Acessibilidade / Reportar erro

Da história econômica à poesia: um conjunto diverso, plural e instigante

Um conjunto diverso, plural e instigante compõe a edição de número 79 da Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. Economia, literatura, música, artes e história econômica constituem uma pequena amostra dos temas e áreas tratados nos artigos ora apresentados.

Abrindo o número, temos o artigo de Ulisses Rubio Urbano da Silva, “O conservadorismo no liberal-desenvolvimentismo de Roberto Campos”, que analisa aspectos ortodoxos e conservadores do liberal-desenvolvimentismo de Campos com base em textos produzidos pelo próprio autor, dando ênfase naqueles publicados no período de 1955 a 1964, além de textos de outros autores que também procuraram analisar o pensamento de Roberto Campos.

Em seguida, o artigo “A estrangeiridade em Os sertões e o dilema da alteridade na imprensa brasileira”, de Otávio Ávila, apresenta uma interessante reflexão sobre o estatuto da estrangeiridade do sertanejo na principal obra de Euclides da Cunha. Utilizando conceitos de teóricos das migrações, o autor discute a contribuição que a obra dá ao tema a partir das próprias contradições existentes nela sobre a alteridade, a pureza e a nacionalidade construídas a partir do pensamento positivista que dominava os intelectuais desse período.

Dos sertões para a arte. No artigo “Do pioneirismo brasileiro da pesquisa em arte ao fenômeno mundial da ‘artistic research’”, Vagner Godói discute o pioneirismo em defesas de produção artística do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, criado em 1974, e o grande número de artistas-pesquisadores nos diversos programas que atualmente contemplam a pesquisa em arte, aproximando o pioneirismo brasileiro nessa área ao fenômeno recente da artistic research.

E passamos da pesquisa em arte para a representatividade feminina. No artigo “Feminismo em revista: a União Universitária Feminina nas páginas do periódico Jornal das Moças (década de 1950)”, Nailda Marinho da Costa e Priscila Dieguez analisam notícias publicadas sobre a União Universitária Feminina, escritas por Flora Ferraz Veloso na revista Jornal das Moças, buscando perceber de que forma a associação de mulheres universitárias era representada nas páginas do periódico e a relação da articulista com essa entidade.

Permanecendo no tema da educação, temos o artigo “Formação do professor de geografia: um olhar para o pensamento geográfico”, no qual Andréa Rabelo Marcelino e Gildo Volpato buscam compreender o pensamento geográfico na formação do professor de geografia, analisando, para isso, a matriz curricular de dois cursos de licenciatura na modalidade à distância.

Passando da educação ao esporte. No artigo “Entre os gramados e os trilhos: a história do Paulista Futebol Clube de Jundiaí”, Guilherme Grandi e Marcelo Roubicek percorrem a história do Paulista Futebol Clube a partir do cruzamento entre fontes documentais do Clube e o Banco de Dados Ferrovia, Cidade e Trabalhadores, a Conquista do Oeste (1850-1920). Como resultado, revela-se o perfil dos ferroviários participantes da agremiação futebolística, trazendo à tona a dimensão paternalista das relações entre a equipe de futebol e a ferrovia.

Do paternalismo à poesia. No artigo “Stela do Patrocínio: um passado de areia”, Solange de Oliveira propõe uma leitura de abordagem fenomenológica existencialista sobre a poesia de Stela do Patrocínio, poetisa negra e pobre que foi interditada com apenas 21 anos no Centro Psiquiátrico Pedro II, em Engenho de Dentro, sendo posteriormente transferida para a Colônia Juliano Moreira, onde permaneceu por cerca de 30 anos até a sua morte. Segundo a autora, a poesia de Stela impõe uma experiência de engajamento, como se o seu olhar invadisse o leitor e nele se instalasse. O ensaio celebra a alteridade como fonte de conhecimento e de inúmeras possibilidades que se abrem quando nos permitimos adentrar em um mundo impensável até então, apresentando caminhos e pontos de resistência ao pensamento homogêneo, redundante da cultura do cancelamento do diverso, convocando à tomada de posição.

E, por fim, da poesia à música. No artigo “Trânsito e significados do pandeiro no Rio de Janeiro (1900-1939)”, Eduardo Vidili examina o trânsito do pandeiro no Rio de Janeiro no período entre 1900 e 1939 e os significado atribuídos ao instrumento. Como questão inicial, problematiza-se o estatuto do pandeiro como instrumento nacional brasileiro em face da suposta proibição imposta a ele anteriormente, buscando mapear os ambientes pelos quais o pandeiro transitava naquela cidade e período histórico, compreendendo os papéis simbólicos ocupados pelo instrumento e instrumentistas no imaginário nacional que se constituía na época, além de examinar, por fim, como se deu a construção das imagens artísticas dos primeiros pandeiristas profissionais.

Encerrando a revista, além da estreia da seção Criação, temos ainda um artigo na seção Documentação e a publicação de uma resenha.

Nesta edição, temos a estreia da seção Criação, que tem como objetivo publicar textos e materiais inéditos de escritores e/ou artistas, fotógrafos, desenhistas, além de documentos inéditos encontrados no Arquivo do IEB/USP. Para inaugurar a seção, publicamos seis poemas de Dinha, Maria Nilda de Carvalho Mota. Poeta, militante contra o racismo, integrante e cofundadora do selo independente Edições Me Parió Revolução, além de pós-doutora em Literatura e Sociedade pelo IEB/USP, Dinha é autora dos livros Zero a zero: 15 poemas contra o genocídio da população negra (2015) e Maria do Povo/María Pepe Pueblo (2019), além de outros. Em 2019 foi homenageada como patrona da Academia Estudantil de Letras da EMEF Candida Dora Pretini, na cidade de São Paulo.

Na seção Documentação, no artigo “Entre plantas e documentos: algumas considerações sobre a contribuição do acervo do IEB ao Pequeno guia da botânica modernista”, Ana Carolina Carmona Ribeiro apresenta o livro Pequeno guia da botânica modernista, no qual são investigadas 19 das espécies vegetais representadas pelos modernistas de São Paulo. A publicação traz, além de reproduções de obras artísticas e literárias, imagens de documentos históricos pertencentes a diversos arquivos, entre eles o do IEB, discutindo as contribuições trazidas por esse acervo, notadamente o do Fundo Mário de Andrade, no qual se encontra um curioso cartão-postal enviado por Oswald a Mário, além de três fotografias pouco conhecidas tiradas por Mário na viagem que fez à Amazônia em 1927.

A resenha “Correspondência intelectual: uma nova perspectiva sobre Furtado”, de Mauricio C. Coutinho, analisa o livro Celso Furtado: correspondência intelectual - 1949-2004, recentemente publicado pela Companhia das Letras.

No mais, os editores esperam que a leitura deste novo número da Revista do Instituto de Estudos Brasileiros seja tão agradável como foi participar de sua editoria.

Referências

  • FURTADO, Celso. Correspondência intelectual 1949-2004. Seleção, introdução e notas: Rosa Freire d’Aguiar. Posfácio: Luiz Felipe de Alencastro. São Paulo: Companhia das Letras, 2021.
  • MOTA, Maria N. C. Maria do Povo. São Paulo: Edições Me Parió Revolução, 2019.
  • MOTA, Maria N. C. Zero a zero: 15 poemas contra o genocídio da população negra. São Paulo: Edições Me Parió Revolução, 2015.
  • RIBEIRO, Ana Carolina Carmona. Pequeno guia da botânica modernista. São Paulo: Governo do Estado de São Paulo/Proac, 2021.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Set 2021
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2021

Histórico

  • Recebido
    05 Ago 2021
  • Aceito
    09 Ago 2021
Instituto de Estudos Brasileiros Espaço Brasiliana, Av. Prof. Luciano Gualberto, 78 - Cidade Universitária, 05508-010 São Paulo/SP Brasil, Tel. (55 11) 3091-1149 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistaieb@usp.br