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Avaliação da assistência pré-natal em unidades básicas do município de São Paulo

Resumos

O objetivo deste estudo foi avaliar a qualidade da assistência pré-natal oferecida em doze Unidades Básicas de Saúde (UBS) do município de São Paulo, através da revisão dos prontuários médicos e de enfermagem antes e após a municipalização do sistema de saúde. Foi utilizado um indicador que considerava como atendimento de excelência aquele com início do acompanhamento pré-natal no primeiro trimestre da gestação, no mínimo seis consultas, registro de pelo menos dois resultados de exames sorológicos para sífilis e um teste para o HIV, retorno à UBS até 42 dias pós-parto. Esse indicador não foi obtido em nenhum atendimento realizado em 2000 e apenas em 7,7% dos atendimentos em 2004 (1,1 a 30% dos atendimentos por unidade avaliada). Embora com evidente melhora do atendimento no período, a baixa proporção de atendimento pré-natal de excelência revela urgente necessidade de melhorar essa assistência nas UBS no Município de São Paulo.

cuidado pré-natal; qualidade da assistência à saúde; sífilis congênita; HIV


The aim of this study was to evaluate the quality of prenatal care offered in 12 Basic Health Units (BHU) in the city of Sao Paulo, Brazil, through a review of medical and nurse charts, before and after the municipalization of the public health system. The indicator used considered excellence in care as: starting prenatal care in the first quarter of pregnancy; at least six medical visits; at least two results of blood screening for syphilis and one for HIV; returning to BHU up to 42 days after delivery. This indicator was not present in any care delivered in 2000, and only 7.7% of the care delivered in 2004 obtained it (1.1% to 30% of the care per unit assessed). Although there was an evident improvement in care during the period, the low proportion of excellent prenatal care shows an urgent need to improve this care in the BHU of São Paulo city.

prenatal care; quality of health care; syphilis, congenital; HIV


El objetivo de este estudio fue evaluar la calidad de la asistencia prenatal ofrecida en doce Unidades Básicas de Salud (UBS) del municipio de San Pablo a través de la revisión de los registros médicos y de enfermería antes y después de la municipalización del sistema de salud. Fue utilizado un indicador que consideraba como atención de excelencia aquella con: inicio del acompañamiento prenatal en el primer trimestre de la gestación; con un mínimo de seis consultas; registro de por lo menos dos resultados de exámenes serológicos para sífilis y una prueba para el VIH; retorno a la UBS hasta 42 días después del parto. Ese indicador no fue obtenido en ninguna atención realizada en el 2000 y apenas en 7,7% de las atenciones en el 2004 (1,1% a 30% de las atenciones por unidad evaluada). A pesar de que con evidente mejoría de la atención en el período, la baja proporción de atención prenatal de excelencia, revela una urgente necesidad de mejorar esa asistencia en las UBS en el Municipio de San Pablo.

atención prenatal; calidad de atención de salud; sífilis congénita; VIH


ARTIGO ORIGINAL

IUniversidade Federal de São Paulo, Brasil: Professor Adjunto, e-mail: succi@picture.com.br, elisabeth@denf.epm.br

IIUniversidade Federal de São Paulo, Brasil: Aluna do curso de graduação em Enfermagem, e-mail: marinapeixe@itelefonica.com.br

IIIUniversidade Federal de São Paulo, Brasil: Professor Titular, e-mail: lvianna@reitoria.epm.br

RESUMO

O objetivo deste estudo foi avaliar a qualidade da assistência pré-natal oferecida em doze Unidades Básicas de Saúde (UBS) do município de São Paulo, através da revisão dos prontuários médicos e de enfermagem antes e após a municipalização do sistema de saúde. Foi utilizado um indicador que considerava como atendimento de excelência aquele com início do acompanhamento pré-natal no primeiro trimestre da gestação, no mínimo seis consultas, registro de pelo menos dois resultados de exames sorológicos para sífilis e um teste para o HIV, retorno à UBS até 42 dias pós-parto. Esse indicador não foi obtido em nenhum atendimento realizado em 2000 e apenas em 7,7% dos atendimentos em 2004 (1,1 a 30% dos atendimentos por unidade avaliada). Embora com evidente melhora do atendimento no período, a baixa proporção de atendimento pré-natal de excelência revela urgente necessidade de melhorar essa assistência nas UBS no Município de São Paulo.

Descritores: cuidado pré-natal; qualidade da assistência à saúde; sífilis congênita; HIV

INTRODUÇÃO

O conjunto de procedimentos clínicos e educativos destinados a acompanhar a evolução da gravidez e promover a saúde da gestante e da criança caracteriza a assistência pré-natal. Avaliar a qualidade dessa assistência, com a proposta de aprimorá-la, requer esforços constantes das autoridades de saúde, dos profissionais que executam essas ações e também da população alvo, que deve estar atenta aos problemas surgidos e buscar soluções.

Em nosso meio, o sistema de vigilância epidemiológica tem sido suficiente para apontar problemas, mas não consegue aprimorar a viabilidade das medidas de prevenção(1). O Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento (PHPN), criado pelo Ministério da Saúde 2000(2), além de definir os procedimentos mínimos para assistência adequada, estabeleceu um sistema informatizado de controle - SisPreNatal para o acompanhamento adequado das gestantes inseridas no PHNP do Sistema Único de Saúde (SUS), cadastrando a gestante na primeira consulta, acompanhando-a até o puerpério. A municipalização dos serviços de saúde é parte de um processo de descentralização política, técnica e administrativa e se traduz na implementação, organização e gestão do trabalho e manejo de recursos - em São Paulo, esse processo se iniciou em 2001.

A avaliação da qualidade da assistência pré-natal e as intercorrências que resultaram em recém-nascidos portadores de sífilis congênita de gestantes atendidas em 41 unidades básicas de saúde (UBS) do município de São Paulo(3), em 2000, concluiu, entre outros pontos, que a assistência prestada às gestantes na maioria das unidades estudadas não atende as exigências do Ministério da Saúde(4). A criação de indicadores da qualidade da assistência nessa pesquisa possibilitou a identificação de problemas e a avaliação da implantação das políticas públicas de saúde e da organização dos serviços, além de monitorar as ações preventivas no pré-natal e tentar erradicar e/ou controlar os possíveis agravos à gestante e ao concepto(3).

O objetivo deste estudo foi avaliar, por meio de indicadores, a qualidade da assistência pré-natal oferecida em unidades básicas de saúde do município de São Paulo, comparando dois períodos distintos: 2000 (antes) e 2004 (quatro anos após a municipalização dos serviços de saúde).

MATERIAL E MÉTODO

Trata-se de estudo epidemiológico, descritivo e de corte transversal onde o objeto de observação foram os prontuários das gestantes. Neste estudo, utilizou-se uma amostra de 12 UBS, escolhidas aleatoriamente, dentre as 41 UBS que fizeram parte do estudo anterior(2), realizado no ano 2000, período imediatamente anterior à municipalização dos serviços de saúde na cidade de São Paulo.

Os modelos administrativos das 12 UBS avaliadas em 2004 eram os mesmos do ano de 2000 (UBS tradicional, unidades mistas com o modelo de atendimento tradicional + programa de saúde da família, unidades apenas com programa de saúde da família) exceto para uma unidade que passou de UBS tradicional em 2000 para unidade mista em 2004. Cinco unidades pertenciam à coordenadoria de saúde leste, enquanto quatro pertenciam à coordenadoria norte, duas à coordenadoria sul, e uma à coordenadoria centro.

Foram analisados todos os prontuários das gestantes que realizaram consultas de pré-natal em cada UBS em 2004 (mesmo se o acompanhamento tenha iniciado em 2003 ou terminado em 2005). Preencheram esse critério de elegibilidade 1299 gestantes, investigando-se em seus prontuários as variáveis relacionadas às gestantes, aos dados do pré-natal e aos recém-nascidos.

Baseado nas normas do Ministério da Saúde(4), foi considerado um acompanhamento pré-natal adequado, aquele caracterizado por apresentar início do acompanhamento no primeiro trimestre da gestação, no mínimo seis consultas, registro de pelo menos dois resultados de exames sorológicos para sífilis (VDRL), registro de um exame sorológico para o vírus da imunodeficiência humana - HIV, retorno à UBS até 42 dias após o parto. Um índice foi construído, utilizando-se a relação entre o número de gestantes cujo acompanhamento pré-natal na unidade preenchia todos esses itens (pré-natal adequado ou de excelência) e o número total de gestantes atendidas no período. Todos os dados disponíveis nos prontuários foram utilizados: anotações médicas e de enfermagem e resultados de exames laboratoriais (dos prontuários médicos e nos registros do sistema SisPreNatal).

Após a coleta, as variáveis selecionadas foram resumidas como número e porcentagem para as variáveis qualitativas e como média±desvio padrão para as variáveis quantitativas. Comparação entre os dois anos do estudo foi feita em cada uma das unidades avaliadas, utilizando para as variáveis qualitativas o teste qui-quadrado ou exato de Fisher e para as variáveis quantitativas o teste t de Student.

Esta pesquisa foi financiada pelo CNPq (edital 036/2004), aprovada pelos Comitês de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo e da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo.

RESULTADOS

Fizeram acompanhamento pré-natal nas 12 unidades (identificadas por números de 1 a 12) 818 gestantes em 2000 e 1299 em 2004, variando de 41 a 147 gestantes/UBS no ano 2000 e 40 a 299 gestantes/UBS no ano 2004. O número de atendimentos em 2004 foi superior ao de 2000 em todas as UBS, exceto uma. Nas unidades avaliadas, o modelo assistencial era o seguinte: sete unidades básicas de saúde (UBS), quatro unidades mistas (UBS + Programa de Saúde da Família - PSF) e uma com atendimento do tipo PSF.

A média e desvio padrão do número de consultas médicas por gestante nas unidades estudadas variaram de 4,6±1,9 a 6,8±3,2 em 2000 e de 3,9±1,8 a 6,5±3,2 em 2004. Comparando os dois anos estudados, essas médias foram diferentes (com significância estatística) em apenas três unidades: nas unidades 2 e 6 houve redução do número de atendimentos (6,1±2,1 para 4,9±2,0 e 6,8±3,2 para 4,7±2,7; teste t de Student, p=0,007 e p< 0,001, respectivamente) e na unidade 9 houve incremento no número de atendimentos (4,8± 2,3 para 5,5±1,8; teste t de Student, p=0,048). Diferenças marginalmente significantes na média do número de consultas foram observadas com redução em uma unidade e aumento em três unidades.

A proporção de gestantes que realizou consultas de enfermagem foi pequena em todas as UBS, variando de 0,70 a 28,20%. A avaliação do número total de consultas realizadas, somando as consultas médicas e de enfermagem pode ser vista na Tabela 1.

O acompanhamento pré-natal foi iniciado no primeiro trimestre da gestação para 459/818 gestantes (56,10%) em 2000, variando de 39,60 a 85% nas 12 UBS estudadas (Tabela 2); em 2004, essa proporção variou de 37,20 a 80,80%. No total, houve acréscimo significativo no número de gestantes que iniciaram o pré-natal no primeiro trimestre de gestação do ano 2000 para o ano 2004 (qui-quadrado, p<0,05), embora em cinco, das 12 unidades avaliadas, essa proporção tenha sido menor.

A proporção de gestantes que fez acompanhamento até o terceiro trimestre de gestação diminuiu no período avaliado: 711/818 (86,90%) em 2000 para 962/1299 (74%) em 2004. Três unidades apresentaram decréscimo significativo nessa proporção e apenas duas apresentaram aumento, mas essa diferença não foi estatisticamente significante.

Pelo menos um exame sorológico para sífilis durante o acompanhamento pré-natal foi realizado em 76,70% (628/818) das gestantes acompanhadas em 2000 e 86% (1117/1288) em 2004. A Tabela 3 apresenta as unidades de saúde, segundo a realização e o número de exames VDRL realizados durante o acompanhamento pré-natal nos dois anos avaliados.

A realização de pelo menos um exame sorológico para sífilis em 100% das gestantes atendidas só foi obtida em duas unidades em 2000 e em 11/12 (92%) em 2004. A proporção de gestantes que realizou os dois testes preconizados variou de zero a 25% em 2000 e de 3,60 a 69,20% em 2004. A proporção de gestantes que realizou sorologia para sífilis aumentou significantemente em cinco unidades, mas apenas duas UBS realizaram pelo menos um teste em todas as gestantes atendidas nos dois períodos. Uma unidade ainda apresentava, em 2004, 17,20% dos prontuários de atendimento pré-natal sem registro de exame para sífilis.

A prevalência de gestantes infectadas pelo HIV era de 3,70% em 2000 e passou a 0,60% em 2004. Houve acréscimo na proporção de sorologias para HIV realizadas do ano 2000 (510/818) para o ano 2004 (1096/1299); essa diferença foi estatisticamente significativa em cinco unidades (p<0,05). Em 2004, mais de 80% das gestantes atendidas em todas as unidades realizaram esse exame. A distribuição das gestantes que realizaram sorologia para o HIV nas unidades de saúde estudadas pode ser vista na Tabela 4.

Na avaliação feita em 2000, nenhuma das 818 gestantes acompanhadas retornou à UBS nos primeiros 42 dias após o parto. Em 2004, 1239 gestantes acompanhadas tinham registro dessa informação nos prontuários médicos, e 481 delas (38,80%) retornaram à UBS dentro desse período, mas em apenas quatro UBS mais de 50% das gestantes foram avaliadas no puerpério.

Quando se aplicou o indicador de excelência, apenas 100 das 1299 gestantes avaliadas em 2004 (7,70%) o obtiveram (Tabela 5). Em 2000 esse indicador não foi obtido pela ausência de retorno à UBS dentro dos 42 dias após o parto.

DISCUSSÃO

A promoção da saúde da gestante e do feto deve ser feita por meio de boa assistência pré-natal considerada um dos melhores indicadores prognósticos dos resultados obstétricos e neonatais da gestação(5). Essa assistência, considerada prioridade em saúde pública, tem por objetivo central diminuir a morbidade e mortalidade materna e infantil(6), caracterizando-se tanto pelo desenvolvimento de ações preventivas e educativas (por meio de contato freqüente e planejado da gestante com os serviços de saúde) quanto pela identificação de situações de risco para gestantes e fetos com intervenção precoce e oportuna nos problemas que afetam a gravidez. A implementação do programa de atenção pré-natal com a implantação do Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM), em meados da década de 80, determinou mudanças significativas com aumento da cobertura e da média do número de consultas, assim como ao início mais precoce do pré-natal(2).

Neste estudo, foi observado aumento do número de consultas realizadas em todas as UBS analisadas, exceto uma, nos dois períodos estudados. Embora não se tenha acesso ao número de habitantes de cada área de abrangência das unidades avaliadas, pode-se supor que aumento de 58,80% no número de gestantes atendidas (818 em 2000 e 1299 em 2004) não é conseqüência apenas de possível aumento populacional (quer seja da população como um todo ou, particularmente, do número de mulheres em idade fértil). Os dados obtidos sugerem maior acessibilidade das mulheres ao pré-natal.

O Ministério da Saúde considera ideal o acompanhamento pré-natal iniciado no primeiro trimestre de gestação e com seis ou mais consultas no período gestacional(4). Comparando-se os atendimentos em 2000 e 2004, observou-se que oito das 12 UBS avaliadas em 2004 apresentaram média de consultas médicas inferior a seis, além de redução estatisticamente significante do número de consultas realizadas em duas unidades. Embora o número de consultas de enfermagem ainda seja muito pequeno em todas as UBS avaliadas, quando se considerou o total de consultas realizadas (médico+enfermeira) houve aumento na proporção de gestantes que atingiram o mínimo de consultas necessárias em metade das UBS. Entretanto, apenas 52,70% das gestantes atendidas em 2004 (685/1299) tinham atingido esse número de consultas e em três unidades a proporção de gestantes com esse indicador foi inferior a 50% (Tabela 1).

O maior número de visitas pré-natais e a assistência precoce à gestante se associam com melhor crescimento intra-uterino e menores taxas de morbimortalidade neonatal, prematuridade, baixo peso ao nascer e morte materna(7-11). A época do início e término do acompanhamento é marcador importante da qualidade do pré-natal, que idealmente se deve iniciar no primeiro trimestre de gestação e se prolongar até o 3º trimestre. O início precoce tem importância principalmente na diminuição das morbidades maternas, e sua manutenção até o terceiro trimestre da gestação favorece a identificação de possíveis riscos perinatais, possibilitando intervenções oportunas. A proporção de gestantes atendidas nas unidades avaliadas com início do acompanhamento pré-natal, no primeiro trimestre de gestação, aumentou no período estudado (Tabela 2), entretanto, a manutenção desse atendimento até o final da gestação, avaliado por meio do número de gestantes que realizaram a consulta no último trimestre de gestação foi pior no ano de 2004, comparado ao ano 2000. O incremento da procura precoce do atendimento pré-natal pode ser reflexo do número de gestantes acompanhadas, como um todo, mas a perda do acompanhamento até o final da gestação pode ser conseqüência de pouco estímulo da família, que desconhece os benefícios desse seguimento, ou mesmo mudanças de endereço, comum nessa população. Entretanto, seja qual for a causa, a perda do acompanhamento pode gerar riscos para o binômio mãe-filho e necessita de ação para corrigir essa falha..

A baixa freqüência às consultas de pré-natal tem como reflexo direto a perda das oportunidades de prevenir os agravos à gestação, principalmente os infecciosos(5). A sífilis e a infecção pelo HIV foram os dois agravos infecciosos utilizados para avaliar a qualidade da assistência pré-natal neste estudo. A despeito do Ministério da Saúde recomendar a realização de dois testes sorológicos para sífilis (VDRL), durante o acompanhamento pré-natal, e considerar o registro de até um caso por 1 000 nascidos vivos, a meta de eliminação da sífilis congênita, estudo realizado em 2004, com amostra representativa de parturientes de 15 a 49 anos de idade, de todas as Regiões do País, observou taxa de prevalência de 1,6% para sífilis ativa(12). Estima-se que cerca de 50 mil parturientes com sífilis ativa e de 12 mil nascidos vivos com sífilis congênita (considerando taxa de transmissão vertical de 25%) ocorreram em 2004, com prevalência diferente em cada Região do País, variando de 1,9% na Região Nordeste a 1,3% na Região Centro-Oeste(12).

Embora tenha sido observado aumento da proporção de unidades que realizaram pelo menos um teste sorológico para sífilis quando se comparou os anos 2000 com 2004, a proporção de gestantes com os dois testes preconizados ainda foi muito baixa (3,60 a 69,20%). A não identificação das gestantes infectadas resulta em ausência de tratamento e impossibilidade de prevenção da doença no recém-nascido.

Conhecer precocemente na gestação a situação de soropositividade para o HIV permite intervir prontamente, visando diminuir o risco de transmissão do vírus à criança. A prevalência de gestantes infectadas pelo HIV nas unidades avaliadas era de 3,70% em 2000 passou para 0,60% em 2004. Essa diminuição da taxa entre os dois anos não deve ser encarada como queda no número de mulheres infectadas no município, o que de fato não ocorreu, mas deve ser avaliada sob a visão da ampliação das solicitações desse teste que, em 2000, eram feitas principalmente para as mulheres que referiam "algum comportamento de risco". Além disso, há no município maior quantidade de centros especializados para o atendimento das gestantes HIV+, o que, por certo, diminui a procura por pré-natal nas UBS. A taxa encontrada em 2004 é compatível com a estimativa de prevalência de parturientes soropositivas para o HIV, feita por meio de estudo sentinela em 2004, que revelou prevalência de 0,537% para a Região Sudeste(12).

O aumento do número de gestantes que realizaram sorologia para sífilis e HIV nas UBS avaliadas sugere busca pela melhoria da qualidade da assistência do pré-natal, cumprindo os objetivos do Programa de Humanização do Pré-natal e prevenindo a transmissão vertical dessas infecções. Entretanto, como já verificado anteriormente(2), a proporção de gestantes que realizou os dois exames para sífilis em todas as unidades foi muito inferior àquela que realizou um teste para HIV.

Retornar à UBS após o parto é uma das medidas de qualidade da assistência pré-natal e estratégia que visa prevenir intercorrências indesejadas ao binômio mãe-filho, sendo também forma de estreitar a relação cliente e serviço, tornando a unidade um local de referência para a saúde e não para a doença. Espera-se, com isso, acompanhar problemas detectados durante o parto e facilitar a adesão da família e a inclusão do bebê no serviço de saúde. Enquanto no ano 2000 não houve registro de retorno às UBS nesse período, em 2004, isso passou a ocorrer em todas as unidades estudadas, embora em apenas quatro delas essa taxa de retorno tenha ultrapassado 50%. A implantação dos programas de saúde da família pode ser responsável por essa melhoria.

O indicador de excelência da assistência pré-natal sugerido(2) utilizou a relação entre o número de gestantes cujo acompanhamento pré-natal na unidade preenchia os critérios de excelência na assistência (início do acompanhamento pré-natal no primeiro trimestre, no mínimo seis consultas, registro de pelo menos dois resultados de exames sorológicos para sífilis - VDRL e um exame sorológico para o HIV e retorno à UBS 42 dias após o parto) e o número total de gestantes atendidas no período nessa unidade. Sua aplicação aos atendimentos realizados em 2004 (Tabela 5), revelou que uma das unidades não apresentou atendimento que se enquadrasse nesse indicador de qualidade, e nas outras unidades os atendimentos que preenchiam esses critérios variaram de 1,10 a 30%. O encontro de apenas 7,7% atendimentos com o indicador de qualidade na assistência ao pré-natal nas unidades avaliadas revela urgente necessidade de melhorar essa assistência.

Também em Maringá, PR, estudo realizado com a finalidade de avaliar a qualidade do atendimento pré-natal, utilizando dois indicadores diferentes (1998 a 2001), revelou 40% de inadequação do atendimento(13). Outro estudo avaliando os dados de 555 979 mulheres cadastradas no SisPreNatal nos dois primeiros anos de sua instalação (2000 e 2001) demonstrou que apenas 20% das mulheres realizaram seis consultas de pré-natal e houve duas vezes mais solicitações de exames para a detecção de infecção pelo HIV do que para sífilis; apenas 2% das mulheres cadastradas em 2001 e 5%, em 2002, realizaram o conjunto das atividades propostas pelo Ministério da Saúde(14).

Importante fator que pode ter interferido na avaliação da qualidade do atendimento pré-natal é a precariedade do registro em prontuário da assistência prestada à gestante. Estudo feito em 1995, numa UBS em Ribeirrão Preto, revelou que os registros da assistência ao pré-natal encontram-se centrados na "incompreensibilidade" e na "incompletude"(15), o que poderia resultar em "sub-registro" dos dados avaliados.

Em conclusão, pode-se dizer que a qualidade do atendimento pré-natal nas 12 UBS estudadas apresentou melhora: aumentou o número de gestantes atendidas e o número de consultas médicas e de enfermagem realizadas; houve aumento da procura pelo atendimento no 1º trimestre da gestação e maior retorno das gestantes às UBS no puerpério; também foram realizados mais testes para identificar gestantes positivas para sífilis e HIV. Entretanto, a manutenção do acompanhamento até o final da gestação diminuiu em 2004 e apenas 7,70% das gestantes tiveram atendimento que cumprisse todas as atividades estabelecidas pelo PHPN(2) do Ministério da Saúde, que ainda não estava implantado em 2000. O pouco retorno às UBS no puerpério pode refletir o baixo vínculo do profissional da saúde com a gestante.

A municipalização dos serviços de saúde parece ter tido importância nessa mudança, embora não tenha sido possível correlacioná-la à influência do modelo assistencial instituído (programa de saúde da família, unidade básica de saúde tradicional ou unidades mistas). Cabe salientar, entretanto, as dificuldades encontradas para avaliar temporalmente o atendimento numa determinada região circunscrita pelo Programa de Saúde da Família, uma vez que a ampliação de áreas de abrangência de uma unidade do PSF resulta em nova identificação numérica das residências e indivíduos, impossibilitando o acompanhamento longitudinal dos usuários do serviço. A recente proposta de Penna e col.(16) que sugeriram a consulta coletiva de pré-natal, poderia priorizar o princípio da integralidade e cidadania, favorecendo assistência humanizada e integral à mulher.

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  • Avaliação da assistência pré-natal em unidades básicas do Município de São Paulo

    Regina Célia de Menezes SucciI; Elisabeth Niglio FigueiredoI; Letícia de Carvalho ZanattaII; Marina Biffani PeixeII; Marina Bertelli RossiII; Lucila Amaral Carneiro ViannaIII
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Fev 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2008

    Histórico

    • Recebido
      14 Ago 2007
    • Aceito
      10 Ago 2008
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