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Análise da produção científica sobre a utilização de atividades grupais no trabalho do enfermeiro no Brasil: 1980 a 2003

Resumos

Dentre as atividades do enfermeiro, muitas estão organizadas no contexto grupal. A constatação de que não havia estudo sistematizado, no Brasil, que oferecesse parâmetro para compreender como o enfermeiro utiliza esse recurso, motivou o desenvolvimento deste estudo, cujo objetivo foi analisar a produção científica sobre a utilização da atividade grupal, relacionada ao trabalho do enfermeiro entre 1980/2003. Pesquisa descritiva/exploratória, realizada por meio de investigação bibliográfica em periódicos nacionais, tendo como base um protocolo específico. Identificou-se 151 artigos que foram analisados quanto à expansão desse conhecimento e às diversas situações em que o grupo é utilizado nas atividades do enfermeiro. Na análise qualitativa, realizada a partir de categorias pré-definidas, identificou-se que o enfermeiro tem utilizado esse recurso na assistência, produção de conhecimento e formação de recursos humanos. A investigação permitiu traçar um panorama dessa produção e elaborar um catálogo que identifica aspectos importantes na construção desse conhecimento pela enfermagem brasileira.

enfermagem; grupos de estudo; pesquisa em enfermagem


Among the many and diverse activities carried out by nurses, many are organized within the context of a group approach. The realization that there were no systematized studies in Brazil, capable of providing parameters that would help to understand how nurses use this resource, motivated the authors to develop this study, whose objective was to review scientific literature on the use of group activity, as it relates to the work carried out by nurses, between 1980 and 2003. This was a descriptive/exploratory research developed through a bibliographic review in Brazilian journals, on the basis of a specific protocol. We were able to identify 151 articles that were reviewed in terms of the expansion of this knowledge and the different situations in which a group is used by nurses. The qualitative analysis done on pre-established categories enabled the authors to verify that nurses have been using this technique while delivering care, producing knowledge and developing human resources. This investigation allowed us to outline a panoramic view of this literature and to develop a catalogue, identifying important aspects in the construction of this knowledge by Brazilian nursing personnel.

nursing; focus groups; nursing research


Entre las actividades del enfermero, muchas están organizadas en el contexto del trabajo en grupo. La constatación de que no había estudio sistematizado, en Brasil, que permitiese un parámetro para comprender como el enfermero utiliza ese recurso, motivó el desarrollo de este estudio, cuyo objetivo fue analizar la producción científica sobre la utilización de la actividad en grupo relacionada al trabajo del enfermero entre 1980/2003. Investigación descriptiva/exploratoria realizada a través de investigación bibliográfica en periódicos nacionales, teniendo como base un protocolo específico. Identificamos 151 artículos que fueron analizados en cuanto a la expansión de ese conocimiento y las distintas situaciones en que el grupo es utilizado en las actividades del enfermero. En el análisis cualitativo, realizado a partir de categorías previamente definidas, identificamos que el enfermero viene utilizando ese recurso en la asistencia, producción de conocimiento y formación de recursos humanos. La investigación nos permitió trazar un panorama de esa producción y elaborar un catálogo que identifica aspectos importantes en la construcción de ese conocimiento por la enfermería brasileña.

enfermería; grupos focais; investigacíon em enfermería


ARTIGO DE REVISÃO

Análise da produção científica sobre a utilização de atividades grupais no trabalho do enfermeiro no Brasil: 1980 a 20031 1 Trabalho Extraído da Dissertação de Mestrado, Vinculado a projeto integrado com apoio do CNPq

Análisis de la producción científica sobre la utilización de actividades grupales en el trabajo del enfermero en Brasil: 1980 a 2003

Maria Tereza Hagen de GodoyI; Denize Bouttelet MunariII

IMestre, Professor Assistente, e-mail: maitehagen@brturbo.com.br

IIProfessor Titular, e-mail: denize@fen.ufg.br. Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Goiás

RESUMO

Dentre as atividades do enfermeiro, muitas estão organizadas no contexto grupal. A constatação de que não havia estudo sistematizado, no Brasil, que oferecesse parâmetro para compreender como o enfermeiro utiliza esse recurso, motivou o desenvolvimento deste estudo, cujo objetivo foi analisar a produção científica sobre a utilização da atividade grupal, relacionada ao trabalho do enfermeiro entre 1980/2003. Pesquisa descritiva/exploratória, realizada por meio de investigação bibliográfica em periódicos nacionais, tendo como base um protocolo específico. Identificou-se 151 artigos que foram analisados quanto à expansão desse conhecimento e às diversas situações em que o grupo é utilizado nas atividades do enfermeiro. Na análise qualitativa, realizada a partir de categorias pré-definidas, identificou-se que o enfermeiro tem utilizado esse recurso na assistência, produção de conhecimento e formação de recursos humanos. A investigação permitiu traçar um panorama dessa produção e elaborar um catálogo que identifica aspectos importantes na construção desse conhecimento pela enfermagem brasileira.

Descritores: enfermagem; grupos de estudo; pesquisa em enfermagem

RESUMEN

Entre las actividades del enfermero, muchas están organizadas en el contexto del trabajo en grupo. La constatación de que no había estudio sistematizado, en Brasil, que permitiese un parámetro para comprender como el enfermero utiliza ese recurso, motivó el desarrollo de este estudio, cuyo objetivo fue analizar la producción científica sobre la utilización de la actividad en grupo relacionada al trabajo del enfermero entre 1980/2003. Investigación descriptiva/exploratoria realizada a través de investigación bibliográfica en periódicos nacionales, teniendo como base un protocolo específico. Identificamos 151 artículos que fueron analizados en cuanto a la expansión de ese conocimiento y las distintas situaciones en que el grupo es utilizado en las actividades del enfermero. En el análisis cualitativo, realizado a partir de categorías previamente definidas, identificamos que el enfermero viene utilizando ese recurso en la asistencia, producción de conocimiento y formación de recursos humanos. La investigación nos permitió trazar un panorama de esa producción y elaborar un catálogo que identifica aspectos importantes en la construcción de ese conocimiento por la enfermería brasileña.

Descriptores: enfermería; grupos focais; investigacíon em enfermería

INTRODUÇÃO

As atividades desenvolvidas por enfermeiros muitas vezes são realizadas no contexto grupal que serve como estratégia em diversas áreas de sua atuação, como na educação em saúde, na assistência hospitalar ou ambulatorial de pacientes em várias situações, em atividades de pesquisa e de formação de profissionais. No Brasil, a Enfermagem de Saúde Pública foi a pioneira na publicação de trabalhos científicos focados a partir desse contexto(1).

O estudo e a prática permitem afirmar que, de modo geral, o enfermeiro utiliza a atividade grupal como "técnica" para a assistência, faz o que considera correto sem, no entanto, buscar o embasamento teórico específico para sustentar a utilização desse instrumento de trabalho. Acredita-se que esse fato se dê, entre outros aspectos, pelo desconhecimento de respaldo teórico específico que possa sustentar suas ações, pois esse não tem sido um conteúdo oferecido sistematicamente na formação de graduandos de enfermagem(2-3).

A utilização do grupo no cuidado humano torna imprescindível o conhecimento desse instrumental para melhor desempenho do profissional. Para isso é necessário que o enfermeiro procure formação específica para ampliar seus conhecimentos nessa área, o que lhe oferece base para a atuação mais assertiva e eficiente.

O termo grupo é designado ao conjunto de pessoas reunidas num mesmo lugar, que apresentam o mesmo comportamento e a mesma atitude e com um objetivo comum que condiciona a coesão de seus membros(4-5).

O que determina a existência de um grupo é a interação entre os seus membros, ou seja, que eles experimentem as mesmas emoções e que essas sejam suficientemente intensas para constituir um grupo(6). Tão importante quanto sua definição é o conhecimento sobre sua natureza e características, especialmente quando se pretende entender os grupos como espaço de ação profissional, como no caso da enfermagem, que o utiliza para várias atividades.

Uma forma de caracterizar os grupos é a partir da finalidade a qual se propõem, podendo ser classificados em operativos e terapêuticos. Os grupos operativos são aqueles centrados na tarefa e cujo conceito é abrangente devido às inúmeras possibilidades de aplicações práticas. Esses são considerados por muitos como sendo um continente de todos os demais grupos e cobrem os campos de ensino-aprendizagem, institucionais e comunitários(5).

Os grupos terapêuticos se dividem em grupos de auto-ajuda, que englobam a área médica em geral, a psiquiátrica e os psicoterapêuticos propriamente ditos, designados estritamente para aqueles tipos de grupos que se destinam à aquisição de insight(5,7).

No trabalho da enfermagem, por exemplo, é adequado o enfoque dos grupos do tipo operativo, pela relativa facilidade com que os profissionais podem ser treinados para exercer essa atividade e pela adequação dos mesmos à abordagem de gestantes, crianças, adolescentes, pacientes internados, entre outros(5,8).

O trabalho com grupos oferece oportunidades para o crescimento e mudança com relação a nós mesmos e ao mundo. A vida de um grupo pode e deve ser observada por vários olhares, o que permite a compreensão de sua complexidade, sua vitalidade e potencialidade(9).

Tendo em vista a aplicação desse recurso em várias dimensões do trabalho do enfermeiro, define-se o termo atividade grupal para se referir às ações realizadas por esse profissional no contexto do grupo e será utilizada no decorrer deste trabalho.

O estudo dessas atividades, sua natureza e aplicação no campo da enfermagem remeteram à constatação de que não havia nenhum estudo sistematizado que proporcionasse parâmetro para compreender como o enfermeiro tem utilizado esse recurso. Esse fato motivou o estudo desse assunto no âmbito da literatura nacional, em particular nos periódicos de enfermagem, tendo em vista o envolvimento dos autores com o desenvolvimento dessa tecnologia e, possivelmente, a contribuição com aqueles que desejam trabalhar melhor com tal ferramenta na enfermagem.

A decisão a respeito de focar a produção brasileira se justifica por se tratar de tema ainda em desenvolvimento, que se delineia através de peculiaridades socioculturais importantes e que precisam ser conhecidas entre nós. A relevância do estudo é justamente calcada na possibilidade de se traçar um panorama nacional sobre a produção desse conhecimento, ainda não realizado.

Assim, tem-se temos como objetivo caracterizar e analisar a produção científica sobre a utilização da atividade grupal, relacionada ao trabalho do enfermeiro, no período de 1980 a 2003, nos periódicos nacionais da área de enfermagem.

MÉTODO

Para se alcançar o objetivo proposto nesta investigação, realizou-se um estudo descritivo e exploratório, de natureza bibliográfica, que é o exame de todo o material escrito e publicado para levantamento e análise do que se produziu sobre determinado assunto, caracterizado como tema de pesquisa(10-11).

A pesquisa bibliográfica permite ao pesquisador ter contato direto com o que já foi escrito sobre o assunto e sua grande vantagem é permitir maior cobertura dos fenômenos pesquisados, o que não seria possível se a mesma fosse feita diretamente na fonte(10-11).

Optou-se por trabalhar apenas com periódicos da área da enfermagem, publicados no Brasil, pelo fato de os mesmos permitirem, com sua publicação regular, análise da produção dos pesquisadores enfermeiros brasileiros sobre o tema em estudo.

O período delimitado para a pesquisa foi entre os anos 1980 e 2003, já que um estudo anterior(1) sinaliza a década de 80 como início da divulgação de pesquisas sobre trabalhos realizados por enfermeiros, utilizando atividades grupais em periódicos nacionais.

A seleção do material a ser pesquisado foi feita a partir de buscas nos acervos da Biblioteca Central do Campus de Ribeirão Preto e na sala de leitura Glete de Alcântara da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, ambos da Universidade de São Paulo.

Considerou-se como critérios da inclusão de periódicos para essa pesquisa que os mesmos fossem indexados, tivessem regularidade e periodicidade de circulação que permitisse análise ao longo do período de estudo e estivessem disponíveis no local de pesquisa no período compreendido entre os meses de julho e dezembro de 2003.

Os periódicos que atenderam os critérios de inclusão foram: Revista Brasileira de Enfermagem; Revista da Escola de Enfermagem da USP; Revista Gaúcha de Enfermagem; Revista Paulista de Enfermagem; Acta Paulista de Enfermagem; Texto & Contexto Enfermagem; Revista Latino-Americana de Enfermagem; Revista de Enfermagem da UERJ; Cogitare Enfermagem; Revista da Escola de Enfermagem Anna Nery.

Para a seleção dos artigos, fez-se uma busca ativa nos periódicos por volumes e números, selecionando para a pesquisa somente aquele que, na leitura prévia dos títulos, dos resumos e da metodologia, indicasse que as atividades grupais eram utilizadas de alguma forma no conteúdo dos mesmos.

Os artigos selecionados foram compilados, separados por ano de publicação, submetidos a leitura cuidadosa e registrados a partir de protocolo elaborado para identificar aspectos considerados relevantes para a pesquisa tais como: publicações por periódicos e por ano; natureza do artigo (síntese de dissertação de mestrado e de tese de doutorado, pesquisa, relato de experiência, estudo de caso ou outras); região de procedência dos autores; descritores; área temática do artigo; enfoque da atividade grupal e o referencial teórico específico de grupo utilizado pelos autores.

Para o levantamento dos dados relativos à procedência dos autores e profissão dos mesmos, foram consideradas as informações constantes nas notas de rodapé apresentadas em cada artigo.

Inicialmente procedeu-se à análise descritiva dos dados constantes no protocolo de modo que essa caracterizasse aspectos já relacionados anteriormente, o que permitiu um panorama da situação da produção desse conhecimento.

Em segunda etapa, o material foi submetido à análise qualitativa(12), a partir de categorias definidas a priori: a) o grupo como recurso na assistência; b) enfermagem e grupo: produção de conhecimento e c) o grupo na formação de recursos humanos. Na definição dessas categorias, assim como na distribuição dos artigos nas mesmas levou-se em consideração, especialmente, os objetivos definidos pelos autores quando da apresentação do artigo, uma vez que alguns trabalhos se encaixavam em mais de uma categoria.

Assim, o que definiu o enquadramento do artigo na categoria foi o foco central do trabalho, delimitado no objetivo. Para tanto, realizou-se um processo de validação da distribuição dos artigos nas respectivas categorias, a partir de cuidadosa revisão de cada um deles, realizada pela pesquisadora e sua orientadora, para garantir fidedignidade e consistência na descrição do conteúdo dos dados para a análise qualitativa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O tratamento dos dados feitos a partir da análise descritiva dos aspectos selecionados no protocolo de coleta e a busca pelos objetivos delimitados no estudo possibilitaram a construção dos resultados, que são apresentados com a caracterização geral dos artigos e com a análise temática do conteúdo dos mesmos.

Caracterização geral dos artigos

Neste tópico delineia-se um panorama geral dos artigos estudados, apresentando os aspectos delimitados na metodologia. Embora vários outros periódicos tenham sido publicados durante o período delimitado para o estudo, vale reforçar que os critérios de inclusão dos mesmos para a coleta de dados, já discriminados na metodologia, permitiram constituir o universo da pesquisa com 10 periódicos, apresentados na Tabela 1.

Apenas um periódico, a Revista Brasileira de Enfermagem, é sediado na Região Centro-Oeste, sendo todos os demais oriundos das Regiões Sul e Sudeste. Alguns números dos periódicos selecionados, embora exaustivamente procurados, não foram encontrados no período delimitado para a pesquisa e, portanto, não foram analisados.

Para a melhor visualização da produção nacional nos periódicos, apresenta-se, na Tabela 2, a distribuição dos artigos estudados, de acordo com o ano de publicação.

A Tabela 2 mostra que, a partir de 1994, houve aumento crescente da produção que tanto pode sinalizar aumento da atividade grupal nas ações do enfermeiro como do interesse desse profissional em divulgar os resultados da sua aplicação.

Em relação ao volume da produção por periódico/ano, verifica-se que a média de publicação dos artigos, levando em consideração o ano de início de sua ocorrência até o ano de 2003, é mais significativa em alguns periódicos, conforme mostra a Tabela 3.

Observa-se que a Revista Brasileira de Enfermagem, embora tenha maior volume de publicações em número, apresenta volume menor se se levar em conta sua média anual (1,86), enquanto a Revista Texto & Contexto Enfermagem apresenta, sob essa ótica, o maior volume de publicações no período estudado (3,33).

Quanto à região de procedência dos autores, a maioria das publicações que compõe esse estudo é da Região Sudeste, com o total de 60 artigos, seguida pela Região Sul, com 57 artigos, Nordeste e Centro-Oeste com 11 artigos e a Região Norte com 1 artigo publicado.

A concentração de publicações nas Regiões Sudeste e Sul, em relação às demais, pode ser explicada devido à concentração dos cursos de pós-graduação existentes nessas regiões, o que facilita e estimula o desenvolvimento da produção do conhecimento e, conseqüentemente, a sua divulgação. Dos 10 periódicos estudados, 9 são vinculados a instituições de ensino superior sediadas nas referidas regiões e que oferecem esses cursos.

Um dado bastante significativo e que reforça essa afirmação, é o fato de que 162 professores vinculados a instituições de ensino superior, que corresponde a 51,4% dos autores da pesquisa, contribuíram na autoria ou co-autoria de 128 artigos, 84,8% do total.

Em 15 artigos encontrou-se a colaboração de 27 profissionais de outras áreas. Além desses profissionais, encontrou-se 18 acadêmicos de enfermagem como parceiros na publicação de 12 artigos, sendo 2 deles de autoria exclusiva dos acadêmicos. Esse fato indica o despertar do futuro profissional para a aplicação dessa tecnologia, o que certamente fortalecerá a utilização de tal ferramenta em sua atividade profissional na abordagem de grupos.

A análise dos descritores que caracterizam os artigos permitiu identificar um volume muito extenso dos mesmos, pois destacavam as áreas de aplicação do trabalho grupal nas ações de enfermagem, não enfocando a abordagem do grupo em si. Por esse motivo, selecionou-se para a análise somente aqueles descritores que, segundo o nosso entendimento, tinham alguma relação com atividades grupais, sendo os mesmos em número de 25. Dentre eles apenas 5 estão disponíveis para caracterizar as atividades com grupos na base de dados BIREME.

Analisou-se, também as referências bibliográficas específicas sobre as teorias de grupos utilizadas pelos autores, o que permitiu verificar que a sua ocorrência foi variável e irregular ao longo dos anos, pois observou-se que elas tanto são utilizadas em trabalhos publicados no início dos anos 80 quanto não o são em artigos publicados em 2003, o que sugere aprofundamento dessa questão em estudos posteriores.

Foram utilizados 61 títulos de textos clássicos das teorias de grupo, bem como de manuais e livros de técnicas grupais. A ocorrência dessas referências nos artigos estudados foi de 39,1% (59 artigos), sendo que em 11 deles foram referidos apenas livros e manuais de técnicas e jogos grupais.

A clientela atendida através de atividades grupais é constituída, em sua maioria, por usuários do serviço de saúde, o que configura que essa técnica está se tornando prática constante na assistência de enfermagem. Assim, pode-se afirmar que o grupo tem sido importante aliado na assistência de saúde prestada pelo enfermeiro, envolvendo grande diversidade de clientes em diferentes agravos, além de ser também ferramenta bastante utilizada no ensino, pesquisa e ainda como auxiliar na questão do gerenciamento do serviço.

Análise da Produção do Conhecimento: uma aproximação por análise temática do conteúdo

A construção da análise qualitativa dos dados foi pensada no sentido de mostrar um panorama do que se tem produzido no Brasil acerca da temática, sem trabalhar em profundidade o conteúdo dos artigos, mas buscando mapeá-los a partir de referência temática que permitiu agrupá-los nas categorias definidas à priori - O grupo como recurso na assistência - Enfermagem e grupo: produção de conhecimento - O grupo na formação de recursos humanos.

Após a leitura exaustiva dos artigos, da distribuição dos mesmos nas categorias e do processo de validação que definiu o conjunto de dados pertencentes a cada categoria, passou-se à análise de cada uma delas em separado, tendo em vista o volume dos dados (151 artigos).

O grupo como recurso na assistência

A categoria: o grupo como recurso na assistência caracteriza os estudos que trabalharam com os diversos níveis de assistência, da promoção à saúde à reabilitação de pessoas. Foram incluídos 37 artigos que correspondem a 24,5% do total dos artigos pesquisados.

Para facilitar a análise dos artigos dessa categoria, utilizou-se um estudo anterior(1) para dividi-los como a autora sugere para a classificação das atividades grupais realizadas pelo enfermeiro com essa finalidade. Assim, os artigos que caracterizavam atividades de assistência foram distribuídos nas subcategorias: grupos de caráter informativo e educação em saúde; grupos para a manutenção de programas e grupos de reabilitação e apoio emocional.

Grupos de caráter informativo e educação em saúde

Nessa subcategoria, foram incluídos 11 artigos (7,3%) que descrevem atividades grupais de curta duração e pouca estruturação como os grupos de sala de espera, de orientações de cirurgia, oficinas e outras ações de caráter educativo.

Grupos para a manutenção de programas e projetos de atendimento ao indivíduo e suas famílias

Nesta subcategoria foram incluídos 13 artigos (8,6%) que relatam diversos tipos de atendimento realizados através de atividades grupais, dentro dos programas preconizados pelo Ministério da Saúde, ou desenvolvidas em instituições com intuito de melhorar a qualidade do atendimento ao indivíduo e sua família.

Grupos de reabilitação e apoio emocional

As atividades descritas em trabalhos incluídos nessa categoria descrevem grupos que são compostos por pessoas portadoras de uma patologia ou de uma mesma necessidade (hipertensos, obesos, diabéticos, colostomizados e outros). Nesses grupos, a força da motivação grupal é o principal instrumento da ação terapêutica, pelo fato dos mesmos utilizarem a mesma linguagem e partilharem os mesmos sofrimentos e dificuldades(5,7,13).

Nessa subcategoria foram incluídos 13 artigos (8,6%), cujos objetivos são centralizados em ações de apoio e suporte através de atividades grupais para o enfrentamento das diversas situações vividas pelas pessoas que precisam conviver com problemas crônicos de saúde.

A vantagem de trabalhos dessa natureza, para esse tipo de cliente, reside no seu potencial para mudanças de comportamentos. As pessoas envolvidas nesses processos mostram uma capacidade de ajuda e demonstram inacreditável capacidade terapêutica que é liberada através da liberdade de expressão de sentimentos proporcionada pela vivência em grupo(14).

Enfermagem e grupos: produção de conhecimentos

Esta categoria incluiu 89 artigos (58,9%) que envolvem o desenvolvimento de conhecimentos acerca da temática, sendo que o enfoque dado aos textos é a exploração de conceitos e aspectos teórico-técnicos, fundamentados em teorias clássicas sobre o movimento dos grupos humanos e sua aplicação na enfermagem.

A importância de se conhecer tais conceitos para a compreensão do comportamento dos grupos humanos e do funcionamento da sociedade, por si só, já justifica que o mesmo continue sendo objeto de pesquisa(15).

Estão inseridos na categoria, ainda, artigos que abordam aspectos teórico-técnicos, aplicados no cotidiano da prática assistencial, da pesquisa, da formação e do processo de avaliação/validação do uso dessa estratégia e artigos nos quais os autores utilizaram atividades grupais para coletar dados nas pesquisas.

Para facilitar a análise da categoria, dividiu-se os artigos nela inseridos em 4 subcategorias: estudos teóricos, modelos de atividade grupal na assistência, modelos para a formação de recursos humanos e utilização de atividades grupais para coleta de dados nas pesquisas.

Estudos teóricos

Nesta subcategoria foram incluídos 11 artigos (7,3%) que contribuem para a produção de conhecimentos teóricos sobre o grupo e sua aplicação no trabalho do enfermeiro. Esses trabalhos abordam conceitos, teorias e metodologias, fornecendo aos profissionais que querem trabalhar com essa ferramenta uma fonte de informações a respeito da temática.

Modelos de atividade grupal na assistência

Nesta subcategoria, considerou-se os artigos que trabalharam com a proposta de construção de modelos de atividades grupais para a assistência e aqueles que trazem relatos de atividades desenvolvidas por grupos, já formados, que atuam na assistência. Foram incluídos 19 artigos (12,6%).

Modelos para a formação de recursos humanos

Nesta subcategoria foram incluídos 7 artigos (4,6%) que descrevem, teoricamente, modelos de trabalhos grupais para a formação de recursos humanos. Os estudos aqui relacionados demonstram o grande potencial dessa tecnologia no desenvolvimento de pessoas como fundamento no avanço do processo de gestão de pessoas na modernidade(3,11).

Utilização de atividades grupais para coleta de dados nas pesquisas

Nesta subcategoria inclui-se artigos nos quais os autores utilizam atividades e técnicas grupais com a finalidade de coletar dados para suas pesquisas. Essa técnica tem sido explorada em larga escala pelos pesquisadores na coleta de dados, haja vista que é nesta subcategoria que se encontra a maior parte dos artigos incluídos na categoria, ou seja, o total de 52 artigos (34,4%).

Nota-se, através da análise dessa categoria que ainda é pequeno o número de pesquisadores que desenvolvem estudos teóricos sobre grupos (7,3%), fato que torna mais difícil a utilização dessa ferramenta pelo enfermeiro devido à falta de referências específicas para embasar a sua prática. Por outro lado, comprovou-se o interesse na divulgação de modelos para essa atividade na assistência, na formação de recursos humanos, bem como estratégia para pesquisa, o que tem contribuído de forma valiosa no desenvolvimento dessa tecnologia pela enfermagem.

O grupo na formação de recursos humanos

Esta categoria concentra estudos que utilizaram atividades grupais na formação de recursos humanos em treinamentos, sensibilização e na educação continuada de profissionais ligados à assistência e também como recurso didático-pedagógico com alunos de enfermagem. São 25 (16,6%) os artigos incluídos nesta categoria.

A utilização das técnicas grupais conduz os indivíduos nelas envolvidos a um movimento de feedback, aumentando a comunicação e propiciando o surgimento de novas idéias, novos conceitos, novas direções que contribuem com o aprendizado em maior escala(15).

A atividade grupal como estratégia didático-pedagógica

Nesta subcategoria traz-se a análise dos artigos nos quais os autores trabalharam utilizando atividades/técnicas grupais como recurso didático. Este tema foi incluído por se tratar de uma estratégia de formação de recursos humanos por excelência. Nesta subcategoria foram incluídos 13 artigos que correspondem 8,6% do total da pesquisa.

O grupo como recurso no desenvolvimento de equipes e fortalecimento das relações interpessoais dos profissionais

Esta subcategoria compreende os artigos que trabalharam com a formação pessoal de todas as categorias profissionais, tanto da enfermagem como dos demais trabalhadores da área da saúde, através de atividades grupais. Foram incluídos 12 artigos (8%) com essa abordagem.

Encontrou-se, neste grupo, estudos nos quais os autores buscaram atender o profissional de saúde com o intuito de trabalhar seus sentimentos, visando a humanização da assistência.

Comprovou-se, através da análise dessa categoria, o despertar do interesse do enfermeiro na utilização de atividades grupais para a formação de recursos humanos, tanto no ensino de enfermagem como na formação do profissional. A atividade grupal é uma forma eficiente de lidar com as dificuldades com as quais convive tanto o profissional como o aluno de enfermagem, por proporcionar a troca de experiências e pela vivência em grupo que fornece suporte, ajudando-os a superar as angústias e os conflitos advindos da sobrecarga emocional e estresse, oriundos de trabalhos desta natureza(2-3).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O alcance do objetivo proposto inicialmente nese trabalho, permitiu construir um panorama da atividade grupal relacionada ao trabalho do enfermeiro ao longo dos últimos 23 anos, no Brasil. Observou-se que houve expansão do desenvolvimento desse conhecimento no período estudado, em particular, a partir do início da década de 90.

Foi possível caracterizar as situações em que o grupo tem sido utilizado pela enfermagem, o que comprova a utilização dessa tecnologia como ferramenta de trabalho nas inúmeras atividades desenvolvidas pelos enfermeiros.

Identificou-se 151 artigos que foram analisados quanto à expansão desse conhecimento e as diversas situações em que o grupo é utilizado nas atividades do enfermeiro. Na análise qualitativa, realizada a partir de categorias pré-definidas, identificou-se que o enfermeiro tem utilizado esse recurso na assistência, na produção de conhecimento e na formação de recursos humanos.

A investigação realizada através da análise bibliográfica permite apontar algumas vantagens deste tipo de estudo, sendo uma delas a possibilidade de voltar ao material coletado quantas vezes for necessário, sanando dúvidas sempre que preciso. A desvantagem da pesquisa bibliográfica, na experiência dos autores, é que, muitas vezes, o pesquisador não encontra respostas para algumas de suas questões, tendo que contar com a clareza de expressão do(s) autor(es) e a disponibilidade do material em bibliotecas.

Destaca-se, ainda, a capacidade de criação de novas maneiras de trabalhar com grupos como estratégia assistencial de enfermagem, desvendada pelos registros dos enfermeiros ao longo da pesquisa.

A ocorrência da produção sobre o tema, em todos os periódicos estudados, permite afirmar que existe tendência cada vez maior da utilização de atividades grupais e da sistematização das mesmas junto a diferentes tipos de clientela e ações do enfermeiro.

A investigação permitiu traçar um panorama dessa produção e elaborar um catálogo que identifica aspectos importantes na construção desse conhecimento pela enfermagem brasileira. Esse material catalogado e descrito está disponível no texto da dissertação, constituindo-se em fonte valiosa de consulta bibliográfica sobre o tema.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido em: 7.3.2005

Aprovado em: 14.6.2006

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  • 1
    Trabalho Extraído da Dissertação de Mestrado, Vinculado a projeto integrado com apoio do CNPq
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Nov 2006
    • Data do Fascículo
      Out 2006

    Histórico

    • Aceito
      14 Jun 2006
    • Recebido
      07 Mar 2005
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