foi arrancada (CARDOSO, 2012, p. 482). O que nos dá o grau da dificuldade de falar e dizer certas palavras. O que não é necessariamente um problema porque aí tento procurar como o autor diz o que quer e como quer. E ele diz: “Estranho dom: Deus deu-me todos os sexos” (CARDOSO, 2012, p. 506). Curiosamente aflora uma autoimagem próxima da monstruosidade do personagem Timóteo de Crônica, inserida dentro de uma linhagem queer, travesti, hoje, trans não binária e pós-humana:
Comparei-me com alguém que arrastasse após si um imenso manto de seda escarlate, comparo-me agora a um monstro rugoso e estranho, com cem antenas e um casco imemorial de cor verde; qualquer coisa monumental e exótica que reinaugurasse o medo como um elemento de enxofre e de depuração. (CARDOSO, 2012, p. 412).
“Só uma coisa importa: sermos totalmente aquele que nos imaginamos” (CARDOSO, 2012, p. 437) mesmo, e sobretudo, se essa imagem não for a que os outros têm de nós, o que pode levar a um isolamento causado tanto por certa incompreensão do nosso lugar no mundo como também por aquilo que pode ser, mesmo contra tudo, contra todos, aquilo que possibilite a criação.
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O que interessa a Lúcio, num sentido mais amplo, é mais o extraordinário do que o ordinário (DAMASCENO, 2012, p. 18), não é o relato dia a dia do calendário, do comum, mas de uma vertigem em que o vivido, o imaginado e o desejado se misturam numa sede de viver experiências múltiplas e diversas, sem temer a quebra de normas, leis, o desregramento, o excesso (CARDOSO, 2012, p. 211-212).
Há um mergulho na vertigem do desejo que vai de encontro ao desejo de fugir da vida boêmia para que possa se dedicar à escrita, à constituição de uma obra (CARDOSO, 2012, p. 408). Vida boêmia da qual faz parte e que é alvo de crítica ferina (CARDOSO, 2012, p. 376). Sem que isso implique uma volta à família - “Aniversário de minha mãe. Amigos e parentes reunidos. E as mesmas conversas de sempre, os mesmos risos, enquanto silencioso o tempo trabalha e desfaz nos rostos a chama da mocidade” (CARDOSO, 2012, p. 244). Surge um cansaço - “Cansaço de que as coisas ainda existam porque não têm por onde acabar - cansaço simplesmente. Nada nos pesa mais do que os sentimentos que se tornaram hábitos” (CARDOSO, 2012, p. 274) -, desejo de fugir do Rio de Janeiro - “A verdade é que me sinto saturado da cidade, da vida da cidade, do seu tédio rumoroso e cor de asfalto” (CARDOSO, 2012, p. 381) - para pequenas cidades do interior, por onde realiza várias viagens: por Valença, onde encontra seu amigo Vito Pentagna e o faz lembrar da infância, suas violetas, violetas que deixa nas mãos de Vito quando ele morre um ano antes de Crônica ser publicada, como Timóteo fizera com Nina; por Barra do Piraí, que parece traduzir mais a imagem da futura Vila Velha de Crônica. Ele chega mesmo a comprar um pequeno sítio envelhecido em Rio Bonito.
Vertigem que, por vezes, no diário, na vida, fica tolhida pelo que há de projetado e autoconsciente em demasia, do mundo das leituras, dos pensamentos, das sensações, por vezes da necessidade de escrever - “Escrever, imaginar - esse velho jogo de feitiçaria, que é no mundo a única coisa realmente importante para mim” (CARDOSO, 2012, p. 199) - e da dificuldade de criar.
Como parece não ter desenvolvido muito uma veia crítica,da qual os rápidos comentários em sua coluna curiosamente chamada de “Diário não íntimo” no jornal A noite entre 1956 e 1957 são uma confirmação, seria o diário uma forma de intervenção nos debates de seu tempo ou um desejo de comunicação, que é também de partilha, para além de conhecidos que parecem ter lido o diário antes de publicado, algo parecido quando fazemos confissões hoje nas páginas das redes sociais em que o risco ou desejo de espetacularização de si paira?
Não sendo um escritor-crítico, não deixa de ter opiniões sobre o que leu, como uma forma de buscar o seu lugar. Sua visão se dá partir de uma perspectiva estética e ética do escrever: “É difícil explicar: literatura para mim não é fábula, mas uma condição de vida” (CARDOSO, 2012, p. 492).
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No Diário II, aumentam também as referências a encontros com escritores e amigos como Walmir Ayala, Augusto Frederico Schmidt, Adonias Filho, Octavio Faria, Mário Peixoto, Marcos Konder Reis, Roberto Burle Marx, Athos Bulcão, Rachel de Queiroz, vários católicos e/ou homossexuais, mas a amizade parece desde cedo não satisfazê-lo, sendo que no caso de alguns volta uma imagem de decadência como em Alberto Cavalcanti (CARDOSO, 2012, p. 365) ou Vinicius de Moraes (CARDOSO, 2012, p. 366-367).
De que modo perdemos os outros, como os contatos que se mostravam tão estreitos, agora empalidecem e se desfazem... Não somos iguais, não sentimos como sempre? Que murchou, que luz se fechou inesperada dentro de nós, que magia perdemos no esforço da amizade? Não, jamais encontraremos a resposta, só uma verdade: de repente somente cadáveres nos rodeiam. (CARDOSO, 2012, p. 200).
A ruptura da amizade com Rachel de Queiroz aparece como representativa da forma como estragou “tudo o que havia de bom na minha vida” bem como do remorso (CARDOSO, 2012, p. 341). Mas há uma visão da perda da amizade que leva a uma outra dimensão: “A ilusão da amizade, como a ilusão de tudo mais. No entanto, há um momento em que a solidão não dói, que é mesmo a única dignidade possível. Não perdemos os amigos, readquirimos a nós mesmos” (CARDOSO, 2012, p. 451). Numa percepção muito atual, quase a dizer espelho, espelho meu, quem tem a dor maior do que a minha: “Rememoro coisas que tenho perdido. Meu Deus, haveria outro que igual a mim houvesse largado tanta coisa no mundo?” (CARDOSO, 2012, p. 404). Mas, sem certa dose de narcisismo e autocentramento, nenhuma aposta de arte e criação emerge diante de tudo que lhe pode impedir. Ou, ainda, reconhece na solidão algo necessário para a própria constituição do artista:
Além de tudo, além de todos os inimigos que temos a vencer - o mundo, a sociedade, os amigos, as facilidades, os bares, o dinheiro, o conforto e as palavras fáceis - o que mais duramente temos a combater somos nós mesmos., O talento é uma conquista como outra qualquer. E toda a marcha para o talento é uma conquista solitária. Somos nós mesmos, autênticos, quando formos, integralmente a nossa solidão. (CARDOSO, 2012, p. 394).
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Diferente de Foucault (1981) - que aposta na homossexualidade centrada na amizade tanto como possibilidade de reinvenção das relações quanto como modo de vida distinto do amor romântico, dos contratos do casamento, do sexo rei -, o amor de Barthes, especialmente pelos rapazes, é explicitado, como uma impossibilidade, em Noites de Paris3, diário feito entre 25 de agosto e 17 de setembro de 1979, publicado em Incidentes (BARTHES, 1987). Livro póstumo, recebido, quando lançado, como uma espécie de coming out de Barthes na imprensa, cuja reserva foi criticada por intelectuais marcados por certa visão ativista, como por D. A. Miller (1992), mas que ganha uma visão mais nuançada por Nicholas de Villiers (2012), que pensa a opacidade como forma de reavaliar o que poderíamos chamar do armário, invisibilidade ou silêncio de Barthes sobre sua homossexualidade e, ao mesmo tempo, como uma resposta estética, recuperando o artigo “La vie posthume de Roland Barthes” (1991), em que Éric Marty elabora uma importante crítica daqueles que interpretaram Incidentes,em particular as Noites de Paris, como um “diário íntimo” confessional dos segredos de seu autor. Marty argumenta que eles perdem a dimensão literária do trabalho (o uso cuidadoso do itálico, de reticências etc.), seu senso cruel de ironia, e o fato de que o assunto do diário não é o “eu” de Roland Barthes (o sujeito da introspecção, do autoconhecimento) mas o único herói é o próprio tempo, a passagem cotidiana das noitadas (apud VILLIERS, 2012, p. 71).
Os aspectos literários de Noites de Paris podem ampliar o sentido de uma confissão centrada na transparência do eu, sobretudo hoje, quando a figura do autor se firma tanto midiaticamente quanto nas formas que valorizam a primeira pessoa em que cada vez mais se misturam sujeito que narra, autor que assina o texto, pessoa que fala sobre o texto escrito. Nesse sentido, há que se perceber que o perambular de Barthes por Paris é fortemente erótico apesar de terminar a noite só, lendo na cama, com exceção do último dia. Se a amizade aparece nos jantares, a cidade é tomada por jovens que seus olhos insistem em olhar, com quem, por vezes, conversa. No debate sobre um livro de Richard Sennett, o único compromisso intelectual e público mencionado, Barthes só pensa em encontrar Olivier, apresentado quase no fim do diário. Quando, dias depois, em 17 de setembro de 1979, poucos meses antes de sua morte, se não é um grand finale como o de Timóteo em Crônica da casa assassinada diante do vislumbre de André, que o confunde com o jardineiro Alberto, é com Olivier que o diário se encerra:
Toquei um pouco de piano para O., a seu pedido, sabendo desde então que tinha renunciado a ele; ele tinha belíssimos olhos, e seu rosto suave, suavizados por seus longos cabelos: um ser delicado mais inacessível e enigmático, ao mesmo tempo, suave e distante. Depois o mandei embora, dizendo que tinha de trabalhar, sabendo que estava acabado, e que para além dele alguma coisa estava acabada: o amor de um rapaz. (BARTHES, 1987, p. 87-88).
Mais do que um desencanto pela passagem do tempo, pela perda de se sentir desejado, que também Lúcio Cardoso encontrava na “cruel luz da gente moça” (CARDOSO, 2012, p. 432), há um último desejo de Barthes, já expresso em Sade, Fourier e Loyola: “Se eu fosse um escritor, e morto, como eu amaria se minha vida... pudesse...vir a tocar... algum corpo futuro...” (apud GALLOP, 2011, p. 1 - tradução minha). Essa fala cautelosa iniciada no condicional aponta, ao mesmo tempo, para uma escrita póstuma, para um desejo póstumo. Podem a escrita, a leitura fazer viver esses autores e corpos no presente, produzindo encontros fugazes na linhagem dos celibatários e distintos das relações estáveis, do casamento tanto quanto dos encontros românticos?
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Aqueles por quem Lúcio demonstrou certa atração são mencionados, em geral, por termos neutros (alguém, pessoa), mas há, pelo menos, duas exceções. Primeira: numa conversa pensa alto se referindo ao ator de A mulher de longe, seu filme não concluído4, Luis Fernando, em que se estabelece um contraponto:
[...] não existia, estou certo, esta indecisão e esta procura de caminho, que, afinal pode muito bem ser uma forma de se enriquecer como qualquer outra. Não, eu vivia cheio de erros e de obscuridade - mas não existia em mim nenhuma dúvida. Sempre me senti talhado como num bloco de pedra. Já sabia, como sempre o soubera, o que pretendia. Cegamente marchava para o meu destino, insubmisso, feroz, atormentado e solitário. (CARDOSO, 2012, p. 210).
A segunda: quando fala serefere a T.:
T. possui dezoito anos, tez pálida, cabelos muito pretos e olhos intensamente azuis. Olhos que vivem nesta face com a melodia agreste dos felinos. Quando o conheci, surpreendeu-me a força que manifestava, calada e secreta. Fugiu de casa, agrediu algumas pessoas, roubou perto de trezentos mil cruzeiros, foi condenado e eu o revi, mais tarde, na penitenciária, numa visita que fiz àquela casa. Não trocamos palavra, ele trabalhava na seção de consertos de rádio e eu o reconheci imediatamente, pela extraordinária particularidade de seus olhos agudos, vigilantes, se bem que tivesse crescido muito e guardasse em todos os gestos um jeito novo de defesa (Lembrei-me particularmente de um dia de carnaval, quando me levou à casa onde então morava, um sórdido barracão, em companhia de um preto que ele espancava continuamente. Embriagou-se nesta noite e quebrou todos os móveis que existiam lá dentro. Eu o contemplava, cheio de admiração). Agora acaba de fugir pelos esgotos da prisão, onde esteve durante dezoito horas, emergindo rasgado, mordido pelos insetos e coberto de lama, num dos bueiros da cidade. Preso de novo, declarou aos jornais que não suporta a monotonia da vida. E eu me lembro mais uma vez daqueles olhos sem repouso, autoritários, capazes de todos os extremos, que tentei evocar numa peça que nunca saiu da gaveta, intitulada Olhos de gato. O que ousei pensar, decerto fica muito aquém da realidade. Ó grande Deus, equívoco da paixão e do crime. (CARDOSO, 2012, p. 259).
Se no encontro com o jovem ator há diálogo, mas não encantamento, até certa decepção, pelo jovem criminoso há mais do que fascínio. Não há diálogo, mas um arrebatamento que o leva à prisão e onde o rapaz morava, numa mistura genetiana de violência, humilhação, crime e desejo, e a vida o coloca num lugar de espectador momentâneo e próximo, sempre espectador? O que o diário não diz foi o limite da vida ou da revelação pela escrita? O que foi desejado no outro, pelo outro não deixa de ser um desejo de si, para si?
Num outro momento, aparece, o que é raro, num crime cometido por “jovens sem escrúpulos”, atraído por um “velho sem escrúpulos” (CARDOSO, 2012, p. 250) marcado por “uma fraqueza sombria, mole, efeminada, que se dilui através dos gestos e das palavras embebidas em morna capciosidade”, sendo esta uma imagem temida como um possível futuro, como quando Gustav von Aschenbach em Morte em Veneza, de Thomas Mann (2001) e filmado por Visconti (1971), recusa com asco o velho dândi, maquiado, que o saúda na chegada a Veneza, filme no qual ele se transformará tomado pelo amor por Tadzio.
O crime também é tirado de uma vida marginal que fascina Lúcio Cardoso (2012, p. 221), também sob a herança de Dostoievski que marcou tantos escritores de sua geração: “o modo pelo qual matamos as pessoas, repito, é pela simples forma com que recusamos seu pedido à vida. Sabemos que elas se sentem à margem e que necessitam daquela confirmação de existência. Mas nossos lábios se fecham e o silêncio consuma o crime” (CARDOSO, 2012, p. 321). Contudo, quando relata o caso do estrangulamento de um velho na Praça da República por jovens estudantes de classe média (CARDOSO, 2012, p. 219-220), identifica uma recorrência que lembra o que se chama hoje de crimes de ódio homofóbico, que cria um contraponto ao que apontei antes, ao fascínio pelo crime feito por pessoas à margem da sociedade.
Com a passagem do tempo, a recusa do sexo chega a ser afirmada como dado da escrita, quando Lúcio se diferencia de seu amigo Octavio de Faria: “A obsessão do sexo, em Octávio de Faria, é uma ressonância do passado, um eco infantil, do qual ele não conseguiu se libertar” (CARDOSO, 2012, p. 482). O que parece fazer sentido junto com certa fuga da sexualidade, da nomeação de encontros. Embora haja um medo enunciado num outro jogo de espelhos:
Ontem à noite, quando regressava ao hotel, encontrei na rua um velho conhecido, que ocupa suas horas mais calmas escrevendo críticas musicais para um jornal. As outras, as que sobram para seu desvario, gasta-as agitando no mesmo instrumento a solidão e o álcool. Estava pois completamente embriagado e fazia-se acompanhar de um soldado, também alcoolizado. Ao me ver, pôs-se a gritar como um louco: “Você fez muito mal em ter vindo aqui, você não me conhece, eu me chamo Antônio.” E depois, mais calmo, como se estabelecesse de súbito uma espécie de cumplicidade, começou a me chamar de João, insistindo em que não devia ter aparecido. Todo seu aspecto era tão decadente - lembrei-me de várias pessoas que conheci, atacadas do mesmo “mal” e que, com o correr do tempo, assumiram idêntico aspecto de degradação e miséria - que me fez pensar no surdo trabalho da carne, tão continuamente semelhante na sua enorme profundeza, e que aos poucos substitui o que era mais nobre, mais límpido, mais humano, nessa incrível máscara já sem nome que ontem tive a tristeza de contemplar. (CARDOSO, 2012, p. 191).
Mais do que um horizonte existencial temido, o sexo, aquém do amor (CARDOSO, 2012, p. 231), longe de liberador, que ele chama de carne, “é inútil, impossível é contentar-nos com tão pouco. O único caminho é ser casto, ante a sensação de pobreza que a posse física nos transmite” (CARDOSO, 2012, p. 203). “Aproveito todas as aquisições da idade: afasto-me da carne pura e simples, sentindo que nela não há prazer e nem enriquecimento, mas somente melancolia e pobreza” (CARDOSO, 2012, p. 413). Parece mesmo uma mudança de perspectiva: “É que o prazer não me interessa. Sempre o que me interessou foi o amor, e agora que vejo perder a possibilidade dele (ai de mim), sinto que não me interesso por outra coisa, e que o prazer sozinho não vale nada e não tem atrativos para mim” (CARDOSO, 2012, p. 416-417). Há mesmo certa sensação de remorso sobre o passado já indicada que volta: “Acredito que aquilo que mais se paga no outro mundo, não são os crimes, nem as traições, nem as bruscas deslealdades - mas os amores, as amizades, os entusiasmos recebidos com desdém” (CARDOSO, 2012, p. 418). Remorsos que vêm junto com uma sensação de apaziguamento que ele chama de amadurecimento (CARDOSO, 2012, p. 419) ou mesmo de impossibilidade porque não há desejos satisfeitos (CARDOSO, 2012, p. 425) nem o amor. O que não parece ser uma adesão a qualquer tipo de puritanismo que critica em Julian Green (CARDOSO, 2012, p. 194) mas que poderia receber a crítica ao discurso moralista que o pianista vê em seu amigo Gustav von Aschenbach no filme de Visconti (1971): “Você nunca teve castidade. Castidade é um presente da pureza, não o resultado doloroso da velhice. E você está velho, Gustav. E em todo o mundo, não há impureza mais impura do que a velhice”.
Lembrando Tadzio, André/Alberto é a figura fantasmagórica que fascina e perturba vários personagens de Crônica, que acaba por fugir da casa e que assume uma outra imagem para Lúcio Cardoso, num sonho que teve numa viagem a Recife depois de um encontro com Alberto Cavalcanti:
Durante a noite, insone, levantei-me e escrevi mais um capítulo da Crônica. Voltei a dormir, um sono extremamente agitado. Sonhei com mortes e cadáveres. Havia um belo rapaz morto e seu corpo era conduzido por um desses antigos carros de defunto que tanto vi em minha infância, num caixão aberto. Vi a cabeça, de belos cabelos cacheados, oscilando ao passo dos cavalos. Eu estava no adro de uma igreja e, antes de parar, o carro girou em torno de mim por duas vezes. Na segunda, como passasse mais perto, vi o morto, distintamente, mover um dedo. (CARDOSO, 2012, p. 407).
Há uma história de jovens mortos que atravessam tempos e que são eles mesmos desejos. Ou o que resta é uma breve intensidade: “E se não sugamos a alma, se não morremos desse beijo, o que temos entre nossas mãos, por cinco minutos, é um cadáver”, paixão cujo único destino é a memória (CARDOSO, 2012, p. 203; p. 207): “Ontem a esta hora, X estava aqui e eu sentia a casa inteira cheia de sua presença.Mas o que é ontem? Somos, cega e deploravelmente, apenas hoje, apenas o que nos vive” (CARDOSO, 2012, p. 216). Ou como fala, citando Balzac: “Uma noite de amor é um livro a menos” (CARDOSO, 2012, p. 408).
Essa fugacidade do tempo e dos afetos, em particular, do amor, Lúcio encontra no diário sob uma forma que não se quer confessional, mas que é centrada numa experiência particular embora a ela não se restrinja. Que importa quem fala? E, caso ele fale, quem o ouvirá? Ao chavão que toda fala é situada, localizada social e historicamente e que um autor situado em alguma margem deve falar e tem um dever ético e político de falar sobretudo de si mesmo encontra Lúcio Cardoso num mal-estar:
Não sei quem inventou o diário íntimo, que alma tocada pela danação, pelo desespero do efêmero - sei apenas que[,] relendo páginas de meses atrás, senti-me de repente com o coração tão pesado que não pude continuar. Ah, como mudamos e como mudamos depressa! Como perdemos tudo, como os sentimentos mais fortes se dissolvem, como a vida é um contínuo e tremendo aniquilamento! Ah, como compreendo, sinto e vejo os meus desastres, os meus erros, os meus enganos! Como é triste essa dor de não poder viver coisa alguma, como é horrível ter perdido tanto, e como agora me sinto - e sempre, e cada vez mais - desamparado e triste. (CARDOSO, 2012, p. 242-243).
O que acaba é visto como uma perda que revela muito de si ao não reconhecer a importância das pessoas próximas, ao não nomear o amor, o amado: “Julgo-me muito mais frio do que sou, e na verdade a ausência das pessoas me causa uma profunda perturbação (Sei que despisto, que não me refiro exatamente ao que devo - porque ao certo, era de X., era da sua ausência que devia falar...)”, sendo o amor “uma alucinação perfeita, um estado de transe e de obsessão” (CARDOSO, 2012, p. 247; p. 250) ou algo passageiro destinado a, no máximo, algumas boas lembranças.. Por fim, a dificuldade do amor, do falar o amor decorre de sua própria importância: “Jamais poderei dizer do meu amor, da curiosa paixão que a face humana sempre me despertou. E foi esse amor que me fez atravessar todas as veredas, onde tantas vezes vi fulgurar a luz crua da destruição” (CARDOSO, 2012, p. 359).
Se há algo de queer nos diários de Lúcio Cardoso está não no prazer mas no terror e na catástrofe, como pensando perambulando entediado pela Cinelândia de noite: “No fundo do coração é a catástrofe que chamamos. Ninguém suporta a horrível monotonia da vida - e para quem quiser sentir, não sei que trágico acontecimento, que revolução já ergue no horizonte seu estandarte de sangue” (CARDOSO, 2012, p. 382). É difícil imaginar esta revolução. Não seria uma luta coletiva, mas aceitar uma solidão que é também no trabalho, na escrita, no quarto de hotel onde morou, lembrando muito das figuras solitárias das gravuras de Goeldi. Uma revolução a partir de uma multidão de solitários?
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Se, em Noites de Paris, a solidão se dá tanto nas ruas, mesmo nos encontros, e na volta para casa, no diário de Lúcio Cardoso, acontece uma outra recorrência:
[...] sete horas da noite: aos domingos, atualmente, é a hora em que me sinto mais sozinho. Inútil disfarçar: escorreguei fora das engrenagens. Devo ter envelhecido bastante, as pessoas já não se interessam mais por mim. Ou são elas que tomaram o partido de viver diferente, enquanto é tempo? Olho os amigos que se despedem com o coração transido. (CARDOSO, 2012, p. 374).
Por isso parece quase uma conquista quando ele consegue sentir uma inefável felicidade de estar sozinho no domingo (CARDOSO, 2012, p. 416). Ou seria mais uma fantasia momentânea diante da solidão cotidiana e avassaladora ou uma pose (MILLER, 1992, p. 57) final? Domingos que no futuro vão trazer desafios parecidos a tantos de nós, que não temos almoços de família, missa ou culto, jogo de futebol nem assistimos a TV, sem saber o que fazer quando o dia acaba, antes que a semana de trabalho comece, quando pela janela vemos televisões ligadas, num silêncio, às vezes, interrompido por brigas e raras festas.
Para além de uma possível complacência diante do fracasso do amor ou do clichê da bicha velha triste, mudando de perspectiva, haveria uma leitura (queer) que deseje o autor agora morto numa melancolia inevitável do leitor? Mas seria mesmo desejo, como por um personagem de romance ou corpo morto, ou admiração, respeito?
O diário de Barthes publicado postumamente diz o fracasso de escrever um romance como ele aparentemente desejava, embora ele mesmo fosse uma forma de outra escrita, da mesma maneira que o fracasso do amor pelos rapazes gerou uma forma de vida bruscamente interrompida pela morte. Já o Diário I de Lúcio Cardoso (1949-1951), publicado em 1960, um ano depois da Crônica da casa assassinada e dois anos antes do derrame cerebral que o impossibilitou de escrever um novo romance e concluir O viajante, restando-lhe frases soltas e os quadros que consegue pintar com a mão esquerda (DAMASCENO, 2012), remete mais do que a um fracasso afetivo, artístico, mesmo ao fracasso como forma de vida, mas também ao diário como impossibilidade da experiência ser narrada e compartilhada:
Se passo a vista nalgumas folhas deste caderno, sinto que deslizei sem atingir coisa alguma - que nada foi tocado em profundidade. Melhor fora então que em vez de anotar sentimentos que me ocorrem, apenas arrolasse fatos, como tantos o fazem. Pelo menos não teria, como o tenho neste minuto, a sensação de uma coisa frustrada, pois o puro vazio das páginas escritas corresponderia perfeitamente ao puro vazio das minhas intenções. (CARDOSO, 2012, p. 351).
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É surpreendente, para os parâmetros de hoje, ver como Lúcio se aproximando dos 50 anos fala com insistência da velhice futura que se faz presente, como uma forma de sentir e estar no mundo associada ao desinteresse, à fraqueza, à dificuldade do desapego (CARDOSO, 2012, p. 383-384). Por fim, em 1959, aos 47 anos, no ano em que lançou Crônica, ele fala de forma bem explícita:
Faço as contas, imagino: no máximo, quantos anos viverei ainda? Se tiver sorte, se escapar ao câncer, ao enfarte, à cirrose, à angina, à diabetes e outros males menores - vinte anos. Nem creio ser necessário viver muito além dos sessenta. Mas nesses vinte anos que possivelmente me restam a viver, posso condensar mais esforço, mais trabalho, mais realização do que o já condensado em todo o tempo decorrido... (CARDOSO, 2012, p. 476).
Sem saber, naturalmente, que em 1961, teria o derrame que o impossibilitaria de escrever qualquer romance, conto, poema até sua morte em 1968, aos 56 anos. Seria então só o espectro da velhice a causa de tantas impossibilidades, ou a própria precariedade da vida de um artista sem herança, sem trabalho estável, de um temperamento boêmio e desejoso de encontros? Também seria importante associar essa sensação de velhice não só a uma atração por rapazes mas também a certa falta de reconhecimento de seu trabalho num momento intermediário de sua carreira, diante da qual o diário a ser publicado tem um papel de encenar uma solidão do poeta (CARDOSO, 2012, p. 440) que é também intelectual,em meio à vida boêmia e à presença nos jornais, isto é, se o que cada vez vai mais importar numa cultura midiática não é mais só a escrita, a obra, mas uma persona pública construída por entrevistas, aparições - “Acredito que muitas vezes costumo inventar um segundo ‘eu’ mais legendário do que outra coisa - e é estranho que surpreenda este outro vivendo quase sempre com mais intensidade do que eu mesmo...” (CARDOSO, 2012, p. 371):
Quando somos novos, e escrevemos avaramente os nossos papéis, imaginamos que todo mundo tem os olhos voltados para nossas atividades e que coisa alguma passa despercebida aos olhos do público; depois amadurecemos, e começamos a desconfiar que muito pouca gente se interessa pelos nossos gestos. Contamos e recontamos os prováveis leitores: talvez meia dúzia. E no fim de tudo, sem grande interesse, constatamos que ninguém nos lê; foi tudo uma cegueira da mocidade. É que as pessoas que lêem ou se interessam pela literatura estão tão ocupadas consigo mesmas que não têm tempo de prestar atenção nos outros. (CARDOSO, 2012, p. 185-186).
Situação que também se insere numa situação existencial:
Envelhecer é talvez abandonar o geral para um particular que se faz cada vez mais eminente; quando moços, participamos de tudo, à medida que envelhecemos nos cingimos a um terreno cada vez mais solitário, até o ápice, a definitiva solidão, que é a morte. (CARDOSO, 2012, p. 407).
Ainda mais do que uma condição etária a que se pertence e participa de um horizonte comum, uma percepção de si, que parece como forma de estar no mundo constituindo mais uma paisagem que se soma às cidades envelhecidas e às praias escuras:
Envelheço como as tempestades - encaminhando-me sem ressentimento para as cores alvas da bonança. Perco os meus relâmpagos e as minhas violências - entrego-me à luz que nasce, humilde e de cabeça baixa. Mas dos céus revoltos por onde andei, conservo o segredo de uma melodia que não é feita somente de paz, mas que na sua última aquiescência, relembra ainda o amontoado negro das paisagens devastadas. (CARDOSO, 2012, p. 249).
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Em meio à insatisfação com a precariedade da vida profissional e sua obra literária, a morte é onipresente - “Não foram apenas todos os sexos que Deus me deu: também todas as formas de morrer” (CARDOSO, 2012, p. 506) - e transita de uma forma um tanto abstrata no Diário I para assumir uma dimensão mais concreta no Diário II a partir da morte de sua mãe, do amigo Vito Pentagna, inspirador do personagem Timóteo da Crônica da casa assassinada, de Cornelio Penna, o escritor brasileiro vivo de maior importância para ele, de Walmir Ayala. Morte e desejo se misturam em cena de gosto genetiano:
Um soldado, no bar, lava as mãos junto a mim, enquanto a boca do esgoto suga a água com avidez. Vejo o revólver que traz à cintura, ao alcance apenas de um gesto. (Ah, quantas vezes sonhei a morte, escura e derramada, nesses antros criados pela noite humana...). (CARDOSO, 2012, p. 389).
Se a morte é o centro da vida (CARDOSO, 2012, p. 385), a perda da morte é perda da palavra:
Todo o meu ser é uma aventura impossível de sonho e de extermínio [...]. Não destruo e nem sou destruído. Torno-me igual e sem identidade. Assim as minhas palavras se pacificam, e a morte, que tanta vez caminhou comigo passo a passo, abandona-me, deixando-me intacto no meu posto de poeta sem voz e sem inspiração. (CARDOSO, 2012, p. 389).
Contudo,
[...] não me abandona a morte, porque ela não nos abandona: sua intromissão é sutil e terrível - e por mais que façamos, e imaginemos a beleza do vento, das nuvens e da tranquilidade, jamais poderemos sorrir, porque tudo que existe como formapalpita e se aquece com todo um lado crestado em sombra. (CARDOSO, 2012, p. 427).
Por fim, parece que certo apaziguamento afora:
[...] a solidão não me dói - e nem o desconhecimento, o insucesso e a má-fé dos outros - porque vivo de um modo pleno e absoluto com o meu trabalho - os meus fantasmas. Para se tratar com fantasmas só há uma receita possível: tornar-se fantasma também. (CARDOSO, 2012, p. 453).
A morte é “antes de tudo, uma libertação do corpo de sua vida sob a ameaça da doença e do desaparecimento - uma espécie de saúde, definitiva, que nos iluminasse, sempre jovens, como uma primavera do sangue” (CARDOSO, 2012, p. 450). E a própria escrita aparece mais do que uma compensação às insatisfações pessoais, aos insucessos, às dificuldades de viver no mundo tal como ele é, como ato de rejuvenescer:
Assim, nesta idade, começa o meu processo de renovação. Sinto-me a cada instante tornar-me mais moço. Sinto desesperadamente ressurgir-me totalmente moço - e totalmente outro. E tudo isto por uma única graça: a de me achar na posse de mim mesmo, de um modo absoluto, sem excesso e sem temores. (CARDOSO, 2012, p. 444).
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O que me fica, agora, desse encontro triangular com Barthes e Lúcio Cardoso, solteirões apegados a suas mães, não é tanto o lugar do leitor voyeur (ÁVILA, 2016), mas essa forma de tocar e ser tocado, é uma grande tristeza, ou melhor, uma grande solidão, ou, melhor ainda, uma solidão a cada momento, a todo momento, uma solidão cheia de pessoas, objetos, lugares, rotinas e acontecimentos, uma solidão da qual não seria suficiente dizer de uma ausência de idealização. E o que se seria sem fantasmas e fantasias? Não se trata de viver dentro do que é possível, mas no impossível=velhice=amor=rapazes=escrita. As lágrimas escorrem inesperadas, lentas e incessantes.
Um navio me levará ao futuro. (CARDOSO, 2012, p. 502).
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Este texto é resultado de pesquisa que teve apoio da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
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Para outras leituras da homossexualidade no diário de Lúcio Cardoso, ver: Moreira (2017), Fortuna (2019a; 2019b).
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Além dos textos diretamente citados, foi importante, para ler esse diário de Roland Barthes, Vidal (2023).
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O cineasta Luiz Carlos Lacerda, recuperando imagens na Cinemateca Brasileira, dirigiu um documentário sobre o filme que Lúcio começou a gravar em 1949, mas que não terminou por falta de recursos.
Referências
- A MULHER de longe. Dirigido por Luiz Carlos Lacerda. Documentário. Brasil, 2012. (70 min.).
- AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? e outros ensaios Tradução de Vinícius Nicastro Honesko. Chapecó: Argos, 2009.
- A MULHER de longe. Dirigido por Luiz Carlos Lacerda. Documentário. Brasil, 2012. (70 min.).
- ÁVILA, Myriam. Diários de escritores Belo Horizonte: Editora Abre, 2016.
- BARTHES, Roland. Fragmentos de um discurso amoroso 10. ed. Tradução de Hortênsia dos Santos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1990.
- BARTHES, Roland. Incidentes Tradução de Mário Laranjeira. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
- BARTHES, Roland. O rumor da língua Tradução de Mário Laranjeira. Prefácio de Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: Brasiliense, 1988.
- BARTHES, Roland. A aula: aula inaugural da Cadeira de Semiologia Literária do Colégio de France. Tradução e posfácio de Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: Cultrix, 1989.
- CARDOSO, Lúcio. Crônica da casa assassinada Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.
- CARDOSO, Lúcio. Diários Editados por Ésio Macedo Ribeiro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.
- CARDOSO, Lúcio.Todos os diários. Organização de Ésio Macedo Ribeiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2023. 2 v.
- CHARBEL, Felipe. Janelas irreais: um diário de releituras. Belo Horizonte: Relicário, 2018.
- DAMASCENO, Beatriz. Lúcio Cardoso em corpo e escrita Rio de Janeiro: Eduerj: 2012.
- FOUCAULT, Michel. Da amizade como modo de vida. Gai Pied, Paris, v. 25, p. 38-39, 1981.
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FORTUNA, Daniele Ribeiro. Comparação entre os diários de Walmir Ayala, Lúcio Cardoso e Harry Laus: considerações finais de uma pesquisa. Cadernos do CNLF (Cifefil), Rio de Janeiro, v. XXIII, tomo I, 2019a, p. 137-146. Disponível em: http://www.filologia.org.br/xxiii_cnlf/cnlf/tomo01/11.pdf Acesso em: 20 mar. 2024.
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FORTUNA, Daniele Ribeiro. Uma vida em “branco”: os diários de Lúcio Cardoso.Revista Ecos,Cáceres, v. 26, ano 16, n. 1, 2019b, p. 44-63. Disponível em: https://periodicos.unemat.br/index.php/ecos/article/view/4150/3314 Acesso em: 20 mar. 2024.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
11 Abr 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
-
Recebido
20 Mar 2024 -
Aceito
20 Dez 2024