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Tuberculose, AIDS e coinfecção tuberculose-AIDS em cidade de grande porte

Resumos

Este estudo objetivou analisar as incidências da tuberculose (TB), AIDS e coinfecção TB-AIDS no município de Campinas, SP, Brasil no período de 2001 a 2009. Trata-se de estudo de tendência histórica, em que se utilizaram dados secundários do Banco de Dados em Vigilância da Tuberculose-Unicamp e do Centro de Referência e Treinamento DST-AIDS do Estado de São Paulo. Foram incluídos casos novos de TB, de AIDS e da coinfecção TB-AIDS notificados pelo município de Campinas. Observou-se decréscimo dos casos de TB até 2007, com aumento em 2008 e 2009. Na AIDS ocorreu redução geral a partir de 2007, mas com aumento entre os homens com 60 anos e mais, entre os anos 2007 e 2009. Para a coinfecção TB-AIDS, a tendência foi de redução. A proporção de testes anti-HIV não realizados, entre pacientes com tuberculose, foi elevada (27,5%). Esse cenário revela a necessidade de integração dos bancos de dados nas atividades de planejamento e controle.

Incidência; Tuberculose; HIV


This study aimed to analyze the incidence of tuberculosis (TB), AIDS and tuberculosis-AIDS co-infection in the municipality of Campinas, in the state of São Paulo, Brazil, in the period 2001 - 2009. A historical trend study, it uses secondary data from the Tuberculosis Surveillance Database of the University of Campinas (UNICAMP) and the São Paulo State STD-AIDS Center of Excellence and Training. It included new cases of TB, AIDS, and of tuberculosis-AIDS reported in the municipality of Campinas. A decrease in cases of TB until 2007 was observed, with an increase in 2008 and 2009. There was a general reduction in AIDS from 2007, but with an increase among men aged 60 or over, in the years 2007 to 2009. For tuberculosis-AIDS co-infection, the tendency was to reduce. The proportion of HIV tests not undertaken, among patients with tuberculosis, was high (27.5%). This scenario shows the need for integration of the databanks into the planning and control activities.

Incidence; Tuberculosis; HIV


Esta investigación tuvo como objetivo analizar la incidencia de tuberculosis (TBC), SIDA y el co-infección SIDA-TB en Campinas-SP-Brasil, 2001-2009. Se trata de un estudio de la tendencia histórica con datos de la Base de Datos de Monitoreo de TBC-UNICAMP y del sitio web del Centro de Referencia en SIDA de São Paulo. Se incluyeron los casos nuevos de TBC, SIDA y co-infección SIDA-TBC registrados a cada año en Campinas. Se observó disminución de casos de tuberculosis en 2007, con aumento en 2008-2009. El SIDA se produjo en la reducción global a partir de 2007, pero aumentan entre los hombres mayores de 60 años, en los años 2007-2009. Para la co-infección TB-VIH la tendencia de reducción. La proporción de exámenes VIH no realizados en pacientes con TBC fue alta (27,5%). Este escenario pone de manifiesto la necesidad de integración de las bases de datos de TBC y SIDA para las actividades de planificación y control.

Incidencia; Tuberculosis; VIH


ARTIGO ORIGINAL

IMestranda, Universidade Estadual de Campinas, Brasil

IIPhD, Professor, Universidade Estadual de Campinas, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

Este estudo objetivou analisar as incidências da tuberculose (TB), AIDS e coinfecção TB-AIDS no município de Campinas, SP, Brasil no período de 2001 a 2009. Trata-se de estudo de tendência histórica, em que se utilizaram dados secundários do Banco de Dados em Vigilância da Tuberculose-Unicamp e do Centro de Referência e Treinamento DST-AIDS do Estado de São Paulo. Foram incluídos casos novos de TB, de AIDS e da coinfecção TB-AIDS notificados pelo município de Campinas. Observou-se decréscimo dos casos de TB até 2007, com aumento em 2008 e 2009. Na AIDS ocorreu redução geral a partir de 2007, mas com aumento entre os homens com 60 anos e mais, entre os anos 2007 e 2009. Para a coinfecção TB-AIDS, a tendência foi de redução. A proporção de testes anti-HIV não realizados, entre pacientes com tuberculose, foi elevada (27,5%). Esse cenário revela a necessidade de integração dos bancos de dados nas atividades de planejamento e controle.

Descritores: Incidência; Tuberculose; HIV.

Introdução

No ano 2010, o coeficiente de incidência (CI) da tuberculose (TB), no mundo, foi de 128 por 100 mil habitantes(1). O Brasil, com incidência de 43 por 100 mil em 2010, ocupa a 19ª posição entre os 22 países que notificaram 80% dos casos de TB(1).

O Estado de São Paulo, em 2010, registrou 19.024 casos, sendo 16.406 identificados como novos(2). O município de Campinas apresentou CI de 26,4/100.000 habitantes em 2010(3).

Apesar de avanços tanto na detecção de casos novos como na introdução de medicamentos potentes, e embora tenham sido evitados milhões de óbitos, a incidência da TB não declinou como se esperava(4).

Determinantes biológicos, sociais e ambientais são reconhecidos, de longa data, como fatores de risco para infecção e adoecimento por TB(5). O HIV é um desses fatores, responsável por elevada morbidade e mortalidade e o que apresenta o maior impacto na incidência da TB, modificandosua apresentação clínica, duração do tratamento, resistência medicamentosa e tendência epidemiológica. A pobreza, também, está claramente associada à TB(6-7), subjacente a outros fatores de risco; no entanto, essa relação, muitas vezes, é atenuada em modelos multivariados que incluem determinantes mais proximais(5).

As variações na tendência da TB, da AIDS e da coinfecção TB-AIDS podem ocorrer entre os Estados e municípios brasileiros pelas diferentes características regionais existentes e pelos níveis de atenção e planejamento em saúde(8-9). O município de Campinas, em 2010, ficou entre as cinco cidades do Estado de São Paulo que mais notificaram casos de TB(2) e de AIDS(10).

A realidade atual das duas doenças reforça a necessidade do acompanhamento dos casos notificados, permitindo verificar, também, a magnitude da comorbidade TB-AIDS, com o direcionamento das ações de controle, otimizando os recursos disponíveis.

Considerando a estratégia global de redução da morbimortalidade por TB, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estabeleceu como metas não apenas a detecção de 70% de casos novos e 85% de sucesso de tratamento, mas, também, a implementação de ações com o objetivo de, em 2015, reduzir a prevalência e mortalidade em 50%, comparado a 1990 e, em 2050, eliminar a TB como problema de saúde pública(11-12).

Para atingir as metas, são necessários o acompanhamento e a avaliação das ações, utilizando-se dados locais coletados do sistema de vigilância epidemiológica. Com isso, esse estudo tem como objetivo analisar a incidência dos casos de TB, de AIDS e da coinfecção TB-AIDS no município de Campinas, SP, nos anos de 2001 a 2009.

Métodos

Foi desenvolvido estudo de tendência histórica, com distribuição anual da incidência de TB, de AIDS e de coinfecção TB-AIDS no município de Campinas, SP, no período de 2001 a 2009.

Campinas é município considerado polo industrial e tecnológico do Estado de São Paulo e tem a característica de atrair pacientes de municípios vizinhos em busca de tratamentos de saúde, incluindo doentes com TB e AIDS que, muitas vezes, são diagnosticados na cidade. Em 2010, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), constavam, nesse município, 1.024.912 habitantes.

Foram incluídos os casos novos de TB e de AIDS, de residentes e notificados em Campinas. Foram excluídos aqueles indivíduos que residem em outros municípios e também os pacientes presidiários.

As informações sobre o número de casos de TB e da coinfecção TB-AIDS entre casos novos de TB foram obtidas através do Banco de Dados em Vigilância da TB da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas-FCM-Unicamp, que utiliza notificações oficiais, dados laboratoriais e dados de mortalidade. As notificações foram verificadas no Sistema Nacional de Agravos de Notificação (Sinam) do Ministério da Saúde, nos anos de 2001 a 2006. A partir de 2007, passou a ser utilizado o sistema TB-WEB da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo.

O Banco de Dados em Vigilância da TB é atividade contínua na FCM-Unicamp desde 1993 e as correções e depurações dos registros são realizadas a partir do nome do paciente, do nome da mãe do paciente e da data de nascimento. As fichas de notificação dos casos de TB são acompanhadas semanalmente através do TB-WEB, com a finalidade de evitar a duplicidade de registros, e o preenchimento dos itens de exames complementares é realizado posteriormente, seguindo-se o encerramento do caso. Dos campos referentes às doenças associadas e do resultado de teste HIV, foram extraídas as informações sobre a coinfecção TB-AIDS.

Para a obtenção dos dados da AIDS foi utilizado o site do Centro de Referência e Treinamento (CRT) DST-AIDS do Estado de São Paulo, sendo selecionados os bancos TABNET adulto e TABNET criança para o número de casos de AIDS, em cada ano estudado. Não foi possível a pesquisa direta das fichas de notificação.

Para o estudo das séries históricas da TB, da AIDSe da coinfecção TB-AIDS do município, foram calculados os coeficientes de incidência (CI) para o período de 2001 a 2009. Para cada série, o numerador foi constituído pelos casos novos de TB, AIDS e TB-AIDS, respectivamente, de residentes em Campinas. Os dados populacionais utilizados no denominador do CI foram provenientes do IBGE. Os coeficientes foram padronizados tendo como referência a distribuição etária da população do Censo de 2000.

A tendência dos coeficientes foi representada em tabelas, com intervalos regulares de um ano-calendário e cálculo de médias móveis. A média móvel é um método não paramétrico, que tem a finalidade de suavizar a série quando essa varia em função do tempo. A transformação da série foi feita através das médias móveis de ordem três para torná-la estacionária e com valores suavizados.

O comportamento da tendência de cada série temporal foi, também, verificado pelo método de alisamento LOWESS (Locally-Weighted Regression Scater plot Smoothing), que é uma técnica de ajuste de curvas baseada na regressão ponderada localmente, ou regressão polinomial de primeiro grau (método não paramétrico). Como a série se constituiu em nove anos, número pequeno para o ajuste, as médias móveis foram consideradas mais adequadas que o método LOWESS.

Além da visualização do suavizamento das séries históricas, foi verificada a proporção do número de casos com coinfecção TB-AIDS entre os casos novos notificados com TB. Foi feita a distribuição dos casos de TB e AIDS, segundo sexo e faixa etária e, também, calculadas as proporções de formas clínicas pulmonares e extrapulmonares, segundo a realização do teste anti-HIV entre os pacientes com TB. Devido às limitações no preenchimento da ficha de notificação da TB, não foram estudadas variáveis como escolaridade, ocupação e outras comorbidades, comprometendo a realização de análises multivariadas. Outro instrumento de coleta de dados seria necessário para o estudo de fatores que pudessem alterar a tendência histórica das doenças apresentadas.

Para procedimentos estatísticos, foram utilizadas planilhas eletrônicas e pacote estatístico.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas - Unicamp, sob Parecer n°413/2006 e contou com autorização para a coleta de dados.

Resultados

No período de 2001-2009 foram notificados 2.876 pacientes com TB, 2.619 com AIDS e 512 doentes com a coinfecção TB-AIDS. Observa-se, na Tabela 1, maior CI da TB em 2001, com 39,61/100.000 habitantes, seguido de decréscimo até 2007 e elevação em 2008 e 2009.

Para a AIDS, o maior CI ocorreu no ano 2006, com 40,98/100.000 habitantes e, para os casos coinfectados, foi verificado decréscimo durante o período estudado. A Tabela 1 mostra, também, que a proporção de indivíduos coinfectados entre os casos de TB variou entre 23,1% (em 2002) e 13,8% (em 2009).

A Tabela 2 apresenta os coeficientes padronizados e médias móveis para a TB, AIDS e coinfecção TB-AIDS. Comparando-se os coeficientes bruto e padronizado, foi verificada pequena diferença entre eles.

Entre 2001 e 2009 foram notificados 941 pacientes com TB, do sexo feminino e 1.935 do sexo masculino (Tabela 3). No sexo feminino, as maiores incidências predominaram na faixa etária de 60 anos e mais, enquanto no sexo masculino os maiores CIs foram observados entre 40 e 59 anos. A razão entre os sexos masculino/feminino (M/F) variou de 1,7 em 2005 a 2,3 em 2009 (dados não apresentados em tabela).

Em relação à AIDS, foram notificados 896 casos do sexo feminino e 1.722 do sexo masculino (Tabela 3). A razão de masculinidade, praticamente, não teve variação com 2,4 em 2001 e 2,5 em 2009 (dados não apresentados em tabela). Para ambos os sexos, as maiores incidências foram entre 20 e 39 anos. Nos anos de 2007 a 2009 observou-se aumento na incidência entre homens de 60 anos e mais.

Foram diagnosticados 2.431 pacientes de TB com apresentação pulmonar e 445 extrapulmonares. Foi elevado o número de testes anti-HIV não realizados (Tabela 4).

Discussão

A mudança na frequência das doenças pode ser estudada através de séries históricas e o número de anos depende da disponibilidade de dados. A incidência é o indicador epidemiológico que, na tuberculose, responde mais lentamente às medidas de controle. Segundo a OMS(1), mesmo em países com controle da doença, a incidência não declina mais do que 5-10% ao ano.

A cidade de Campinas, apresentando taxa de incidência de 26,4 por 100.000 habitantes, em 2010(3), está classificada como incidência média(1). A Tabela 1 mostra que no período entre 2001 e 2009 ocorreu diminuição do número de casos e do CI de TB; porém, ainda está distante da categoria de incidência baixa, com menos de 20 casos por 100 mil.

Tanto a TB como a AIDS apresentaram maior número de casos entre o sexo masculino, atingindo, principalmente, a população economicamente ativa. Esses dados são semelhantes aos de outros municípios paulistas(2,10). Entre os homens, as maiores incidências de TB foram na faixa etária de 40-59 anos, seguidas pelos 60 anos e mais. Nas mulheres, as incidências mais elevadas se alternaram entre 20 e 39 anos e 60 anos e mais. A TB no idoso vem se mostrando mais evidente devido ao envelhecimento populacional, ao aumento da expectativa de vida e à melhora da qualidade de vida. Por outro lado, os idosos estão sujeitos a fatores de risco como pobreza, desnutrição, hábito de fumar, que favorecem a reativação do bacilo(13).

Em relação à AIDS, no Estado de São Paulo, a razão entre os casos do sexo masculino e feminino foi de 34:1, em 1985, e apresentou tendência de queda até 1996, com 2:1, mantendo-se estável até 2011(10). Campinas, com razão de 2,5:1, em 2009, seguiu a mesma tendência do Estado, tendo passado por processos importantes como a heterossexualização, interiorização, feminização e a pauperização(14) da epidemia.

A AIDS era pouco difundida entre os Estados brasileiros e adquiriu considerável proporção no país com o passar dos anos, principalmente nas Regiões Sudoeste e Centro-Oeste, com o maior número de casos notificados no Brasil(14-15). Campinas pode ser considerada um espaço representativo do Brasil, em menor escala, e alguns fatores merecem destaque: situa-se perto da cidade de São Paulo, facilitando o acesso tanto a essa metrópole quanto às cidades menores, localizadas no entorno(3); apresenta grande número de favelas e, ao mesmo tempo, é polo financeiro-empresarial, atraindo investimentos. Além disso, a área da saúde recebe incentivos, desenvolve pesquisas e dispõe de dois hospitais-escola. Isso pode explicar a atração dos doentes para realizar o tratamento em Campinas, muitas vezes, omitindo endereço em outras cidades.

Em estudo sobre a feminização e pauperização da AIDS, em Campinas(16), foram observadas diferenças na razão de masculinidade, de forma heterogênea no espaço urbano, maiores no centro e na região norte da cidade e valores menores na periferia, com destaque para a região sudoeste do município. O aumento da incidência da AIDS, entre os homens com 60 anos e mais, nos anos de 2007 a 2009, pode ser atribuído a fatores ligados à sexualidade, como baixa noção de risco, prática de sexo sem uso de preservativos, tratamento da impotência. É possível que, com maior expectativa de vida mais ativa, a sexualidade seja promovida entre os idosos. Também, o impacto da introdução dos antirretrovirais aumentou a prevalência de indivíduos portadores de AIDS.

O conhecimento da presença da coinfecção TB-AIDS é fundamental para o acompanhamento diferenciado dos pacientes, uma vez que envolve menor adesão ao tratamento, resistência às drogas e maior mortalidade(17). Observou-se, neste estudo, declínio no CI e na proporção de coinfectados entre os doentes com TB (de 23,1% em 2001 para 13,8% em 2009), declínio semelhante ao de outros municípios paulistas(18-19). Ressalta-se que a magnitude da associação entre a TB e a AIDS pode não ser aparente, por problemas relacionados à subnotificação dessas doenças, sendo essa estimada em 17,7% para o Brasil(20).

Outro dado que chama a atenção, neste estudo, contribuindo para a subnotificação, é a elevada proporção de testes anti-HIV não realizados (27,5%). Apesar de ter ocorrido, no período avaliado, diminuição dos exames não realizados entre as formas pulmonares da TB (41,5% para 19,5%), o mesmo não foi observado entre as apresentações extrapulmonares. Quanto menor o número de pacientes com TB que realizam o teste de HIV, maior a incerteza sobre a prevalência da coinfecção(20).

Esse exame pode deixar de ser realizado por muitos doentes, provavelmente por medo da aquisição de uma doença estigmatizante como a AIDS, pela falta de informação sobre a importância do teste ou pelas dificuldades que os profissionais de saúde encontram na escolha da melhor abordagem na orientação para o teste anti-HIV e na solicitação desse exame entre doentes com TB. O médico, também, pode estar pouco atento ao resultado do teste anti-HIV de doentes diagnosticados com TB, por sobrecarga de consultas, pela falta de supervisão e de atualizações.

A realização do teste anti-HIV deve estar garantida para todos os que consentirem, mas, também, deve estar assegurado que os resultados sejam inseridos nos sistemas de informação, logo que disponíveis(20).

Merece destaque a importância da avaliação de dados secundários como os utilizados neste estudo, preenchidos por diferentes profissionais com conhecimentos distintos sobre as doenças e provenientes de locais diferentes, com a finalidade de melhorar a qualidade dos dados e implementar intervenções(21), paralelamente à organização e manutenção de um sistema de vigilância ágil e resolutivo, capaz de fornecer dados fundamentais às ações preventivas e, ao mesmo tempo, importante para a avaliação da situação e tendência da coinfecção(22). Em 2004, 26% dos municípios brasileiros não notificaram casos de TB, sendo que 1% tinha população igual ou superior a 20.000 habitantes(23).

Uma das limitações deste estudo foi o pequeno número de anos das séries. Com exceção da coinfecção TB-AIDS, a partir de 2004, com tendência à estabilização, não foram detectadas alterações relevantes. No período estudado, não se observaram fatores para possíveis modificações, como mudanças nos critérios de diagnóstico ou no tratamento. Na AIDS, a queda na letalidade já havia sido verificada após a introdução da highly active antirretroviral therapy (HAART), no final de 1996(17). Fatores ligados à notificação dos pacientes poderiam explicar as flutuações observadas nas séries estudadas.

Considerações finais

O estudo das séries, utilizando-se dados secundários, retratou a tendência do número de casos notificados, bem como o perfil epidemiológico da TB, da AIDS e da coinfecção TB-AIDS, permitindo detectar decréscimo dos casos de TB até 2007, com aumento em 2008 e 2009. Na AIDS, ocorreu redução geral a partir de 2007, mas com aumento entre os homens com 60 anos e mais, nos anos de 2007 a 2009. Para a coinfecção TB-AIDS, a tendência foi de redução. Esse cenário revela a necessidade de integração das informações tanto na TB e na AIDS, com preenchimento minucioso dos registros para a comorbidade TB-AIDS, como na capacitação que estimule o sucesso na comunicação dos diferentes profissionais envolvidos, como subsídio para as ações de planejamento e controle.

Perante a elevada proporção de testes anti-HIV não realizados (27,5%), entre pacientes com tuberculose, devem ser enfatizadas a importância da solicitação do teste e a garantia de que os resultados sejam inseridos nos sistemas de informação. Ressalta-se que o enfermeiro possui papel essencial para o desenvolvimento e a concretização desse objetivo, quando realiza uma vigilância adequada dos casos notificados, na orientação dos agentes de saúde, buscando maior efetividade na busca de casos e do tratamento diretamente supervisionado, além de maior efetividade, também, na investigação de contatos entre os familiares.

A interface de ações relacionadas à TB e à AIDS se dá no plano técnico e no político. Os dados deste estudo podem reforçar a necessidade do conhecimento das especificidades relacionadas a cada região, com monitoramento em nível local, pelo sistema de vigilância da tuberculose e da AIDS, contribuindo para uma visão que complete a compreensão do panorama nacional relativo à coinfecção TB-AIDS.

Agradecimentos

Agradecemos a Coordenação do programa estadual de TB pelo fornecimento do TB-WEB para pesquisa direta das fichas de notificação. Ao projeto International Clinical, Operational and Health Services Research training awards for Aids and Tuberculosis (ICOHRTA) - Brasil e John's Hopkins University pelo incentivo à pesquisa e oferecimento de cursos na área de tuberculose.

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  • Tuberculose, AIDS e coinfecção tuberculose-AIDS em cidade de grande porte

    Nanci MIchele SaitaI; Helenice Bosco de OliveiraII
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Ago 2012
    • Data do Fascículo
      Ago 2012

    Histórico

    • Recebido
      22 Nov 2011
    • Aceito
      03 Ago 2012
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