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Ruído na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal e no interior da incubadora

Resumos

Este trabalho teve por objetivo identificar o nível de pressão sonora (NPS) da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) e do interior da incubadora de um hospital escola de uma universidade pública de São Paulo, SP, Brasil. Como método para essa identificação, tanto do NPS da UTIN como do NPS da incubadora, foram utilizados quatro dosímetros, em janeiro de 2010. Os resultados obtidos apontam que o NPS da UTIN variou entre 52,6 dBA e 80,4 dBA, e que o NPS do interior da incubadora foi de 45,4dBA a 79,1dBA. Evidenciou-se que tanto o NPS da UTIN como o do interior da incubadora estão acima dos recomendados, sendo mais altos na UTIN do que na incubadora. Embora haja alguns fatores específicos relacionados ao NPS no interior da incubadora, perfis acústicos da UTIN e da incubadora são como sistema: elevação/redução do NPS da UTIN, geralmente, tende a elevar/reduzir o NPS no interior da incubadora. Portanto, pode-se concluir que o presente estudo aponta para a importância do monitoramento simultâneo dos NPS da UTIN e do interior da incubadora.

Ruído; Terapia Intensiva Neonatal; Enfermagem Neonatal; Humanização da Assistência; Recém-Nascido


The goal was to identify sound pressure level (SPL) at the neonatal intensive care unit (NICU) and inside the incubator of a teaching hospital of a public university from São Paulo - SP, Brazil. SPL inside the NICU and the incubator were measured using four dosimeters in January/2010. SPL at the NICU varied from 52.6 dBA to 80.4 dBA and inside the incubator, from 45.4 dBA to 79.1 dBA. SPL both at the NICU and inside the incubator are above the recommended values, but levels were higher at the NICU than inside the incubator. Although there are some specific factors related to SPL inside the incubator, the NICU and incubator acoustic features present a system: an increase/decrease in SPL at the NICU usually tends to increase/decrease SPL inside the incubator. The study points to the need for simultaneous monitoring of SPL at the NICU and inside the incubator.

Noise; Intensive Care, Neonatal; Neonatal Nursing; Humanization of Assistance; Infant, Newborn


Se tuvo por objetivo identificar el nivel de presión sonora (NPS) de la Unidad de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) y del interior de la incubadora de un hospital escuela de una universidad pública de Sao Paulo-SP, Brasil. El NPS de la UTIN y de la incubadora fueron obtenidos por cuatro dosímetros en enero de 2010. El NPS de la UTIN varió entre 52,6 dBA y 80,4 dBA y el del interior de la incubadora fue de 45,4dBA a 79,1dBA. Tanto el NPS de la UTIN como el del interior de la incubadora son mayores que lo que recomendado, siendo más altos en la UTIN que en la incubadora. A pesar de que existen algunos factores específicos relacionados al NPS en el interior de la incubadora, los perfiles acústicos de la UTIN y de la incubadora son como un sistema, es decir: la elevación/reducción del NPS de la UTIN generalmente tiende a elevar/reducir el NPS en el interior de la incubadora. Se concluye que muy importante la monitorización simultánea del NPS de la UTIN y del interior de la incubadora.

Ruido; Cuidado Intensivo Neonatal; Enfermería Neonatal; Humanización de la Atención


ARTIGO ORIGINAL

Ruído na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal e no interior da incubadora

Eliana Moreira PinheiroI; Ruth GuinsburgII; Marco Antonio de Araujo NabucoIII; Tereza Yoshiko KakehashiI

IEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil. E-mail: Eliana - elianapinheiro@hotmail.com, Tereza - terezayk@ig.com.br

IIMédica, Doutor em Pediatria, Departamento de Pediatria, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil. E-mail: ruthgbr@netpoint.com.br

IIIEngenheiro Elétrico, Doutor em Engenharia Mecânica, Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: nabuco@inmetro.br

Endereço para correspondência

RESUMO

Este trabalho teve por objetivo identificar o nível de pressão sonora (NPS) da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) e do interior da incubadora de um hospital escola de uma universidade pública de São Paulo, SP, Brasil. Como método para essa identificação, tanto do NPS da UTIN como do NPS da incubadora, foram utilizados quatro dosímetros, em janeiro de 2010. Os resultados obtidos apontam que o NPS da UTIN variou entre 52,6 dBA e 80,4 dBA, e que o NPS do interior da incubadora foi de 45,4dBA a 79,1dBA. Evidenciou-se que tanto o NPS da UTIN como o do interior da incubadora estão acima dos recomendados, sendo mais altos na UTIN do que na incubadora. Embora haja alguns fatores específicos relacionados ao NPS no interior da incubadora, perfis acústicos da UTIN e da incubadora são como sistema: elevação/redução do NPS da UTIN, geralmente, tende a elevar/reduzir o NPS no interior da incubadora. Portanto, pode-se concluir que o presente estudo aponta para a importância do monitoramento simultâneo dos NPS da UTIN e do interior da incubadora.

Descritores: Ruído; Terapia Intensiva Neonatal; Enfermagem Neonatal; Humanização da Assistência; Recém-Nascido.

Introdução

Os primeiros estudos sobre a importância do ruído na ecologia da UTIN datam da década de 1970; porém, intensificaram-se a partir da década de 1990, na medida em que se constataram seus efeitos imediatos no estado clínico e consequências no desenvolvimento do neonato, bem como sobre o bem-estar da equipe, com reflexos no seu desempenho profissional(1). Observa-se que pesquisas recentes abordam o monitoramento dos níveis de pressão sonora (NPS) do ambiente da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) ou da incubadora, realizados sob a perspectiva do cuidado desenvolvimental e individualizado aos recém-nascidos prematuros, hospitalizados em unidades neonatais.

O enfoque do cuidado desenvolvimental foi introduzido na década de 1980, como estratégia para mudar as condições ambientais da UTIN, visando o bem-estar e a segurança do neonato, por meio de redução do nível de ruído e intensidade da iluminação, manipulação mínima, provisão de períodos mais longos de descanso, entre outros(2).

O controle do ruído pode constituir-se em difícil tarefa para o enfermeiro, uma vez que os ruídos em UTIN são, em grande parte, gerados pelas atividades assistenciais e conduta dos profissionais(3-4).

A incubadora, por outro lado, idealizada por M.Tarnier, em 1880, foi introduzida pela primeira vez, na história da assistência neonatal, na Maternité de Paris, em 1881, constituindo-se em um dos mais importantes avanços na assistência aos recém-nascidos prematuros(5). Ela proporciona, no seu interior, ar filtrado, visando a proteção contra as infecções, temperatura e umidade do ar controladas para serem ajustadas às necessidades fisiológicas e, por muito tempo, foi considerada o microambiente ideal para o neonato. No entanto, estudos recentes relacionam a permanência na incubadora como um dos fatores de desenvolvimento de surdez em neonatos(6) ou que potencializam os efeitos adversos de outras medidas necessárias ao tratamento. A incubadora funciona parcialmente como barreira para penetração dos sons ambientais, porém, os sons produzidos pelo próprio funcionamento e pelos cuidados executados em relação à criança reverberam na parede dura da cúpula, amplificando o ruído que atinge o neonato(7).

Transformar a UTIN de alta complexidade, geralmente amedrontadora aos pais e hostil aos neonatos, e os profissionais que nela atuam em contexto de cuidado e acolhimento, está relacionado à humanização da assistência(8), que pode ser entendida como processo que considera a singularidade do ser humano, possibilitando a expressão de sua subjetividade. Pressupõe o bom uso dos equipamentos, procedimentos e saberes aliados ao processo de comunicação efetiva, de escuta e diálogo, que potencializem o afeto(9). Assim, se o enfermeiro tem o ambiente como um dos focos do cuidar, será possível criar espaço de trabalho seguro para o desempenho das atividades da equipe de saúde.

Parte-se do pressuposto de que existe relação entre o NPS do interior da incubadora e o do ambiente da UTIN. Assim, conhecendo-se, concomitantemente, o perfil acústico desses dois ambientes, será possível o desenvolvimento de medidas mais especificas para o manejo ambiental do ruído. Avalia-se que este estudo possa contribuir para que os profissionais incorporem a saúde ambiental como um componente essencial do cuidado seguro para o recém-nascido, e que também possa promover a saúde ocupacional para atuação na UTIN.

Este estudo tem o objetivo de identificar o NPS da UTIN e do interior da incubadora de um hospital universitário ligado a uma universidade pública de São Paulo, SP, Brasil.

Métodos

Estudo quantitativo, descritivo, realizado em uma sala de UTIN e no interior das incubadoras de um hospital universitário de São Paulo, SP, Brasil, no período de 24 a 30 de janeiro de 2010.

Essa sala possui capacidade para 4 leitos e área de aproximadamente 23,80m2, pé direito de 3,40m, piso de material vinílico, paredes de alvenaria, teto de concreto e janelas de vidro com telas que permanecem abertas continuamente, expondo o ambiente ao ruído das vias públicas. A sala está situada ao lado do posto de enfermagem, local em que se encontram o telefone, o estoque de medicamentos controlados e onde permanecem funcionários para executarem algumas tarefas. Na extensão do posto de enfermagem, encontra-se o corredor, onde circulam e ficam os profissionais de saúde, alunos e docentes durante discussões clínicas e execução de prescrições médicas. O ambiente é desprovido de ar condicionado. O modelo de todas as incubadoras utilizadas na unidade neonatal é o C186T S, da marca FANEM®.

Na coleta de dados, utilizaram-se simultaneamente 4 dosímetros: três foram destinados ao registro do NPS da UTIN e 1 para a verificação no interior da incubadora. Os 3 dosímetros foram pendurados no centro de três quadrantes da sala, em diferentes alturas: 1,65m, 1,70m e 1,90m, afastados pelo menos 1m das paredes, do piso e do teto, conforme a recomendação brasileira(10). Optou-se por posicioná-los em alturas diferentes, para que os três microfones não ficassem num plano paralelo a qualquer das superfícies da sala, com o objetivo de reduzir a possibilidade da influência de ondas sonoras estacionárias no ambiente.

Para obter o registro do NPS no interior da incubadora, o microfone do dosímetro foi posicionado a aproximadamente 20cm da orelha do bebê(11). Todos os dosímetros utilizados para coletar os dados eram da marca Quest 400.

Para decidir, inicialmente, em qual incubadora se faria a mensuração, identificou-se entre os neonatos da unidade, aquele que apresentava o maior valor do Score for Neonatal Acute Physiology Version II (SNAPII). Adotou-se esse critério, em virtude de esse escore avaliar o risco de mortalidade neonatal(12) . Durante esse período, o dosímetro foi transferido para outra incubadora por duas vezes, em decorrência da necessidade de o recém-nascido sair da UTIN.

Os quatro dosímetros, com capacidade para registrar o NPS minuto a minuto, foram configurados da seguinte forma: tempo de resposta rápida (fast), medindo o nível de pressão sonora em decibel (dB) e a ponderação em frequência A dB(A)(13). A escala A (dBA) é o método de filtragem que mimetiza as características receptivas da orelha humana, sendo indicada para apreensão de ruídos contínuos de nível de pressão sonora equivalente (Leq)(14). Todos os aparelhos foram programados para operar em intervalos de NPS entre 40 e 140 dB(A). Assim, cada nível de ruído medido teve o tempo de duração precisamente registrado e armazenado, fornecendo um conjunto de dados como Leq, Leqmax, Leqmin para tratamento estatístico e análise. O Leq é o nível sonoro médio integrado durante determinado período de tempo. Tal medida é importante por se saber que as lesões à audição humana são provocadas não somente pelo alto nível de ruído, mas também pela duração do mesmo.

Efetuaram-se diariamente as trocas de baterias, registros dos Leq e a calibragem dos quatro dosímetros, com o calibrador QC10, ao final de cada plantão. Os registros de Leq foram obtidos ao se desligar os dosímetros ao final do plantão e ao religá-los no início do outro, em todos os dias da semana.

Foi considerada a possibilidade de mudança de conduta dos profissionais que atuam na UTIN pela presença dos pesquisadores e dos aparelhos. Desse modo, realizou-se a dessensibilização da equipe durante uma semana. Nesse período, o microfone do dosímetro permaneceu posicionado no interior da incubadora, e os três dosímetros foram pendurados ao teto. Simulavam-se a troca de baterias, registros dos Leq e recalibragem ao final de cada plantão.

Na estratégia de coleta de dados, foi previsto que os quatro aparelhos permanecessem ligados, simultaneamente, na UTIN e no interior da incubadora, durante 24 horas, perfazendo o total de 168 horas para cada ambiente, durante uma semana. Perderam-se seis horas de registros na UTIN, em virtude de problema técnico de mensuração em um dos dosímetros. Além disso, antes de proceder à análise dos dados, descartaram-se 30 minutos de registros iniciais e finais de cada plantão, considerando-se a possibilidade de se provocar ruído durante o manuseio dos aparelhos ao calibrá-los e reinstalá-los, influenciando o Leq do período. Essa operação, realizada sequencialmente em cada um dos dosímetros, durava, em média, 30 minutos. Dessa maneira, foram desprezadas 16 horas e 30 minutos de registros. Assim, a amostra constitui-se em 151 horas e 30 minutos de registros dos NPS na UTIN e na incubadora.

Os registros de NPS efetuados pelo dosímetro introduzido no interior da incubadora, e pelos três aparelhos instalados na UTIN, foram transferidos para o programa QuestSuite for Excel, o que possibilitou o tratamento dos dados. Para a análise dos dados, consideraram-se os NPSs contínuos e equivalentes (Leq) e os valores máximos (Leqmax) e mínimos (Leqmin) dos dados registrados por todos os dosímetros durante o período de coleta.. Calculou-se a média espacial entre os valores de Leq obtidos pelos três dosímetros que foram instalados na UTIN, a fim de captar, de maneira realística, o ruído do ambiente vivenciado pelas pessoas de diversas estaturas, que se movimentam dentro da sala para exercer as suas atividades. Além disso, calculou-se também o desvio padrão entre os mesmos, nos diferentes dias e plantões da semana.

Antes do início da coleta de dados, obteve-se a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, e a autorização da direção hospitalar (Processo nº0391/07).

Resultados

Os resultados revelam que os valores de NPS da UTIN e da incubadora estão acima dos recomendados pelos órgãos regulamentadores.

A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) preconiza valores entre 35 e 45 dBA para ambientes hospitalares(10); a Academia Americana de Pediatria (AAP)(15) e Committee to Establish Recommended Standards for Newborn ICU Design(16) recomendam que sejam evitados NPS acima de 45 dBA, e a Organização Mundial da Saúde propõe, da mesma forma, 45 dBA(17).

Quanto ao NPS no interior da incubadora, a ABNT estabelece valores de Leq abaixo de 60,0 dBA(18), e a AAP preconiza valores inferiores a 58,0 dBA, como o nível máximo permitido(15).

Os resultados da mensuração do NPS da UTIN indicam que o maior valor do Leq médio foi 80,4 dBA, no período da tarde de sábado. Por outro lado, o Leq médio mais baixo foi 52,6 dBA, no plantão noturno de segunda-feira (Figura 1). Nesse ambiente, a variação de Leq na semana estudada foi 27,8 dBA.


Obteve-se na UTIN valores de Leqmáx de 105,5 dBA (Figura 2) no plantão de sábado à tarde, e Leqmín de 47,7dBA na noite de segunda-feira (Figura 3).



Nas incubadoras, o maior Leqmédio registrado foi de 79,1 dBA, no plantão noturno de sábado, e o menor foi de 45,4 dBA na noite de segunda-feira (Figura 1). A variação dos Leqmédio foi de 33,7 dBA. O Leqmáx mais elevado registrado foi de 106,0 dBA (Figura 2), no plantão noturno de domingo, e o menor Lmin foi 48,0 dBA, no sábado à noite (Figura 3).

Discussão

O ruído é considerado como um dos importantes fatores de estresse para o neonato e os profissionais da UTIN. Na presente pesquisa, constatou-se que os dois ambientes são bastante ruidosos. Ao avaliar o ambiente acústico pesquisado, há que se considerar que a UTIN e a incubadora funcionam como um sistema. Estudo demonstrou que, de maneira geral, o NPS dentro da incubadora é superior ao da UTIN19). Sons ambientais da UTIN atravessam parcialmente a parede de plexiglass da cúpula da incubadora que, por sua vez, produz seus próprios sons, oriundos do funcionamento do motor, das atividades de cuidado e também das manifestações do próprio neonato(20-21). Por se tratar de ambiente fechado, esses sons reverberam na parede dura da cúpula, amplificando o ruído que atinge o neonato(7). Essa informação é corroborada por estudo realizado em São Paulo, que constatou NPS maior no interior da incubadora com portinhola fechada, do que aberta(21). O estado comportamental do neonato é um dos determinantes importantes do NPS dentro da incubadora. Constatou-se que a agitação do recém-nascido pode elevar o NPS em até 20 dBA(22). Outra variável relacionada ao aumento do NPS no interior da incubadora é o peso do bebê: considerando-se tanto os fatores ambientais como os próprios da incubadora, observa-se que existe relação inversa entre o peso do neonato e o NPS dentro da incubadora; assim, quanto menor o peso da criança, maior será o NPS. A possibilidade de compreensão desse fenômeno é ligada à reverberação e absorção dos sons pelas superfícies relacionadas. A pequena superfície corporal de recém-nascido de muito baixo peso e o tamanho menor das fraldas utilizadas propiciam menor absorção do ruído, favorecendo a reverberação e o aumento do NPS dentro da incubadora(20). No presente estudo, os bebês atendidos em incubadoras nas quais se realizou a verificação do NPS, classificavam-se como prematuros de extremo baixo peso. Por esse motivo, eram submetidos a frequentes intervenções invasivas, o que, consequentemente, aumentava as experiências dolorosas e a agitação psicomotora. Esses fatores podem ter contribuído para elevar o NPS dentro da incubadora.

Com o objetivo de reduzir o ruído no interior das incubadoras, minimizando a reverberação, um estudo avaliou o efeito de um painel de espuma colocado no interior da incubadora, e observou diminuição tanto do ruído de fundo – de 47 dBA para 43 dBA, como do choro do bebê – de 79 dBA para 69 dBA. Do mesmo modo, observaram-se reduções significativas dos ruídos provocados por outras fontes, como os alarmes dos monitores, motor do equipamento e fechamento das portinholas(23). Salienta-se a importância desses resultados, uma vez que, na escala logarítmica de medição de ruído em decibéis, aumento/diminuição de 3 dB significa incremento/diminuição de cerca de 50% no NPS(19).

Ao contrário do descrito acima no presente estudo, o NPS mensurado na UTIN foi maior do que o do interior da incubadora, na maior parte do tempo. Esse resultado está em consonância com os dados de pesquisa que comparou os NPSs aos quais estão expostas as crianças dentro da incubadora e no berço aquecido, e verificou nível mais alto no berço aquecido, entre 62 a 70 dBA, do que na incubadora, cujo NPS variou entre 60 e 67 dBA(24). Credita-se o resultado, em parte, ao critério de seleção da incubadora: foram sempre escolhidas aquelas que abrigavam bebês clinicamente mais críticos, conforme avaliado por SNAP II, portanto, com a indicação de manipulação mínima. Ao mesmo tempo, destinavam-se a eles, sempre que possível, os mais novos e melhores equipamentos de suporte à vida, e incubadoras disponíveis na unidade. Supõe-se que esse fato tenha contribuído para reduzir o NPS dentro das incubadoras pesquisadas, tal como verificado no estudo que constatou redução de até 4 dBA nos NPSs das incubadoras mais novas, comparados aos das mais antigas(22). Além disso, por se tratar de hospital universitário, há sempre a circulação de número elevado de profissionais e alunos nessa unidade. Assim, as discussões clínicas são mais frequentes e, não obstante o esforço empreendido para se realizar tais sessões no corredor, inevitavelmente surgem situações em que há, simultaneamente, diversos grupos de discussão, e alguns não encontram espaços na unidade, a não ser na sala onde se encontra o neonato. Como o ruído provocado pelas vozes e alarmes dos aparelhos exerce mais impacto no ambiente do que na incubadora(21), e considerando-se que os centros dos dois quadrantes nos quais foram instalados os dosímetros situavam-se sobre o espaço de circulação, onde, em situações de necessidade, os profissionais se reúnem para discussões, supõe-se que o NPS por eles captado tenha influenciado mais o ruído ambiental do que o do interior da incubadora.

Aspecto que deve ser sempre lembrado no manejo do ruído na assistência ao neonato, é que, na UTIN, o bebê está exposto tanto a ruídos de impacto, que provocam desorganização no seu estado fisiológico, como também a ruídos contínuos, que não permitem sua recuperação. Especialistas consideram o fenômeno de habituação em neonatos, como a capacidade de diminuir as respostas comportamentais a estímulos repetitivos, o que lhe possibilita menor desgaste energético ou maior capacidade de manter o sono. No entanto, quando os estímulos ambientais são muito fortes e contínuos, a habituação é comprometida, e o bebê responde a tais estímulos até à exaustão(25).

Na UTIN estudada, um dos aspectos cruciais para a redução do NPS refere-se à adequação das condições arquitetônicas e materiais. Nessa unidade, existem alguns fatores que não favorecem a manutenção de nível acústico confortável, tais como: o posto de enfermagem e o espaço para os profissionais de saúde realizar a prescrição e evolução estão situados no corredor, em comunicação direta com a sala, cuja porta é mantida aberta a maior parte do tempo. Não há, também, um local designado para a recepção, externo à UTIN, assim, o ruído da campainha é audível dentro do setor. E o toque do telefone colocado sobre o balcão do corredor potencializa ainda mais o ruído no interior da unidade. Além disso, o hospital é localizado em área de tráfego intenso e, como a UTIN não dispõe de ar condicionado, muitas vezes, suas janelas são mantidas abertas, aumentando a influência do ruído externo.

O manuseio adequado e a redução do tempo de uso dos equipamentos podem também constituir-se em importantes estratégias para a redução do ruído(26). Estudo realizado em 2006 constatou redução do NPS de até 4 dBA em incubadoras novas, comparadas a outras com 6 a 9 anos de uso(21). Neste estudo, as incubadoras têm, em média, 15 anos de uso. Essa situação não difere da realidade da maioria das instituições de saúde brasileiras, em que há a utilização intensiva de seus equipamentos de alta tecnologia, sem a possibilidade de programas de manutenção preventiva.

Conclusões

Tendo verificado que tanto o NPS da UTIN quanto o do interior da incubadora estão acima dos recomendados pelos órgãos reguladores, esforços devem ser desenvolvidos pela instituição e pelos profissionais para reduzir esse nível de ruído, uma vez que os efeitos deletérios estão suficientemente documentados pelas pesquisas realizadas por diversos autores, em diferentes circunstâncias.

O manejo do ruído em UTIN e no interior das incubadoras envolve fatores arquitetônicos, de recursos materiais e humanos. Porém, implementar mudanças que abranjam todos esses aspectos simultaneamente está além das possibilidades de muitas instituições. Entretanto, é preciso lembrar o efeito cascata do ruído: diversos estímulos em interação podem potencializar o NPS, ou seja, quanto mais elevados forem os ruídos dos equipamentos, mais os profissionais elevam seu tom de voz e demoram mais para atender os alarmes. Assim, no raciocínio inverso, pode-se esperar que, quanto mais silenciosa a UTIN mais sensíveis os profissionais se tornarão ao choro e agitação do neonato, e mais prontamente atenderão aos alarmes. Portanto, conclui-se que cada unidade deve iniciar o seu programa de redução, a partir do que a sua realidade permite e, provavelmente, obterá repercussões positivas em outros aspectos.

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  • Corresponding Author:
    Tereza Yoshiko Kakehashi
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Out 2011
    • Data do Fascículo
      Out 2011

    Histórico

    • Recebido
      09 Out 2010
    • Aceito
      10 Ago 2011
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