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Gerenciamento de resíduos em unidades não hospitalares de urgência e emergência

Resumos

OBJETIVO: analisar o gerenciamento de resíduos nos serviços de saúde, em unidades não hospitalares de atendimento às urgências e emergências. MÉTODO: estudo epidemiológico, transversal, realizado em três unidades não hospitalares de atendimento às urgências e emergências. Os dados foram coletados por meio de observação sistematizada e registrados diariamente em planilha e checklist e analisados por meio de estatística descritiva. RESULTADOS: a geração de resíduos variou de 0,087 a 0,138kg/usuário/dia. O manejo de resíduos apontou inadequações em todas as etapas, principalmente na segregação. Encontraram-se resíduos infectantes adicionados aos comuns, inviabilizando a reciclagem, bem como perfurocortantes misturados aos diferentes grupos, aumentando o risco de acidente ocupacional. CONCLUSÃO: o estudo revela a inexistência de política institucional de gerenciamento de resíduos, evidenciada por falhas nas etapas operacionais que envolvem problemas de gestão, estrutura física, recursos materiais e humanos das unidades. Apresenta relevância para os estabelecimentos de saúde no que tange à qualidade do atendimento ao usuário e à sua interface com a sustentabilidade.

Resíduos de Serviços de Saúde; Gerenciamento de Resíduos; Enfermagem


OBJECTIVE: to analyze waste management in urgency and emergency non-hospital health care service units. METHOD: Epidemiological cross-sectional study undertaken at three Non-Hospital Emergency Units. The data were collected using systematic observation, registered daily in a spreadsheet and checklist, and analyzed through descriptive statistics. RESULTS: the generation of waste varied from 0.087 to 0.138 kg per patient per day. Waste management showed inadequacies in all stages, especially in the separation stage. Infectious waste was found together with common waste, preventing recycling, and piercing and cutting objects were mixed with waste from different groups, increasing the risk of occupational accidents. CONCLUSION: the study reveals the lack of an institutional waste management policy, as demonstrated by the failure of operational stages, involving problems related to management, physical structure, material and human resources at the units. This is relevant for health care units, considering the quality of patient care and its interface with sustainability.

Medical Waste; Waste Management; Nursing


OBJETIVO: analizar la gestión de los residuos en unidades hospitalarias de emergencias y urgencias. MÉTODO: estudio epidemiológico. Los datos fueron recolectados por observación sistemática, registrados diariamente en una hoja de cálculo y check list y analizados mediante estadística descriptiva. RESULTADOS: la generación de residuos varió desde 0,087 hasta 0,138 kg / usuario / día. La gestión de los residuos mostró deficiencias en todas las etapas, especialmente en la segregación. Fueron encontrados residuos infecciosos añadidos a los comunes, invalidando el reciclaje, así como materiales punzantes y cortantes mezclados con los diferentes grupos, amentando el riesgo de accidentes de trabajo. CONCLUSIÓN: el estudio revela la ausencia de una política institucional para la gestión de los residuos, como lo demuestran las fallas en las medidas operacionales, que implican problemas de gestión, estructura física, recursos materiales y humanos de las unidades. Muestra relevancia para los servicios de salud en lo que se refiere a la calidad del servicio para el usuario y su interfaz con la sostenibilidad.

Residuos de Servicios de Salud; Gestión de Residuos; Enfermería


ARTIGO ORIGINAL

Gerenciamento de resíduos em unidades não hospitalares de urgência e emergência

Milca Severino PereiraI; Sergiane Bisinoto AlvesII; Adenicia Custódia Silva e SouzaIII; Anaclara Ferreira Veiga TippleIV; Fabiana Ribeiro de RezendeV; Érika Goulart RodriguesVI

IPhD, Professor Adjunto, Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Brasil

IIDoutoranda, Faculdade de Enfermagem, Universidade Federal de Goiás, Brasil

IIIPhD, Professor Adjunto, Pontifica Universidade Católica de Goiás, Brasil. Professor voluntário, Faculdade de Enfermagem, Universidade Federal de Goiás, Brasil

IVPhD, Professor Associado, Faculdade de Enfermagem, Universidade Federal de Goiás, Brasil

VAluna do curso de Graduação, Faculdade de Enfermagem, Universidade Federal de Goiás, Brasil

VIMestranda, Faculdade de Enfermagem, Universidade Federal de Goiás, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: analisar o gerenciamento de resíduos nos serviços de saúde, em unidades não hospitalares de atendimento às urgências e emergências.

MÉTODO: estudo epidemiológico, transversal, realizado em três unidades não hospitalares de atendimento às urgências e emergências. Os dados foram coletados por meio de observação sistematizada e registrados diariamente em planilha e checklist e analisados por meio de estatística descritiva.

RESULTADOS: a geração de resíduos variou de 0,087 a 0,138kg/usuário/dia. O manejo de resíduos apontou inadequações em todas as etapas, principalmente na segregação. Encontraram-se resíduos infectantes adicionados aos comuns, inviabilizando a reciclagem, bem como perfurocortantes misturados aos diferentes grupos, aumentando o risco de acidente ocupacional.

CONCLUSÃO: o estudo revela a inexistência de política institucional de gerenciamento de resíduos, evidenciada por falhas nas etapas operacionais que envolvem problemas de gestão, estrutura física, recursos materiais e humanos das unidades. Apresenta relevância para os estabelecimentos de saúde no que tange à qualidade do atendimento ao usuário e à sua interface com a sustentabilidade.

Descritores: Resíduos de Serviços de Saúde; Gerenciamento de Resíduos; Enfermagem.

RESUMEN

OBJETIVO: analizar la gestión de los residuos en unidades hospitalarias de emergencias y urgencias.

MÉTODO: estudio epidemiológico. Los datos fueron recolectados por observación sistemática, registrados diariamente en una hoja de cálculo y check list y analizados mediante estadística descriptiva.

RESULTADOS: la generación de residuos varió desde 0,087 hasta 0,138 kg / usuario / día. La gestión de los residuos mostró deficiencias en todas las etapas, especialmente en la segregación. Fueron encontrados residuos infecciosos añadidos a los comunes, invalidando el reciclaje, así como materiales punzantes y cortantes mezclados con los diferentes grupos, amentando el riesgo de accidentes de trabajo.

CONCLUSIÓN: el estudio revela la ausencia de una política institucional para la gestión de los residuos, como lo demuestran las fallas en las medidas operacionales, que implican problemas de gestión, estructura física, recursos materiales y humanos de las unidades. Muestra relevancia para los servicios de salud en lo que se refiere a la calidad del servicio para el usuario y su interfaz con la sostenibilidad.

Descriptores: Residuos de Servicios de Salud; Gestión de Residuos; Enfermería.

Introdução

A preocupação com os resíduos gerados pelas diversas atividades humanas é recente, em especial os advindos dos serviços de saúde. As Resoluções nº306 da Agência Nacional do Meio Ambiente – Anvisa, de 2004(1) e nº358 do Conselho Nacional do Meio Ambiente – Conama, de 2005(2), representaram um marco, visto que estabeleceram a harmonização entre os órgãos regulatórios a respeito dos resíduos de serviços de saúde (RSS) e transferiram a responsabilidade do manejo para os geradores.

A publicação da Lei Federal nº12.305 de 2 de agosto de 2010(3), que instituiu a política nacional de resíduos sólidos, significa outro avanço na busca da adoção de procedimentos apropriados. Estabeleceu a obrigatoriedade de estados e municípios elaborarem seus planos de gerenciamento, por meio dos quais se otimizará a gestão em duas esferas, o que poderá desencadear impactos ecoambientais, socioeconômicos e ocupacionais.

Resíduos de serviços de saúde consistem em resíduos gerados em todas as atividades relacionadas ao atendimento à saúde humana ou animal, inclusive na assistência domiciliar e de trabalhos de campo. São classificados em cinco grupos: A - infectantes, B - químicos, C - radioativos, D - comuns e E - perfurocortantes(1-2).

As Resoluções preconizam todas as etapas do manejo, desde a segregação até a disposição final, com vistas à proteção profissional e ambiental(4-5). Contudo, as unidades não hospitalares de urgência e emergência ainda apresentam pouca preocupação com essas questões, a despeito da sua responsabilidade com o gerenciamento dos seus resíduos.

Existe a preocupação de autoridades internacionais com a questão dos diferentes resíduos gerados pela comunidade e, não somente, com os resíduos gerados pelos serviços de saúde(6). Outro desafio encontrado diz respeito ao meio ambiente, com especial destaque às normas de regulação e destino final, nos diferentes países(7).

Esse assunto representa um problema crítico, pois constitui ameaça direta para a saúde humana, bem como, para o meio ambiente(8). Um quarto dos resíduos produzidos pelos serviços de saúde é considerado perigoso, com potencial de risco para os trabalhadores da saúde e para a comunidade(9).

Considerando o impacto dos RSS no ecossistema e seu significado epidemiológico no contexto da saúde pública, questiona-se: como esse assunto é tratado nesses serviços? Existe uma política institucional sistematizada para o seu gerenciamento?

A questão dos RSS é de uma relevância inquestionável tanto nos contextos da segurança dos profissionais de saúde e da preservação e conservação do meio ambiente como no âmbito da construção de novos paradigmas de atenção à saúde.

Por essa razão, objetivou-se, neste estudo, analisar o gerenciamento de resíduos gerados nas unidades não hospitalares de atendimento às urgências e emergências.

Método

Este é um estudo epidemiológico, transversal, realizado em três unidades não hospitalares de atendimento às urgências e emergências, denominadas de centros de atenção integral à saúde, de uma região administrativa do município de Goiânia. Essas unidades estão aptas a prestar atendimento resolutivo aos pacientes acometidos por quadros agudos ou crônicos agudizados. Apresentam suporte ininterrupto de laboratório de patologia clínica de urgência, de radiologia, de equipamentos para a atenção às urgências, de dispensação de medicamentos e leitos de observação em um período de 6 a 24 horas.

Os dados foram coletados no período de março a abril de 2010, por meio de observação sistematizada do manejo dos resíduos e quantificação. O local e horário para a sua pesagem foram pactuados com os gerentes e a coleta de dados, em cada unidade, ocorreu em sete dias consecutivos, nos períodos matutino e vespertino, durante quatro horas, em cada turno, contemplando todos os turnos, seja diurno ou noturno. Para essa etapa, contou-se com o apoio de dez auxiliares de pesquisa, do Núcleo de Pesquisa de Enfermagem em Prevenção e Controle de Infecção Relacionada à Assistência à Saúde-NEPIH/UFG.

Para a quantificação, realizou-se a pesagem em uma balança eletrônica, com capacidade máxima de 30kg e mínima de 5g, registrada no Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial –(Inmetro). Antes de cada pesagem, verificou-se o nivelamento da balança com o nível de carpinteiro, conforme orientação do fabricante.

Os sacos foram recolhidos do abrigo temporário e transportados até o ambiente da pesagem, previamente preparado com a balança e os recipientes para os diferentes resíduos. Cada um foi pesado duas vezes: primeiro, da forma como estavam dispostos para a coleta pública, considerando-se a cor do saco, para classificar o conteúdo como infectante ou não. Em seguida, foram abertos, sendo realizada a segregação conforme legislação brasileira(1) e feita a nova pesagem.

As anotações, levando-se em consideração o peso e a segregação por grupo, foram registradas em uma planilha, e em um checklist, diariamente. Utilizou-se um diário de campo para o registro das informações referentes ao fluxo dinâmico do gerenciamento.

Com vistas à proteção dos pesquisadores, foi adotado, para a coleta de dados, um protocolo padronizado acerca das medidas de seguridade ocupacional, amplamente discutido com os auxiliares de pesquisa. Todos entraram em campo devidamente paramentados, conforme recomendação do Ministério do Trabalho(10). Para a separação, foi utilizada uma pinça do tipo Cheron.

Os resíduos químicos e radioativos não foram incluídos no estudo. Os radioativos, por não serem gerados nas unidades estudadas, e os químicos pela dificuldade de quantificar, em virtude das diferentes formas de descarte, algumas pelo sistema de esgoto, outras por armazenamento sob selo d'água, outras por encaminhamento nas embalagens originais para unidades centralizadas.

Os dados foram processados no programa SPSS – Statistical Package for the Social Sciences e agrupados em tabelas, com uso da estatística descritiva, com cálculo da média de geração diária por unidade e por usuário/dia.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás, sob Protocolo nº029/09. O estudo foi autorizado pela Secretaria Municipal de Saúde do município de Goiânia, GO.

Resultados

As unidades I, II e III geraram, em média, 90,0kg, 78,0 kg e 40,1 kg de resíduos por dia, respectivamente. A Tabela 1 apresenta a geração diária por grupo em cada unidade.

Os setores que mais geraram resíduos do grupo A foram a sala de curativo, os serviços de odontologia e o posto de enfermagem. Entre eles, prevaleceram: coberturas de curativos, sondas, ataduras e gazes com grande quantidade de sangue, escovas ginecológicas, espéculos e espátulas de Ayres, sugadores odontológicos e dentes, entre outros. Observou-se a presença do grupo A em locais nos quais esses não são gerados, tais como copa e área externa.

Os resíduos de maior geração nas unidades pertencem ao grupo D, como: invólucros de materiais, frascos de soro, caixas de papelão, copos, papéis-toalha e restos de alimentos.

A Tabela 2 mostra as incongruências encontradas no gerenciamento, em especial na etapa da segregação. Mais de 80% dos resíduos do grupo D poderiam ser reciclados. Entretanto, em todas as unidades houve presença dos grupos A e E acondicionados junto aos do grupo D. Apenas uma unidade separava os papelões e galões plásticos para a reciclagem.

Em uma das unidades, no período de coleta de dados, as pesquisadoras presenciaram um acidente com perfuração por agulha oca na perna de um trabalhador da limpeza, ao coletar os resíduos comuns, onde deveriam existir apenas os do grupo D.

As três unidades acondicionaram por dia, junto ao grupo A, em sacos plásticos da cor branco leitoso, 0,654kg de resíduos perfurocortantes. Entre esses, agulhas, lâminas de bisturi e ampolas de vidro.

Tabela 3

A maioria das unidades (66,7%) possuía sacos identificados para resíduos infectantes, entretanto, apenas 33,3% identificavam os recipientes de acondicionamento.

A coleta e o transporte interno, em 100% das vezes, foram realizados em horários preeestabelecidos e, em todas essas ocasiões, os do grupo A e D foram recolhidos no mesmo momento. Em todas as unidades, havia o esvaziamento e reaproveitamento de sacos que acondicionam os resíduos do grupo D. Nenhuma unidade possuía local específico para o abrigo temporário.

Duas unidades possuíam ambiente exclusivo para o armazenamento externo. Em ambas, existiam local específico para os do grupo A e E e outro para os do grupo D. Apenas um abrigo foi identificado, além disso, 100% não eram de acesso restrito aos funcionários e permaneciam abertos.

Um abrigo era de alvenaria, possuía piso lavável e tinha rotina de descontaminação. Contudo, os sacos estavam dispostos diretamente no chão. Quanto ao outro, sua construção não obedecia aos parâmetros previstos na legislação e possuía apenas uma estrutura de grade e telhado; os resíduos estavam dispostos em containers e sem rotina de descontaminação. Em outra unidade, estavam depositados em containers, um para os do grupo A e E, outro para os do grupo D, todos sem tampa. Eram depositados em locais com acesso facilitado aos veículos coletores, mas, também, à população.

Em nenhuma unidade foi realizado qualquer tratamento prévio para os resíduos que dele necessitassem. A coleta externa era realizada três vezes por semana e separada para os dos grupos D e A/E.

Discussão

Não se identificou estudo sobre a geração de resíduos em unidades não hospitalares de atendimento às urgências e emergências, entretanto, diversas publicações acerca das hospitalares foram encontradas(11-12).

Encontrou-se que as três unidades produzem 208,189kg de resíduos por dia. Embora não tenha sido possível comparar os resultados aqui encontrados com achados de outras pesquisas, por não utilizarem a mesma unidade de medida e por apresentarem características de atendimento diferentes, uma investigação realizada em unidades básicas de saúde mostrou média de geração de 270 litros de resíduos por dia, e nenhuma possuía um plano de gerenciamento(13).

De acordo com a legislação brasileira(1), é obrigatória a segregação dos resíduos na fonte e no momento da geração, conforme suas características, para fins de redução do volume a ser tratado e disposto na destinação final, garantindo a proteção à saúde e ao meio ambiente.

Os dados revelam que apenas uma parcela dos resíduos gerados é potencialmente infectante, ou seja, 22,267kg/dia nas três unidades não hospitalares, o que representa 10,7% de infectante. Contudo, se a segregação não for adequada, no momento da geração, todos os que estiverem misturados ao grupo A deverão ser tratados como potencialmente infectantes, exigindo procedimentos especiais para o acondicionamento, a coleta, o transporte e a disposição final e, consequentemente, elevando os custos do tratamento(14-15). A segregação mostrou-se como o ponto fundamental de todo o manejo dos RSS e interferiu diretamente nas etapas subsequentes, na reciclagem, na segurança ocupacional e no meio ambiente.

Na área hospitalar, o processo de segregação também é inadequado, revelando a necessidade premente de instituir plano de gerenciamento e treinamento para os profissionais(15) .

Neste estudo, as unidades de saúde não realizaram segregação adequada. Encontraram-se perfurocortantes (grupo E) e lixo comum (grupo D) segregados como infectante (grupo A), em saco plástico branco leitoso. Isso significou que, em uma semana, nas três unidades, contaminaram-se desnecessariamente 361,802kg de resíduos comuns, os quais foram encaminhados para tratamento, aumentando o custo e os danos para o meio ambiente.

Estudo detectou que 98,8% dos profissionais da saúde possuíam conhecimento da importância do manejo dos resíduos provenientes da assistência, porém, 76,4% não sabiam os códigos de cores usados na segregação(9).

Em um serviço de odontologia, 75% dos cirurgiões-dentistas entrevistados tinham conhecimento acerca do gerenciamento de resíduos, mas apenas 67% seguiam as regras no seu exercício profissional, e o principal motivo de preocupação em um consultório odontológico era o manejo do mercúrio(8).

Neste estudo, 3,8 % de resíduos infectantes (A) e 0,6% de perfurocortantes (E) foram segregados por dia, erroneamente, como resíduo comum (D), tendo esses contaminado os comuns que, ao serem encaminhados para coleta pública, não receberam nenhum tratamento, refletindo em danos ao meio ambiente e riscos aos catadores e aos trabalhadores.

Em serviços de saúde, 21,05% dos estabelecimentos não realizavam segregação e 26,34% não padronizavam os sacos plásticos para o acondicionamento(12).

Destaca-se, ainda, a presença do grupo A em locais em que estes não são gerados, como copa e setores administrativos. Provavelmente esses resíduos não foram descartados logo após a sua geração, contrariando as recomendações vigentes(1-2).

Os resultados encontrados, principalmente em relação à presença de perfurocortantes acondicionados em sacos sem qualquer proteção, revelam que os profissionais das unidades estudadas não incorporaram, em sua prática, a segregação adequada. O descumprimento dessa importante etapa do manejo de resíduos expõe a riscos a segurança tanto de quem segrega como da equipe de saúde, dos usuários e acompanhantes, dos trabalhadores da coleta pública, dos catadores e do meio ambiente.

As principais causas de acidentes com perfurocortantes com presença de material biológico estão associadas ao seu descarte em locais inapropriados(6,16-17), sendo o gerenciamento correto de RSS uma questão de biossegurança(14,18). Contudo, os profissionais da atenção primária consideram que o risco de infecção à exposição pelo HIV no cotidiano do trabalho é baixo(19).

Essa situação pode ser comprovada pelo acidente com perfurocortante com exposição ao material biológico, ocorrido com o trabalhador da limpeza durante o período deste estudo, ao coletar resíduo comum da copa. Na ocasião, o funcionário estava corretamente paramentado, mas devido ao erro na segregação, ocorreu o acidente de trabalho.

Os fatores de risco para soroconversão pelo HIV(20-21) estão mais relacionados ao tipo de acidente, dispositivos envolvidos, locais de uso desses dispositivos, estado sorológico do paciente-fonte, do que propriamente com o local de trabalho do acidentado.

Verificou-se que, em uma semana, as três unidades poderiam ter encaminhado para a reciclagem 639,329kg de resíduos comuns. Essa atitude diminuiria os danos ao meio ambiente, além de preservá-lo pela redução da extração de nova matéria-prima e, ainda, geraria renda.

Atividades de educação para a saúde possibilitam, significativamente, o conhecimento sobre o manejo de resíduos sólidos com melhores práticas em termos de gerenciamento e reciclagem(22). Princípios como ecoeficiência devem ser trabalhados entre os profissionais de saúde.

A geração por usuário/dia nas unidades pesquisadas variou de 0,087 a 0,138kg/usuário/dia. Não foram encontrados estudos que analisassem a geração usuário/dia de resíduos em unidades de atendimento às urgências e emergências, para que pudessem ser comparados aos dados deste estudo.

Em relação às demais etapas do manejo, a identificação é tão importante para os sacos quanto para os recipientes de acondicionamento. Deve estar afixada em local de fácil visualização e com a relação dos resíduos que ali devem ser descartados. O não cumprimento dessa etapa compromete o gerenciamento.

Apenas os recipientes destinados ao descarte de perfurocortantes estavam identificados em todas as unidades, fato relacionado não apenas à obrigatoriedade de uso, mas, também, à padronização desse recipiente de descarte pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

O transporte interno, nas unidades, ocorreu em carrinhos, como recomenda a Resolução(1). Entretanto, todos os do grupo D eram recolhidos simultaneamente com os do grupo A e E, contrariando a legislação(1).

Em apenas uma unidade o abrigo externo foi construído de forma a atender as normas(1), contudo, os resíduos estavam dispostos diretamente no solo e o local não permanecia trancado. Os demais ficavam em áreas facilitadas para a coleta externa e para a população.

O armazenamento externo inadequado expõe a riscos toda a população, principalmente os indivíduos que procuram meios de sobrevivência no lixo, pois é frequente, em uma das unidades, pessoas revirando o container destinado aos resíduos comuns, a fim de encontrarem algo que possa ser reciclado e funcione como fonte de renda. Além disso, resíduos dispostos em locais inapropriados favorecem o aparecimento de roedores, vetores e animais.

O manejo inadequado nas unidades estudadas dava-se por falhas de gestão e de infraestrutura, evidenciadas pelo uso de saco branco leitoso e lixeiras não identificadas, falta de armazenamento interno e abrigos externos inadequados.

Percebeu-se que as falhas no gerenciamento dos resíduos, muitas vezes, acontecem pelo desconhecimento dos profissionais, sejam os trabalhadores da saúde, sejam os do serviço de higiene e limpeza, em relação a essa temática. Algumas vezes, ao abrir o saco branco leitoso encontraram-se apenas resíduos de banheiro e, também, observou-se o seu uso em lixeiras do corredor, sinalizando que o saco também é colocado em locais inadequados. Essas condutas indicam negligência por parte dos profissionais e da gerência da unidade.

Os problemas relacionados ao manejo incorreto são complexos, exigindo não apenas posicionamento consciente, mas, sobretudo, disponibilidade para colaborar na sua resolução(23). Essa disponibilidade deve ser dos gestores dos serviços, dos trabalhadores, das instituições de ensino, dos órgãos normalizadores e da vontade política dos estados e municípios.

A preocupação com o grupo B é ainda muito incipiente. Os profissionais desconhecem o destino do mercúrio e seus derivados. Desinfetantes e reveladores são desprezados no ambiente, sem qualquer tratamento. Outros estudos devem ser realizados para caracterizar o seu manejo nas unidades não hospitalares.

Como limitação deste estudo, pontua-se o fato de não quantificar os resíduos químicos (grupo B), tanto os desprezados no sistema de esgoto quanto as sobras dos frascos de medicamentos.

Conclusão

As unidades geram um total de 208,189kg de resíduos por dia, sendo 80,6% comuns, dos quais 67,1% são desprezados junto aos infectantes, inviabilizando a possibilidade de reciclagem. A geração por usuário/dia variou de 0,087 a 0,138kg.

A análise do gerenciamento de resíduos gerados nas unidades não hospitalares de atendimento às urgências e emergências do município de Goiânia, GO, apontou falhas em todas as etapas operacionais, na estrutura física, na gestão e nos recursos materiais e revela a inexistência de política institucional. A segregação, considerada a fase mais importante do manejo, foi a que apresentou maior falha, comprometendo as etapas subsequentes e aumentando custos e riscos.

O conhecimento dessa realidade representa a etapa inicial para a elaboração do plano de gerenciamento. Possibilita desde o planejamento e readequação da estrutura física e de recursos materiais e humanos até o levantamento dos pontos críticos a serem trabalhados na educação permanente. A elaboração do plano de gerenciamento de resíduos de serviços de saúde (PGRSS), como proposto pela legislação aliada à educação permanente dos profissionais, representa um avanço para a solução dos problemas identificados.

Este estudo poderá despertar maior interesse sobre a magnitude do problema e estimular a adoção de esforços para a implantação de medidas sistemáticas de controle, para minimizar os agravos à saúde e ao meio ambiente.

A enfermagem, como grande geradora e segregadora de resíduos, tem papel fundamental na elaboração do plano de gerenciamento. Esse deve ser discutido de forma ampla e interdisciplinar e refletir a postura crítica, ecológica e comprometida dos profissionais, englobando a ética social e a responsabilidade ecoambiental.

O mais importante destaque para a pesquisa realizada se refere ao seu significado para os estabelecimentos de atenção à saúde, no que tange à qualidade do atendimento ao usuário e à sua interface com a sustentabilidade. De forma contundente, fundamentada nos dados e na literatura, existe negligência nos procedimentos atinentes à preocupação com o impacto no meio ambiente e suas consequências para a sociedade. A enfermagem pode e deve dar a sua contribuição.

Referencias

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    Manejo de residuos en las unidades no hospitalarias de urgencia y emergencia
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Mar 2013
    • Data do Fascículo
      Fev 2013

    Histórico

    • Recebido
      26 Ago 2012
    • Aceito
      10 Out 2012
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