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Consumo de drogas por homens internados em hospital psiquiátrico* * O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - Código de Financiamento 001, Brasil.

Resumos

Objetivo:

avaliar risco relacionado ao uso de drogas em homens internados em hospital psiquiátrico e identificar associações com variáveis sociodemográficas, socioeconômicas e condições de risco.

Método:

estudo transversal com aplicação de teste de rastreamento em 209 participantes internados por transtornos mentais e comportamentais, devido ao uso de substâncias psicoativas. A análise estatística foi realizada através de estatísticas descritivas e ajuste de modelo de regressão logística binária para o risco moderado ou elevado relacionado ao uso de drogas. A força de associação foi medida pela razão de chances.

Resultados:

observou-se elevado uso na vida, com início de experimentação de álcool e tabaco ainda na adolescência. Maiores prevalências de risco relacionado observadas para álcool, tabaco, cocaína fumada e inalada, e maconha. Riscos moderados e elevados foram encontrados para tabaco (22,5 e 62,5%, respectivamente), álcool (13,5 e 73%), maconha (16 e 32,5%), cocaína fumada (3 e 41%) e inalada (9 e 19,5%).

Conclusão:

os resultados apontaram elevado uso na vida, com idade de experimentação precoce. O tabaco e o álcool são as principais drogas utilizadas pelos homens internados.

Descritores:
Programas de Rastreamento; Risco; Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias; Alcoolismo; Drogas Ilícitas; Saúde do Homem


Objective:

to assess risk related to drug use in men admitted to a psychiatric hospital and to identify associations with sociodemographic, socioeconomic variables, and risk conditions.

Method:

a cross-sectional study with the application of a screening test in 209 participants hospitalized for mental and behavioral disorders due to the use of psychoactive substances. Statistical analysis was performed using descriptive statistics and adjustment of a binary logistic regression model for moderate or high risk of drug use. The odds ratio measured the strength of association.

Results:

high use in life was observed, with alcohol and tobacco experimentation in adolescence. A high prevalence of related risk was observed for alcohol, tobacco, smoked and inhaled cocaine, and marijuana. Moderate and elevated risks were found for tobacco (22.5% and 62.5%, respectively), alcohol (13.5% and 73%), marijuana (16% and 32.5%), smoked cocaine (3% and 41%) and inhaled cocaine (9% and 19.5%).

Conclusion:

the results showed high use in life, with an age of early experimentation. Tobacco and alcohol are the main drugs used by hospitalized men.

Descriptors:
Mass Screening; Risk; Substance-Related Disorders; Alcoholism; Street Drugs; Men’s Health


Objetivo:

evaluar riesgo relacionado al uso de drogas en hombres internados en hospital siquiátrico e identificar asociaciones con variables sociodemográficas, socioeconómicas y condiciones de riesgo.

Método:

estudio transversal con aplicación de test de rastreo en 209 participantes internados por trastornos mentales y conductuales debido al uso de sustancias psicoactivas. El análisis estadístico fue realizado a través de la estadística descriptiva y ajuste del modelo de regresión logística binaria, para el riesgo moderado o elevado de tipo uso drogas. La fuerza de asociación fue medida por la razón de chances.

Resultados:

se observó elevado uso en la vida, con inicio de experimentación de alcohol y tabaco en la adolescencia. Fueron observadas mayores prevalencias de riesgo relacionado para alcohol, tabaco, cocaína fumada e inhalada, y mariguana. Riesgos moderados y elevados fueron encontrados para tabaco (22,5% y 62,5%, respectivamente), alcohol (13,5% y 73%), mariguana (16% y 32,5%), cocaína fumada (3% y 41%) e inhalada (9% y 19,5%).

Conclusión:

los resultados apuntaron elevado uso en la vida, con edad de experimentación precoz. El tabaco y el alcohol son las principales drogas utilizadas por los hombres internados.

Descriptores:
Tamizaje Masivo; Riesgo; Trastornos Relacionados con Sustancias; Alcoholismo; Drogas Ilícitas; Salud del Hombre


Introdução

O Movimento da Luta Antimanicomial no Brasil resultou na promulgação da Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001(11 Presidência da República (BR). Casa Civil. Lei 10.216 de 6 abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. [Internet]. Brasília: Presidência da República; 2001 [Acesso 25 jan 2001]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LEIS_2001/L10216.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEI...
), criando barreiras às internações involuntárias e compulsórias, principalmente em instituições asilares. Já em 2011, instituíram-se as Redes de Atenção Psicossocial (RAPS) com vistas às pessoas com sofrimento decorrente do uso de crack, álcool e outras drogas, mudando a abordagem do usuário e do dependente de drogas que, antes criminalizado, passa a ter status de portador de um transtorno de saúde, devendo ser adotadas estratégias diferenciadas de atenção e reinserção social voltadas a esses usuários ou dependentes de drogas(22 Ministério da Saúde (BR). Portaria no 3.088 de 23 dezembro 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. [Acesso 25 jan 2012]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt3088_23_12_2011_rep.html
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
).

A assistência hospitalar do usuário e dependente de drogas vem sendo gradativamente substituída por dispositivos extra-hospitalares pautados na reabilitação e reinserção social, por meio da RAPS articulada às demais redes de saúde(33 Santos RQ Junior, Cardoso AC, Carvalho SC, Oliveira ZC, Mazzei MP. Men’s health in Bahia: hospitalization of adult subjects between 2000 and 2010. Rev Enferm Contemp. 2017;6(2):50-68. DOI: 10.17267/2317-3378rec.v6i2.1630.
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). Esses avanços foram positivos, mas o tratamento integral do dependente de drogas é incipiente e dificultado pelo baixo protagonismo dos homens em relação aos cuidados de saúde, pelo estigma social do consumo e dependência de drogas, e pela atual lacuna assistencial da Atenção Primária(44 Farias LM, Silva NM, Azevedo AK, Lima JD. Nurses and the assistance to drug users in basic care services. J Nurs UFPE On Line. 2017; 11(Supll 7): 2871-80. doi: https://doi.org/10.5205/1981-8963-v11i7a23467p2871-2880-2017
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). Tais fatores podem levar à procura tardia por tratamento, elevando os indicadores de morbimortalidade e os custos para o sistema de saúde(33 Santos RQ Junior, Cardoso AC, Carvalho SC, Oliveira ZC, Mazzei MP. Men’s health in Bahia: hospitalization of adult subjects between 2000 and 2010. Rev Enferm Contemp. 2017;6(2):50-68. DOI: 10.17267/2317-3378rec.v6i2.1630.
https://doi.org/10.17267/2317-3378rec.v6...
).

Os transtornos relacionados ao uso de drogas são considerados problema de saúde pública, com graves consequências pessoais, comunitárias e elevada prevalência mundial, contribuindo substancialmente para a sobrecarga(55 GBD 2016 Alcohol and Drug Use Collaborators. The global burden of disease attributable to alcohol and drug use in 195 countries and territories, 1990-2016: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet Psychiatry. 2018; 5(12): 987-1012. doi: 10.1016/S2215-0366(18)30337-7. Erratum in: Correction to Lancet Psychiatry 2018; 5: 987-1012.
https://doi.org/10.1016/S2215-0366(18)30...
) da saúde pública e elevados custos econômicos, sob a forma de combate à criminalidade, perdas de produtividade e custos de cuidados de saúde. Apesar das políticas públicas voltadas para essa problemática, os pacientes apresentam alta variabilidade de resposta às intervenções e taxas igualmente elevadas de recidivas(66 Capella MD, Adan A. The age of onset of substance use is related to the coping strategies to deal with treatment in men with substance use disorder. Peer J. 2017; 5: e3660. doi: 10.7717/peerj.3660.
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-77 Gryczynski J, Schwartz RP, O’Grady KE, Restivo L, Mitchell SG, Jaffe JH. Understanding Patterns Of High-Cost Health Care Use Across Different Substance User Groups. Health Aff. (Millwood). 2016; 35(1): 12-9. doi: 10.1377/hlthaff.2015.0618
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).

Conhecer os perfis sociodemográfico e clínico de usuários e dependentes de drogas internados contribui para o aprofundamento do conhecimento dessa temática na área da saúde pública e de enfermagem. Apesar de sua importância, poucos trabalhos de enfermeiros brasileiros enfocam os critérios diagnósticos para internação de homens em hospital psiquiátrico por diagnóstico de transtornos relacionados ao consumo de substâncias. Estudos da área poderiam permitir a geração de subsídios para planos de enfrentamento condizentes com as necessidades dessa clientela, bem como fomentar políticas públicas com vistas à prevenção, diagnóstico precoce e tratamento.

Neste estudo os objetivos foram avaliar o risco relacionado ao uso de drogas em homens internados em hospital psiquiátrico e identificar associações com variáveis sociodemográficas, socioeconômicas e condições de risco.

Método

Estudo transversal e descritivo, realizado em um hospital psiquiátrico integrado à RAPS, com 364 leitos, em um município do noroeste do Estado do Paraná. Os dados foram coletados na unidade de internação para pacientes do sexo masculino com dependência química, que possui 80 leitos. A população do estudo foi composta por pacientes internados nessa unidade.

A amostragem foi definida de maneira não probabilística, e os indivíduos foram selecionados por conveniência. Nos meses que antecederam a coleta de dados, observou-se taxa de ocupação acima de 90% e, no ano 2015, foram observadas 717 internações na unidade que recebe os dependentes químicos. Para o cálculo amostral, considerou-se o valor 717 como tamanho da população, estimando-se que 80% dos internados apresentariam Risco Relacionado ao Uso (RRU) de drogas nos níveis moderado ou elevado para, pelo menos, um tipo droga. Considerando margem de erro de 5% e nível de confiança de 95%, seriam necessárias 184 entrevistas para representar tal universo. Dessa forma, decidiu-se recrutar para o estudo a totalidade de 218 pacientes internados no período compreendido entre abril e julho de 2016.

Adotou-se como critério de inclusão a internação do paciente do sexo masculino que recebeu diagnóstico de transtornos relacionados ao consumo de substâncias com codificação F10 a F19, de acordo com a décima versão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID-10). Foram excluídos aqueles pacientes internados com síndrome de abstinência, delirium ou outra condição clínica que os impossibilitasse de responder à entrevista ou assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

No período da coleta de dados, os pesquisadores verificaram as novas internações na unidade para dependentes químicos três vezes por semana, e realizavam a abordagem dos pacientes e sua disponibilidade em participar da pesquisa. Após breve explicação dos objetivos da pesquisa, os pacientes foram entrevistados em local privativo.

O roteiro estruturado de entrevista foi composto por um bloco de variáveis sociodemográficas, socioeconômicas e de condições de risco, e pelo instrumento de rastreamento do RRU de drogas Alcohol, Smoking and Substance Involviment Screening Test, versão 3.1 (ASSIST 3.1).

Para a caracterização sociodemográfica, foram utilizadas as seguintes variáveis: idade, estado civil, número de filhos, raça/cor e religião. Já para a caracterização socioeconômica, foram avaliados: renda familiar, se exercia trabalho ou atividade remunerada no momento da pesquisa, condições de moradia, anos de estudo e dados relativos às condições de risco às quais está exposto decorrente do uso de drogas, sendo, para tanto, listadas as variáveis direção sob o efeito de álcool ou outras drogas, internação involuntária, comportamento sexual desprotegido ou com múltiplos parceiros, convívio com familiar usuário de drogas e presença de problemas com a justiça.

O ASSIST 3.1 é composto de oito questões sobre o uso de nove classes de substâncias (tabaco, álcool, maconha, cocaína, anfetaminas, sedativos, inalantes, alucinógenos e opiáceos) e objetivando abordar a frequência de uso de cada uma delas (na vida e nos últimos três meses), por meio das seguintes variáveis: problemas relacionados ao uso, preocupação por parte de pessoas próximas do usuário, prejuízo na execução de tarefas esperadas, tentativas de cessação ou redução do consumo malsucedidas, sentimento de compulsão e uso por via injetável. Cada resposta corresponde a uma pontuação, que varia de zero a 8, e a soma compõe o escore de risco relacionado ao uso (RRU) de drogas, podendo variar de zero a 39(88 Henrique IF, De Micheli D, Lacerda RB de, Lacerda LA, Formigoni ML. Validation of the Brazilian version of Alcohol, Smoking and Substance Involvement Screening Test (ASSIST). Rev Assoc Med Bras. [Internet]. 2004 [cited Jan 25, 2001]; 50: 199-206. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ramb/v50n2/20784.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ramb/v50n2/2078...
-99 Humeniuk R, Ali R, Babor TF, Farrel M, Formigoni ML, Jittiwutikam J, et al. Validation of the alcohol, smoking and substance involvement screening test (ASSIST). Addiction. 2008; 103(6): 1039-47. doi: 10.1111/j.1360-0443.2007.02114.x.
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).

Para o consumo de álcool, escores do RRU na faixa de zero a 10 são considerados de baixo risco; de 11 a 26, como de risco moderado; e, quando superior a 27 pontos, de alto risco. Já para outras drogas, as pontuações necessárias para o preenchimento de cada uma das categorias são, respectivamente, 0 a 3 pontos, 4 a 26 pontos e superior a 27 pontos. Pode-se identificar uma série de problemas associados ao uso de drogas, incluindo intoxicação aguda, uso crônico ou dependência e risco elevado de uso de substâncias injetáveis. Um resultado com escores do RRU na faixa intermediária do ASSIST é indicativo de uso de substâncias perigosas ou prejudiciais (risco moderado), e escores mais altos indicam a dependência de drogas (alto risco)(88 Henrique IF, De Micheli D, Lacerda RB de, Lacerda LA, Formigoni ML. Validation of the Brazilian version of Alcohol, Smoking and Substance Involvement Screening Test (ASSIST). Rev Assoc Med Bras. [Internet]. 2004 [cited Jan 25, 2001]; 50: 199-206. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ramb/v50n2/20784.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ramb/v50n2/2078...

9 Humeniuk R, Ali R, Babor TF, Farrel M, Formigoni ML, Jittiwutikam J, et al. Validation of the alcohol, smoking and substance involvement screening test (ASSIST). Addiction. 2008; 103(6): 1039-47. doi: 10.1111/j.1360-0443.2007.02114.x.
https://doi.org/10.1111/j.1360-0443.2007...
-1010 World Health Organization (WHO). Management of Substance Abuse. The ASISIT project - Alcohol, Smoking and Substance Involvement Screening Test (ASSIST) [Internet]. Geneva: WHO; 2010 [cited Jan 25, 2001]. Available from: https://www.who.int/substance_abuse/activities/assist/en/
https://www.who.int/substance_abuse/acti...
).

O uso sustentado, nos últimos três meses de drogas por via injetável, é classificado pelo instrumento ASSIST 3.1 como de risco elevado, não existindo cálculo de escore para essa questão. Dependendo do padrão de consumo, os usuários com uso sustentado devem ser submetidos a intervenção breve, intervenção mais aprofundada e/ou tratamento intensivo.

Os dados foram compilados com o uso do softwareStatistical Package for Social Sciences (SPSS), e as variáveis independentes (sociodemográficas, socioeconômicas e de condições de risco) foram dicotomizadas para posterior realização da análise estatística descritiva e do ajuste do modelo de regressão logística binária para o evento RRU moderado ou alto, separadamente para cada DA. A seleção das variáveis independentes para o modelo final foi realizada pelo método backward stepwise com nível de significância de 5%. Para as variáveis significativas no modelo final adotou-se, como medida de associação, a razão de chances (Odds Ratio - OR) e seu respectivo intervalo de confiança de 95% (IC95%)(1111 Agresti A. An introduction to categorical data analysis. 3. ed. Hoboken, NJ: John Wiley; 2019.).

O estudo atendeu às normas éticas nacionais e internacionais em pesquisa envolvendo seres humanos e o estudo foi submetido à aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Faculdade Ingá/Uningá, sob o número 51754915.5.0000.5220, sendo aprovado pelo parecer número 1.375.463.

Resultados

No período do estudo, foram realizadas 218 internações no setor de dependentes químicos, sendo entrevistados 209 homens, com perda de seis indivíduos que se encontravam em síndrome de abstinência ou incapacidade de assinar o TCLE, e de três recusas em participar da pesquisa. Os dados da caracterização sociodemográfica, socioeconômica e de condições de risco da amostra são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1
Variáveis sociodemográficas, socioeconômicas e condições de risco dos 200 homens internados em um hospital psiquiátrico. Maringá, PR, Brasil, 2016

Os entrevistados (51,5%) tinham entre 18 e 34 anos de idade, com média de 34,9 anos (Desvio-Padrão - DP=10,87 anos) e mediana de 34 anos; solteiros (79%), com filhos (60,7%) e de raça/cor branca (48,4%). Já os dados socioeconômicos revelaram renda mensal familiar média de R$1.997,93 (DP=1903,68) e mediana de R$1.600,00. Dos homens 51,5% não estavam trabalhando na época da coleta dos dados, residiam em casa própria (51,5%) e tinham menos de 8 anos de estudo (62,3%) (Tabela 1).

Na amostra em tela observou-se que os homens estiveram internados por transtornos relacionados ao consumo de substâncias em média 4,33 vezes (DP=4,9), com mediana de internações de 2 e moda de uma internação, sendo que 27,2% (n=57) estavam internados pela primeira vez.

Com relação às condições de risco às quais se submeteram em vista do uso de drogas, a maior parte relatou ter dirigido sob efeito de alguma DA (70%), sido internada voluntariamente (77,5%), apresentado comportamento sexual de risco (87,6%), convivia com, pelo menos, um familiar que era usuário de alguma DA (87,6%) e tinha problemas com a justiça (58,9%) (Tabela 1).

O uso de drogas na vida, triado pelo instrumento ASSIST, está demonstrado na tabela 2. Evidenciaram-se três padrões de prevalência de uso na vida e de idade de experimentação das drogas: o primeiro estava relacionado às drogas lícitas álcool e tabaco, que apresentaram maiores prevalências de uso na vida e menores idades de experimentação. O segundo padrão diz respeito às drogas ilícitas (maconha, inalantes, cocaína e crack), para as quais as idades médias de experimentação coincidem com o final da adolescência e início da idade adulta, e apresentam prevalências intermediárias de uso na vida. Por fim, estiveram as drogas de uso recreativo como alucinógenos, anfetaminas e opioides, com menores prevalências de uso na vida e idades médias de experimentação maiores, prevalentes em adultos jovens. Na amostra em tela, não foi verificado uso na vida de drogas hipnóticas e sedativas. Observou-se ainda que 3 homens (1,4%) referiram já ter feito uso de cocaína por via injetável, porém de forma experimental, sem, no entanto, ter desenvolvido uso sustentado (Tabela 2).

Tabela 2
Uso na vida de drogas de abuso rastreadas pelo ASSIST 3.1* * ASSIST 3.1: Alcohol, Smoking and Substance Involvement Screening Test, versão 3.1 e idade média de experimentação de drogas de abuso de 209 homens internados em um hospital psiquiátrico. Maringá, PR, Brasil, 2016

Os dados relativos ao RRU de drogas são apresentados na Tabela 3. Para o tabaco, 85,2% dos participantes se enquadraram nas faixas de risco moderado e elevado, para o álcool, 86,6%. Já para as drogas ilícitas, identificaram-se as seguintes prevalências de RRU: maconha com 48,3% da amostra; para a cocaína inalada foram 32,5%; enquanto, para a cocaína fumada (crack), 44,0% dos homens se enquadram nos níveis de risco moderado e elevado. Em relação às anfetaminas, a prevalência do RRU moderado e elevado foi de 3,3%; para os inalantes foi de 3,0%; para os alucinógenos foi de 8,6% e, finalmente, a prevalência do RRU de opioides foi de 1,4%. Na presente amostra, foi observada prevalência de 6,2% de consumo de drogas (cocaína) pela via injetável nos últimos três meses, de forma sustentada, sendo esse padrão de uso considerado de risco alto, segundo o ASSIST 3.1.

Tabela 3
Risco Relacionado ao Uso (RRU) de drogas rastreadas pelo Alcohol, Smoking and Substance Involvement Screening Test, versão 3.1 (ASSIST 3.1), em 209 homens internados em um hospital psiquiátrico. Maringá, PR, Brasil, 2016

Com relação à associação de drogas, ou seja, o uso concomitante de substâncias psicoativas que tiveram prevalência de RRU, nos níveis moderado e elevado, observou-se que 72,7% dos homens internados foram rastreados positivamente para tabaco e álcool, 29,7% para tabaco, álcool e maconha, 18,1% para tabaco, álcool, maconha e cocaína, 11,4% para tabaco, álcool, maconha, cocaína e crack, 1,9% para tabaco, álcool, maconha, cocaína, crack e anfetaminas e 1,0% para todas as 7 substancias rastreadas (Tabela 4).

Tabela 4
Distribuição de frequências de associação de drogas rastreadas pelo Alcohol, Smoking and Substance Involvement Screening Test, versão 3.1 (ASSIST 3.1), em 209 homens internados em um hospital psiquiátrico. Maringá, PR, Brasil, 2016

O resultado da regressão logística binária das variáveis (sociodemográficas, socioeconômicas e de condições de risco) sobre o desfecho do RRU (moderado e elevado) está demonstrado na Tabela 5. Não foram observadas associações significativas entre as variáveis e os níveis de RRU de tabaco, álcool, anfetaminas, inalantes, hipnóticos/sedativos e opioides e drogas injetáveis.

Tabela 5
Análise de regressão logística binária para o efeito das variáveis selecionadas sobre o nível de risco relacionado ao uso moderado ou elevado de cada tipo de drogas em homens internados em um hospital psiquiátrico. Maringá, PR, Brasil, 2016

Para os níveis de risco moderado e elevado de maconha, houve associação significativa com problemas com a justiça, assumir comportamento sexual de risco, ter idade de 18 até 34 anos e conviver com familiares usuários de substâncias.

Para os níveis de RRU de cocaína inalada, nos níveis moderado e elevado, verificou-se associação estatística significativa com as variáveis não professar religião, ter comportamento sexual de risco, ter idade de 18 até 34 anos e conviver com usuário de drogas. Já para a cocaína fumada (crack) os níveis de RRU foram estatisticamente associados com as variáveis ter problemas com a justiça, ser internado involuntariamente, ter idade até de 18 a 34 anos e ter sido internado mais de duas vezes.

Para as drogas alucinógenas, verificaram-se associações significativas, no nível de confiança de 95% entre os níveis moderado e elevado de RRU com as variáveis não trabalhar atualmente e idade de 18 até 34 anos.

Discussão

Os principais achados deste estudo foram quatro: o perfil sociodemográfico, o padrão etário de experimentação (uso na vida), os níveis de RRU de drogas, e a associação de variáveis sociodemográficas com os níveis de RRU de maconha, cocaína, crack e alucinógenos.

Sabidamente maior entre homens, o início do uso de drogas também é mais precoce, mantendo relação com o consumo sustentado. Fatores como fácil acesso, baixo custo e preferência por drogas consideradas potentes, são apontados como contribuintes para esse quadro. Esse cenário resulta em dificuldade para a recuperação, sendo um desafio para os profissionais de saúde que terão que enfrentar a baixa adesão aos tratamentos propostos e as elevadas taxas de recaídas(1212 Kuhn C. Emergence of sex differences in the development of substance use and abuse during adolescence. Pharmacol Ther. 2015; 153: 55-78. doi: https://doi.org/10.1016/j.pharmthera.2015.06.003
https://doi.org/10.1016/j.pharmthera.201...

13 Capella MdM, Adan A. The age of onset of substance use is related to the coping strategies to deal with treatment in men with substance use disorder. Peer J. 2017; 5: e3660. doi: https://doi.org/10.7717/peerj.3660
https://doi.org/10.7717/peerj.3660...
-1414 Raposo JC, Costa AC, Valença PA, Zarzar PM, Diniz AD, Colares V, et al. Binge drinking and illicit drug use among adolescent students. Rev Saúde Pública. 2017; 51: 83. doi: https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2017051006863.
https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2017...
). Dados sobre essa realidade são importantes para advogar políticas de saúde e de desinstitucionalização desses homens.

A experimentação de drogas durante a adolescência, ou seja, dos 12 aos 18 anos(1515 Lei no 8.069, de 13 de julho 1990. Câmera dos Deputados. Estatuto da Criança e do Adolescente ECA. Diário Oficial da União, de 16 jul 1990. Brasília, DF. Disponível em: http://www.crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/publi/camara/estatuto_crianca_adolescente_9ed.pdf
http://www.crianca.mppr.mp.br/arquivos/F...
), é virtualmente normativa. No entanto, a maioria dos indivíduos não se torna dependente de drogas(1212 Kuhn C. Emergence of sex differences in the development of substance use and abuse during adolescence. Pharmacol Ther. 2015; 153: 55-78. doi: https://doi.org/10.1016/j.pharmthera.2015.06.003
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). As vulnerabilidades para o desenvolvimento de transtornos relacionados às drogas estão relacionadas à idade de experimentação, genética, sexo e causas psiquiátricas, como depressão, transtornos de conduta, o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) − classificados como intrínsecas; os extrínsecos são o acesso às drogas, o ambiente (familiar, escolar e comunitário), os pares, o convívio com pais usuários, estresse comum a essa fase do desenvolvimento e ocorrência de abuso físico ou sexual(1212 Kuhn C. Emergence of sex differences in the development of substance use and abuse during adolescence. Pharmacol Ther. 2015; 153: 55-78. doi: https://doi.org/10.1016/j.pharmthera.2015.06.003
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13 Capella MdM, Adan A. The age of onset of substance use is related to the coping strategies to deal with treatment in men with substance use disorder. Peer J. 2017; 5: e3660. doi: https://doi.org/10.7717/peerj.3660
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-1414 Raposo JC, Costa AC, Valença PA, Zarzar PM, Diniz AD, Colares V, et al. Binge drinking and illicit drug use among adolescent students. Rev Saúde Pública. 2017; 51: 83. doi: https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2017051006863.
https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2017...
).

Estudos indicam que os transtornos relacionados às drogas têm grande prevalência mundial, sendo o abuso de tabaco e álcool os mais prevalentes(55 GBD 2016 Alcohol and Drug Use Collaborators. The global burden of disease attributable to alcohol and drug use in 195 countries and territories, 1990-2016: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet Psychiatry. 2018; 5(12): 987-1012. doi: 10.1016/S2215-0366(18)30337-7. Erratum in: Correction to Lancet Psychiatry 2018; 5: 987-1012.
https://doi.org/10.1016/S2215-0366(18)30...
), ocasionando elevados custos aos sistemas públicos (saúde, segurança e previdenciário), relacionados ao tratamento e às consequências diretas do abuso, uma vez que as drogas têm importante protagonismo com certos tipos de câncer, doenças respiratórias, cardiovasculares, gastrintestinais e em causas externas de morbimortalidade como acidentes, violências e criminalidade(1616 Rehm J, Gmel GE, Gmel G, Hasan OSM, Imtiaz S, Popova S, et al. The relationship between different dimensions of alcohol use and the burden of disease-an update. Addiction. 2017; 112(6):968-1001. doi: https://doi.org/10.1111/add.13757
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).

A carga global de doenças causadas pelo consumo de drogas é heterogênea, sofrendo influência de fatores sociodemográficos e socioeconômicos. É mais prevalente em países com baixas e médias rendas, como é o caso do Brasil e, consoante a essa característica, observamos que os homens internados eram jovens ou adultos jovens (em idade economicamente ativa), solteiros, com filhos, com menos de oito anos de estudo e que não trabalhavam no momento da pesquisa, indicando que o consumo de drogas é um problema social global que varia substancialmente entre países, dependendo do desenvolvimento social de cada uma deles(55 GBD 2016 Alcohol and Drug Use Collaborators. The global burden of disease attributable to alcohol and drug use in 195 countries and territories, 1990-2016: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet Psychiatry. 2018; 5(12): 987-1012. doi: 10.1016/S2215-0366(18)30337-7. Erratum in: Correction to Lancet Psychiatry 2018; 5: 987-1012.
https://doi.org/10.1016/S2215-0366(18)30...
,1717 Whiteford HA, Ferrari AJ, Degenhardt L, Feigin V, Vos T. The Global Burden of Mental, Neurological and Substance Use Disorders: An Analysis from the Global Burden of Disease Study 2010. PLoS One. 2015; 10(2): e0116820. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0116820
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).

As drogas são responsáveis por 14,7% dos anos de vida perdidos ajustados por incapacidades, e tal magnitude continuará a crescer à medida que ocorre a transição na carga de doenças transmissíveis para não transmissíveis. Os sistemas de saúde em todo o mundo precisam responder a essa demanda crescente, implementando intervenções comprovadas e economicamente viáveis, bem como apoiar a pesquisa necessária para desenvolver melhores opções de prevenção e tratamento(1818 Cavalcanti AM, Kusma S, Chomatas ER, Ignácio SA, Mendes E, Moysés S, et al. Noncommunicable diseases and their common risk factors in Curitiba, Brazil: results of a cross-sectional, population-based study. Rev Panam Salud Pública. 2018; 42:1-10. doi: https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.57
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).

O risco RRU de álcool e tabaco foi o mais prevalente na amostra, e o tabaco, que não leva a internações psiquiátricas. Essas substâncias são fatores de risco para uma série de doenças não comunicáveis, como câncer de pulmão e outros tipos de cânceres, Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), doenças cardiovasculares, gastrintestinais e psiquiátricas. Estudo de base populacional em cidade do Sul do Brasil indicou que dentre os principais fatores de risco para doenças não comunicáveis estão o tabagismo, presente em 16,1% da população, e o alcoolismo, presente em 23,4%, na forma de beber pesado(1818 Cavalcanti AM, Kusma S, Chomatas ER, Ignácio SA, Mendes E, Moysés S, et al. Noncommunicable diseases and their common risk factors in Curitiba, Brazil: results of a cross-sectional, population-based study. Rev Panam Salud Pública. 2018; 42:1-10. doi: https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.57
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).

A embriaguez alcoólica e o uso de drogas direcionam o usuário para o aumento da probabilidade de fazer ou se envolver em algo potencialmente prejudicial(1919 Leigh BC. Peril, chance, adventure: concepts of risk, alcohol use and risky behavior in young adults. Addiction. 1999; 94(3): 371-83. doi: https://doi.org/10.1046/j.1360-0443.1999.9433717.x
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), como dirigir embriagado, comportamentos violentos e crimes(2020 Banks DE, Hershberger AR, Pemberton T, Clifton RL, Aalsma MC, Zapolski TCB. Poly-use of cannabis and other substances among juvenile-justice involved youth: variations in psychological and substance-related problems by typology. Am J Drug Alcohol Abuse. 2019: 1-10. doi: 10.1080/00952990.2018.1558450.
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), ou comportamentos descuidados (sexual, por exemplo)(2121 Kidd JD, Tross S, Pavlicova M, Hu MC, Campbell AN, Nunes EV. Sociodemographic and Substance Use Disorder Determinants of HIV Sexual Risk Behavior in Men and Women in Outpatient Drug Treatment in the NIDA National Drug Abuse Treatment Clinical Trials Network. Subst Use Misuse. 2017; 52(7): 858-65. doi: https://doi.org/10.1080/10826084.2016.1264971
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). No tocante às atividades, elas podem aumentar a probabilidade de acidentes(2222 Al-Hamdani M, Joyce KM, Cowie M, Smith S, Stewart SH. Too little, too much or just right: Injury/illness sensitivity and intentions to drink as a basis for alcohol consumer segmentation. Subst Use Misuse. 2019; 1-5. doi: https://doi.org/10.1080/10826084.2018.1549081
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), levando ao risco aumentado de ferimentos e traumas(1717 Whiteford HA, Ferrari AJ, Degenhardt L, Feigin V, Vos T. The Global Burden of Mental, Neurological and Substance Use Disorders: An Analysis from the Global Burden of Disease Study 2010. PLoS One. 2015; 10(2): e0116820. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0116820
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).

O poliuso de drogas, verificado na amostra em tela, corrobora achados de outros estudos(2323 Zambon A, Airoldi C, Corrao G, Cibin M, Agostini D, Aliotta F, et al. Prevalence of Polysubstance Abuse and Dual Diagnosis in Patients Admitted to Alcohol Rehabilitation Units for Alcohol-Related Problems in Italy: Changes in 15 Years. Alcohol Alcohol. 2017; 52(6): 699-705. doi: https://doi.org/10.1093/alcalc/agx061
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-2424 Cunha SM, Araujo RB, Bizarro L, Cunha SM, Araujo RB, Bizarro L. Profile and pattern of crack consumption among inpatients in a Brazilian psychiatric hospital. Trends Psychiatry Psychother. 2015; 37(3): 126-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/2237-6089-2014-0043
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), nos quais foi observada tendência de poliuso de drogas em indivíduos hospitalizados para o tratamento de alcoolismo(2323 Zambon A, Airoldi C, Corrao G, Cibin M, Agostini D, Aliotta F, et al. Prevalence of Polysubstance Abuse and Dual Diagnosis in Patients Admitted to Alcohol Rehabilitation Units for Alcohol-Related Problems in Italy: Changes in 15 Years. Alcohol Alcohol. 2017; 52(6): 699-705. doi: https://doi.org/10.1093/alcalc/agx061
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). Já naqueles internados por dependência de crack, foi verificado envolvimento com drogas lícitas durante a adolescência(2424 Cunha SM, Araujo RB, Bizarro L, Cunha SM, Araujo RB, Bizarro L. Profile and pattern of crack consumption among inpatients in a Brazilian psychiatric hospital. Trends Psychiatry Psychother. 2015; 37(3): 126-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/2237-6089-2014-0043
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).

A assistência do usuário de drogas é afetada pelas mídias, resultando em discursos que simultaneamente recusam a repressão policial e a adoção de aparatos visíveis de coerção, mas coadunam dispositivos institucionais nem sempre visíveis de violência sanitária, como a internação desses usuários, legitimada pelo passivo reconhecimento da desarticulação da RAPS e pelo corpus biomédico compartilhado pelos profissionais(2525 Borges SA, Santos ML, Porto PN, Borges SA, Santos ML, Porto PN. Humanized Moral-Legal Discourse on drugs and healthcare violence in family health. Saúde em Debate. 2018; 42(117): 430-41. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0103-1104201811707
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).

Define-se o usuário como avolitivo, dominado pela droga autônoma. Tais práticas corroboram a desassistência na Atenção Primária, legitimando lacunas assistenciais, preenchidas por instituições mais humanizadas, porém não menos perversas, que sobrevivem sustentadas por meio de financiamento público, ajustando-se às fragilidades na implementação da reforma psiquiátrica e sanitária no Brasil(2525 Borges SA, Santos ML, Porto PN, Borges SA, Santos ML, Porto PN. Humanized Moral-Legal Discourse on drugs and healthcare violence in family health. Saúde em Debate. 2018; 42(117): 430-41. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0103-1104201811707
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).

As limitações deste estudo residem no fato de a coleta de dados ter ocorrido dentro de uma instituição psiquiátrica, o que pode enviesar as respostas dos participantes, ciosos pela alta hospitalar ou mesmo receosos pelo fato de essa temática tangenciar com a ilegalidade e, em última análise, pelo estigma internalizado pelos próprios participantes. No entanto, essa abordagem apresenta fortalezas e traz, como contribuição para o avanço do conhecimento, a possibilidade de evidenciar os perfis sociodemográficos, socioeconômicos e de condições de risco que têm influência sobre o RRU de drogas, que podem ser utilizados para subsidiar o planejamento e elaboração de políticas públicas de prevenção, programas de redução de danos, bem como servir para a capacitação da atenção básica para o atendimento desses indivíduos.

Conclusão

Observou-se risco relacionado ao uso nos níveis moderado e elevado para álcool, tabaco, maconha, crack, alucinógenos, anfetaminas, inalantes e opioides. Na amostra em tela observou-se que 1,4% dos homens fez uso experimental (uso na vida) de cocaína por via injetável, sem manutenção de uso sustentado, e 6,2% apresentam uso sustentado (uso atual) na avaliação dos últimos três meses.

A variável idade de 18 até 34 anos foi associada ao risco relacionado ao consumo de maconha, cocaína inalada e fumada e alucinógenos; conviver com usuários de drogas de abuso foi associada ao risco relacionado ao consumo de maconha e cocaína inalada; envolver-se com problemas de justiça foi associada ao risco relacionado ao consumo de álcool, maconha e cocaína fumada; a variável ter comportamento sexual de risco foi associada ao risco relacionado ao consumo de maconha e cocaína inalada; não ter religião foi associado ao risco relacionado ao consumo de cocaína inalada; ter sido internado involuntariamente e ter sido internado mais de duas vezes foram associados ao risco relacionado ao consumo de cocaína fumada; e não estar trabalhando atualmente foi associado ao risco relacionado ao consumo de alucinógenos.

  • *
    O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - Código de Financiamento 001, Brasil.

Agradecimentos

Os autores agradecem aos pacientes que participaram da pesquisa e aos profissionais e direção do Hospital Psiquiátrico de Maringá.

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Editado por

Editora Associada: Sueli Aparecida Frari Galera

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    28 Jan 2019
  • Aceito
    15 Mar 2020
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